O aparente conflito entre o tema de repercussão geral nº 497 do STF com a tese vinculante nº 55 do TST e a interpretação da doutrina do 'stare decisis' na sistemática dos precedentes judiciais

02/07/2025 às 17:12
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Julio Cesar da Silva Nunes [1]

INTRODUÇÃO

O Direito se apresenta conforme a sua realidade, no entanto, antes de analisar qualquer parte de seu sistema, implica, necessariamente, conhecê-lo, aproximando-se de suas bases. Os precedentes judiciais se prestam a estabelecer segurança jurídica no ordenamento, devendo se mostrar coerente e em obediência à hierarquia Constitucional entre os tribunais.

Para essa análise, propomos um breve estudo sobre os efeitos e impactos da neoprocessualística na teoria da decisão judicial, ligada à estabilidade da gestante celetista quando solicita demissão, seja ela vinculada à pessoa jurídica de direito público (servidora celetista) ou privado, já que a Constituição Federal (art. 39, §3º) garante extensão dos direitos sociais às servidoras públicas, sob o aspecto da positivação do sistema de precedentes judiciais e o aparente conflito entre as normas vinculantes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior do Trabalho.

Considerando todo o contexto apresentado, é possível afirmar que temos como grande desafio a enfrentar, os tribunais, ao pacificar suas jurisprudências, devem observar princípios jurídicos como o da “stare decisis”, hierarquia constitucional do Poder Judiciário, sempre em observância às decisões da Corte Suprema, cuja finalidade precípua é a guarda da Constituição e a pacificação da jurisprudência nacional.

1. AS FONTE DO DIREITO, A ATUAL HERMENÊUTICA JURÍDICA E O PRINCÍPIO DA “STARE DECISIS”

O estudo da decisão judicial não se restringe ao campo do processo civil, muito embora seja esse o nosso ponto de partida. As atividades jurisdicionais trabalhistas e penais, por exemplo, respeitadas suas particularidades, também estão em consonância com a temática, eis que são esferas afetas à teoria geral do processo (Jurisdição), cujas bases, na contemporaneidade, encontram-se em ebulição; fatos que nos obrigam a enveredarmos por novos contornos, resultando numa nova compreensão.

Declinamo-nos a tese de que a Teoria Geral do Processo é ramo da Teoria Geral do Direito, conforme afirma Didier citando Morello e outros.[2]

Num patamar contemporâneo, o processo conceitua-se de várias formas. No entanto, importa para o presente estudo, devido às suas especificidades, adotar um direcionamento a partir da Teoria da Norma Jurídica, considerando o processo como método de criação e produção normativa.

Não obstante, insta esclarecer que a doutrina de Didier [3] enumera a criação de normas e diretrizes de variados tipos de processos para sua formação, à guisa de exemplo: a) processo legislativo; b) processo administrativo; c) processo negocial; e d) jurisdicional.

No que toca à releitura do direito processual, após o segundo quartel do século XX, inarredável se fazer uma reflexão, ainda que muito breve. Em linhas gerais, segundo aponta Didier [4], o direito processual evoluiu, atravessando fases como a do a) “praxismo ou sincretismo”, na qual direito material e processual eram fundidos, valorizando-se o conhecimento prático, sem qualquer caráter científico; b) “processualismo”, apresentando aspectos científicos; c) “instrumentalismo”, fase na qual se apresenta um direito processual autônomo a serviço do direito material. O Neoprocessualismo, por sua vez, retrata uma outra espécie de evolução, no qual aplica-se o direito processual a partir do prisma Constitucional (Teoria dos Direitos Fundamentais), caracterizando-se como a constitucionalização do Direito Processual.

Com efeito, o Código de Processo Civil, não há mais o que discutir sobre a legitimidade desta “quarta” evolução do direito processual e sua compatibilidade com o sistema brasileiro, in verbis:

Art. 1o O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

A doutrina do “stare decisis et non quieta movere” [5], ou simplesmente “stare decisis”, derivada do latim, e traduz-se na ideia de "manter-se nas decisões e não perturbar o que está estabelecido", revelando-se no dever de os tribunais decidirem casos futuros de maneira coerente com decisões anteriores já tomadas, respeitando a dogmática jurídica e a essência da norma extraída do processo cognitivo para a interpretação/aplicação do sistema normativo.

