Capa da publicação A ascensão, declínio e queda da chuva privatizada
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A ascensão, declínio e queda da chuva privatizada

05/10/2025 às 14:42

Resumo:


  • A BlackRock conseguiu aprovar a privatização da chuva em diversos países, visando proteger seus lucros e controlar a água.

  • A população enfrentou restrições severas, como multas e até prisão, por coletar água da chuva, levando a resistência e desafios à nova política.

  • O debate sobre a privatização da chuva gerou tensões internacionais e resultou em consequências inesperadas, como prejuízos para empresas de tecnologia e movimentos de resistência.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Seria possível criminalizar um banho de chuva em nome do lucro corporativo? Conto de ficção que imagina a privatização da chuva pela BlackRock em 2167.

Ano 2167. Após uma intensa campanha de seus lobistas, a BlackRock finalmente consegue convencer os parlamentos dos EUA, Inglaterra e Alemanha a aprovar a privatização da chuva. Doravante toda água que cair dos céus nesses países é propriedade da empresa e não pode ser coletada por ninguém.

Essa medida foi necessária porque as pessoas empobrecidas estavam coletando água da chuva para não pagar a água encanada da BlackRock. Isso havia provocado uma redução de 0,78% nos lucros da empresa nos anos anteriores dificultando a distribuição de bilhões de dólares de lucros aos acionistas da empresa. Algo que obrigou o CEO mundial da BlackRock a renunciar ao cargo.

O novo CEO declarou guerra à coleta de chuva e uma campanha publicitária começou a ser elaborada e distribuída. A chuva não podia ser um bem comum, porque a água privatizada evaporada era em grande medida uma coisa privada. Durante a campanha, filmes com atores virtuais foram financiados para fazer as crianças temer e odiar a chuva. Nas peças de propaganda favoráveis à privatização da chuva, os coletores de chuva foram retratados não como pessoas pobres, mas como comunistas malditos que sabotavam o capitalismo.

No princípio os produtores rurais foram contra a privatização da chuva. Especialmente quando ficou claro que eles teriam que pagar à BlackRock uma taxa fixa mensal de permissão para usar a chuva com base no tamanho de suas propriedades de acordo com estimativas de chuva feitas com base na média histórica de chuvas dos últimos 10 anos. Os lobistas dos produtores rurais entraram em cena e um acordo de compromisso foi costurado. O Estado pagaria a eles um subsídio mensal igual a 90% do valor devido à BlackRock por 100 anos, período de tempo em que a privatização da chuva certamente seria globalizada.

Aprovada a privatização da chuva, o engajamento das pessoas comuns no combate à coleta de água da chuva foi conseguido mediante um programa que previa descontos na conta de água para quem denunciasse vizinhos que faziam isso. IAs poderosas faziam análises de consumo fornecendo relatórios em tempo real cruzando dados das condições climáticas com o consumo das residências, o que facilitava a fiscalização da "polícia da chuva".

Nesse contexto, usar guarda-chuva se tornou obrigatório e tomar banho de chuva era considerado infração grave punível com multa. A reincidência acarretava prisão. Coletar água da chuva para beber só deveria ser permitido em regiões extremamente secas como o Sahara, o Sinai e o semiárido brasileiro. Em regiões onde chovia regularmente, entretanto, isso era considerado terminantemente proibido e a "polícia da chuva" estava autorizada a usar violência letal contra os infratores.

Grupos de resistência furaram a Lei, é claro. Isso acontecia especialmente quando chovia a noite. Festas noturnas de banho na chuva começaram a ser organizadas e se tornaram uma verdadeira febre. Os funcionários da BlackRock não sabiam como combater esse comportamento desafiador que se multiplicou com a divulgação de vídeos amadores no YouTube. A monetização de contas em que esses vídeos eram compartilhados era derrubada, mas cópias deles continuavam a ser compartilhados e vistos no Bluesky.

Um grande debate começou em torno da liberdade de expressão começou na TV. Especialistas e jornalistas simpáticos à privatização da chuva diziam que as redes sociais deviam ser responsabilizadas caso não derrubassem imediatamente convocações para festas noturnas de banho na chuva e vídeos das mesmas.

- Isso é um absurdo intolerável - disse um herdeiro de Elon Munk - minha IA vai começar a vasculhar a Internet para localizar os principais responsáveis por isso e eles serão punidos.

A BlackRock começou a oferecer pequenas quantias em dinheiro para os espiões da noite. Quem conseguisse com sucesso direcionar a "polícia da chuva" para operações de repressão das festas noturnas de banho na chuva podia ganhar de 100 a 1000 dólares. Agentes disfarçados da "polícia da chuva" começaram a se infiltrar nos grupos de resistência à chuva privatizada.

IAs de reconhecimento facial começaram a ser utilizadas pelas autoridades para analisar vídeos e localizar possíveis infratores. Mas isso somente levou à uma escalada. O movimento chuva livre começou a utilizar pinturas faciais que impediam o reconhecimento por IAs antes de saírem para tomar banho na chuva. A iluminação pública também passou a ser sabotada nos locais em que as pessoas se reuniam para tomar banho na chuva.

O dedurismo causou prisões e mortes, mas depois ele se voltou contra o policiamento. Os militantes da chuva livre organizavam festas noturnas de banho na chuva num local e dirigiam a repressão para outro local distante mediante pistas e informações falsas espalhadas por uma rede informal de hackers.

As violações da lei eram sempre mais importantes e acintosas em regiões de fronteira. Afinal, nem todos os países haviam privatizado a chuva e aqueles em que o banho de chuva não era proibido e reprimido funcionavam recebiam e davam salvo conduto aos infratores americanos, ingleses e alemães que cruzassem a fronteira. As relações bilaterais entre EUA e Canadá/México, entre Alemanha e França e entre Inglaterra e Escócia azedaram. Ameaças de guerra foram feitas. Novas leis proibindo o fluxo internacional por terra de pessoas durante a época das chuvas foram aprovadas.

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O aumento das despesas com a repressão policial noturna das infrações à lei da privatização da chuva virou uma dor de cabeça em diversos países. Artistas e pessoas importantes incentivavam o movimento chuva livre retratando-o como algo justo, uma reação natural contra uma política gananciosa e sem sentido desenhada para legitimar apenas uma coisa: o fascismo empresarial e político.

Desesperados os técnicos da BlackRock faziam contas. Talvez algum tipo de flexibilização do uso da chuva durante a noite fosse necessário.

O debate pegou fogo, porque aqueles que exigiam mais repressão temiam o pior. Liberar o banho de chuva à noite e reduzir os gastos com a "polícia da chuva" levaria os comunistas a começar a organizar festas de banho de chuva em plena luz do dia. Isso era inadmissível.

O mundo em que a chuva foi privatizada e o uso dela criminalizado era estranho, perigoso e triste. Mas ele não era muito diferente do mundo em que a água encanada se tornou escassa e cara porque passou a alimentar os sistemas de refrigeração dos imensos datacenters da Amazon, Google, Microsoft, OpenAI, Oracle e outras empresas do ramo.

Ano 2172, os debates sobre a revogação da privatização da chuva começam ser impulsionados no Congresso dos EUA pelos lobistas das empresas do ramo de tecnologia. Elas começaram a ter prejuízos imensos quando um grupo terrorista passou a armar drones convencionais baratos com Artefatos Explosivos Improvisados para danificar os telhados de datacenters durante chuvas torrenciais. A infiltração de água da chuva nas instalações causavam danos irreparáveis aos supercomputadores causando blackout na internet e prejuízos financeiros incalculáveis às Big Techs.

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Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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