No palco da justiça, o direito de se manifestar tem seu espaço, mas a fronteira entre a legítima defesa e a tática protelatória é mais tênue do que se imagina, com um custo que vai além do processo.
Introdução – Desvendando o "Jus Esperniandi"
No universo do Direito brasileiro, onde a precisão terminológica e a formalidade são a tônica, deparamo-nos com uma expressão que, à primeira vista, parece destoar: o "Jus Esperniandi". Embora soe como um termo jurídico de peso, trata-se, na verdade, de um falso latinismo, desprovido de raízes no latim clássico, mas amplamente difundido no cotidiano forense. Sua tradução mais próxima, "direito de espernear" ou "direito de reclamar", evoca a imagem de uma criança que, inconformada com uma decisão, manifesta seu descontentamento. E é justamente essa a conotação que a expressão carrega no ambiente jurídico (1).
O caráter informal e, por vezes, irônico do "Jus Esperniandi" é um ponto crucial. Ele não encontra guarida em textos normativos formais e, de fato, não constitui um direito previsto em nossa legislação (3). Contudo, é uma ferramenta linguística comum entre advogados e magistrados para descrever a atitude de quem se insurge contra uma decisão judicial ou uma situação desfavorável, mesmo quando essa manifestação carece de fundamentos jurídicos sólidos ou de chances reais de sucesso (3). Frequentemente, a expressão é empregada com um tom de crítica ou ironia, direcionada àqueles que insistem em rediscutir questões já pacificadas ou decididas por instâncias superiores (3).
É fundamental, contudo, distinguir o "espernear" do legítimo direito de defesa. Nosso ordenamento jurídico, alicerçado na Constituição Federal, assegura a todos os litigantes a ampla defesa, o contraditório e os meios recursais a eles inerentes (3). O "Jus Esperniandi", por outro lado, não se confunde com nenhuma dessas garantias processuais. Pelo contrário, ele é invocado precisamente quando essas garantias já foram exercidas e esgotadas, restando à parte vencida apenas a expressão de seu descontentamento (3). Nesse sentido, a expressão atua mais como uma "válvula de escape emocional" ou uma "resistência simbólica" diante de uma derrota judicial ou de uma limitação imposta pela norma, do que como um mecanismo jurídico eficaz (3).
A própria existência e o uso disseminado do "Jus Esperniandi" no ambiente jurídico, que é inerentemente formal e técnico, revelam uma tensão intrigante entre a rigidez do sistema legal e a resposta emocional humana à perda e à derrota. Essa persistência de um falso latinismo no vocabulário forense aponta para uma lacuna entre a formalidade legal e o comportamento prático e psicológico dos envolvidos em litígios. Isso sugere que, mesmo em um sistema construído sobre lógica e precedentes, há um espaço reconhecido, ainda que não oficial, para mecanismos psicológicos de enfrentamento. Juízes e advogados, apesar de seus papéis profissionais, demonstram compreender o elemento humano do litígio, onde as partes podem ter dificuldade em aceitar resultados adversos, mesmo que juridicamente sólidos. Esse reconhecimento informal do "espernear" pode, de fato, influenciar sutilmente como os juízes inicialmente percebem ou toleram certos atos processuais repetitivos, mas ainda não abusivos, especialmente nas instâncias inferiores, antes que eles escalem para a litigância de má-fé formal. Essa dinâmica indica uma compreensão tácita da jornada emocional dos litigantes no complexo caminho da justiça.
A Prática do "Esperneio" no Processo Judicial: Quando a Insatisfação Ganha Contornos Táticos
Como o "Jus Esperniandi" Se Manifesta na Prática
No dia a dia dos tribunais, o "Jus Esperniandi" se manifesta de diversas formas, quase sempre quando a parte não está satisfeita com uma decisão desfavorável e busca, por todos os meios possíveis, reverter a situação (5). Essa prática se traduz na insistência em repetir argumentos que já foram exaustivamente debatidos e rechaçados, na interposição de recursos manifestamente inadmissíveis ou na manutenção de uma postura de inconformismo perante uma realidade jurídica já consolidada (3).
