Capa da publicação Burguesia e construção do Estado capitalista moderno
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A ascensão e consolidação da burguesia como classe dominante na política e economia do modo de produção capitalista

09/04/2025 às 17:20
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Como a burguesia consolidou seu poder no Estado e na economia? O pensamento de Comte e Saint-Simon buscou estabilizar a nova ordem capitalista e industrial.

Resumo: Com a ascensão e consolidação da burguesia como classe dominante, na política e economia, o estabelecimento do modo de produção capitalista como fundamento dos Estados modernos e a proliferação de diversos conflitos sociais, proporcionou o surgimento de alguns teóricos ‘reformadores’ que se preocupavam com as conseqüências da mudança social, política e econômica do ‘antigo regime’ para a nova sociedade burguesa.

Palavras-chave: burguesia, classe dominante, Estado.


INTRODUÇÃO

Com a ascensão e consolidação da burguesia como classe dominante, na política e economia, o estabelecimento do modo de produção capitalista como fundamento dos Estados modernos e o proliferamento de diversos conflitos sociais, proporcionou o surgimento de alguns teóricos ‘reformadores’ que se preocupavam com as conseqüências da mudança social, política e econômica do ‘antigo regime’ para a nova sociedade burguesa.

É fundamental entendermos que estes reformadores se inserem no ambiente social que precederam à queda do assim chamado ‘antigo regime’ e sua sociedade feudal, a superação da economia mercantilista pelo nascente sistema econômico capitalista e pela ascensão no domínio político - institucional de uma nova classe social governante, a burguesia. E com essa nova classe dominante surge um número variável de distúrbios sociais na sociedade industrial.

Entre estes ‘reformadores’, notadamente se destacam Saint-Simon e Auguste Comte, considerados os fundadores da sociologia e da própria Ciência Social. Eles queriam manter a sociedade integrada e evitar o ‘caos’ social, sendo contra a radicalização das novas estruturas da sociedade capitalista. Estes entendiam que a sociedade deve ser organizada e que os conflitos ocorriam devidos serem ‘herança’ do antigo regime.


AS BASES DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO DO ESTADO CAPITALISTA.

As idéias destes reformadores marcam a transição de um pensamento burguês ‘revolucionário’ para um ‘organizador’, ‘planejador’, ou seja, um pensamento burguês ordenador da sociedade capitalista e industrial.

Saint-Simon é considerado como um dos mais expoentes teóricos desta sociedade industrial e da organização da nova elite capitalista-industrial, a qual acreditava ser fundamental para o ‘progresso’. O mesmo entendia que com a que do ‘antigo regime’ a sociedade estava imersa em inúmeros conflitos sociais e que ‘o problema era pôr fim à profunda agonia que a sociedade tivera que suportar no período desde a decadência do velho sistema político até a final constituição do novo’ (RAISON, Timothy. OS PRECURSORES DAS CIÊNCIAS SOCIAIS, Página 34), assim Simon entendia que tais conflitos eram conseqüências do antigo sistema político, não concordando que estes eram gerados pela nova ordem econômica predominante na sociedade industrial, ao contrário acreditava que cabia aos teóricos da ‘nova ordem’ solucionar os problemas deixados pelos ‘antigos’ para ‘aperfeiçoar’ o ‘novo’ regime político – social.

Seu entendimento era de tanto proteger como fortalecer o industrialismo bem como a própria sociedade e para isso era preciso estudar ‘objetivamente’ este fenômeno, a sociedade industrial, incluindo o ‘social’ no rol das ciências positivas, de onde surgia a sociologia, ou seja, Simon era um ‘reformista’ convicto que a nova ordem social era benéfica e ‘positiva’ desejando somente estruturar suas instituições e idéias no plano social e moderadamente no político. A idéia de indústria desenvolvida por este teórico é que se enquadra ‘toda atividade ‘útil’ ao desenvolvimento humano, podendo ser tanto intelectual como manual’ (RAISON, Timothy. OS PRECURSORES DAS CIÊNCIAS SOCIAIS, Página 34), assim neste aspecto a idéia reformista é nítida, pois além de já visualizar a inclusão de outros atores sociais diferentes dos detentores do capital, tais como intelectuais, artesão e pequenos comerciantes, entende a sociedade do ‘progresso’ sendo a sociedade dos produtores, os que fomentam o desenvolvimento material e intelectual, os quais segundo Simon é que devem organizar tanto a produção como a sociedade dando racionalidade à nova ordem social e econômica.

Para compreender e ‘ordenar’ a sociedade industrial Simon ‘acreditava que as instituições eram simples idéias em ação e que todo regime social é uma aplicação de um sistema filosófico e, conseqüentemente, é impossível instituir um novo regime sem haver previamente estabelecido o novo sistema filosófico ao qual ele deve corresponder’ (RAISON, Timothy. OS PRECURSORES DAS CIÊNCIAS SOCIAIS, Página 31), ou seja, acredita que somente uma teoria da nova ordem social, uma ciência positivista seria capaz de proporcionar estabilidade social acabando com os conflitos existentes, restabelecendo a ordem e a moral.

