Hoje é um dia muito especial, porquanto é comemorado o dia do(a) Advogado(a), data escolhida em homenagem à criação dos dois primeiros cursos de Direito no Brasil.
A missão dos advogados é de extrema importância no mundo pós-moderno.
Ao pensar em advogado(a), e seu dia, imediatamente me vem à memória o grande jurista uruguaio Eduardo Couture, que escreveu os dez mandamentos do advogado. Tomo a liberdade de relembrar cada um deles1 e apresentar algumas reflexões, porquanto importantes.
1º. Estuda
O Direito se transforma constantemente. Se não seguires seus passos, serás a cada dia um pouco menos advogado
O estudo diário enriquece não apenas o(a) advogado(a). Sem abrir livros, dificilmente o profissional estará apto a atuar em casos concretos, desde os mais “simples” até os mais complexos.
Mais que isso, o(a) advogado(a) há de se atualizar, ler muito, não somente as obras relacionadas à sua área de atuação, mas a literatura em geral.
Vive-se a erar pós-moderna, de modo que cabe ao profissional estar sintonizado com os acórdãos do Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça (dentre outros tribunais) e os proferidos pelos Tribunais dos Estados, quanto aos temas relevantes, que lhe dizem de perto; a jurisprudência é importante, assim como a leitura da doutrina de ponta.
Imprescindível a leitura dos clássicos jurídicos.
Há de se atualizar quanto as leis regentes da matéria e não perder de vista que o estudo é hábito, é diário.
2º. Pensa
O Direito se aprende estudando, mas se exerce pensando
O Direito exige interpretação axiológica, teleológica e sistemática de textos legais e a hermenêutica jurídica se deve fazer presente no dia a dia dos advogados. Sem dúvida, pensar [e refletir] se traduz em verdadeira arte.
Interpretar o texto legal em harmonia com a Constituição Federal e o sistema jurídico é de rigor.
Pensar, refletir acerca do que se lê é passo primeiro para boa e sólida argumentação jurídica do profissional. Pensar a respeito do que os clássicos da área escreveram é outro caminho a ser trilhado. Indispensável o aprimoramento profissional.
Jamais esquecer os clássicos jurídicos, insiste-se.
3º. Trabalha
O Direito é uma árdua fadiga posta a serviço da justiça
O trabalho jurídico do(a) advogado(a) há se diário, metódico, sistemático, amparado em agenda, anotações. Vive-se diariamente com agenda, não há outro jeito.
Esse trabalho jurídico não é apenas e tão somente a redação de textos direcionados ao magistrado da causa, na defesa do direito do cliente.
A atividade é mais abrangente e tem a ver com o estudo profundo.
Exige efetiva preparação, exame de documentos, reflexão sobre o rumo a tomar e quais as medidas, a bem do cliente. Por outro lado, o trabalho, por vezes, está em apenas orientar clientes acerca de questão singela ou mesmo mais complexa.
Não raro, o consulente nem se torna cliente. A arte de rever a doutrina jurídica mais utilizada cotidianamente também é salutar. Assim, possível até memorizar a página onde o autor escreve acerca de determinado tema. É muito corriqueiro ocorrer.
4º. Luta
Teu dever é lutar pelo Direito, mas no dia em que encontrares em conflito com direito e a justiça, luta pela justiça.
Lutar pelo Direito é algo inerente a todos os(as) advogados(as), mas não se crê firmemente que, em havendo conflito com a justiça, há de preponderar esta.
O magistrado aplica o Direito ao caso concreto e ponto final. Não faz, nunca fez justiça. A justiça absoluta seria um ideal irracional, consoante Kelsen, citado pelo jurista Eros R. Grau. Comungo de tal pensamento, sem dúvida alguma.
Conforme bem assenta Grau, justiça é com a religião, a filosofia, a história 2 . Tenho para mim que o(a) advogado(a) deve lutar pela defesa de seu cliente, mas não pode lutar por justiça, porquanto, distante do mundo dos homens. Necessária a leitura do clássico de Kelsen.
5º. Sê leal
Leal para com o teu cliente, a quem não deves abandonar até que compreendas que é indigno de ti. Leal para com o adversário, ainda que ele seja desleal contigo. Leal para com o juiz, que ignora os fatos e deve confiar no que tu lhes dizes; e que quanto ao direito, alguma outra vez, deve confiar no que tu lhe invocas
A lealdade deve ser algo imperativo, não somente em relação ao cliente, mas também a todos os agentes que atuam nos autos do processo. Mesmo que nem sempre o(a) advogado(a) da parte adversa seja leal em suas manifestações judiciais, com escritos pouco recomendáveis, há de se manter a postura ética e responder a tudo de forma jurídica.
Deixar que o tempo se encarregue de dar as respostas a atos incorretos. A tranquilidade, conforme ensina o estoicismo, é imprescindível. A lealdade para com o magistrado condutor do processo e o representante do Ministério Público é outro fator que impera.
É de rigor apresentar as questões jurídicas de forma transparente, clara, concisa, elegante e com boa-fé objetiva.
Sem dúvida, é o caminho mais natural a quem exerce a profissão com dignidade, lealdade, boa-fé objetiva, competência e ética.
Bem diz o jurista Pontes de Miranda: nada que melhor impressione aos juízes que a elegância discreta das petições, sem encômios, que vexam, e asperezas, que desagradam e às vezes pode ser interpretadas como exuberância advocatícia para avivar as cores de direito duvidoso 3 .