Exemplos práticos do "esperneio" incluem o excesso de manifestações das partes, a concessão de prazos extras desnecessários, a não decretação da preclusão de atos processuais ou, ainda, a solicitação de repetição de perícias já realizadas. Muitas vezes, essas condutas são justificadas sob o pretexto de evitar o cerceamento de defesa, um princípio fundamental do processo (6). No contexto da arbitragem, por exemplo, o "Jus Esperniandi" é explicitamente visto como um "intuito desesperado de evitar uma condenação ou postergá-la", evidenciando a motivação por trás de tais atos (6).
Natureza como "Válvula de Escape Emocional" vs. Mecanismo Jurídico Efetivo
Conforme já mencionado, a natureza do "Jus Esperniandi" é primariamente psicológica. Ele traduz o comportamento de quem se recusa a aceitar passivamente uma decisão, mesmo sabendo que todas as vias legais de reversão foram esgotadas (3). Não se trata de uma garantia processual legítima, como a ampla defesa ou o contraditório, mas sim de uma reação que surge após essas garantias terem sido devidamente aplicadas e superadas (3).
A manifestação do "Jus Esperniandi" frequentemente borra a linha entre a diligência processual legítima e a conduta abusiva, representando um desafio constante para os operadores do direito discernirem a real intenção por trás dos atos. A tensão central reside entre o direito constitucional à ampla defesa (3) e os princípios da celeridade e boa-fé processual (7). Juízes e árbitros enfrentam a difícil tarefa de distinguir tentativas genuínas de garantir a justiça – por exemplo, evitar o cerceamento de defesa (6) – de meras táticas protelatórias. Essa distinção exige uma avaliação subjetiva da intenção da parte (8), o que é inerentemente complexo. O uso do "manto de evitar a ofensa à ordem pública" (6) ilustra esse dilema judicial: o receio de anular o processo muitas vezes sobrepõe-se ao desejo de celeridade, permitindo inadvertidamente o "esperneio" até que ele se torne claramente abusivo. Essa dificuldade de discernimento contribui para o acúmulo de processos judiciais e a ineficiência do sistema, pois os juízes precisam agir com cautela para preservar as garantias constitucionais, mesmo diante de ações repetitivas ou aparentemente infundadas. Essa situação também pressiona os profissionais do direito a aconselharem seus clientes eticamente, distinguindo entre um recurso legítimo e um mero "esperneio".
A Linha Tênue: Do "Jus Esperniandi" à Litigância de Má-Fé
A Conexão com Recursos Protelatórios e o Abuso do Direito de Recorrer
O "Jus Esperniandi" está intrinsecamente ligado ao conceito de abuso do direito de recorrer e à interposição de recursos protelatórios (1). Recursos protelatórios são definidos como medidas processuais utilizadas com o propósito claro de estender a duração de um processo judicial, sem oferecer contribuições significativas ao mérito da causa (7). É importante notar que o abuso do direito de defesa não se restringe ao réu; o autor da ação também pode cometê-lo, buscando vantagens indevidas ou dificultando o andamento do processo (11).
Princípios Processuais Violados
A prática de recursos protelatórios e o abuso do direito de recorrer violam princípios fundamentais do processo judicial brasileiro. Entre eles, destacam-se a celeridade processual e a boa-fé processual (7). O princípio da celeridade visa a um processo ágil, evitando delongas desnecessárias (7). Já o princípio da boa-fé processual exige que as partes atuem de maneira honesta e leal, comprometendo-se com o esclarecimento dos fatos e com a busca pela justiça (7). O processo judicial, em sua essência, deve ser conduzido sob as diretrizes da boa-fé e da lealdade processual, conforme preconizado pelo Código de Processo Civil (11).
Conceito e Condutas Caracterizadoras da Litigância de Má-Fé (CPC, Arts. 79-81)
A litigância de má-fé é definida como qualquer conduta maliciosa ou temerária por parte de um litigante ou seu advogado durante o curso de um processo judicial, que cause prejuízo à administração da justiça e viole obrigações éticas (13). O Código de Processo Civil (CPC) brasileiro, em seus artigos 79 a 81, especifica as condutas que podem ser consideradas como litigância de má-fé (10).
