A chamada da ONU ao Brasil como “país da impunidade”, com destaque para a violência policial e abusos cometidos pelo Estado, revela uma visão enviesada e generalista que menospreza a soberania nacional e ignora os esforços autônomos do país para enfrentar seus desafios internos. A relatoria de Mary Lawlor, em relatório encaminhado ao Conselho de Direitos Humanos em 31 de janeiro de 2025, apresentou críticas contundentes: apontou que o assassinato de defensores de direitos humanos pelo Estado, aliado à falta de investigação, reforça uma cultura de impunidade estruturada. Se por um lado essas constatações servem de alerta, por outro, revelarão também uma clara interferência midiática no debate nacional.
A soberania brasileira é legitima e plena justamente porque contamos com instituições constitucionais, como o Ministério Público, as corregedorias e o Judiciário, compostas por autoridades designadas pela própria sociedade. A produção de câmeras corporais, a modernização de corregedorias policiais e a criação de protocolos para suspeita de crimes são fruto de processos internos, impostos por demandas da sociedade civil, de parlamentares e de operadores do direito, não por imposição internacional. A ONU parece ignorar que esses avanços são manifestações legítimas da democracia brasileira, não reféns de narrativas externas.
É por isso que classificar o Brasil como “país da impunidade” transcendendo esse diagnóstico e se fixando apenas na acusação externa representa uma forma de paternalismo institucional. A interferência exógena pode gerar pressão política, mas pouco constrói em termos de solução real e sustentável. A soberania nacional exige que cada reformador, juiz e promotor tome decisões com base no direito interno, na jurisprudência e na análise factual. Por isso, a ONU precisa entender: a justiça aqui não será conduzida por relatórios de fora, mas por compromisso de dentro.
O Brasil, embora ainda combata desafios graves, como violência policial e morosidade processual, não poderá abrir mão de seu protagonismo institucional, do controle social ao Legislativo e ao Judiciário, em favor de formatos internacionais que, mesmo bem-intencionados, raramente vislumbram a complexidade real do país. Priorizar a soberania não significa ignorar falhas; significa enfrentá-las com transparência, autonomia e sem curvar-se à narrativa moralisadora de uma organização multilateral que, por vezes, transforma um diagnóstico técnico em sentença moral.
A construção de soluções nacionais deve se apoiar na educação, no aperfeiçoamento das leis internas e na atuação proativa da sociedade e do Estado, assim como vem ocorrendo. A soberania existe para que o Brasil reconecte a justiça aos seus valores, aos seus cidadãos e à sua soberania constitucional, sem danos à sua dignidade institucional.
Interferências bem-intencionadas não substituem compromissos nacionais; soberania não é prisão, é o poder de armar a si mesmo.