Resumo: Este trabalho propõe uma abordagem inovadora para promover a inclusão previdenciária de trabalhadores informais no Brasil, por meio da criação de um sistema de premiações vinculado à contribuição previdenciária. A proposta, denominada Loteria do Bem, visa estimular a formalização de cerca de 40 milhões de brasileiros atualmente à margem da seguridade social, utilizando o apelo cultural das loterias como incentivo à adesão ao sistema previdenciário. A iniciativa encontra respaldo jurídico na Constituição Federal e em decisões recentes do Supremo Tribunal Federal, que reconhecem a competência dos entes federativos para explorar concursos de prognósticos.
Palavras-chave: inclusão previdenciária; informalidade; concursos de prognóstico; seguridade social; inovação pública.
1. INTRODUÇÃO
A informalidade no mercado de trabalho brasileiro representa um dos maiores desafios à universalização da seguridade social. Estima-se que cerca de 40 milhões de trabalhadores atuem sem vínculo formal, o que os exclui de benefícios previdenciários como aposentadoria, auxílio-doença e pensão por morte. Diante desse cenário, torna-se urgente a criação de mecanismos inovadores que estimulem a formalização e a adesão ao sistema previdenciário.
2. A PROPOSTA: A LOTERIA DO BEM
A Loteria do Bem consiste na criação de concursos de prognóstico vinculados à contribuição previdenciária. A cada contribuição realizada, o trabalhador formalizado passa a concorrer automaticamente a prêmios em dinheiro, sem custo adicional. A apuração pode ser realizada com base nos sorteios da Loteria Federal, utilizando os quatro últimos dígitos do CPF, NIS, PIS ou CNPJ como número de aposta.
A proposta visa transformar o ato de contribuir em uma experiência positiva e recompensadora, aproveitando o apelo emocional e cultural das loterias, amplamente difundidas na sociedade brasileira.
3. FUNDAMENTO JURÍDICO
A Constituição Federal, em seu artigo 195, inciso III, prevê que receitas oriundas de concursos de prognósticos podem ser destinadas ao financiamento da seguridade social. Além disso, o Supremo Tribunal Federal, por meio da ADI nº 4.986, decidiu que a exploração de loterias não é monopólio da União, permitindo que estados e o Distrito Federal criem e administrem suas próprias modalidades.
Essa decisão abre caminho para que os entes federativos desenvolvam loterias com finalidades sociais, como a inclusão previdenciária, desde que respeitados os princípios da legalidade, moralidade e finalidade pública.
As loterias são consideradas serviços públicos desde os primeiros decretos que regulamentaram sua existência. O Decreto nº 21.143/1932, assinado por Getúlio Vargas, já previa que tanto a União quanto os estados poderiam explorar esse serviço.
O Decreto-Lei nº 2.980/1941 e o Decreto-Lei nº 6.259/1944 reforçam que a exploração pode ser feita diretamente pelos entes ou por meio de concessionários, desde que estes tenham idoneidade moral e financeira comprovada.
O artigo 195, inciso III da Constituição Federal estabelece que parte da arrecadação das loterias pode ser destinada ao financiamento da Seguridade Social, o que conecta diretamente com sua proposta de inclusão previdenciária.
Em decisão recente, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que não é exclusividade da União explorar loterias. Estados e municípios têm autonomia para criar e operar suas próprias modalidades, desde que respeitem os princípios constitucionais.
O STF também definiu que os entes federativos podem explorar modalidades próprias, mas devem observar a territorialidade — ou seja, a atuação deve se restringir ao território do ente que criou a loteria.
4. VIABILIDADE ECONÔMICA
A proposta prevê a destinação de um valor simbólico da contribuição previdenciária para a composição dos prêmios. Por exemplo, considerando R$0,25 por contribuinte, com 40 milhões de participantes, teríamos R$10 milhões por concurso. Após dedução de custos operacionais, restariam cerca de R$8 milhões em prêmios, distribuídos em até oito concursos mensais, totalizando R$64 milhões por mês.
Esse modelo pode ser ampliado com a participação dos trabalhadores já formalizados, aumentando significativamente o montante arrecadado e o impacto social da iniciativa.
5. ASPECTOS PSICOLÓGICOS E CULTURAIS
Estudos apontam que o ato de apostar está associado à liberação de dopamina, neurotransmissor ligado ao sistema de recompensas do cérebro. A expectativa de ganhar, mesmo diante de probabilidades mínimas, gera sensação de prazer e esperança. Segundo especialistas como Kléber Marinho, Daniela de Oliveira e Elen Contro, o comportamento de apostar está profundamente enraizado na cultura brasileira e pode ser canalizado de forma positiva para fins sociais.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Loteria do Bem representa uma proposta inovadora, juridicamente viável e socialmente relevante. Ao transformar a contribuição previdenciária em uma oportunidade de premiação, promove-se a inclusão de milhões de brasileiros à margem da seguridade social, fortalecendo o pacto federativo e ampliando a arrecadação pública.
A iniciativa alia criatividade, legalidade e impacto social, demonstrando que é possível pensar políticas públicas com base em incentivos culturais e emocionais, sem abrir mão da responsabilidade fiscal e da justiça social.