O Brasil assiste, com certa empolgação, ao crescimento do uso de veículos elétricos, motivado não exatamente por preocupações ambientais, mas, majoritariamente, por razões econômicas — afinal, quem não quer gastar menos no posto? Curiosamente, relatos de proprietários indicam que a preservação ambiental raramente figura como a principal justificativa de compra.
Entretanto, esse entusiasmo encontra um obstáculo não desprezível: o aumento expressivo da demanda por eletricidade, sobretudo em períodos de estiagem, pressiona o já vulnerável sistema energético nacional. O resultado é o acionamento recorrente da temida bandeira vermelha, que transforma a fatura de luz em um novo item de luxo – onde todos pagam.
Assim, aquilo que parecia ser um passo à frente na sustentabilidade revela-se um curioso paradoxo: veículos ditos “verdes” que, ao exigirem maior consumo de energia, acabam contribuindo para o encarecimento dela — especialmente nos momentos em que mais se deveria economizar.
A ironia não para por aí. Enquanto a conta de luz sobe, estados brasileiros generosamente concedem isenção de IPVA aos veículos elétricos, em nome da sustentabilidade — ainda que essa decisão implique, na prática, um subsídio indireto ao consumo de energia elétrica em um país que mal consegue manter suas hidrelétricas em funcionamento pleno.
Essa renúncia fiscal, travestida de incentivo verde, representa um custo social que recai, curiosamente, sobre aqueles que não possuem condições de adquirir um automóvel elétrico. No esforço de promover a transição energética, o Estado transfere o ônus do benefício de poucos à fatura de muitos.
Em contraste, o Brasil já dispõe de uma solução energética madura, limpa e amplamente acessível: o etanol. Com mais de 85% da frota nacional composta por veículos flex (segundo a UNICA), e com estudos do Instituto Mauá de Tecnologia (2024) indicando a viabilidade técnica do aumento da mistura etanol-gasolina para 30%, o país poderia evitar a importação de 760 milhões de litros de gasolina por ano e reduzir 1,7 milhão de toneladas de CO2, sem depender de tomadas e tarifas imprevisíveis.
Além disso, o etanol brasileiro — segundo a Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) — pode reduzir em até 61% as emissões de gases de efeito estufa e possui uma das mais altas eficiências energéticas do mundo. Tudo isso utilizando uma infraestrutura já disponível e funcional.
Projeções da UNICA e do Boston Consulting Group (BCG) indicam que o investimento contínuo na tecnologia flex e em híbridos a etanol pode gerar R$ 7,4 trilhões em valor econômico e milhões de empregos ao longo das próximas décadas.
Diante disso, insistir na eletrificação total da frota, em um país com vocação bioenergética, soa menos como vanguarda e mais como um descuido estratégico. A sustentabilidade, afinal, também exige coerência com a realidade nacional.