Com isso, inegável a nova feição do direito processual brasileiro na era contemporânea. Nessa esteira, a função jurisdicional também adquire feições de criação de normas jurídicas, ao lado da positivação do sistema de precedentes judicias, o que examinaremos em itens próprios.

2. A DECISÃO JUDICIAL COMO NORMA JURÍDICA

Como resultado de um processo intelectivo exegético, a sentença parte do sentir judicial, ao analisar provas em determinada instrução, construindo normas jurídicas, sendo relevante objetos de estudos da Teoria Geral do Processo, e também dentro da dogmática do Direito Processual. A sentença em sentido lato (decisão judicial), como gênero de pronunciamento judicial, ou seja, com cunho decisório, ora se referindo ao juízo monocrático, ora tratada no âmbito de órgãos colegiados.

No capítulo da sentença, no direito processual comum, por sua vez, lança mão de critérios cumulativos e restritivos para identificá-la, diferenciando-a, evidentemente, da decisão interlocutória, ora sendo tratada como decisão final, que “põe fim” ao processo ou quaisquer de suas etapas, ora como decisão definitiva (resolvendo mérito) ou terminativa (sem apreciação e resolução de mérito). Além disso, sabe-se que é com base na espécie de decisão judicial é que o sistema recursal irá se orientar e mover, pois é através da sentença que se saberá qual o recurso cabível.

Podemos apontar situações nas quais se resolvem questões sem se extinguir o processo, através de decisões interlocutórias, impugnáveis por agravo de instrumento, a título de exemplo, casos de improcedência liminar do pedido (CPC, art. 332 e seguintes); exclusão de litisconsórcio por ilegitimidade (CPC, 1015, VII), dentre outros. É possível notar que atrelar sentença ao seu conteúdo, como conceito, pode causar confusão, pois tais situações representariam uma sentença com alma de decisão interlocutória, refletindo diretamente, como mencionado, na etapa recursal.

A sentença deve continuar sendo lida e compreendida como ato que encerra determinada fase processual (espírito do processo sincrético). Além disso, na seara epistemológica e normativa, ela apresenta, no mínimo, um duplo discurso, apresenta uma resposta ao caso concreto, e serve de modelo para casos futuros semelhantes.

Para o jurista Didier [6], a sentença é um ato jurídico que contém uma norma jurídica individualizada, ou simplesmente norma individual, definida pelo Poder Judiciário, que se diferencia das demais normas jurídicas.

Marinoni registra, com propriedade, que as fases da resposta judicial, antes, um juiz mero reprodutor de textos legais (Juiz robô, juiz bouche de laloi ou, simplesmente, “boca da lei”), assim, afirma que se nas teorias clássicas o juiz apenas declarava a lei ou criava a norma individual a partir da norma geral, agora ele constrói a norma jurídica a partir da interpretação de acordo com a Constituição.[7]

Nota-se que, apesar de considerável evolução legislativa, o sistema ainda é incompatível com a aproximação da sentença como norma jurídica.

2.1. A teoria geral do sistema de precedentes no Brasil

Conforme exposto, da sentença extraem-se normas a partir da fundamentação e do dispositivo. Sendo que, no dispositivo, o juiz fixa a norma jurídica individualizada, ou seja, o caso submetido à apreciação do juiz, diante de determinada Lide [8], solucionando a demanda, tornando-se indiscutível através da coisa julgada e seus efeitos.

Como resultado da evolução do direito e de seu conceito, especialmente na era em que a Constituição deixa de ser simples documento político, e passa a figurar como documento jurídico (força normativa), na fundamentação da decisão, no pós-positivismo, o juiz terá que identificar qual será a norma jurídica geral do caso concreto, ou seja, a norma geral que serviu para regular o caso concreto em análise. Essa norma jurídica geral do caso concreto, que não se confunde com a lei (sentido amplo, fruto da produção legislativa, por exemplo), será descoberta, revelada, ao ler a fundamentação da sentença.

