A responsabilidade solidária de administradores e conselheiros em cooperativas de crédito.

Riscos e formas de prevenção

Leia nesta página:

Resumo: O presente artigo aborda, sob o ponto de vista jurídico e institucional, a crescente responsabilização de dirigentes de cooperativas de crédito, em especial administradores e conselheiros. A partir da análise de dispositivos legais, regulamentações do Banco Central e casos concretos, demonstram-se os riscos civis, administrativos e penais aos quais esses agentes estão expostos. Propõe-se, ademais, um conjunto de medidas preventivas e de boas práticas de governança que minimizam essa exposição, com destaque para a atuação estratégica do setor jurídico institucional.

Palavras-chave: cooperativas de crédito; responsabilidade civil; governança corporativa; conselhos; gestão temerária; compliance.


1. Introdução

O sistema de cooperativas de crédito tem se consolidado como um dos principais instrumentos de inclusão financeira no Brasil, com crescimento contínuo de ativos, carteira de crédito e base de cooperados. Esse protagonismo, entretanto, acarreta também maior complexidade regulatória e rigor no controle institucional, especialmente quanto à responsabilidade de seus administradores e conselheiros.

O presente artigo tem por objetivo analisar, de forma sistêmica e detalhada, os fundamentos legais da responsabilização de dirigentes de cooperativas de crédito, os tipos de responsabilidade aplicáveis, situações recorrentes em que ela é atribuída, bem como os mecanismos preventivos e o papel do jurídico institucional na defesa da boa governança.


2. Fundamento legal da responsabilidade

As cooperativas de crédito, embora constituídas sob forma societária própria, são submetidas a uma normatização híbrida que envolve o Código Civil (arts. 1.094 a 1.096), a Lei Complementar nº 130/2009, a regulamentação do Banco Central do Brasil e, de forma subsidiária, a Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76).

O art. 1.016 do Código Civil estabelece que os administradores respondem solidariamente pelos prejuízos causados por culpa ou dolo no exercício de suas funções. Além disso, os princípios gerais de governança cooperativa exigem dos dirigentes o dever de lealdade, diligência, boa-fé e transparência na tomada de decisões.

Cabe ainda destacar que o Banco Central, por meio da Resolução CMN nº 4.434/2015, impõe às cooperativas a adoção de estruturas de governança compatíveis com sua complexidade operacional, reforçando a responsabilidade institucional de seus órgãos de gestão e fiscalização.

3. Tipologia da responsabilidade

a) Civil

Responsabilidade civil por danos materiais e morais causados à cooperativa, aos cooperados ou a terceiros, em decorrência de ações ou omissões irregulares. A jurisprudência reconhece a responsabilidade solidária entre dirigentes que deliberaram em conjunto ou se omitiram frente a ilegalidades.

b) Administrativa

Inclui penalidades aplicadas pelo Banco Central por infração a normas prudenciais, operacionais ou de conduta, como multas, advertências e inabilitação para o exercício de cargos de direção em instituições financeiras.

c) Penal

Decorrente de práticas tipificadas como crimes contra o sistema financeiro (Lei nº 7.492/86), notadamente gestão fraudulenta ou temerária, falsidade documental e apropriação indevida. A responsabilidade penal também alcança os dirigentes omissos quando havia o dever de evitar o resultado.


4. Causas recorrentes de responsabilização

A experiência revela um conjunto de situações recorrentes que ensejam responsabilização de administradores e conselheiros:

  • Aprovação de operações de crédito sem garantias adequadas ou em desconformidade com a política de risco;

  • Aprovação de balanços com inconsistências contábeis sem solicitação de esclarecimentos;

  • Omissão diante de sinais evidentes de inadimplência sistêmica;

  • Ausência de atuação efetiva do Conselho Fiscal;

  • Falta de documentação formal das decisões, especialmente registros de dissenso em atas;

  • Deliberações tomadas sem respaldo jurídico ou parecer técnico.


5. Mecanismos de prevenção

A gestão diligente requer um conjunto integrado de práticas que visam minimizar os riscos de responsabilização individual:

a) Redação criteriosa das atas

Garantir que todas as deliberações estejam adequadamente registradas, inclusive votos divergentes, evita que o dirigente seja responsabilizado solidariamente por decisões com as quais não concordou.

b) Parecer jurídico e técnico

Toda decisão complexa deve ser precedida de parecer elaborado por corpo técnico e jurídico especializado. Isso demonstra cautela e observância das normas.

c) Capacitação permanente

Treinamentos regulares em temas como contabilidade, gestão de risco, normas do Bacen e responsabilidade civil evitam condutas por desconhecimento da legislação.

d) Seguros D&O

Apólices de responsabilidade civil para diretores e conselheiros (D&O) são recomendadas como instrumento de proteção patrimonial e apoio em eventual litígio judicial.


6. O papel do jurídico institucional

O departamento jurídico deve ser parte ativa da governança e estar presente nas decisões mais sensíveis. Suas funções incluem:

  • Elaborar pareceres e análises preventivas;

  • Atualizar dirigentes sobre mudanças normativas;

  • Acompanhar reuniões e deliberar sobre riscos regulatórios;

  • Prestar apoio em auditorias e inspeções;

  • Representar a cooperativa em processos judiciais e administrativos.

A atuação jurídica preventiva, articulada com os demais órgãos da cooperativa, é essencial para reduzir a exposição dos dirigentes.


7. Considerações finais

A responsabilidade solidária dos dirigentes não deve ser encarada como um fardo, mas como um incentivo à profissionalização da gestão cooperativa. Com assessoramento jurídico qualificado, políticas de governança bem definidas e uma cultura de responsabilidade institucional, é plenamente viável conciliar segurança jurídica com eficiência administrativa.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

A prevenção é, sem dúvida, a melhor estratégia para proteger tanto os gestores quanto a cooperativa como um todo.


Referências

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

BRASIL. Lei Complementar nº 130, de 17 de abril de 2009. Dispõe sobre o Sistema Nacional de Crédito Cooperativo.

BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações.

BRASIL. Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Define os crimes contra o sistema financeiro nacional.

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Resolução CMN nº 4.434, de 5 de agosto de 2015.


Abstract: This article addresses, from a legal and institutional perspective, the increasing accountability of leaders in credit cooperatives, particularly administrators and board members. Based on the analysis of legal provisions, Central Bank regulations, and concrete cases, the article demonstrates the civil, administrative, and criminal risks to which these agents are exposed. Additionally, it proposes a set of preventive measures and good governance practices that minimize this exposure, highlighting the strategic role of the institutional legal sector.

Keywords: credit cooperatives; civil liability; corporate governance; boards; reckless management; compliance.

Sobre as autoras
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos