É de conhecimento público e notório que o criminoso Marcelo Valle Silveira Mello, presidiário, preso no Presídio Federal de Campo Grande, no Mato Grosso, no Mato Grosso do Sul, se faz passar por outras pessoas na internet para praticar crimes cibernéticos. No entanto, até hoje ele não foi investigado, denunciado e processado pelos crimes de falsidade ideológica e falsa identidade.
Segundo o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, nos Autos TJDFT – PJE n. 0038136-38.2016.8.07.0001:
“Contudo, no curso das investigações, que transcorreram no âmbito da Polícia Federal (IPL 508/2017), verificou-se que, embora o e-mail tenha sido assinado em nome de EMERSON EDUARDO RODRIGUES SETIM, o verdadeiro remetente foi o denunciado MARCELO VALLE SILVEIRA MELLO.”
“No presente caso, o endereço eletrônico goec@sigaint.org faz parte de serviços de e-mail conhecidos por prometer anonimidade aos seus usuários, sendo evidente que EMERSON, detentor de profundos conhecimentos de informática, não se valeria desse endereço eletrônico e se identificaria ao mandar a mensagem via e-mail com conteúdo criminoso.”
“Em verdade, MARCELO, descontente com a conduta adotada por EMERSON nas investigações citadas (confissão e entrega de materiais à Polícia Federal), as quais culminaram em sua condenação, fingiu-se tratar de EMERSON e enviou à vítima a seguinte mensagem:”
Fonte: https://www.mpdft.mp.br/portal/pdf/comunicacao/outubro_2020/Den%C3%BAncia_0038136-38.2016.8.07.0001_Marcelo_Vale_-_v%C3%ADtima_jean_wyllys_final_3.pdf
Segundo a Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso:
“Robson Aguiar remete a autoria do site Tio Astolfo a Marcelo Vale Silveira Melo e que há cerca de 3 meses o teria denunciado como sendo o dono do blog Puaheite Brasil, que divulga matéria de pedofilia, conteúdo racista e de estupro. A denúncia, segundo ele, foi feita via rede social e seria este o motivo de Marcelo ter atribuído a ele a autoria do site Tio Astolfo.”
Fonte: https://www.pjc.mt.gov.br/-/blogueiro-presta-interrogatorio-na-policia-civil-pagina-esta-hospedada-na-malasia
Segundo o Centro de Humanidades da Universidade Federal do Ceará:
“No entanto, um blog falso foi criado em seu nome. Nesse blog, são feitas postagens de discursos pela castração de homens e de apologia ao aborto e infanticídio de meninos, na tentativa de reforçar os mais ridículos estereótipos com relação ao feminismo. Esse blog fake também divulga endereço e telefone residenciais da Prof. Lola, que tem recebido inúmeras ameaças, agora estendidas à sua família e ao seu trabalho.”
“Para o Conselho do Centro de Humanidades, discordar, ou mesmo não gostar de alguém, é um direito de todos. A Universidade é um espaço democrático de produção do conhecimento e do amplo debate. Difamar, jogar lama nas pessoas, além de inadmissível, é criminoso e deve ser combatido. O Conselho espera que as pessoas envolvidas nessas ações de difamação e calúnia sejam responsabilizadas pelo que dizem e assumam as consequências decorrentes.”
Fonte: https://ch.ufc.br/pt/nota-de-apoio-a-prof-lola-aronovich/
O que diz o Direito Brasileiro:
Código Penal - Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940
Falsidade ideológica
Art. 299. - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular.
Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.
É importante destacar que os crimes de falsa identidade não se confundem com os delitos de falsificação e uso de documento falso.
Código Penal - Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940
Falsa identidade
Art. 307. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:
Pena: detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.
Art. 308. Usar, como próprio, passaporte, título de eleitor, caderneta de reservista ou qualquer documento de identidade alheia ou ceder a outrem, para que dele se utilize, documento dessa natureza, próprio ou de terceiro:
Pena: detenção, de quatro meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.
Súmula
Súmula 522 do STJ – "A conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa."
