RESUMO
Este estudo aborda a violência doméstica como um problema que afeta toda a família, não apenas as mulheres. Serão analisados problemas centrais que causam conflitos em relações familiares, como ciúme, herança cultural, falta de comunicação e financeira, e a falta de educação de qualidade. Também será discutido como a violência pode partir de ambos os sexos e os efeitos colaterais da Lei Maria da Penha, incluindo a denunciação caluniosa. O objetivo é compreender a complexidade do problema e buscar soluções, sem desqualificar a importância da lei ou da palavra da vítima.
Palavras-chave: Cultura do ciúme. Violência doméstica. Relações abusivas.
PREFÁCIO
Em 2020, por meio do Portal Jus.com.br, realizei uma das publicações mais importantes da minha experiência como cientista jurídico. O tema abordado foi: “Violência doméstica contra o homem: um crime menosprezado”, um estudo que demonstrou que, na pandemia, o número de denúncias de agressões tendo homens como vítimas de suas parceiras cresceram significativamente e que, mesmo diante disse, o Estado distinguia a reprimenda da violência doméstica de acordo com o gênero da vítima, dando maior atenção quando esta era mulher.
Recebi diversas mensagens de vários Estados com relatos de homens que viveram ou viviam situações de violência doméstica por parte de suas companheiras.
Estudiosos de outros países, principalmente de Portugal, entraram em contato para solicitar fontes bibliográficas sobre o tema, diante da escassez de fontes de estudo voltadas para o assunto.
E foi nesse contexto que verifiquei que tratar de violência contra o homem é um tabu no Brasil e no mundo. Cinco anos se passaram desde o estudo e o problema continua o mesmo.
Atualmente, basta uma pesquisa na internet sobre o tema “violência doméstica” que os sites de busca lotam suas páginas com centenas de cartilhas sobre a Lei Maria da Penha.
Um fato extremamente benéfico para a segurança e dignidade da pessoa humana das mulheres, porém, uma constatação de que o tema se nega a tratar sobre os abusos que muitos homens sofrem quando falamos, de um modo geral, de violência dentro das relações domésticas e familiares.
Portanto, o intuito desse trabalho é, como há meia década atrás, trazer à margem o problema da violência doméstica de modo geral. Demonstrando que esse tipo de violência deve ser tratada, também, como um problema geral onde homens e mulheres devem trabalhar, com igualdade de esforços, para combate-la.
Para facilitar a busca por informações, buscou-se sustentar o presente estudo com base em cartilhas e fontes mais acessíveis, as quais podem ser acessadas pela rede mundial de computadores e que possuem uma leitura mais simples. O intuito dessa ação é aproximar a ciência jurídica da sociedade e democratizar o Direito para todos, sem distinção de sua classe social ou nível de conhecimento.
Outra observação necessária se faz em relação ao conceito de gênero. O gênero refere-se aos papéis sociais, comportamentos, características e identidades culturalmente construídos para homens e mulheres, distintos do sexo biológico. Portanto, para uma melhor facilidade de se explicar o objeto de estudo, o presente autor se baseará na relação entre homem e mulher (considerando todos os conceitos que podem ser contidos dentro dessas palavras). Ou seja, homem e mulher, aqui trabalhados se dá pelo papel exercido dentro da sociedade .
INTRODUÇÃO
Violência doméstica não deve ser abordada apenas em prol da mulher, mas sim como uma questão que afeta toda a família, pois embora a legislação avance, é a mudança cultural que realmente moldará o futuro da sociedade.
No decorrer desse estudo, serão apresentadas informações retiradas das diversas cartilhas sobre violência doméstica contra a mulher disponíveis nos portais governamentais de diversos Estados.
Na primeira etapa do estudo, será apresentada alguns dos problemas centrais que causa conflitos dentro de uma relação familiar ou amorosa entre duas pessoas.
Será debatido o ciúme na relação, a herança cultural, o senso comum, a falta de comunicação ou a comunicação ineficiente, a falta de dinheiro nos lares brasileiros, dentre outros problemas que, ao final, se resume na falta de educação de qualidade dentro da sociedade brasileira.