A formalização do "Jus Esperniandi" em "litigância de má-fé" pelo CPC reflete uma postura proativa do judiciário em equilibrar direitos individuais, como a ampla defesa e o acesso à justiça, com interesses coletivos, como a celeridade, a eficiência e a boa-fé processual. As disposições detalhadas do CPC, especialmente a menção explícita de "interpor recurso com intuito manifestamente protelatório" no Art. 80, Inciso VII (10), demonstram um esforço legislativo deliberado para coibir os impactos negativos do "esperneio" na eficiência judicial. Isso mostra uma transição da mera "tolerância" a um desabafo emocional para uma resposta legal estruturada quando tal desabafo impede a justiça. Sublinha que, embora o direito de expressar descontentamento possa ser implicitamente compreendido, o direito de perturbar o processo não é. Esse desenvolvimento legislativo e jurisprudencial, como a postura do Superior Tribunal de Justiça (8), indica um amadurecimento do sistema jurídico brasileiro, caminhando para um judiciário mais eficiente e menos sobrecarregado, desencorajando ativamente os abusos processuais, mesmo aqueles que decorrem de uma frustração humana compreensível.
As condutas caracterizadoras da litigância de má-fé, conforme o Art. 80 do CPC, incluem: deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; alterar a verdade dos fatos; usar do processo para conseguir objetivo ilegal; opor resistência injustificada ao andamento do processo; proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; provocar incidente manifestamente infundado; e, de forma mais direta, interpor recurso com intuito manifestamente protelatório (10).
A Tolerância Judicial: Uma Escala Ascendente de Rigor
A forma como o "Jus Esperniandi" é percebido e tolerado varia significativamente entre as diferentes instâncias do Poder Judiciário brasileiro, refletindo uma progressão da compreensão do fenômeno e da aplicação das sanções.
Nas Primeiras Instâncias: Onde a Compreensão é Mais Ampla
Nas primeiras instâncias, o "esperneio" pode ser visto com uma certa dose de "normalidade" e expectativa, especialmente em contextos de derrota, como em disputas eleitorais (14). Juízes de primeira instância, por estarem mais próximos do contato direto com as partes e o impacto imediato do litígio, podem ter uma percepção mais branda do "inconformismo natural" da parte que perde a demanda (3). Embora a legislação preveja penalidades para a litigância de má-fé, a aplicação dessas sanções em primeira instância exige prova inequívoca do propósito de causar dano ou obstruir o processo (15). A jurisprudência aponta que a negligência grave pode ser equiparada ao dolo para fins de caracterização da má-fé (16).
Nos Tribunais de Justiça (TJs): Onde a Análise se Aprofunda
Nos Tribunais de Justiça (estaduais e federais), a discussão sobre recursos protelatórios é amplamente presente, uma vez que estas cortes lidam com a reiteração de recursos após a primeira instância (7). A jurisprudência dos TJs tende a se alinhar com os entendimentos dos tribunais superiores, especialmente em casos de recursos repetitivos ou súmulas (17). A condenação por litigância de má-fé nos TJs segue os preceitos do CPC, com a imposição de multas e indenizações (10).
No Superior Tribunal de Justiça (STJ): Onde a Linha é Mais Fina
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) é uma instância crucial na delimitação do "Jus Esperniandi". Embora o termo seja encontrado rara e indiretamente em sua jurisprudência, ele é aplicado quando o direito de peticionar ou recorrer é exercido de forma abusiva (1). O STJ reconhece que a pluralidade de recursos serve tanto para o inconformismo psicológico natural da parte que perde a demanda quanto para evitar a perpetuação de erros judiciais. Contudo, a Corte também enfatiza que o excesso de recursos tende a prolongar os processos, retardando a formação da coisa julgada e a solução das disputas (9).
Para combater esses abusos, o STJ defende, por exemplo, a criação de um "filtro de relevância" para a admissão do recurso especial, visando coibir o retardamento de soluções definitivas (9). A Corte possui diversos entendimentos que delimitam as punições por litigância de má-fé e abuso do direito de recorrer (8). É importante notar que a mera interposição de um recurso cabível, mesmo com argumentos reiteradamente refutados pelo tribunal de origem, não implica, por si só, má-fé, a menos que haja uma intenção clara de deslealdade (8).
