Não podemos deixar de mencionar a discussão sobre a possibilidade de a pessoa jurídica ser considerada sujeito ativo de práticas criminosas.
Para adequada ponderação dos argumentos favoráveis e contrários, se faz necessário rememorar a natureza jurídica destes entes.
Teoria da ficção jurídica - Para a referida teoria, idealizada por Savigny, a pessoa jurídica não possui existência real, assim inexistindo nela vontade própria. Desta forma, seria impossível a prática de crime por um ente fictício.
Teoria da realidade (personalidade real) - Esta teoria defende ser a pessoa jurídica um ente autônomo e distinto de seus membros, possuidor de vontade própria. Portanto, é sujeito de direitos e obrigações, assim como as pessoas físicas. É a teoria prevalente.
Em linhas gerais, adotando-se a teoria da ficção jurídica, resta impossível a prática de condutas criminosas por pessoas jurídicas. De outro lado, elegendo-se a teoria da realidade, é admissível questionar a possibilidade de imputação de crimes às pessoas jurídicas.
Entre ambas as correntes, podemos elencar inúmeros argumentos, dos quais destacamos os de maior relevância.
1) Principais argumentos pela impossibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito ativo de crime:
a) A pessoa jurídica não tem vontade própria, não sendo assim possível configurar o dolo e a culpa (culpabilidade);
b) A Constituição Federal não autoriza expressamente a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, sendo à estas reservadas as sanções civis e administrativas;
c) Não é possível aplicar pena privativa de liberdade às pessoas jurídicas. A referida modalidade de pena constitui medida central entre as punições previstas pelo direito penal. Para aplicação de qualquer outro tipo de sanção, mostra-se suficiente o direito administrativo ou civil;
d) A aplicação de pena à pessoa jurídica alcançaria todos os sócios, inclusive eventual sócio inocente, violando o princípio constitucional da personalidade da pena.
LEITURA COMPLEMENTAR:
"Teoria da ficção: Idealizada por Savigny, essa teoria, segundo o artigo (Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: Fundamentos e Implicações) de Regis Prado:
"[...] afirma que as pessoas jurídicas têm existência fictícia, irreal ou de pura abstração - devido a um privilégio lícito da autoridade soberana -, sendo, portanto, incapazes de delinquir (carecem de vontade e de ação).".
Segundo essa teoria, o direito penal considera somente o ser humano, dotado de liberdade, sensibilidade e inteligência como sujeito ativo de delito. Sendo assim, a pessoa jurídica analisada isoladamente de seus representantes é incapaz de receber sanções da esfera penal, ou seja, a pessoa jurídica é apenas uma entidade fictícia e não importa para a punição se o delito cometido foi de interesse ou não da corporação.
Teoria da realidade: Esta teoria, pensada por Otto Gierke, contrapõe-se à teoria acima. Segundo o artigo de responsabilidade penal de pessoas jurídicas do autor Regis Prado:
"A pessoa moral não é um ser artificial, criado pelo Estado, mas sim um ente real (vivo e ativo), independente dos indivíduos que a compõem. Do mesmo modo que uma pessoa física, 'atua como o indivíduo, ainda que mediante procedimentos diferentes, e pode, por conseguinte, atuar mal, delinquir e ser punida'. A pessoa coletiva tem uma personalidade real, dotada de vontade própria, com capacidade de agir e de praticar ilícitos penais."(...)."
JURISPRUDÊNCIA:
QUEIXA CRIME. INJURIA. CALUNIA E DIFAMAÇÃO. ARTS. 138, 139 E 140 DO CP. PESSOA JURÍDICA. ILEGITIMIDADE. REJEIÇÃO DA QUEIXA-CRIME. ART. 44 DO CPP. DECADÊNCIA. DECISÃO MANTIDA. 1- À exceção dos crimes contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular, cuja previsão encontra-se no art. 173, § 5º, da Constituição Federal, bem como dos crimes contra o meio ambiente, de que trata a Lei 9.605/98, a pessoa jurídica é parte ilegítima para figurar no polo passivo de ação penal. 2- Tratando-se de queixa-crime, necessária procuração com poderes especiais, na qual deve constar a descrição sucinta do fato criminoso, uma vez que a finalidade do art. 44 do CPP é a fixação da responsabilidade penal por denunciação caluniosa no exercício do direito personalíssimo de queixa. 3- Vício não sanado dentro do prazo decadencial. Extinção da punibilidade do autor do fato. Recurso Improvido. (Recurso Crime Nº 71005530712, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Luis Gustavo Zanella Piccinin, Julgado em 09/11/2015).
FONTE BIBLIOGRÁFICA:
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NUCCI, Guilherme de Souza, Curso de Direito Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
NUCCI, Guilherme de Souza, Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais. 4. ed. Rio de janeiro: Forense, 2015.