Entre a “Lei” e o caso concreto, figura o juiz, que deverá buscar a solução do caso no sistema normativo jurídico, devendo sentenciar até mesmo ante a ausência de lei, aplicando um princípio de direito, por exemplo. Sob esse aspecto, registre-se que o juiz, no pós-positivismo jurídico reconstrói o sistema, produzindo norma para as partes e com poder de influenciar, em tese, casos futuros.

Essa norma geral da fundamentação apresenta, didaticamente, as seguintes características: a) norma produzida pela atividade jurisdicional; b) norma construída a partir de um caso (aplicação da norma existente no ordenamento jurídico ao caso concreto, norma que apresenta determinado contexto), não se confundindo com a “Lei” em sentido amplo, produzida para regular casos futuros; e c) norma que serve como modelo para solução de casos futuros semelhantes (padrão interpretativo de aplicação).

Quando citamos acórdão ou ementa de determinado tribunal, com a pretensão de que ele nos favoreça, dizendo que o direito em debate é o do caso, ou não, tal função restringe-se à análise da norma geral do caso concreto, com a esperança de que essa norma produzida deva ser aplicada.

Portanto, o processo jurisdicional, na era contemporânea, apresenta dupla finalidade, a saber, solucionar o caso concreto e servir de base para casos futuros. A concepção moderna de que o processo era um meio de solução de um caso apenas ficou no passado, tornou-se incompatível com o atual constitucionalismo. Passamos a seguir a algumas considerações acerca da norma jurídica do caso concreto, jurisprudência e súmula.

A norma jurídica geral do caso concreto, construída a partir de um caso, localizada na fundamentação, possui o nomem iuris deprecedente judicial. A jurisprudência é a reiterada aplicação de um precedente, ou seja, é o precedente que começa a ser reiteradamente aplicado em um determinado tribunal.

A súmula, por sua vez, é o enunciado normativo do precedente judicial consolidado, ou seja, é o enunciado da jurisprudência de determinado tribunal, com eficácia erga omnes. A coisa julgada, por sua vez, vincula apenas as partes da norma jurídica individualizada. Por essa razão, não faz sentido interpretar uma súmula sem conhecer os precedentes que lhe deram origem, assim, só se interpreta a súmula dentro de um contexto fático-jurídico.

A interpretação do precedente, aplicando-o ou não, ao caso concreto, chama-se distinguishingora comunicada como distinguimento ou simplesmente como distinção. Com isso, todo precedente judicial somente pode ser aplicado após o distinguishing. Dessa forma, o juiz, ao aplicar o precedente judicial, deve realizar o distinguimento, interpretando o precedente, é conatural à interpretação.

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A eficácia de qualquer precedente judicial, conforme sumariamente aventado, serve para toda a coletividade, produzindo efeitos, a saber: a) persuasivo: elemento de convencimento do juiz; b) obstativo: impedindo recursos. Ex.: súmulas de tribunais; c) vinculante: de observância obrigatória. Ex.: súmulas vinculantes do STF; vinculação do tribunal à sumulas que prolata; e precedentes em julgamento de recursos repetitivos.

Como exposto na introdução de nossa pesquisa, o Direito é um organismo vivo e dinâmico, por isso, passível de interpretações e superações de entendimentos. Os precedentes, portanto, são interpretados da mesma forma que as leis. Nessa esteira, os precedentes podem ser, hermeneuticamente, superados por justificada interpretação, ou seja, advento de novo precedente. Todo fenômeno jurídico pode ser relido com o advento de normas legislativas ou até mesmo releitura de entendimento, uma nova razão ou visão do aspecto social. Tal fato apresenta-se com o nome de overruling. O overruling pode apresentar eficácia ex tunc (retrospectiva) ou eficácia ex nunc (prospectiva).

O sistema atual do Brasil, disciplinado no CPC prega o respeito ao sistema dos precedentes, consequentemente, algumas normas fundamentais devem passar por uma repaginação. O princípio da igualdade, nesse contexto, passa a ser representado não apenas pela igualdade perante a lei, mas sim, perante o Direito, incluindo, assim, os precedentes (igualdade perante os tribunais).

Outro instituto que deve ser repensado nesta sistemática é a motivação da sentença, ou seja, no duplo discurso da sentença, o juiz deve ater-se ao caso concreto e para a coletividade. Norma jurídica geral do caso concreto também se apresenta como a razão de decidir, chamando-se de ratio decidendi (elemento normativo do precedente, norma que sustenta a solução do caso concreto). É a aplicação reiterada da ratio decidente que irá se transformar em jurisprudência.