Casos emblemáticos no STJ incluem o reconhecimento do "assédio processual" em situações de sucessivas ações desprovidas de fundamentação idônea, intentadas com propósito doloso e abusivo (18). Além disso, o STJ já se posicionou pela possibilidade de imposição de multa acima do teto previsto no CPC (2%) em casos de valor da causa insignificante, para que a sanção não se torne inócua (20).
No Supremo Tribunal Federal (STF): O Ápice da Rigidez
No topo da hierarquia judicial, o Supremo Tribunal Federal (STF) também se depara com as manifestações do "Jus Esperniandi", especialmente quando se trata de interpretar seu próprio regimento ou de julgar recursos que chegam à última instância (21). A Constituição de 1988, garantindo o direito à ampla defesa e aos "meios e recursos a ela inerentes" (2), estabelece um pilar fundamental do processo. No entanto, o STF, como guardião da Constituição, também reconhece que esse direito não é absoluto e encontra limites (4). A Corte já negou seguimento a recursos por "abuso do direito de recorrer" (23), demonstrando que a função social do processo e a integridade do sistema judicial são valores a serem preservados. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), inclusive, defende a constitucionalidade da Lei de Abuso de Autoridade, enfatizando que prerrogativas profissionais não são privilégios, mas um braço do cidadão para a defesa de seus direitos (22).
Existe uma clara relação inversa entre o nível da instância judicial e a tolerância ao "Jus Esperniandi" que se converte em táticas protelatórias. Tribunais inferiores podem inicialmente tolerá-lo mais como um "inconformismo natural", enquanto tribunais superiores, especialmente o STJ e o STF, priorizam a eficiência sistêmica e a finalidade das decisões. Essa dinâmica se explica porque os tribunais de primeira instância lidam com o impacto emocional bruto e imediato do litígio, estando mais próximos do elemento humano e podendo conceder mais margem para as partes processarem a derrota, desde que isso não obstrua imediata e obviamente a justiça. Já os tribunais superiores operam em um nível sistêmico, e suas principais preocupações se voltam para garantir a uniformidade legal, manter os precedentes e gerenciar o imenso volume de casos (9). Para eles, o "esperneio" que se manifesta como recursos protelatórios impacta diretamente a efetividade e a celeridade de todo o sistema judicial (8). Assim, o foco é menos nas saídas emocionais individuais e mais na integridade e eficiência do processo legal como um todo. Essa tolerância diferencial destaca a natureza multifacetada da administração da justiça, onde diferentes prioridades entram em jogo em vários níveis. Também sugere que o aspecto psicológico do "jus esperniandi" (3) é mais facilmente acomodado nas fases iniciais, mas rapidamente cede a um escrutínio legal mais rigoroso à medida que o caso avança.
O conceito de "assédio processual", reconhecido pelo STJ (18), representa uma evolução crítica no combate a formas extremas de "Jus Esperniandi", indo além de meras táticas protelatórias para reconhecer um padrão de abuso malicioso e sistêmico. O reconhecimento do "assédio processual" significa uma mudança jurisprudencial de ver os atos abusivos isoladamente para reconhecer um padrão de conduta projetado para assediar ou exaurir a parte oposta e o sistema judicial. Isso vai além de simplesmente penalizar um único "recurso protelatório" (10) para abordar um uso estratégico, muitas vezes predatório, do sistema legal (19). Implica uma compreensão mais profunda pelos tribunais de que alguns "esperneios" não são apenas explosões emocionais, mas estratégias calculadas para obter objetivos ilegítimos ou desgastar um adversário. Esse desenvolvimento fornece uma ferramenta legal mais forte para os juízes intervirem em casos de litígios persistentes e maliciosos, visando proteger não apenas a parte oposta de ônus indevidos, mas também o próprio sistema judicial de ser instrumentalizado. Reforça a ideia de que o acesso à justiça, embora fundamental, não é ilimitado e deve ser exercido com responsabilidade.
