Crimes em Territórios de Saber. A Proteção Penal das Instituições de Ensino e de Seus Trabalhadores

04/07/2025 às 20:02
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Resumo

A Lei nº 15.159, de 2025, em vigor a partir de 04/07/2025, promoveu profundas alterações no Código Penal e na Lei dos Crimes Hediondos ao recrudescer as penas de crimes praticados nas dependências de instituições de ensino. A norma surge em resposta ao aumento de ataques violentos em escolas brasileiras, ampliando a proteção penal a alunos, professores, funcionários e demais frequentadores desses ambientes. Este artigo analisa as inovações legislativas, contextualizando o conceito de instituição de ensino à luz da LDB, com foco especial na função essencial dos educadores e na repercussão dessa nova política criminal no ordenamento jurídico.

Palavras-chave:

Instituição de ensino. Lei nº 15.159/2025. Código Penal. Crimes Hediondos. Professores. Lesão Corporal. Homicídio Qualificado. Educação. Política Criminal.

INTRODUÇÃO

O cenário nacional tem sido marcado por uma onda crescente de violência dentro de instituições de ensino, locais historicamente destinados à formação do saber, à construção da cidadania e ao exercício da paz. Diante de episódios de brutalidade chocantes, como os atentados de Suzano, Blumenau e outros tantos registrados em diversas regiões do Brasil, tornou-se imperiosa a adoção de medidas legislativas eficazes para salvaguardar o ambiente escolar e seus atores.

É neste contexto que nasce a Lei nº 15.159, de 2025, um marco legislativo que modifica o Código Penal e a Lei dos Crimes Hediondos para tornar mais severas as sanções contra crimes cometidos nas dependências de instituições de ensino. Inspirada em dados alarmantes apresentados pelo Instituto Sou da Paz, essa legislação representa não apenas um avanço técnico, mas um grito ético de toda a sociedade em defesa da educação e da vida.

Neste estudo, o jurista Jeferson Botelho apresenta uma análise crítica e sistemática das alterações promovidas pela nova lei, com ênfase na definição de instituição de ensino conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), e na valorização da figura do professor e dos demais trabalhadores da educação. A norma penal em branco exige complementação interpretativa e aplicação harmônica com o sistema jurídico-constitucional brasileiro, o que torna ainda mais relevante a reflexão proposta.

MODIFICAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI Nº 15.159, DE 2025

A Lei nº 15.159/2025 operou quatro alterações significativas no ordenamento penal:

1. Código Penal – Parte Geral

A primeira mudança ocorreu no artigo 61, inciso II, alínea “m”, com a inclusão de uma nova agravante genérica:

“m) o crime for praticado nas dependências de instituição de ensino.”

Esta medida amplia o rol de circunstâncias agravantes, indicando que o cometimento do crime nesse espaço educacional representa maior reprovabilidade da conduta.

2. Código Penal – Parte Especial (Homicídio)

No art. 121, § 2º, inciso X, foi incluída uma qualificadora do homicídio:

“X - se o homicídio for praticado nas dependências de instituição de ensino.”

Pena: reclusão de 12 a 30 anos.

Além disso, foi criado o § 2º-C, que aumenta a pena do homicídio nas seguintes hipóteses:

I - 1/3 (um terço) até a metade se a vítima é pessoa com deficiência ou com doença que acarrete condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental;

II - 2/3 (dois terços) se o autor é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela ou, ainda, se é professor ou funcionário da instituição de ensino.

3. Código Penal – Lesão Corporal (art. 129)

No § 12 do artigo 129, estabelece-se o aumento de pena da lesão corporal dolosa: Assim, aumenta-se a pena de:

I - 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se a lesão dolosa for praticada:

a) contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal ou integrantes do sistema prisional ou da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição;

b) contra membro do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública ou da Advocacia Pública, de que tratam os arts. 131 e 132 da Constituição Federal ou oficial de justiça, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente, inclusive por afinidade, até o terceiro grau, em razão dessa condição; ou

c) nas dependências de instituição de ensino;

II - 2/3 (dois terços) ao dobro se a lesão dolosa for praticada nas dependências de instituição de ensino e:

a) a vítima for pessoa com deficiência ou com doença que acarrete condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental; ou

b) o autor for ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela ou, ainda, for professor ou funcionário da instituição de ensino.

4. Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/1990)

Modifica-se o art. 1º, passando a considerar hediondos:

I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por 1 (um) só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º);

I – A - lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2º) e lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º), quando praticadas:

a) contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal ou integrantes do sistema prisional ou da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição;

b) contra membro do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública ou da Advocacia Pública, de que tratam os arts. 131 e 132 da Constituição Federal, ou oficial de justiça, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente, inclusive por afinidade, até o terceiro grau, em razão dessa condição; ou

c) nas dependências de instituição de ensino;

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ANÁLISE CRÍTICA ARROJADA

A Lei nº 15.159/2025 representa um endurecimento penal justificado por uma escalada de violência no âmbito escolar, mas seu alcance vai além do recrudescimento. Ao tipificar circunstâncias qualificadoras e agravantes específicas, o legislador reconhece as instituições de ensino como espaços de vulnerabilidade social e de importância estratégica para o futuro do país.

Trata-se de norma penal em branco, pois exige complementação do conceito de “instituição de ensino”. Conforme a Lei nº 9.394/1996 (LDB), entende-se por instituição de ensino qualquer estabelecimento, público ou privado, que ofereça educação básica (educação infantil, ensino fundamental e médio), educação superior, ou educação profissional e tecnológica, incluindo cursos de idiomas.

A definição técnica é fundamental para aplicação segura e objetiva da norma penal. Ao criminalizar com maior severidade a violência praticada nesses ambientes, o legislador presta homenagem ao valor simbólico e funcional das instituições de ensino como pilares de civilidade, democracia e progresso.

Por outro lado, impõe-se uma crítica quanto à efetividade isolada da resposta penal. Sem políticas públicas que reforcem a prevenção, a inteligência escolar e o acolhimento psicossocial, o direito penal não resolverá os conflitos que ali se acumulam. A lei é necessária, mas não suficiente.

CONCLUSÃO

A Lei nº 15.159, de 2025, inaugura uma nova era de tutela penal aos ambientes de ensino e seus integrantes. Mais que uma resposta jurídica, ela representa um gesto civilizatório diante da barbárie que se infiltrou onde antes reinava a sabedoria.

Este diploma legal valoriza o papel do professor e dos trabalhadores da educação como verdadeiros sentinelas da paz social. Em um tempo de discursos odiosos e ações intolerantes, os mestres e servidores escolares se tornaram alvos de uma guerra ideológica perversa e silenciosa.

A nova legislação vem dizer, em alto e bom som: a escola é sagrada; o professor, inviolável; o saber, inegociável. A pena se transforma em escudo. A lei se ergue como muralha em defesa do futuro. Que o direito penal não seja apenas o lamento após o sangue, mas a voz que ressoa antes da tragédia.

Por fim, a nova lei carrega o nobre desafio de evitar a revitimização dos servidores que labutam diariamente nas instituições de ensino. São profissionais que, mesmo imersos na eterna ausência de políticas públicas consistentes de valorização, seguem firmes na missão de produzir conhecimento e semear sabedoria — os pilares da construção de um país mais justo, desenvolvido e humano.

A esses heróis da educação, não basta apenas segurança física: é urgente garantir respeito, dignidade e reconhecimento. É dever do Estado e da sociedade reverenciar todos aqueles que exercem a profissão mais importante do mundo — ensinar, formar, transformar pessoas para o grande território do saber. Valorizá-los é proteger o futuro. Respeitá-los é consolidar a paz. Defender sua missão é engrandecer a Nação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOTELHO, Jeferson. Estudos introdutórios sobre a Lei nº 15.159/2025. In: Coletânea de Direito Penal Contemporâneo.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

BRASIL. Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos).

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB).

BRASIL. Lei nº 15.159, de 2025. Altera o Código Penal e a Lei nº 8.072/1990 para agravar penas de crimes cometidos em instituições de ensino.

INSTITUTO SOU DA PAZ. Relatório de ataques a escolas no Brasil (2002-2023).

Texto ajustado com apoio técnico da IA ChatGPT. Acesso em 04 de julho de 2025.

Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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