Como se sabe, em regra, o devedor principal é responsável pela dívida, o que significa dizer que, no âmbito trabalhista é do Empregador a responsabilidade de realizar o pagamento correto de todas as verbas trabalhistas garantias em Lei ou instrumentos normativos.
Não obstante, é certo que mesmo após o trânsito em julgado de sentença o devedor principal pode não pagar as verbas a que foi condenado, e isso pode ser dar por diversas razões, especialmente financeiras.
Uma saída para esses casos é justamente verificar em tempo oportuno a existência de outros devedores responsáveis solidários ou subsidiariamente pelos créditos cobrados na ação. Por oportuno, define-se cada uma dessas modalidades e como ela pode ser aplicada ao processo do trabalho.
A solidariedade está prevista no Código Civil (arts. 264 a 285) e ocorre quando dois ou mais devedores são obrigados pela totalidade da dívida, podendo o credor cobrar de qualquer um deles. No âmbito das relações de trabalho seria dizer que duas ou mais empresas é responsável pelo pagamento das verbas trabalhistas, sendo que o empregado pode cobra-las de qualquer uma delas.
No grupo econômico, por exemplo, é possível identificar essa responsabilidade, já que as empresas componentes respondem solidariamente pelos créditos trabalhistas devidos ao empregado, ainda que não tenham diretamente firmado contrato com o trabalhador. Nesse sentido, inclusive, é como dispõe o §2º do art. 2º da CLT:
Art. 2º - Considera-se empregadora a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
(...)
§ 2º. Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego.
Assim, se no caso concreto for observada que o Empregador, devedor principal, está sob a direção, controle de outra antidade empresarial, ou ainda está em comunhão de interesses e a atuação conjunta com outras empresas, é possível estender a responsabilidade quanto às verbas para as demais integrantes do grupo econômico, garantindo maior efetividade na cobrança.
Deve-se destacar que, não obstante as recorrentes discussões sobre o tema, o entendimento majoritário na justiça do trabalho é de que é possível o redirecionamento da execução para outras empresas do mesmo grupo econômico mesmo que não tenha participado do processo de conhecimento. A matéria, no entanto, está sob debate no Supremo Tribunal Federal desde 2023, quando foi determinada a suspensão nacional do processamento de todas as execuções que tratam da matéria.
A responsabilidade subsidiária, por sua vez, possui caráter suplementar, uma vez que há uma ordem de responsabilização a ser seguida. Em simples palavras, o responsável subsidiariamente só é chamado a cumprir a obrigação se o devedor principal não o fizer.
Veja-se que nesse caso, há sim, um responsável principal pelo pagamento das dívidas, cuja inadimplência dará seguimento à cobrança dos demais.
Esse tipo de responsabilização também é muito comum no Direito do Trabalho, especialmente nos contratos de terceirizações, haja vista o entendimento sumulado da Corte Superior Trabalhista (TST), in verbis:
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE
(...)
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
Assim, o tomador dos serviços terceirizados, pode ser responsabilizado judicialmente pelo pagamento das verbas devidas ao trabalhador caso a contratante principal descumpra suas obrigações. Para que isso ocorra, no entanto, é necessária sua participação desde o início do processo, constando sua condenação subsidiária em sentença.
Ou seja, o operador do direito deve se atentar que nas hipóteses de responsabilidade subsidiária, a inclusão apenas em execução não é possível, como acontece nos casos da solidariedade, devendo qualificar a tomadora de serviços já na petição inicial, requerendo expressamente tal responsabilização no rol dos pedidos.
Nessa tocante, é necessário destacar também que existe a possibilidade de a administração pública ser responsável subsidiariamente pelos créditos cobrados nas ações trabalhistas, isso porque, cada vez mais se observa a utilização da terceirização pelo poder público como técnica de gestão administrativa visando a eficiência e especialização de suas atividades finalísticas.
No entanto, é necessário destacar que a jurisprudência dá tratamento diferenciado no que se refere ao reconhecimento da responsabilidade subsidiária quando a tomadora do serviço é entidade pública.
Por exemplo, a citada súmula nº 331 do E. TST já diferenciava hipóteses estabelecendo que o reconhecimento de tal responsabilidade no âmbito do poder público não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada, como acontece nas contratações entre empresas privadas, pelo contrário, deveria haver a comprovação de que o poder público atuou de forma culposa no cumprimento dos dispositivos da antiga Lei de Licitações de nº 8.666/931.