Posteriormente, será evidenciado que a violência que, muitas vezes, é sofrida pela mulher também pode partir dela, em relações problemáticas e carentes de inteligência emocional.
Em uma última análise, o estudo buscará trabalhar um dos efeitos colaterais gerados pela Lei Maria da Penha na vida de inúmeros homens: o afastamento da presunção de inocência e o aumento de episódios de denunciação caluniosa por parte de parceiras.
Levando em conta o narrado, tal estudo é um desafio e deve ser levado da maneira mais cautelosa possível. A violência doméstica contra a mulher, no Brasil, é um problema vivo, sério e persistente e deve ser combatido. Não se busca aqui desqualificar a Lei Maria da Penha, ou tirar a importância da palavra da vítima de tal contexto.
MAPEANDO AS CAUSAS DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
A partir de agora, o estudo buscará evidenciar os problemas que mais contribuem para a violência doméstica e os conflitos familiares. Lembrando, mais uma vez, que o objetivo desse tópico não é focar na vítima, mas sim nas relações entre as partes.
Feito o alerta, passamos a trabalhar um dos problemas mais associados à violência doméstica no Brasil: A cultura do ciúme.
A CULTURA DO CIÚME
Antes de iniciar as considerações sobre o ciúme, é preciso defini-lo.
De acordo com o Dicionário Online de Português , o verbete ciúme pode ser definido como “Sentimento de tristeza ou de raiva por imaginar que a pessoa amada pode se relacionar com outra: tenho ciúmes de você; Despeito por ver alguém ter algo que é alvo do seu desejo; inveja; Proteção em relação ao que se tem orgulho; zelo”.
No contexto fático, vamos levar em consideração apenas a primeira definição, ou seja, enxergar o ciúme como um sentimento negativo por cogitar que o parceiro esteja se relacionando com outro ou, que possa se relacionar.
De acordo com a BBC Brasil, em 2003, um estudo realizado por Gary Brase, da Universidade de Sunderland, na Grã-Bretanha, analisou o ciúme em muitos países e verificou que o brasileiro era o mais ciumento do mundo e que, quanto maior a taxa de fertilidade de um país, mas essa relação de ciúmes e desconfiança em relação ao parceiro se aumentava.
Cerca de 21 anos após esse estudo, em uma pesquisa obtida com exclusividade pelo Portal CNN, verificou-se números impressionantes em relação ao problema.
Embora a sociedade brasileira tenha evoluído culturalmente durante quase duas décadas, inclusive com a Lei Maria da Penha tendo completado 19 anos atualmente, no ano de 2024, o citado estudo evidenciou que, dentro do conjunto pesquisado, mais da metade dos homens ainda acreditam que o ciúme é um sinal de amor.
De acordo com o portal CNN,
“A pesquisa foi elaborada pelo Instituto Locomotiva em parceria com a QuestionPro e contou com dados coletados de 1.500 pessoas, entre homens e mulheres com mais de 18 anos, no período de 13 a 24 de maio, em todo o Brasil. Os dados revelaram que 59% dos homens brasileiros acreditam que quem ama de verdade sente ciúme. Entre as mulheres, 47% compartilham dessa opinião. Apesar do número ser maior nos homens, só 11% deles admitiram que são os mais ciumentos dentro de uma relação, embora 57% admita que tem algum nível do sentimento. Em relação às mulheres, 65% admitem que sentem ciúme, e 27% dizem serem mais ciumentas que seus parceiros.”
Com base nos dados obtidos, podemos traçar uma linha de raciocínio: no Brasil, ciúmes não é visto como problema, mas como um ato de amor.
Esse pensamento é algo perigoso e uma das origens da violência doméstica dentro do nosso país. As consequências da ideia de posse sobre uma pessoa é a causa de diversas violências praticadas dentro das relações de afeto justamente por considerar a outra parte como uma propriedade e não uma companheira/companheiro.