Esta nova ordem político-social deve ser caracterizada por uma nova teoria de classes, a qual para Simon representava um sistema antagônico ao ‘antigo regime’ os ‘não-produtores’ tais como os aristocratas, clérigos e sacerdotes e os proprietários de terra, assim o ‘novo regime político’ estaria representado pelos ‘produtores’, ou seja, todos aqueles que produzem material e intelectualmente e proporcionam o progresso técnico - científico. Neste aspecto a perspectiva de Simon além de reformador é também ‘conciliatório’ porque defende uma única classe social sem considerar uma hierarquia entre estes, os produtores, que representam o ‘progresso’ e a ‘modernidade’ da sociedade industrial.

Com esta teoria de classe Simon entedia que a ‘ luta de classes chegaria ao seu fim e o desejo de dominar, que é inato em todos os homens, deixaria de ser pernicioso’ (RAISON, Timothy. OS PRECURSORES DAS CIÊNCIAS SOCIAIS, Página 36). Assim, acreditava que o progresso técnico-científico oriundo da sociedade industrial proporcionaria ‘justiça’ social para a sociedade moderna, para a classe produtiva, não sendo mais necessário nenhum conflito entre os homens, dando início a uma fase positiva da sociedade.

No modelo apresentado por Saint-Simon o ‘desenvolvimento’ só seria alcançado por uma organização política em que favorece a indústria, tendo ‘um governo em que o poder político não tenha mais força ou atividade do o necessário para que o trabalho útil não seja prejudicado’ (RAISON, Timothy. OS PRECURSORES DAS CIÊNCIAS SOCIAIS, Página 36), ou seja, um Estado que defenda os interesses da nova classe dominante, um Estado Liberal que defenda as idéias da ‘classe produtiva’ e que interfira somente em favor desta, em detrimento dos não produtores, os quais devem desaparecer juntamente com tudo que restou do ‘antigo regime’.

Assim, o entendimento que Saint-Simon tinha da sociedade industrial era de que a mesma somente precisava de ‘reformas sociais’, pois esta representava a etapa da humanidade que traria ‘prosperidade’, ‘progresso’ e ‘modernidade’ necessários para extirpar de vez todos os obstáculos do desenvolvimento que era o ‘antigo regime’. Para isso uma nova classe dominante devia liderar a organização da nova ordem – a classe produtiva.

Outro grande ‘reformador’ da sociedade industrial moderna é Auguste Comte o ‘sociólogo da unidade humana e social, da unidade da história humana’ (ARON, Raymond. AS ESTAPAS DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO, Página 83), ou seja, entendia que a humanidade tinha uma história unificada, determinada e ‘evolutiva’.

Para Comte a sociedade do ‘antigo regime’ é caracterizada pelo conceito teológico e militar dará passagem para uma nova sociedade científica e industrial, ‘os cientistas substituem os sacerdotes e teólogos como categoria social que dá base intelectual e moral da ordem social’ (ARON, Raymond. AS ESTAPAS DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO, Página 85), com isso entende que as ‘reformas’ necessárias que a sociedade industrial precisa para ‘restabelecer’ a ordem social só será possível com a ascensão de um novo personagem social, o cientista, que será o fundamento desta nova sociedade.

Da mesma forma que os cientistas substituíram os sacerdotes na nova ordem social, os ‘industriais’ ocuparam o lugar dos militares na sociedade moderna, pois acredita que à medida que os homens passam a pensar cientificamente deixa de existir a necessidade belicosa, de conflito entre os homens e passar a ter a necessidade explorar racionalmente a natureza, transformando-a em ‘progresso’ e ‘modernidade’. Com isso, Comte não acredita que a violência seja a forma eficiente de transformação social e reorganização da sociedade, ‘Comte considera que a sociedade moderna está em crise, e encontra a explicação dos problemas sociais na contradição entre uma ordem histórica teológica - militar em via de desaparecer e uma ordem social científica- industrial que nasce’ (ARON, Raymond. AS ESTAPAS DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO, Página 86), ou seja, entende como característica da nova ordem à superação das ‘idéias’ teológica’ e ‘militar’ pelas novas categorias sociais da modernidade – ciência positiva e a indústria.

Para isso, a função da sociologia é compreender o destino inevitável da sociedade, o estágio final, o positivismo científico. Nesse aspecto o entendimento de Comte é que a ciência deve ser levada ao ‘extremo’ com o positivismo e expandir o método positivo para a análise da sociedade. Sociologia é compreendida como uma síntese entre duas dimensões sociais, a ordem estática e a dinâmica do progresso social sucessivo e necessário. Ordem esta que o teórico ser a mesma da sociedade européia, sendo bastante etnocêntrico neste aspecto.

Segundo Comte o espírito humano teria passado por três estágios diferentes – o teológico, o metafísico e o positivo. Na primeira, se entende os fenômenos como seres ou forças iguais aos homens. Na segunda, o entendimento se dá por meio de entidades abstratas, como a natureza. Na terceira, a observação e comparação dos fenômenos passam a ser o entendimento geral, os homens começam a estabelecer leis gerais para governa-los. Este aspecto é o ‘coração’ do modelo de análise e reorganização da sociedade de Comte, entretanto o mesmo afirmava que estas fases não ocorriam simultaneamente e somente podiam ser entendidas rigorosas com uma perspectiva de uma nova classificação das ciências.