No entanto, nem tudo que está na fundamentação é ratio decidendi. Pode constar comentários satélites, paralelos, de passagem, opiniões doutrinárias, feitos pelo juiz também são conhecidos como obter dictum (ou, no plural, obter dicta). Ele revela futuro entendimento do juiz, é possível citar como exemplo o voto vencido.

3. DO PEDIDO DE DEMISSÃO DA GESTANTE E O APARENTE CONFLITO ENTRE O TEMA DE REPERCUSSÃO GERAL Nº 497 E A TESE VINCULANTE Nº 55 DO TST

O pedido de demissão, cuja natureza processual é retratada como prova pré-constituída [9], revela verdadeira manifestação de vontade livre e incondicionada, perante seu empregador, podendo ser entendido também como expressão de Negócio Jurídico. Nesse aspecto, sua validade e veracidade se subentende, recaindo o encargo probatório em sentido contrário para a parte que, eventualmente, venha a alegar a sua nulidade ou vício de consentimento.

A estabilidade provisória da gestante é um direito garantido e reconhecido pelo ordenamento jurídico, desde a confirmação da gravidez, até cinco meses após o parto, nos termos do art. 10, II, “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), independentemente da ciência do empregador (súmula 244, I, do TST), e ainda que posterior ao desligamento a pedido.

Além disso, dando sequência à análise da jurisprudência do TST, fica garantido o direito à reintegração, desde que ela ocorra durante o período da estabilidade mencionada (súmula 244, II), incidindo, inclusive, em contratos por prazo determinado (súmula 244, III). Porém, apesar do posicionamento firmado, a questão permanecia polêmica e divergente nos Tribunais Regionais, inclusive entre Turmas do C. TST, seja no contrato a termo, seja na modalidade por prazo indeterminado.

Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, por sua vez, ao julgar RE 629.053/SP, em 10/10/2018, tendo por “ratio decidendi” a Dispensa sem Justa Causa nos contratos a termo ou por prazo indeterminado, estabeleceu com Repercussão Geral, o Tema 497, que se revela no sistema jurídico da seguinte forma:

“A incidência da estabilidade prevista no art. 10, inc. II, do ADCT, somente exige a anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa.”

A celeuma se instala quando o C. Tribunal Superior do Trabalho, analisa a validade da demissão, inclusive quando na modalidade “a pedido”, estabelece, reafirmando sua jurisprudência, a Tese Vinculante nº 55, com o seguinte teor, vejamos:

“A validade do pedido de demissão da empregada gestante, detentora da garantia provisória de emprego prevista no artigo 10, inciso II, alínea "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), está condicionada à assistência do sindicato profissional ou da autoridade local competente, nos termos do artigo 500 da CLT.”

Note-se que, quando da análise das normas internacionais, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) também recomenta proteção à maternidade contra a demissão. Nesses termos, o Brasil ratificou a Convenção 103, da OIT (Decreto nº 58.820/1966), que estabelece a proteção contra a “demissão”, não tratando sobre “pedido de demissão”. No mesmo sentido, a Convenção 183 da OIT, que estabelece a proibição da “demissão” durante a gravidez ou licença, salvo por motivo não relacionado à maternidade, dando margem interpretativa para se vislumbrar a desnecessária proteção da maternidade quando se trata de pedido de demissão.

Embora a Convenção 183 não tenha sido ratificada pelo Brasil, a Constituição da OIT, de 1919, estabelece que os Estados-membros, ao integrarem, assumem o compromisso de respeitar, promover e realizar os princípios e direitos fundamentais do trabalho, mesmo que não tenham ratificado todas as convenções [10], ou seja, mesmo sem ratificar a Convenção nº 183, por exemplo, deve o país se abster de agir contra seus princípios, como vincular o pedido de demissão da gestante à homologação sindical (CLT, art. 500), visto que a proteção está no âmbito da demissão, nem tampouco pode ser visto sob o pálio da Legalidade (CF, art. 5º, II).