6º. Tolera
Tolera a verdade alheia na mesma medida em que queres que seja tolerada a tua
Tolerar é uma grande virtude.
Virtude que nem todos exercem. Tolerar os paralogismos e até os sofismas, colocando em prática a boa retórica, a indispensável argumentação jurídica parece ser o caminho mais correto. Observar a dialética no âmbito do processo judicial talvez seja outro imperativo, salvo engano.
Ouvir e falar, debater com propriedade técnica e respeito, buscar o convencimento do julgador, tolerando a argumentação jurídica da parte contrária. Refutar as alegações com classe e estilo. A contradição de ideias faz parte do processo; apresentar contrapontos razoáveis também é imprescindível.
Colocar em relevo a argumentação jurídica - com base nos autores clássico -, no referencial teórico adquirido no decorrer da atividade profissional, é o melhor caminho. A leitura de obras estrangeiras é enriquecedora e abre a visão para vários temas.
O Direito é argumentação.
7º. Tem paciência
O tempo se vinga das coisas que se fazem sem sua colaboração
Outra importante virtude a ser exercida diariamente pelo profissional. Como dito, o tempo se encarrega de dar as respostas a todos os questionamentos. O tempo do processo não é o tempo que almeja a parte litigante. Com sabedoria, diz Plutarco que o tempo é o mais sábio dos conselheiros. Pura verdade.
A seu turno, Sófocles assenta que não se deve esconder nada; o tempo vê, escuta e revela tudo. A verdade processual sempre vem à tona e, às vezes, máscaras argumentativas caem; falsas alegações são afastadas. Basta aguardar, com paciência.
Os estóicos hão de ser lidos para que se possa exercitar a paciência. Persevera, sempre, na longa caminhada profissional.
8º. Tem fé
Tem fé no Direito, como o melhor instrumento para a convivência humana, na Justiça, como destino normal do Direito; na Paz, como substituto bondoso da Justiça; e, sobretudo, tem fé na Liberdade, sem a qual não há Direito, nem Justiça, nem Paz
Conforme Miguel Reale, o Direito corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência ordenada, pois nenhuma sociedade poderia subsistir sem um mínimo de ordem, de direção e solidariedade 4 .
O(a) advogado(a) deve contribuir, na justa medida do possível, para que ocorra a paz na sociedade, praticando os atos necessários à boa e correta resolução do processo, por exemplo.
Há de fazer com que o devido processo legal substantivo seja colocado em prática, a bem do esclarecimento da verdade, concedendo-se, ao final, a cada um o que realmente é seu.
9º. Esqueça
A advocacia é uma luta de paixões. Se em cada batalha fores carregando tua alma de rancor, sobrevirá o dia em que a vida será impossível para ti. Concluído o combate, olvida tão prontamente tua vitória como tua derrota
Há anos, ouvi de um grande profissional algo que nunca mais esqueci: os clientes passam, os(as) colegas advogados(as) ficam. Pura verdade. Nenhum cliente é eterno; não existe a questão do vínculo advogado-cliente para sempre. Nada o é.
Não se apaixonar pela causa onde defende a parte. Afinal, é apenas uma causa e um dia será julgada. A página será efetivamente virada e a vida profissional seguirá seu curso.
Manter sempre as portas abertas - especialmente aos colegas de profissão - é algo muito importante. É imperativo o dever é tratar a todos com educação, lealdade e urbanidade.
Este mandamento tem estreita ligação com o pensamento estóico, ou seja, as posições adotadas por Marco Aurélio, Sêneca, Epicteto e tantos outros (aliás, o estoicismo está na vitrine atualmente).
10º. Ama a tua profissão
Trata de conceber a advocacia de tal maneira que no dia em que teu filho te pedir conselhos sobre seu destino ou futuro, consideres um honra para ti propor-lhe que se faça advogado
Amar o Direito, em primeiro lugar, sempre. Amar o trabalho como advogado(a) e a ele se dedicar, diuturnamente. Amar a profissão de advogado(a).
Viver o Direito diuturnamente, aprender com os erros competidos, com os equívocos e buscar ampliação do seu universo jurídico. Exercitar a advocacia é uma arte. Advogar é correr riscos diários; é não ter a certeza de mantença do cliente, é lutar diariamente para que as causas sejam decididas a bem dos interesses/direitos do cliente.
É cuidar dos processos todos os dias e zelar para que tramitem de forma rápida e com segurança jurídica. Advogar é agir com ética, lealdade, prudência, honra, competência e bom senso.
Nunca, jamais esquecer que o(a) advogado(a), por força da Constituição Federal, é indispensável à administração da justiça. Tem, por fim, evidente, insofismável função social. A profissão tem relevo.
Notas
1 COUTURE, Eduardo. Os mandamentos do Advogado. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999. Tradução: Ovídio A. B. da Silva e Carlos O. Athayde.
2 GRAU, Eros. R. Por que tenho medo dos juízes: (a interpretação/aplicação do direito e os princípios). 7ª edição. São Paulo: Malheiros, 2016.
3 Comentários ao Código de Processo Civil. Tomo IV. Arts. 282. a 443. 3ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 10. Atualização legislativa de Sergio Bermudes.
4 Lições Preliminares de Direito. 27ª edição. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 2.