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Donald Trump x 11 de setembro de 2001

10/08/2025 às 11:08
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O presidente Donald Trump se considera uma força da natureza, um homem capaz de deformar a política interna e externa dos EUA e de outros países. Quando aparece cercado de fanáticos evangélicos, ele olha para as câmeras como se fosse a corporificação de uma nação, o avatar de uma nova era, quase uma divindade.

Nisso ele guarda certa semelhança com o 11 de setembro de 2001, episódio que definiu uma imensa mudança de paradigma nos EUA. Após esse incidente, quer ele tenha sido ou não uma operação coberta secreta, ocorreu uma profunda mudança no estado mental dos norte-americanos. Eles subitamente se sentiram menos autoconfiantes e mais paranoicos, algo que facilitou bastante o trabalho dos políticos republicanos que queriam empurrar o país para um ciclo de guerras intermináveis e uma espiral de vigilância autoritária digital interna.

As guerras contra o terror fracassaram, porque só conseguiram produzir duas coisas: mais terroristas e um imenso desperdício de recursos que poderiam ter sido utilizados para modernizar a infraestrutura dos EUA.

Estima-se que os EUA gastou 8 trilhões de dólares direta ou indiretamente em decorrência das guerras do Iraque e do Afeganistão. Para se ter uma ideia do que esse dinheiro representa, basta lembrar que a China investiu entre 1,4 e 1,7 trilhão de dólares para modernizar suas ferrovias entre 2001 e 2025, se tornando o país com mais trens-bala do planeta.

Com aproximadamente 1/4 do que os norte-americanos desperdiçaram nas guerras do Iraque e do Afeganistão os chineses ganharam uma infraestrutura de transporte ferroviário invejável:

  • Rede de alta velocidade: 45.000 km (maior do mundo, cobrindo 95% das grandes cidades).

  • Rede ferroviária total: ~165.000 km (sendo ~70% eletrificada).

  • Velocidade operacional: Trens como o Fuxing atingem 350 km/h.

  • Integração regional: Projetos como a Ferrovia Sichuan-Tibet (difícil terreno alpino) e conexões com a Rota da Seda.

Enquanto a China construiu a infraestrutura necessária para tirar maior proveito de sua expansão industrial, os EUA fabricou e desperdiçou armamentos em guerras com retorno econômico discutível. E os norte-americanos continuam com uma infraestrutura ferroviária obsoleta e extremamente perigosa.

Nesse sentido, o 11 de setembro de 2001 não foi apenas um divisor de águas do ponto de vista político, social e militar dentro dos EUA. Ele foi um fenômeno que fez a balança de poder pender em favor da Ásia e contra a hegemonia norte-americana. Mas é claro que os governantes dos EUA acreditavam que estavam fazendo o oposto, ou seja, eles acreditavam que conquistando o Iraque e o Afeganistão os EUA estavam criando o século norte-americano.

Donald Trump segue uma orientação parecida com a dos pais fundadores neoconservadores norte-americanos pós 2001 que, imaginando fazer uma coisa diferente, possibilitaram indiretamente a ascensão da China. Ele impõe tarifas contra todos os países e se comporta como se pudesse deixar potências estrangeiras de joelhos. Mas sua estratégia apenas colocará mais pressão sobre a própria economia norte-americana fragilizada por guerras inúteis do período anterior e dominada por especuladores gananciosos que não tem compromisso nenhum com o desenvolvimento industrial daquele país.

Todos os pequenos empresários que dependiam de matérias primas importadas do Brasil foram condenados a falência por Donald Trump. Sem mão de obra no campo em virtude da expulsão de trabalhadores imigrantes e endividados, impossibilitados de exportar seus produtos para países que rejeitam produtos "made in USA" os fazendeiros norte-americanos estão falindo e cometendo suicídio. A Índia reagiu às tarifas deixando de comprar armamentos americanos, uma péssima notícia para o único setor industrial americano realmente produtivo e lucrativo. O Brasil também não se curvou às chantagens tarifárias dos EUA.

Assim como a reação militar ao 11 de setembro de 2001 não fortaleceu os EUA e sim a China, a obsessão de Donald Trump por ostentar e exercer um poder hegemônico que os norte-americanos já não tem vai apenas enfraquecer ainda mais a economia e a coesão social no país que ele desgoverna. Todavia, é claro que ele pensa que está fazendo o oposto disso. E o auto-engano dele será fatal, porque o estrago feito pelos neoconservadores após 2001 vai apenas piorar nos próximos anos.

É realmente difícil dizer se qual dos dois fenômenos (11 de setembro de 2001 ou Donald Trump) é pior. Ambos estão entrelaçados pela mesma ideologia neoconservadora, que pode ser resumida em três frases: ódio contra pobres, sejam eles norte-americanos ou não; crença na superioridade intrínseca da elite governamental dos EUA e; miopia política reforçada pela arrogância imperial. Todavia, Trump está desmantelando tudo que resta do Estado americano. E isso se fará sentir com muito mais peso nas décadas que estão por vir e produzirá ondas de choque negativas que reverberarão por décadas.

O fato do atual presidente dos EUA hostilizar parceiros antigos dos norte-americanos também não melhorará muito as perspectivas dos EUA agora que Canadá e México se afastam do vizinho. Japão e Europa são obrigados a escolher entre a paz e a prosperidade chinesa e as guerras estúpidas que os norte-americanos inventam para manter suas fábricas de armamentos funcionando.

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Nos próximos 10 anos, o governo dos EUA inverterá essa tendência ou afundará mais no pântano que eles mesmos construíram? Na verdade, essa pergunta é irrelevante.

A balança do poder econômico já pende em favor da Ásia, algo reconhecido pelo Japão (país que se aproxima da China e começou a vender títulos do tesouro dos EUA). Nada do que os norte-americanos fizerem vai interromper o sucesso da China ou a sinergia econômica benéfica e pacífica entre os países que compõe os BRICS.

Uma nova ordem mundial já nasceu e o século não será norte-americano. Bem... de certa maneira, um século norte-americano também está começando, mas somente se nós consideramos os EUA o “homem doente” incurável do Hemisfério Norte, que condenou a si mesmo a declinar e cair querendo preservar a hegemonia que ele mesmo colocou a perder.

Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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