Analisando uma cartilha sobre o assunto, chamada “Entenda a Leia Maria da Penha”, do Fundo de População das Nações Unidas , podemos citar algumas práticas que configuram violência contra a mulher (pág. 14 a 16):
a) tirar a liberdade de ação, crença e decisão; b) controlar tudo o que ela faz, quando sai, com quem e onde vai; c) impedir que ela trabalhe, estude, saia de casa, vá à igreja ou viaje; d) procurar mensagens no celular ou e-mail; e) isolar a mulher de amigos e parentes; f) humilhar a mulher publicamente; g) inventar histórias e/ou falar mal da mulher para os outros com o intuito de diminuí-la perante amigos e parentes;
Das várias práticas constantes na cartilha, são estas a práticas mais relacionadas ao problema do ciúme. Ocorre que, ao verificar essas condutas e substituindo a figura da mulher pela figura do homem, verifica-se que o homem também pode ser vítima dessas práticas, e os seus efeitos operam da mesma maneira, causando sofrimento e tristeza para a vítima.
No entanto, por ser a Lei Maria da Penha uma lei direcionada somente à mulher, o homem que sofre tais ataques psicológicos de sua parceira não possui qualquer meio legal de se proteger ou buscar reparação. Este fica refém sobre a decisão de aguentar tais condutas da sua parceira ou terminar o seu relacionamento, não cabendo nenhuma resposta estatal para protegê-lo.
Cabe aqui uma reflexão, muitos psicólogos narram que a figura da sociedade sobre o homem acaba afetando sua saúde mental. Para a cultura e sociedade, o homem não chora, não se entristece, não se abala e deve permanecer sempre forte e poderoso. Chorar, sentir-se triste ou deprimido, dentro da sociedade, é um sinal de fraqueza masculina.
Muitos são os estudos que demonstra o quão negativo é tal pensamento, mas analisando o contexto acima. Quando o Estado não vê o homem/vítima com a mesma preocupação quanto a mulher/vítima, acaba reforçando a ideia de que o homem deve aguentar mais crises de ciúme excessivo do que o outro gênero.
Acontece que, conforme os episódios de ciúmes vão acontecendo, vai se criando uma pressão dentro das relações afetivas e, ao explodir, causar diversos danos, em ambas as partes.
Isso se dá, pois, a sociedade brasileira não aprendeu a manter relações afetivas saudáveis, tendo herdado problemas familiares desde as épocas onde a violência contra a mulher era algo normal.
Sem uma educação reconstrutora dessa visão, com base na mudança da cultura, criou-se uma mentalidade patriarcal moderna onde o homem pensa ser dono da sua mulher e, esta, por sua vez, exige que o parceiro seja constantemente vigiado e controlado pelo ato de amor de uma mulher ciumenta.
A verdade hoje é que o ciúme virou um traço cultural do brasileiro, onde a mulher ciumenta é motivo de risadas nos encontros dos homens. E, caso apareça tal mulher ciumenta, nesses encontros, irritada, impondo que o seu marido volte com ela sob pena de um punhado de tapas e arranhaduras na frente dos amigos, tal evento se tornará um assunto a ser comentado com risos e uma roupagem de comédia.
Citando Miller (1995), a mestranda Lauane Baroncelli, da University College Cork, Cork, Ireland, narra que:
“No campo das relações amorosas contemporâneas, Miller (1995) associa tal processo ao que ele denomina "terrorismo íntimo" (p. 74). A partir dessa metáfora, o autor explica como, frequentemente, casais contemporâneos, ao invés de estabelecerem um encontro com o outro, no qual a afirmação mútua retroalimente os envolvidos, constroem um padrão baseado na disputa pelo controle da relação e prevalência das ideias e desejos de cada um. Nesse sentido, ao invés de uma relação ou parceria, o que acaba se desenvolvendo é algo semelhante a uma "guerra a dois" em que, nos moldes da cultura capitalista de mercado, cada um luta por seus próprios interesses, sem conseguir efetivamente se comunicar com o outro.”
A lógica para a solução disso seria a criação de uma legislação sobre a introdução da inteligência emocional dentro das instituições públicas e privadas de ensino, evidenciando que, dentre outras verdades, o ciúme deveria ser tratado como um problema de saúde mental e emocional e que, a vítima desse tipo de problema pode ser tanto o homem quanto a mulher.
O ciúme não pode ser tratado com menosprezo, sendo o problema um gerador de diversas agressões. Não pode ser tratado com comédia e nem ser entendido como um sentimento bom.
