Nos últimos anos, uma perigosa narrativa vem sendo construída por grandes conglomerados econômicos – especialmente bancos e seguradoras – que visa deslegitimar o trabalho de advogados que atuam na defesa de consumidores lesados. O rótulo “advocacia predatória”, cunhado não pelo ordenamento jurídico, mas por interesses corporativos, tem sido utilizado de forma leviana para tentar desqualificar o exercício legítimo e essencial da advocacia.
É preciso, com urgência, desmistificar essa narrativa.
A atuação de advogados especializados em demandas massificadas – como seguros de vida, DPVAT, planos de saúde ou abusos bancários – é uma resposta natural e necessária à histórica vulnerabilidade do consumidor no Brasil. A massificação das ações não é uma criação da advocacia, mas reflexo do padrão sistemático de abusos praticados por grandes instituições, que negam direitos básicos de forma reiterada, na expectativa de que o cidadão comum, carente de recursos, não busque reparação judicial.
Desde a Constituição de 1988, o Brasil passou a reconhecer, com mais ênfase, a necessidade de proteção ao consumidor. O advento do Código de Defesa do Consumidor em 1990 institucionalizou mecanismos que facilitaram o acesso à Justiça, fortaleceram os direitos dos hipossuficientes e impuseram limites à atuação predatória de fornecedores.
Nesse cenário, o advogado passou a ser figura central, como prevê o artigo 133 da Constituição Federal: “O advogado é indispensável à administração da Justiça”. A atuação desses profissionais, sobretudo na defesa dos economicamente mais frágeis, consolidou jurisprudência, fez valer garantias fundamentais e viabilizou a reparação de inúmeros danos antes ignorados.
Tentar transformar esse exercício legítimo em infração disciplinar ou até em conduta criminosa, como se tem visto em representações infundadas contra advogados que militam nesta área, é uma clara tentativa de criminalizar a advocacia como forma de intimidar e desencorajar o acesso da população ao Poder Judiciário.
Não se nega, evidentemente, que práticas ilícitas devam ser investigadas e punidas, se comprovadas. Mas é inaceitável que o simples fato de um advogado patrocinar centenas ou milhares de demandas semelhantes seja, por si só, indício de má-fé ou fraude. Trata-se, na verdade, de especialização e eficiência – características desejáveis e legítimas em qualquer profissão.
É justamente por conhecerem profundamente os abusos enfrentados por seus clientes que esses profissionais são capazes de atuar com maior eficácia. E isso incomoda. Incomoda quem se beneficia da desinformação, da burocracia, da omissão e da desigualdade de armas no processo judicial.
É preciso que a sociedade – e a própria OAB – estejam atentas a esse movimento de tentativa de censura e intimidação da advocacia combativa. Defender o direito de atuação desses profissionais é defender o acesso à Justiça, o devido processo legal e, em última instância, o próprio Estado de Direito.
Que não se permita, sob o pretexto de combate a abusos, a inversão dos papéis: transformar o advogado em vilão, quando sua verdadeira missão é proteger quem mais precisa.