Recurso repetitivo
Tema 646 – "É típica a conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial, ainda que em situação de alegada autodefesa (art. 307. do CP)." REsp 1.362.524/MG
Repercussão geral
Tema 478 – "O princípio constitucional da autodefesa (art. 5º, LXIII, da CF/88) não alcança aquele que atribui falsa identidade perante autoridade policial com o intento de ocultar maus antecedentes, sendo, portanto, típica a conduta praticada pelo agente (art. 307. do CP)." RE 640.139 RG/DF
Acórdãos representativos
Acórdão 1236129, 00002148920188070001, Relator: JAIR SOARES, Segunda Turma Criminal, data de julgamento: 5/3/2020, publicado no PJe: 16/3/2020;
Acórdão 1232078, 00067415720188070001, Relator: CARLOS PIRES SOARES NETO, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 20/2/2020, publicado no PJe: 3/3/2020;
Acórdão 1228349, 00077655720178070001, Relator: JESUINO RISSATO, Terceira Turma Criminal, data de julgamento: 30/1/2020, publicado no PJe: 10/2/2020;
Acórdão 1187660, 20180110124363APR, Relator: J.J. COSTA CARVALHO, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 18/7/2019, publicado no DJE: 29/7/2019;
Acórdão 1153128, 20170310006822APR, Relator: GEORGE LOPES, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 7/2/2019, publicado no DJE: 26/2/2019.
A atribuição de falsa identidade com o fim de ocultar antecedentes é conduta revestida de tipicidade formal e material. O réu, no momento em que foi abordado por policiais em razão de suposta prática de tráfico de drogas, atribuiu a si falsa identidade, com o intuito de ocultar antecedentes criminais que ostentava. Em sua defesa, pleiteou a absolvição fundada na ausência de dolo e na consequente atipicidade da conduta. O entendimento da Turma Recursal, seguindo a jurisprudência consolidada no âmbito do STF, é o de que “o princípio constitucional da autodefesa (art. 5º, inciso LXIII, da CF/88) não alcança aquele que atribui falsa identidade perante autoridade policial com o intento de ocultar maus antecedentes, sendo, portanto, típica a conduta praticada pelo agente (art. 307. do CP)".
Acórdão n.º 840269, 20140110758949APJ, Relator: LUIS MARTIUS HOLANDA BEZERRA JUNIOR, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 16/12/2014, Publicado no DJE: 18/12/2014. Pág.: 261
Quando o agente falsificador utiliza o documento adulterado, o delito de uso de documento falso absorve o de falsidade ideológica. Uma delegada de polícia foi condenada como incursa nos artigos 299, parágrafo único, c/c 304, ambos do Código Penal, por ter solicitado verba à direção geral do órgão em que atuava para realizar diligências em outro Estado da Federação, a pretexto de prender e recambiar um indiciado para o Distrito Federal, quando o real motivo da operação era a busca de menores desaparecidos. As partes apelaram. O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios requereu o reconhecimento do concurso de crimes entre a falsificação e o uso de documento falso. A defesa arguiu a preliminar de prescrição como causa extintiva da punibilidade. No mérito, alegou que houve retificação das diligências. Também sustentou que “a solicitação” não poderia ser considerada um documento na forma descrita pela legislação penal. Por fim, aduziu que o crime de uso de documento falso absorveria o tipo do artigo 299 do CP. A Turma rejeitou a preliminar, ao verificar que o prazo necessário para o reconhecimento da prescrição retroativa não transcorrera. No mérito, confirmou a divergência entre os pedidos realizados pela ré e a realidade. Ressaltou que a solicitação encaminhada aos superiores hierárquicos da apelante é considerado “documento”, pois apresenta forma escrita, destina-se a comprovar um fato e foi elaborado por servidor público competente, conforme definição doutrinária. Em relação às alegações do Parquet, os Julgadores entenderam que a prática dos dois delitos pela ré importa em progressividade criminosa, ou seja, primeiro inseriu-se a informação falsa no documento (crime-meio) para depois utilizá-lo em objetivo determinado (crime-fim), de forma que o segundo delito absorveria o primeiro. Ao final, o Colegiado negou provimento ao recurso da acusação e proveu parcialmente o da defesa.
Acórdão 1117785, 20130111921547APR, Relatora Desa. SANDRA DE SANTIS, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 16/8/2018, publicado no DJe: 21/8/2018.