O ciúme não pode ser tratado como um traço natural feminino enquanto que é tratado como um pressuposto criminoso do homem. O ciúme deve ser entendido como uma prática que afeta o ser humano dentro de uma relação, independente se este é homem ou mulher.
Ao citar a educação emocional como fator decisivo de mudança do paradigma, passaremos a falar de outro tipo de educação que deveria ser útil para o fim do contexto de violência doméstica dentro da sociedade brasileira: O planejamento financeiro e familiar como ferramenta de diminuição da violência doméstica.
A FALTA DA EDUCAÇÃO FINANCEIRA E DO PLANEJAMENTO FAMILIAR
“A família é uma instituição social fundamental, composta por pessoas unidas por laços biológicos, afetivos ou legais, que desempenha papéis essenciais no desenvolvimento emocional e social dos indivíduos. ”
Um conceito simples, porém, crucial para concluir que a família deve ser um elo de pensamentos e atitudes comuns entre os dois parceiros. Como sendo o primeiro espaço de socialização e formação do indivíduo, a família desempenha papel fundamental na formação de uma sociedade.
Criar uma família é uma das tarefas mais importantes que um ser humano pode realizar ao longo da sua vida. Este veio de uma família e fundará uma nova, a qual fundará outras, ramificando um legado que já dura milhares de anos.
No Brasil, conforme o portal de notícias CNN, através de uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Comércio (CNC), o endividamento das famílias em abril de 2025 chegou ao patamar de 77,6%.
Uma família endividada não só afeta a sua saúde financeira, mas contribui para ciclos de violência doméstica. Há uma correlação entre a pobreza e a violência contra a mulher uma vez que tal tema contribui para a vulnerabilidade feminina, por ser esta, na maioria das vezes, a pessoa que viver em prol de organizar a casa e cuida dos filhos, ficando dependente do marido para sua subsistência financeira.
Assim, destaca Maíra Soalheiro e Antônio Rediver na obra “Mulher, pobreza e violência – a face perversa da desigualdade de gênero, conforme vemos a seguir:
"O lugar ocupado pela mulher na sociedade desde há muito tempo foi estabelecido como um espaço de submissão. Ainda hoje, mesmo quando possuem um emprego formal (no qual muitas vezes recebem remuneração menor do que homens que ocupam a mesma função), ainda existe uma aceitação, por parte da maioria das próprias mulheres, de que lhes é destinada a realização dos afazeres domésticos e o cuidado com os filhos ."
O mesmo estudo ainda destaca que a pobreza é vista como uma privação de capacidades e se revela de maneira mais clara quando se trata de desigualdade de gênero, uma vez que a baixa renda dentro do organismo familiar costuma impactar os seus membros de maneira desigual, afetando ainda mais a mulher, inclusive com números de mortalidades mais altos para o gênero do que em comparação aos outros membros.
Embora exista em todos os contextos sociais e econômicos, a violência doméstica está mais presente nos lares mais pobres. Seja pela falta de uma boa educação no seio de tais lares, seja pela posição de extrema inferioridade que mulheres pobres acabam se submetendo, haja vista a falta de oportunidades que outras mulheres de classes sociais mais ricas possuem.
Como já foi dito, a família é o elo pioneiro do ser humano com as demais instituições sociais. Uma família bem equilibrada, sem dívidas e com um planejamento familiar condizente com suas capacidades financeiras tende a gerar um ambiente propício para a harmonia e saúde dos seus integrantes.
A família é a instituição mais importante para um indivíduo e, se há algo tão importante na história da humanidade, questiona-se porque o Brasil ainda não introduziu em sua educação básica disciplinas como planejamento familiar e educação financeira familiar, dentro das bases curriculares nacionais voltadas para indivíduos que ainda não estão em idade de fundar uma nova família.
Indivíduos estes que podem, com base nos ensinamentos oriundos desse tipo de educação, não só modificar a família nas quais eles já estão inseridos, atuando como um indivíduo de transformação, mas como também reiniciar um ciclo de pensamentos patriarcais e ultrapassados, passando a ser um disseminador de um pensamento mais voltado para a proteção das futuras relações familiares.
