Após Donald Trump impor 50% de tarifas aos produtos brasileiros exigindo o fim do processo contra Jair Bolsonaro três coisas aconteceram.
Lula reagiu de maneira enérgica, dizendo que o Brasil estudará sancionar produtos e serviços norte-americanos. A imprensa brasileira também condenou a agressão comercial imotivada e lembrou ao grande imperador branco norte-americano que o nosso país é soberano. Inicialmente, os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado ficaram em silêncio. Após aguardar as manifestações de ambos por algum tempo, às 10:32 do dia 10/07/2025 perdi a paciência e protocolei a representação abaixo no PGR-MPF:
“Sem que o nosso país tivesse adotado qualquer tipo retaliação comercial e/ou obrigação ilícita aos produtos e serviços norte-americanos importados e consumidos no Brasil, Donald Trump sobretaxou as exportações brasileiras de maneira imotivada. Com isso ele pretende inclusive garantir a impunidade de Jair Bolsonaro e outros membros da quadrilha golpista e terrorista que parcialmente destruiu as sedes dos poderes executivo, legislativo e judiciário em 08 de janeiro de 2023. Tudo isso é fato notório amplamente divulgado pela imprensa brasileira e internacional sendo desnecessário fazer prova documental do ocorrido. Em razão do princípio da reciprocidade, o Brasil tem o direito de sobretaxar produtos e serviços norte-americanos. Isso será eventualmente decidido pela presidência da república dentro da competência que lhe foi atribuída pela constituição e pela legislação aplicável à espécie. Mas a interferência no funcionamento do Poder Judiciário não viola apenas o princípio da soberania. Isso constitui crime passível de punição (art. 359-L, do Código Penal). Donald Trump não tem o direito de interferir no funcionamento da Suprema Corte, nem tampouco pode ele exigir a impunidade de um ex-presidente brasileiros cujos atos serão julgados pelo Tribunal competente no momento adequado. Ademais, a constituição do Brasil não outorga à uma autoridade estrangeira a prerrogativa de perdoar ou anistiar crimes cometidos dentro do território brasileiro. Donald Trump não é o único que está em tese incorrendo no tipo descrito no art. 359-L, do Código Penal. Após o ataque dele contra soberania do Brasil e a autonomia do STF, os presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados não se manifestaram. Eles se recusam a publicamente defender o Brasil, a soberania brasileira, nossa constituição e a autoridade máxima do STF para julgar um réu regularmente denunciado pelo PGR. O desvio de finalidade nesse caso é evidente, sendo plausível a existência de uma colusão ou conspiração entre autoridades brasileiras e o presidente dos EUA. Talvez seja difícil processar e julgar por crime comum uma autoridade estrangeira. Mas os presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados podem sim ser investigados por silenciosamente se associarem a Donald Trump como se ele mesmo tivesse mais autoridade no Brasil do que a constituição, a legislação e as instituições brasileiras. A conduta das autoridades brasileiras deve ser adequada aos cargos que elas ocupam. O Senado Federal e a Câmara dos Deputados não podem se associar a um presidente dos EUA que ilegalmente tenta interferir no funcionamento da Suprema Corte. Isso é crime.
Requeiro sejam investigados os presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. Caso tenham se associado a Donald Trump no ataque contra o STF em defesa de Jair Bolsonaro eles cruzaram a linha vermelha, devendo responder pelo crime descrito no art. 359-L, do Código Penal ou outro tipo penal que o PGR considere mais adequado à situação.”
Referida representação foi recebida e autuada sob número 20250049426 e pode ser consultada no portal do MPF mediante a seguinte chave de acesso 5605254c5722c06c25250c81cfb86d48.
Horas depois que a representação foi protocolada e divulgada em inglês, os presidentes da Câmara e do Senado se manifestaram. Mas o fizeram de maneira ambígua, dizendo que estão observando o desenrolar dos acontecimentos. Não é isso que o país espera das duas autoridades máximas do Poder Legislativo. Ambos tem o dever de defender a soberania do país e a autonomia das instituições brasileiras, com destaque para o STF (Tribunal que Donald Trump tratou como se fosse uma secretária pessoal dele).
A Constituição Federal é absolutamente clara. São poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário (art. 2. º, da CF/88). O Senado e a Câmara dos Deputados não podem se omitir nesse caso, porque o Brasil foi agredido e os presidentes de ambas não devem em hipótese alguma considerar os interesses norte-americanos defendidos por Donald Trump mais importantes do que os interesses brasileiros que o país deve defender. A soberania brasileira para decidir qualquer processo é inquestionável (art. 1º, I, da CF/88) e não pode ser atropelada, pisoteada por uma autoridade estrangeira com ajuda do Poder Legislativo.
Donald Trump pode até perdoar condenados norte-americanos. Mas esse poder conferido à presidência dos EUA pela constituição daquele país só pode ser exercido e beneficiar pessoas condenadas pelo Poder Judiciário dentro do território norte-americano O presidente dos EUA não pode perdoar ou anistiar Jair Bolsonaro. Em hipótese alguma as autoridades brasileiras devem se submeter ao comando de uma autoridade estrangeira ou agir como se o poder presidencial norte-americano operasse efeitos extraterritoriais no Brasil. A chantagem comercial/econômica para fins políticos não é algo admissível, nem tampouco deve se tolerada pelos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado.
Davi Alcolumbre e Hugo Motta não foram suficientemente incisivos ao repelir a agressão de Donald Trump à Suprema Corte do Brasil. Eles tem obrigações institucionais para com nosso país e suas instituições do que para com a familícia Bolsonaro. Se ficarem ao lado de Donald Trump contra o Brasil ambos devem perder os cargos e isso poderá ser requerido ao STF, poder cuja autonomia foi afrontada pelo presidente dos EUA. A Justiça brasileira não tem longas mãos para responsabilizar um presidente norte-americano, mas certamente pode alcançar os presidentes da Câmara e do Senado.