Mais recentemente, a Corte Constitucional afunilou ainda mais a possiblidade de responsabilização estatal a partir do julgamento do Tema 1118, que buscava pacificar a discussão, infraconstitucional, diga-se de passagem, quanto ao ônus da prova acerca da conduta culposa na fiscalização das obrigações trabalhistas de prestadora de serviços, para fins de responsabilização subsidiária da Administração Pública.
Em linhas gerais, o debate que já se arrastava desde 2020, se concentrava na legitimidade da transferência o ônus de comprovar a ausência de culpa na fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas ao poder público, entendimento que vinha sendo adotado pelos Tribunais Trabalhistas.
Após anos de discussão, recentemente foi fixada tese retirando dos ombros do poder público tal encargo processual, senão, veja-se:
Tema 1118
Tese fixada:
1. Não há responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pela parte autora, da efetiva existência de comportamento negligente ou nexo de causalidade entre o dano por ela invocado e a conduta comissiva ou omissiva do poder público.
2. Haverá comportamento negligente quando a Administração Pública permanecer inerte após o recebimento de notificação formal de que a empresa contratada está descumprindo suas obrigações trabalhistas, enviada pelo trabalhador, sindicato, Ministério do Trabalho, Ministério Público, Defensoria Pública ou outro meio idôneo.
3. Constitui responsabilidade da Administração Pública garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato, nos termos do art. 5º-A, § 3º, da Lei nº 6.019/1974. 4. Nos contratos de terceirização, a Administração Pública deverá: (i) exigir da contratada a comprovação de capital social integralizado compatível com o número de empregados, na forma do art. 4º-B da Lei nº 6.019/1974; e (ii) adotar medidas para assegurar o cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada, na forma do art. 121, § 3º, da Lei nº 14.133/2021, tais como condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas do mês anterior.
Veja-se que a tese, entre outras coisas, estabelece a necessidade de comprovação pelo trabalhador de comportamento negligente por parte do Ente público, assim como estabelece exatamente como se caracteriza esse comportamento negligente.
Desse modo, nos casos em que o trabalhador vise o reconhecimento da responsabilidade subsidiária do ente público, é necessário, de maneira primordial, a comprovação de um comportamento negligente, descuidado, descompromissado do poder público.
Esse comportamento negligente, por sua vez ficará caracterizado quando o Estado apesar de devidamente notificado da violação ao direito trabalhista nada faz.
Ou seja, a partir do julgamento do Tema 1118 eventual responsabilização subsidiária da administração pública por créditos trabalhistas deve ser precedida necessariamente de notificação ao poder público, que se permanecer inerte poderá ser responsabilizado também.
Veja-se que o envio da notificação e da inércia do poder público ante as violações por parte do empregador, serão as duas provas que o trabalhador terá que produzir para ter êxito em cobrar as verbas desse tomador de serviços, devendo o operador do direito observar tais requisitos sob pena do não reconhecimento da responsabilidade subsidiária do Estado.
Na parte final, do item 1 da tese fixada, verifica-se a responsabilidade subsidiária da administração pública também poderá ser reconhecida quando ficar demonstrado o nexo de causalidade entre o dano por ela invocado e a conduta comissiva ou omissiva do poder público.
Isso significa dizer que, para responsabilizar o Estado pelo não pagamento de direitos trabalhistas em uma terceirização, o trabalhador precisa provar que o poder público agiu com negligência ou que existe uma relação direta entre o prejuízo sofrido e uma ação ou omissão do Estado, o que vem sendo duramente criticado uma vez que é muito difícil comprovar a inexistência de um fato. Lembrando que a exigência de prova negativa de fato é vedada no ordenamento jurídico brasileiro.
Com a inclusão de tais óbices processuais, é desnecessário pontuar que, na prática, milhares de trabalhadores terceirizados que atuaram em favor do ente estatal acabem privados de receber suas verbas trabalhistas devendo apresentar prova negativa de seu direito, o que é impossível, caso queira ver deferido o reconhecimento da responsabilidade subsidiária do poder público.
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CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res.174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
(...)
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.︎