O planejamento familiar vai muito além do que a quantidade de filhos ou ao momento em que eles chegarão. Ele percorre pela conscientização das leis de proteção à família, a quebra de padrões negativos sobre as relações familiares e visa, com base na prevenção, uma nova roupagem e proteção, não somente à mulher, mas à relação.
A formação cultural, ética e moral de mulheres deve levar em conta a sua capacidade de assumir posições de destaque na sociedade e na sua família. Não se resumindo a meras coadjuvantes em uma família, incumbidas integralmente aos cuidados dos filhos e da casa.
Por outro lado, cabe à formação dos homens uma maior conscientização de que homens e mulheres são iguais entre direitos e deveres, conforme narra a Constituição e tal afirmação abrange todos os campos da sociedade.
Ensinar tais premissas aos jovens, mediante a introdução de matérias específicas dentro da Base Nacional Comum Curricular, é uma solução que dará uma melhor conscientização dos direitos inerentes à pessoa humana, reduzindo a herança triste que o Brasil traz consigo, quando se trata de menosprezo à mulher de modo geral.
Isso faz gerar pessoas mais conscientes dentro de suas relações e menos propensas à erros culturais como a cultura do ciúme, a resolução de conflitos com base na violência, o preconceito baseado no gênero e vários outros problemas herdados de uma cultura misógina, outrora difundida entre nossos pares.
Todo esse contexto cultural, econômico e social contribui para a presença de violência doméstica nos lares brasileiros. E, por mais que o predomínio dessa violência aconteça tendo o homem como sujeito ativo, há de se levar em conta que o brasil normaliza certas culturas nas quais a mulher é também protagonista.
QUANDO O HOMEM É VÍTIMA DE UMA MULHER?
Depois de todo o narrado, já não há mais dúvidas de que o problema da violência doméstica é uma questão estrutural na sociedade. A cultura, a música, o teatro, o cinema e o senso comum normalizam certos abusos oriundos de uma relação tóxica onde, muitas vezes, o homem também é vítima:
“Tapas, beliscões, arranhaduras, socos, arremessos de facas, de tesouras ou de panelas, uso de palavrões, xingamentos ou acusações que venham a ferir a integridade física ou a honra de seus companheiros podem até ser características e atitudes que qualificam mulheres ciumentas e convencionalmente aceitas pela sociedade. Parece até algo usual na cultura brasileira, sendo reproduzida na dramaturgia, música, cinema e demais meios artísticos, porém tais atos podem configurar uma linha de violência doméstica capaz de destruir famílias tanto como aquelas oriundas da violência masculina. ” (MATA, Leandro F.)
O grande problema é que a pessoa vítima de tais abusos geralmente não se sente bem e o pior, é ridicularizado por ser vítima, na condição de homem.
Isso impede que o sujeito passivo tome uma atitude e, infelizmente, aos que se veem com coragem para tomá-las, correm o risco de responder de forma violenta e agressiva, contribuindo para o ciclo de violência doméstica, caso não seja devidamente amparado e direcionado para o procedimento adequado para a resolução de tais situações.
Geralmente, relações onde a mulher tende a ter um comportamento agressivo, movido por ciúme excessivo e carregado de violência, há um efeito colateral destacável no tratamento das instituições públicas em relação a relação de gênero, podendo causar violações em relação aos princípios da presunção de inocência e ao princípio do devido processo legal.
Nesse caso, nos episódios de conflitos familiares, a mulher exerce papel de protagonismo no conflito, ou no mínimo, ambas as partes possuem igualdade no fator de violência. Porém, ao Judiciário analisar o caso, friamente, se dá mais ênfase na palavra da mulher e há um esvaziamento de sua responsabilidade dentro do conflito.
Para contextualizar a situação, passamos a imaginar uma situação de violência doméstica.
De um lado, uma mulher que, movida por ciúme, arremessa o aparelho celular do marido no chão, quebrando-o. Após isso, a mulher pega um objeto perfurocortante e tenta acertar o marido. Este, valendo-se de sua força e temendo por sua vida, consegue desarmar a esposa e passa a segurá-la firme pelos braços, gerando uma pequena mancha arroxeada em ambos os membros.