As Consequências de um "Esperneio" Excessivo: O Preço da Inconformidade
Quando o "Jus Esperniandi" ultrapassa a esfera do desabafo emocional e se materializa em condutas abusivas, o sistema jurídico brasileiro impõe consequências formais para coibir tais práticas e proteger a integridade do processo judicial.
Sanções Legais - Multas e Indenizações por Perdas e Danos
O Código de Processo Civil (CPC) é claro ao estabelecer a aplicação de multas e sanções em casos de uso abusivo de recursos (7). A condenação por litigância de má-fé, que abrange o "esperneio" excessivo, gera o dever de pagamento de multa, que geralmente varia de 1% a 10% do valor corrigido da causa. Além disso, a parte litigante de má-fé deve indenizar os prejuízos sofridos pela parte contrária, incluindo honorários advocatícios e despesas processuais (2).
Em um movimento notável, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já permitiu a fixação de multa acima do teto de 2% do CPC em casos onde o valor da causa era insignificante. Essa decisão visa garantir que a sanção não se torne "insignificante" e cumpra seu papel dissuasório (20). A aplicação dessas penalidades, contudo, exige prova inequívoca de que a má conduta processual foi realizada com o propósito de causar dano ou obstruir o trâmite regular do processo (15).
A aplicação de sanções financeiras para o "esperneio" (litigância de má-fé) não é meramente punitiva, mas serve como um mecanismo de dissuasão projetado para internalizar os custos externos do comportamento processual abusivo, como o atraso e o ônus judicial. As disposições do CPC sobre multas e a disposição do STJ de ir além do teto legal para valores de causa insignificantes revelam uma clara intenção de tornar o "esperneio" financeiramente desinteressante. Esta é uma abordagem econômica da justiça: ao tornar o abuso processual caro, o sistema visa reduzir sua incidência. É uma tentativa de transferir o ônus da ineficiência, causada pelo atraso, do sistema judicial coletivo e da parte contrária de volta para a parte que causa o atraso. Isso destaca uma mudança pragmática na política judicial, reconhecendo que advertências puramente legais ou éticas podem não ser suficientes para conter problemas sistêmicos como o acúmulo de processos judiciais. Os desincentivos financeiros tornam-se, assim, uma ferramenta chave na promoção da boa-fé processual e da celeridade.
Impacto na Celeridade e Efetividade da Justiça
O uso de recursos protelatórios e o "esperneio" excessivo têm um impacto direto e negativo na celeridade e efetividade da justiça. A principal consequência é o atraso no andamento do processo, o que pode prejudicar uma das partes e, invariavelmente, sobrecarregar o sistema judiciário como um todo (7). A tensão entre a existência de uma diversidade de recursos e o retardamento de soluções jurisdicionais definitivas é uma discussão constante e atual no meio jurídico (9). O excesso de recursos tende a prolongar os processos, retardando a formação da coisa julgada e a solução final das disputas (9). A morosidade judicial é um problema crônico que a doutrina e a jurisprudência brasileiras buscam incessantemente combater, buscando a efetividade da prestação jurisdicional (21).
O Papel Ético do Advogado na Orientação do Cliente
Nesse cenário, o papel do advogado é fundamental e ético. Ele é responsável por orientar seu cliente sobre os riscos e as responsabilidades de interpor recursos sem fundamentos válidos (7). A ética profissional na advocacia exige que o profissional guie corretamente o cliente sobre a viabilidade e as consequências de um recurso, enfatizando a importância da boa-fé e da veracidade nos procedimentos judiciais (7). Um advogado comprometido com a justiça deve priorizar procedimentos que busquem uma resolução efetiva dos conflitos, evitando qualquer ato que possa ser considerado meramente protelatório (7).