Ora, demissão a pedido não se confunde com demissão sem justa causa, distinguindo-se, inclusive, em seu sentido semântico, pois a primeira não retrata razão subjacente. Já esta última, apresenta-se como manifestação de vontade livre da empregada, normalmente manifestada por escrito, no sentido de não mais quer manter o vínculo de emprego.

Se o objetivo da legislação é proteger a maternidade do desamparo social e pessoal, proporcionado pelo desemprego, não faz sentido dificultar a rescisão contratual quando a gestante resolve rescindir o contrato de trabalho. Diante de patente desrespeito à autoridade da jurisprudência vinculante do STF, a Tese n. 55 do TST deve ser objeto de questionamento, pela via difusa, mediante Reclamação Constitucional, com fundamento no art. 103-A, da CF, regulamentado pela Lei 11.417/2016, para que seja revista e corrigida, mantendo a uniformidade no sistema.

Por se tratar de missão institucional dos precedentes a estabilização jurisprudencial e segurança jurídica, os tribunais, órgãos de Estado, devem observar e sanar eventuais inconsistências ou incoerências na interpretação. No presente caso, inegável o fato de o STF estar localizado em patamar Constitucional superior pois, nos termos do art. 102 e seguintes da Carta Maior, possui a missão de pacificar a jurisprudência nacional, estando o TST em posição inferior, muito embora decida sobre matéria especializada.

Fredie Didier Junior [11] reforça a necessidade de segurança jurídica, estabelecendo que:

“Não se pode admitir como isonômica a postura de órgão do Estado que, diante de uma situação concreto, chega a um determinado resultado e, diante de outra situação concreto, em tudo semelhante à primeira, chega à conclusão distinta”

Sendo assim, a fim de se manter o que a doutrina denomina como “stare decisis et non quieta movere”, compreendido como a inalterabilidade do que se decidiu [12], o entendimento estabelecido pelo TST não se sobrepõe ao entendimento vinculante ventilado no STF, preservando-se a coerência do sistema, garantindo, em última instância, a segurança jurídica da temática tratada.

A tese firmada pelo TST, ao aplicar o art. 500, da CLT, previsto no capítulo que se refere à estabilidade, estabelece como requisito para a dispensa a pedido do empregado estável, a assistência do sindicato. O mens legis da norma extraída, é proporcionar ao empregado já estável a orientação acerca de seus direitos, até porque, seria impossível submeter a empregada à assistência sindical quando de seu pedido de demissão, até porque não era do conhecimento da própria reclamante, ou seja, a estabilidade, cuja origem começa com o empregado decenal, deve ser preexistente e anterior ao pedido, o que não se amolda aos termos da razão de decidir estabelecida pelo STF, ao fato da ciência da superveniência gestacional após pedido de demissão.

CONCLUSÃO

A teoria geral do processo, compatível com a sistemática trabalhista (CLT, art. 769), também sofreu transformações o que, atravessando o viés da jurisdição, refletiu na natureza da decisão judicial, que passa a ter caráter dúplice, ou seja, a partir do caso concreto, cria-se a norma jurídica do caso e também a norma jurídica geral do caso concreto, que passará a reger casos futuros semelhantes, dando origem aos precedentes judiciais.

No entanto, a segurança jurídica é a essência dessa técnica de pacificação da jurisprudência, devendo guardar coerência, tanto no âmbito do tribunal que decide, quanto em obediência à hierarquia entre tribunais, apresentando-se o STF em patamar superior aos demais tribunais, pois a Constituição Federal lhe incumbiu o dever de pacificar a jurisprudência nacional.

Portanto, entendemos que a norma extraída do Tese nº 55, do TST, se mostra incompatível com aquela extraída do Tema 497, do STF, pelo fato de disciplinar imposição de regra não prevista em lei, determinando homologação sindical para todo tipo de demissão de gestante, mesmo a matéria já ter sido disciplinada pela Corte Suprema, devendo ser corrigida mediante Reclamação Constitucional, mantendo-se a coerência do sistema (“stare decisis”), sob pena de se incorrer em inconstitucionalidades e inconvencionalidades.

BIBLIOGRAFIA

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 12. Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho.
21.ª ed. São Paulo: Juspodivm, 2024.

DIDIER, Fredie Jr. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. Vol. I. 17. Ed. - Salvador: Ed. Jus Podivm, 2015.