Ao chegar na delegacia, a mulher mostra os braços e narra os fatos, porém, ocultando suas condutas, visando não produzir provas contra si mesmo. Enquanto o homem narra todo o acontecido fielmente.
Embora a mulher tenha ocultado a sua motivação em perfurar o marido. É a sua palavra que terá relevância se, no contexto dos fatos, não se resta outra prova para o convencimento da autoridade policial.
Levando em conta que a maioria das violências dentro dos lares brasileiros não possuem testemunhas oculares, será o marido que responderá por um crime e terá, contra si, diversas medidas protetivas.
No final do conflito, por mais que o homem tenha tido risco de perder a sua vida, tal fato será injustamente ignorado pelas instituições públicas, uma vez que é a palavra da mulher que possui relevância.
O que foi apresentado na situação fática é um dos problemas que mais ocorrem quando a mulher registra um boletim de ocorrência falseando os fatos com o intuito de prejudicar ou afastar o companheiro.
De acordo com a Cartilha “Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher: Mitos e verdades” da Defensoria Pública do DF (pág. 17) :
A posição predominante dos juízes e Tribunais é de que o depoimento da vítima prepondera sobre a versão do réu. A premissa é de que, como os delitos costumam ser praticados no ambiente doméstico, sem a presença de testemunhas, a palavra da vítima ganha maior relevância.
Por mais que a maioria das ocorrências narram violências verdadeiras cometidas contra as mulheres. Por mais que seja casos isolados, o desbalanceamento que a Lei Maria da Penha exerce no Direito como um todo, tende a deixar os casos de denunciação caluniosa um problema sério no país e que deve ser retificado urgentemente.
No final de 2024, o tema ganhou destaque e virou ponto de discussão no Senado Federal, em uma audiência pública que tratou de relatos “sobre situações em que homens teriam sido vítimas de acusações falsas sob a Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 2006) e a controvérsia sobre a aplicação de medidas protetivas. ”
De acordo com especialistas que participaram da Audiência, a aplicação da Lei Maria da Penha possui um problema de segurança jurídica em sua aplicação, necessitando de um aprimoramento do texto da norma, tendo em vista que a simples palavra da mulher, quando convincente e formalizada em delegacias e varas especializadas sobre o tema, tende a causar o afastamento entre pais e filhos, podendo levar a um afastamento tanto justo quanto injusto.
Além disso, verifica-se pela fonte supracitada que a mudança da redação da citada lei pode manter a proteção da mulher e retificar tais injustiças ao exigir indícios de prática de violência doméstica para a concessão de medidas de afastamento.
A Jurisprudência brasileira cita que deve haver pressupostos fáticos mínimos para o deferimento da medida protetiva, porém, vê-se na prática que o problema da denunciação caluniosa geralmente vence quando o conflito se desenrola em uma relação sem testemunhas, justamente pelo fato de prevalência da palavra da vítima na relação.
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECLAMAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. AMEAÇA. INDEFERIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS DE RISCO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. I. CASO EM EXAME 1. Reclamação criminal interposta contra decisão do Juízo do 2º Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Brasília, que indeferiu pedido de medidas protetivas de urgência em favor da vítima reclamante. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Se há nos autos elementos probatórios suficientes para comprovar risco iminente à integridade física ou psicológica da vítima, justificando a concessão das medidas protetivas de urgência. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. As medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha possuem natureza cautelar e visam a resguardar a integridade da mulher em situação de violência doméstica. 4. Para seu deferimento, exige-se demonstração concreta de risco atual ou iminente à vítima, sob pena de indevida restrição de direitos fundamentais do suposto agressor. 5. No caso, a análise da ocorrência policial e dos elementos dos autos não revela indícios suficientes de ameaça real e imediata à ofendida. 6. A jurisprudência confere especial relevância à palavra da vítima, mas essa presunção não dispensa a necessidade de elementos mínimos que indiquem a situação de perigo para justificar a imposição de medidas restritivas. IV. DISPOSITIVO 7. Pedido julgado improcedente. (Acórdão 1991537, 0704886-58.2025.8.07.0000, Relator(a): CRUZ MACEDO, 3ª TURMA CRIMINAL, data de julgamento: 23/04/2025, publicado no DJe: 09/05/2025.)