A responsabilidade ética dos advogados (7) é um mecanismo de "controle suave" crucial, embora muitas vezes negligenciado, contra o "Jus Esperniandi", complementando as sanções legais formais. Enquanto o CPC impõe sanções às partes, os códigos de ética da profissão jurídica atribuem uma responsabilidade direta aos advogados para evitar que seus clientes se envolvam em práticas abusivas. Isso atua como uma medida preventiva, antes mesmo que o "esperneio" chegue à atenção do tribunal como litigância de má-fé formal. O advogado, como profissional, é esperado que discirna entre a estratégia legal legítima e o mero "esperneio", orientando o cliente para uma litigância responsável. Isso sugere que a luta contra o "esperneio" não é apenas sobre punição, mas também sobre orientação profissional e educação dentro da comunidade jurídica. Isso enfatiza que a eficiência e a integridade judicial não são apenas responsabilidade dos tribunais, mas também exigem a participação ativa e ética de todos os atores jurídicos. Aponta para a importância da educação jurídica e dos padrões de conduta profissional na formação do comportamento litigioso.
O Equilíbrio Necessário para uma Justiça Eficaz
O "Jus Esperniandi", em sua essência, reflete uma faceta da condição humana diante da adversidade, um desabafo compreensível em face de uma derrota. No entanto, no ambiente jurídico, essa expressão informal encontra seus limites na formalidade e nos princípios que regem o processo.
Reafirmação da Importância do Direito de Defesa, mas com Responsabilidade
É imperativo reafirmar que o direito à ampla defesa e ao contraditório são pilares inabaláveis do Estado Democrático de Direito e devem ser assegurados a todos os litigantes (3). Contudo, como qualquer direito, o acesso à Justiça e o direito de defesa não são absolutos. Eles encontram limitações no ordenamento jurídico e devem ser exercidos com responsabilidade, evitando o abuso (11). O abuso de direito se caracteriza precisamente quando a parte, mesmo exercendo um direito formalmente legítimo, extrapola os limites impostos pela boa-fé e pela função social do processo (11).
A Busca Contínua do Judiciário por um Balanço entre Garantias Processuais e a Eficiência
A tensão entre a diversidade de recursos e a necessidade de celeridade na entrega da justiça é um desafio constante para o Poder Judiciário brasileiro (9). O Judiciário busca incessantemente a efetividade da tutela jurisdicional, o que, por vezes, fundamenta a limitação do alcance do direito de defesa quando há uma resistência infundada ao andamento do processo (24). Medidas como a implementação de um filtro de relevância para recursos no STJ e a aplicação de multas visam garantir a celeridade e a racionalidade do serviço jurisdicional, promovendo a uniformidade nas decisões e combatendo o uso estratégico e abusivo do processo (9). A luta contra a litigância abusiva é, portanto, essencial para a entrega de um serviço jurisdicional efetivo, justo e célere (12).
A evolução da compreensão jurisprudencial, particularmente o reconhecimento do "assédio processual" e a disposição de impor sanções mais significativas, indica um sistema jurídico em amadurecimento que prioriza cada vez mais a eficiência coletiva e a integridade da justiça em detrimento de uma interpretação irrestrita e individualista dos direitos de defesa. Essa evolução não se trata apenas de punição; trata-se da saúde sistêmica. O sistema judicial, que frequentemente se encontra sobrecarregado por litígios excessivos (9), está desenvolvendo ativamente ferramentas e interpretações legais mais sofisticadas para gerenciar essa carga e garantir a justiça para todos. A transição de meramente "tolerar" o "esperneio" psicológico para combater ativamente suas manifestações abusivas reflete um reconhecimento de que "direitos" individuais descontrolados podem minar o bem coletivo de um sistema de justiça eficiente e acessível. Essa tendência sugere um movimento em direção a um sistema judicial mais robusto e autorregulador no Brasil, capaz de distinguir cada vez mais entre a defesa legítima e a obstrução estratégica, salvaguardando assim sua própria capacidade de entregar justiça em tempo hábil.
Em suma, o "Jus Esperniandi" é uma expressão que, embora informal, revela muito sobre a dinâmica do processo judicial no Brasil. Ele simboliza o limite tênue entre o direito legítimo de expressar inconformismo e o abuso do direito de defesa, que gera consequências sérias para a efetividade da justiça. O Poder Judiciário, em todas as suas esferas, tem se mostrado cada vez mais atento a essa distinção, buscando um equilíbrio que preserve as garantias individuais sem comprometer a celeridade e a boa-fé processual, essenciais para a confiança e a credibilidade do sistema de justiça.
Referências consultadas e citadas neste artigo
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