MACHADO MEYER / VIEIRA, Gustavo Silveira. Stare Decisis e segurança jurídica: o precedente e sua fundamentação no Novo CPC, 07 abr. 2016.

MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. São Paulo: RT, 2006, v.1, p. 99. In: DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael.

NOGUEIRA, Gustavo Santana. Stare Decisis et Non Quieta Movere: A Vinculação dos Precedentes no Direito Comparado e Brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

[1] Advogado, pós-graduado em direito e trabalho, processual do trabalho e previdenciário, palestrante e articulista.

[2] Nesse sentido, também, MORELLO, Augusto M. La eficácia de/proceso. 2ª ed. Buenos Aires: Hamurabi, 2001. P. 142 - 143; ARENAL, María Amparo Renedo. "Convenienciadelestudio de leTeoría General delDerechoProcesal. Suaplicabilidad a las distintas ramas delmismo". Teoria do Processo - panorama doutrinário mundial. Fredie Didier Jr. E Eduardo Jordão (coord.). Salvador: Editora jus Podivm, 2008, p. 624; SOARES, Ricardo Maurício Freire. "Fundamentos Epistemológicos para uma Teoria Geral do Processo". Teoria do Processo - panorama doutrinário mundial. Fredie Didier Jr. E Eduardo Jordão (coord.). Salvador: Editora Jus Podivm, 2008, p. 846-850.

[3] DIDIER, Fredie Jr. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. Vol. I. 27. Ed. - Salvador: Ed. Jus Podivm, 2020, p. 20.

[4] DIDIER, Fredie Jr., op cit., p. 31.

[5] “A doutrina do stare decisis, utilizada há muito tempo pelos países da common law, busca sua expressão no famoso adágio stare decisis et non quieta movere (‘aquilo que foi decidido deve ser respeitado’). No caso, devem‑se garantir a confiabilidade e a estabilidade do precedente, e, inclusive, os próprios membros da Corte que o formaram devem respeitá‑lo.” (Vieira, 2016, p. n.p)

[6] DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Bahia: JusPodivm, 2018, vol. 2, 282 p.

[7] MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. São Paulo: RT, 2016, v.1, p. 99. In: DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Op. Cit, p. 226.

[8] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 12 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p.69) comenta a visão de Carnelutti sobre o que seja lide: [...]. Como é por demais conhecido, Carnelutti construiu todo o seu sistema jurídico em torno do conceito de lide, instituto de origem metajurídica que o mesmo definia como conflito de interesses degenerado pela pretensão de uma das partes e pela resistência da outra. Segundo aquele jurista italiano, pretensão é a “intenção de submissão do interesse alheio ao interesse próprio”, e – sempre segundo Carnelutti -, se num conflito de interesses um dos interessados manifesta uma pretensão e o outro oferece resistência, o conflito se degenera, tornando-se uma lide. Assim é que, segundo a clássica concepção de Carnelluti, jurisdição seria uma função de composição de lides.

[9] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 21.ª ed. São Paulo: Juspodivm, 2024, p.1.744) comenta que “O pré-aviso é também cabível nos pedidos de demissão pelo empregado. Ou seja, tanto na resilição unilateral por ato obreiro em contrato de duração indeterminada, como na antecipação, por iniciativa obreira, do fim do pacto a termo que tenha cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão”.

[10] Preâmbulo e no art. 19, §5, alínea d, da Constituição da OIT: “A simples adoção de uma convenção por parte da Conferência Internacional do Trabalho cria, para os Estados-membros, o dever moral de respeitar seu conteúdo e considerá-la na elaboração de suas políticas internas, ainda que não a tenham ratificado.”

[11] DIDIER JR., Fredie; OLIVEIRA, Rafael; BRAGA, Paula. Curso de direito processual civil. Salvador: Jus Podvm, 2016, p. 468.

[12] NOGUEIRA, Gustavo Santana. Stare Decisis et Non Quieta Movere: A Vinculação dos Precedentes no Direito Comparado e Brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 1, 163.

Sobre o autor
Julio Cesar da Silva Nunes

Advogado, pós-graduado em Direito Público, do Trabalho e Previdenciário, palestrante e articulista.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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