Isso se dá porque, corretamente, as autoridades judiciárias devem zelar cautelarmente pela proteção da mulher, em casos de supostas violências no âmbito das relações afetivas.
Se não fosse dessa forma, em maior número seria os casos de feminicídios dentro da realidade brasileira, os quais, atualmente, ainda são elevados.
A questão não é sufocar a prevalência da palavra da vítima sobre os fatos, mas sim, ter a capacidade de analisar o contexto. Baseando na personalidade da mulher, assim como a do homem.
Por outro lado, é cabível uma reprimenda maior quando se tratar, claramente, de um contexto de denunciação caluniosa por parte da mulher. Isso se mostra importante pois visa dar maior credibilidade social à Lei Maria da Penha, tendo em vista as críticas se concentrarem em tais fatos.
Aqui, não se busca uma reprimenda criminal para mulher, mas uma reprimenda capaz de reeducar a maneira correta de usufruir de um direito que a ela pertence. Como sugestão, parece-nos ideal uma reprimenda baseada em indenizações ou obrigações de fazer por parte da mulher que denuncia, caluniosamente, uma ocorrência de violência doméstica. Gerando o dever de se retratar, de se matricular compulsoriamente em cursos de inteligência emocional ou, em casos mais severos, indenizar a vítima por meio de um processo de execução mais célere do que os atuais, valendo-se até mesmo de sua meação dos bens provenientes do relacionamento.
Já em relação à conduta cultural da mulher ciumenta, agressiva e que, muitas vezes, não responde pelos danos gerados por sua conduta, há de se valer de sugestões de erradicar esse tipo de comportamento prejudicial ao homem, como sujeito de direitos.
Mais uma vez, diferente dos crimes cometidos por homens que ainda devem ser tratados na seara criminal, pela predominância das ocorrências, a mulher, por sua vez, deve ser responsabilizada por seus atos abusivos através de comparecimentos a cursos ou palestras sobre inteligência emocional, sobre saúde mental dos homens, e outros gêneros que visem a reeducação emocional sobre o tema, podendo haver indenização por danos morais ou materiais.
O objeto não criar uma Lei João da Penha, mas conscientizar a mulher de que suas atitudes também devem contribuir para a extinção do ciclo de violência doméstica do qual ela é a principal vítima.
Em face do alegado, é importante que os réus de violência doméstica, na condição de homens, adotem mais cautelas quando as relações se apresentarem conturbadas e possível de gerarem ocorrências de natureza criminal. Desde a produção de provas que lhe sejam favoráveis até a realização de consultas com defensores e advogados, para minimizar os efeitos de uma possível denunciação caluniosa .
O ideal é que seja realizada a prevenção a fim de que os conflitos familiares não cheguem ao ponto da ocorrência de um contexto de violência.
Porém, havendo conflitos e analisando a conduta e o comportamento da parceira, é necessário que o homem passe a ter um comportamento cauteloso, não somente produzindo provas de que a mulher é capaz de fornecer uma denúncia falsa, como também a produção de provas de que não há ou não houve qualquer conduta agressiva na condição de homem.
Embora pareça moralmente depreciativo agir de tal maneira, é necessário analisar o contexto no qual a relação está inserida e, com base em tal contexto, analisar que será preciso se defender de uma acusação falsa, motivada por alguém que possui presunção de veracidade perante toda e qualquer autoridade pública.
METODOLOGIA
A metodologia aplicada no presente estudo se deu de forma mista. Buscou-se a pesquisa de dados quantitativos, devidamente publicados por portais de notícias comprometidas com a veracidade dos fatos.
Para uma melhor interpretação das ideias, tendo em vista que o público alvo é a família brasileira, buscou-se priorizar fontes disponíveis a qualquer cidadão, baseada em cartilhas que, por sua vez, dada a importância e ao autores envolvidos, basearam-se em dados críticos sobre o tema, fontes científicas e experiência de órgãos públicos que tratam, cotidianamente, o tema.
A partir de dados obtidos e divulgados pela imprensa nacional, e fazendo uso de artigos científicos já publicados, buscou-se analisar os dados trabalhando o problema central.
