Resumo: É sabido por todos que a Reforma Tributária brasileira, consubstanciada na Emenda Constitucional nº 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar nº 214/2025, introduziu inovações estruturais no sistema fiscal, dentre as quais se destaca o split payment (pagamento fracionado). Essa modalidade altera profundamente a sistemática de recolhimento dos tributos sobre o consumo, notadamente o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que compõem o novo Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) nacional. No presente artigo analisamos o funcionamento, os impactos econômicos e os desafios operacionais decorrentes da implantação do split payment no Brasil, destacando suas implicações para empresas, contadores e o fluxo de caixa corporativo.
Palavras-chave: Split payment; Reforma Tributária; IBS; CBS; IVA; fluxo de caixa; compliance fiscal.
I - INTRODUÇÃO
É bem de ser ver que a Reforma Tributária em curso no Brasil representa a mais ampla reestruturação fiscal das últimas décadas. Com a instituição do IVA dual, formado pelo IBS (de competência estadual e municipal) e pela CBS (de competência federal), busca-se simplificar o sistema, reduzir cumulatividade e aprimorar a eficiência arrecadatória.
Nesse contexto, o split payment surge como um dos pilares tecnológicos e operacionais dessa transformação. Trata-se de um modelo de pagamento fracionado, no qual a parcela correspondente ao tributo é automaticamente direcionada ao Fisco no momento da transação comercial, sem transitar pelo caixa do contribuinte.
Essa medida visa mitigar a sonegação, aumentar a transparência e eliminar a inadimplência tributária, promovendo um ambiente de maior previsibilidade fiscal.
II – OS FUNDAMENTOS LEGAIS DO SPLIT
Por sua vez o split payment tem base normativa na Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta o IBS e a CBS, e no artigo 156-A da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 132/2023.
De acordo com o texto legal, o recolhimento será realizado de forma automática, por meio de sistemas eletrônicos integrados às plataformas de pagamento, às instituições financeiras e às administrações tributárias.
A sua implementação ocorrerá gradualmente, a partir de 2026, com transição prevista até 2032, conforme cronograma estabelecido pelo Comitê Gestor do IBS (CG-IBS) e pela Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária.
III – COMO SERÁ O FUNCIONAMENTO DO SPLIT PAYMENT
É uma novidade da reforma, pois o modelo de split payment difere substancialmente do regime tradicional de recolhimento de tributos. Enquanto hoje o contribuinte recolhe os impostos após receber integralmente o valor da operação, no novo modelo o sistema fraciona o pagamento no ato da transação.
Etapas do processo:
O comprador realiza o pagamento integral do valor da compra ou serviço.
O sistema identifica a operação e separa automaticamente a fração referente ao tributo.
O valor do imposto é remetido diretamente ao Fisco, enquanto o vendedor recebe apenas o valor líquido.
Por isso, esse mecanismo é considerado “autoliquidável”, pois extingue o crédito tributário simultaneamente à ocorrência do fato gerador, conforme preceitua o art. 156, inciso I, do CTN (pagamento).
IV – OS IMPACTOS NO FLUXO DE CAIXA DAS EMNPRESAS
Portanto, podemos afirmar que o principal efeito do split payment será a redução imediata do montante líquido recebido pelas empresas em cada operação, alterando significativamente o fluxo de caixa operacional.
4.1 Necessidade de Revisão do Capital de Giro
Com o tributo retido automaticamente, haverá menor entrada bruta de recursos, exigindo reavaliação das políticas de capital de giro, de modo a garantir liquidez para despesas e investimentos.
4.2 Ajustes nos Controles Financeiros
Os sistemas de gestão, conciliação bancária e previsão de caixa deverão ser modernizados. O controle de recebíveis será mais rigoroso, demandando integração entre contabilidade, fiscal e tesouraria.
4.3 Capacitação e Planejamento
Equipes de contabilidade e finanças precisarão compreender as novas dinâmicas operacionais, dominando o uso de softwares integrados e as regras de apuração e repasse do IBS e da CBS.
V – UM EXEMPLO PRÁTICO DE CÁLCULO
Descrição |
Valor (R$) |
|---|---|
Valor da venda |
12.000,00 |
Alíquota total (IBS + CBS) |
20% |
Tributo retido (12.000 x 20%) |
2.400,00 |
Valor líquido recebido pela empresa |
9.600,00 |
O valor do imposto (R$ 2.400,00) é automaticamente direcionado ao Fisco, enquanto a empresa recebe apenas o valor líquido (R$ 9.600,00), já deduzido o tributo.
VI – AS VANTAGENS E DESAFIOS DO SPLIT PAYMENT
Vantagens
- Redução da inadimplência fiscal: o imposto é recolhido no momento da operação.
- Diminuição de fraudes e sonegação: o sistema elimina a retenção indevida de tributos.
- Previsibilidade e segurança jurídica: o contribuinte passa a ter maior clareza sobre seu fluxo líquido.
- Simplificação do compliance: reduz a necessidade de controles manuais de recolhimento.
Desafios
- Redução do capital de giro disponível;
- Necessidade de investimentos em tecnologia;
- Treinamento de pessoal contábil e financeiro;
- Integração de sistemas entre empresas e Fisco.
VII – A IMPORTÂNCIA DO PROFISSIONAL
A figura do contador torna-se ainda mais estratégica nesse novo cenário. Sua atuação envolverá:
- Monitorar a correta aplicação das alíquotas de IBS e CBS;
- Validar a consistência dos valores retidos e repassados;
- Adequar o planejamento tributário das empresas;
- Capacitar gestores e equipes operacionais;
- Assegurar conformidade com as normas do Comitê Gestor do IBS e da Receita Federal.
O contador assume, portanto, papel de gestor de conformidade tributária, sendo fundamental para a transição segura ao novo modelo.
VIII – CONCLUSÃO:
Diante de todo o exposto, podemos concluir que o split payment representa uma das mais profundas inovações no sistema tributário brasileiro desde a criação do Simples Nacional (Lei Complementar nº 123/2006). Ao transferir a responsabilidade pelo recolhimento diretamente ao sistema de pagamentos, reduz-se o espaço para inadimplência e evasão, fortalecendo o equilíbrio fiscal do país.
Entretanto, a efetividade da medida dependerá da capacidade das empresas em se adaptar, do suporte tecnológico e da atuação proativa dos profissionais da contabilidade. A adoção gradual até 2032 permitirá ajustes operacionais e normativos, consolidando um modelo mais transparente, automatizado e eficiente de arrecadação tributária. Por certo diminuirá, e muito, a sonegação fiscal no Brasil.
NOTAS
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Emenda Constitucional nº 132, de 20 de dezembro de 2023. Dispõe sobre a Reforma Tributária.
Lei Complementar nº 214, de 2025. Regulamenta o IBS e a CBS, institui regras de transição e dispõe sobre o split payment.
Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966).
APPY, Bernard. Entrevista sobre a Implementação do Split Payment. Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, 2025.
ALVES & MELLO Contabilidade. Split Payment e a Modernização da Cobrança Tributária no Brasil. Sorocaba, 2025.