Para Comte ‘a combinação da lei dos três estados com a classificação das ciências tem por objeto provar que a maneira de pensar que triunfou na matemática, na astronomia, na física, na química e na biologia deve, por fim, se impor à política, levando à constituição de uma ciência positiva da sociedade, a sociologia’ (ARON, Raymond. AS ESTAPAS DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO, Página 88), assim, Comte apresenta como modelo de entendimento da sociedade um ‘atrelamento’ ao método das ciências da natureza, o método positivo, para o surgimento da nova ciência humana, a sociologia, problemática está ainda debatida no entendimento da objetividade das ciências sociais. Este pensador entendia que a sociologia é que deveria determinar a reorganização social necessária para o progresso social.

Segundo Comte não havia nenhuma oposição antagônica entre os interesses dos operários e os dos empresários, mas seu modelo entendia que o desenvolvimento da produção se ajustava aos interesses de todos os atores sociais, acreditando numa conciliação de interesses na sociedade industrial. Apesar disto, o mesmo ‘justifica a concentração de capitais e dos meios de produção, que não lhe parece contraditória com a propriedade privada’ (ARON, Raymond. AS ESTAPAS DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO, Página 100), ou seja, neste aspecto é claro que o desejo de Comte é de apenas ‘reformar’ alguns pontos negativos da sociedade industrial não acreditando na tese do antagonismo entre capital e trabalhadores, propriedade privada e desigualdade. Sua tese é que para ‘reformar’ a sociedade a propriedade privada deve ter uma função coletiva, utilidade social.

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Um aspecto peculiar, para a época, do entendimento da sociedade em Comte, é que o mesmo além de não acreditar na função da guerra na sociedade industrial não apoiava qualquer tentativa de colonização de povos ‘não desenvolvidos’ pelos europeus.

Outra característica fundamental do pensamento de Comte é a função que a religião deve ter na sociedade industrial, com isso a religião não deve ser mais ser obstáculo ao ‘progresso’ e sim um aparelho de justificação da nova classe dominante. É preciso para isso estabelecer uma ordem racional e burocrática para a religião, sendo neste ponto essencialmente um ‘reformador’ da sociedade.

Assim, Auguste – Comte acreditava que a ‘única reforma social válida seria a que transformasse o modo de pensar teológico e difundisse a atitude própria do positivismo’ (ARON, Raymond. AS ESTAPAS DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO, Página 142), com isso sua reforma se passava essencialmente nas idéias-chaves para a sociedade industrial, na superação das idéias oriundas do feudalismo e na consolidação do positivismo como modelo ideal para o entendimento e para a ‘reforma ’ da sociedade.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluímos entendendo que tanto Saint-Simon quanto Auguste-Comte foram ‘reformadores’ da sociedade industrial e os precursores de uma nova ciência, a sociologia, pretendendo não abolir a nova ordem social vigente, a burguesa, mas acima de tudo queriam ‘aperfeiçoar’ esta ordem e racionalizar suas instituições político-social. O desejo era de superar totalmente o estágio teológico e metafisico do ‘antigo regime’ para poder caminhar para o ‘progresso’ e a ‘modernidade’ do novo regime, o estágio positivo do espírito humano.


REFERÊNCIAS

  1. OLIVEIRA. Roberto Cardoso de. 1998. O TRABALHO DO ANTROPÓLOGO/SÃO PAULO: Editora Unesp. 220. Pág.

  2. DAMATTA. Roberto da. 2010. RELATIVIZANDO: UMA INTRODUÇÃO A ANTROPÓLOGIA SOCIAL/ SÃO PAULO: Editora Vozes. 256. Pág.

  3. SISTEMA INTEGRADO DE TRANSPORTE – SIT EM SÃO LUIS, pesquisado em G:/Ciencias Sociais/Antropologia/Sistema Integrado de Transporte em São Luís – Wikipédia, a enciclopédia livre.htm acessado em 02/01/2012.

  4. HOBSBAWM, Eric J. A ERA DAS REVOLUÇÕES. 1998.

  5. ARON, Raymond. AS ESTAPAS DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO.

  6. RAISON, Timothy. OS PRECURSORES DAS CIÊNCIAS SOCIAIS


Abstract: With the rise and consolidation of the bourgeoisie as the dominant class, in politics and economics, the establishment of the capitalist mode of production as the foundation of modern States and the proliferation of various social conflicts, led to the emergence of some 'reformist' theorists who were concerned with the consequences of the social, political and economic change of the 'old regime' for the new bourgeois society.

Key words: bourgeoisie, ruling class, State.

Sobre o autor
Israel Pinheiro Rocha Costa

Administrador e Advogado - Universidade Estadual do Maranhão - UEMA. Aluno do do curso de Licenciatura em Ciências Sociais da Universidade FMU.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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