Ou seja, o estudo se deu tanto na fundamentação metodológica qualitativa, quanto quantitativa, levando em consideração pesquisas bibliográfica e estudos de campo realizados por instituições públicas e de pesquisa.
No momento da escolha das fontes, percebeu-se que Portais de notícias podem fornecer contexto e informações sobre eventos atuais, que podem ser úteis para artigos que abordam temas contemporâneos. Como é o caso da pesquisa. Se amparar em artigos científicos sobre o tema, capturando dados antigos, seria prejudicial ao foco central da pesquisa, o qual é apresentar a realidade sobre a violência doméstica.
Nesse contexto as informações obtidas por meio de portais de notícias foram contextualizadas e analisadas criticamente, tendo como referências audiências legislativas, pesquisas estatísticas, dentre outros fatores de ancoragem científica.
Ademais, além dos portais, a fundamentação teórica foi recheada de outros documentos estatais sobre o tema, dando credibilidade e estrutura a fundamentação jurídica apresentada, uma vez que as cartilhas citadas apresentam o tema como ele é.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Finalizando o presente estudo, fica a sensação de que o seu teor causará constrangimento no meio acadêmico por tratar de um assunto que não é abraçado pelos demais cientistas jurídicos.
Falar do homem como vítima e a mulher como abusiva parece ser errôneo e injusto, tendo em vista os diversos casos de feminicídios que acontecem no Brasil a cada hora.
Porém, é necessário entender que o remédio geralmente é amargo em seu sabor, mas precisa ser administrado a um paciente doente. No caso, a cultura brasileira precisa ser restaurada, visando se alicerçar no respeito mútuo dentro dos lares brasileiros.
É necessário enfatizar que, na sociedade brasileira, não cabe mais a cultura do ciúme, para ambos os lados de uma relação afetiva. Que não se deve normalizar comportamentos abusivos como algo culturalmente aceito.
É imprescindível que as novas gerações passem a entender que o papel de homem e de mulher possuem peso igual e, como sujeitos de direitos, devem ser respeitados em igualdade de tratamento.
Deve-se predominar na educação brasileira, práticas que visem deixar a família mais saudável, menos agressiva e mais tolerante, deixando as portas abertas para uma melhor qualidade de vida, financeira e cultural.
Verifica-se que, para que a Lei Maria da Penha seja motivo de orgulho nacional, há a necessidade de se trabalhar a boa-fé, cortando condutas que possam levar a lei à um julgamento moral errôneo e cercado de injustiça.
Para isso, é necessário que a Lei Maria da Penha, que tanto protege a mulher brasileira, passe a se autorregular de uma forma melhor, desencorajando mulheres a denunciar seus parceiros de forma injusta, por saber que a sua versão terá um peso maior perante as instituições públicas.
De uma forma geral, o objetivo do estudo é apresentar ao leitor um terceiro caminho, visando encarar a violência doméstica como um produto cultural e que, como tal, não pode ser totalmente resolvido com criação de leis, mas sim, com um trabalho sistemático da sociedade e do Estado, tendo como base a educação e a mudança ética e moral.
A mudança na forma de enxergar a sociedade deve vir de ambas as partes. A mulher deve se conceber como uma pessoa de direitos iguais aos dos homens, no mesmo patamar de direitos e deveres. E os homens, principalmente os homens, devem modificar o pensamento secular herdado de um passado violento e abusivo e passar a ver a mulher como um sujeito de direitos sem a necessidade de leis específicas para tanto .
Espera-se que daqui meia década, um novo estudo seja realizado, e nele conste as evoluções que a família brasileira obteve, com o combate da violência doméstica e familiar em todos os lares do país.
O saldo do estudo aqui gerado é extremamente positivo, uma vez que, sem atacar uma lei tão importante como se faz a Lei Maria da Penha, identificou que a busca pelo equilíbrio pode ser exercida sem modificar o que está bom e que até a lei mais eficaz pode ser objeto de melhora..
REFERÊNCIAS
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BARONCELLI, Lauane. Amor e ciúme na contemporaneidade: reflexões psicossociológicas. Disponível em: https://www.scielo.br/j/psoc/a/F9LwbG4bFJQN46Jb6BTWDsh/. Acesso em: 08 jun. 2025.
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