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A democracia brasileira enquanto estado de exceção

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20/06/2013 às 10:33
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4. A doutrina de Giorgio Agamben

O estado de exceção integra o gênero dos fenômenos jurídicos-políticos que abarca a guerra civil, a insurreição e a resistência, marcados com a nota do estado de necessidade social. O estado de exceção é a intersecção entre a política e o direito, identificado pela abolição provisória da separação entre os poderes legislativo, judiciário e executivo, com a concentração de poder no último, que usurpa da função legislativa, exercendo-a por meio de atos com “força de lei”, submetendo, também, o judiciário.

A origem do estado de exceção está na prática governamental francesa dos séculos XVIII e XIX, quando a Assembléia Constituinte distinguiu o estado de paz do estado de guerra, delimitando os espaços de atuação das autoridades civis e militares em ambas as situações. Na confluência entre os dois momentos havia o estado se sítio, quando todas as funções de que a autoridade civil é investida para a manutenção da ordem passavam para o comando militar, que as exercia sob sua responsabilidade, nas hipóteses em que uma cidade ou portos militares estivessem sitiados. Paulatinamente a utilização da excepcionalidade do estado de sítio foi ampliada para abafar as desordens internas e rebeliões civis, emancipando-se em relação à sua origem que era a situação de guerra ou invasão estrangeira para acomodar medidas extraordinárias de polícia. O seu ápice se deu com o Decreto napoleônico de 24.12.1811 que lhe deu a possibilidade de declarar estado de sítio, com plenos poderes para suspender normas constitucionais que protegiam as liberdades individuais. O estado de exceção francês foi retomado no período da Primeira Guerra Mundial, durando de 1914 a 1919, quando o Presidente decretou estado de sítio no país inteiro e passou a regular por decretos todos os temas de interesse da sociedade, transformando o Executivo em legislador permanente.

Após o final do período de guerra, a ampliação dos poderes do Executivo foi mantida substituindo-se a emergência militar pela emergência econômica, por meio de uma assimilação implícita entre guerra e necessidades financeiras. Seguiu-se durante o século XX a prática governamental francesa de regular a economia, depois os tributos, por meio de decretos executivos, chegando ao ponto do Presidente Laval emitir mais de cinqüenta decretos “com força de lei” para evitar a desvalorização da moeda em 1935.

Na Alemanha o estado de exceção atual encontra seu antecedente próximo no artigo 48 da Constituição de Weimar, de 1919, o qual concedia plenos poderes ao presidente para tomar as medidas necessárias para o restabelecimento da segurança e da ordem pública, inclusive com ajuda das forças armadas e a suspensão de direitos fundamentais, dispositivo que levou Carl Schmitt a escrever em 1925 que “nenhuma constituição do mundo havia, como a de Weimar, legalizado tão facilmente um golpe de Estado”[20], exatamente o que veio a ocorre em 1933 quando Adolf Hitler tomou o poder e fez o Decreto para a proteção do povo e do Estado, instaurando o estado de exceção permanente que vigeu entre os tedescos por doze anos, durante todo o Terceiro Reich, cujo mecanismo jurídico permitiu a implantação do regime totalitário, com a migração dos poderes legislativos para o Führer, que passou a submeter o sistema judiciário.

É com Abraham Lincoln que tem início a prática excepcional de governo nos Estados Unidos da América, mais precisamente durante a guerra civil. Contrariando os artigos 1º e 2º da Constituição norte-americana, o presidente Lincoln decretou a guerra, recrutou o exército e convocou o Congresso em sessão especial para o dia 04.07.1861. No interstício entre a decretação e a reunião do Parlamento, o governo emitiu diversos outros atos executivos com força de lei, inclusive suspendendo direitos individuais. No discurso proferido perante o Congresso em 04.07.1861 o presidente justificou que as medidas que havia adotado, tenham ou não sido legais em sentido estrito, haviam sido decididas sob a pressão de uma exigência popular e de um estado de necessidade. O Congresso, consciente da exacerbação dos poderes executivos, mas constrangido pela situação fática já consumada, ratificou os atos presidenciais, o que fortaleceu Lincoln a decretar diversos outros atos, passando pela libertação dos escravos, extensão para todo o país do estado de exceção, culminando com a autorização de prisão e posterior julgamento dos rebeldes e insurgentes perante um tribunal de exceção.

Os poderes excepcionais do executivo foram utilizados por Woodrow Wilson durante a Primeira Guerra Mundial, migrando depois, já pelas mãos de Roosevelt, para aspectos de natureza econômica.[21] A grande depressão foi enfrentada pelos atos de natureza executiva, inclusive o New Deal foi instituído mediante decreto.

Com as mesmas exortações o presidente George W. Bush reivindicou para si os poderes soberanos de comandante e chefe das armas, para decretar o Military Order de 13.11.2001, por meio do qual se permitia a prisão de suspeitos de envolvimento em atividades terroristas, inclusive o Senado promulgou o USA Patriot Act de 26.10.2001, autorizando os militares a manterem presos os estrangeiros suspeitos de atividades que pusessem em perigo a segurança do país. Na opinião de Agamben, Bush produziu uma situação de emergência artificial, tornando-a regra, na qual “a própria distinção entre paz e guerra (e entre guerra externa e guerra civil mundial) se torne impossível”.[22]

Lecionando sobre a realidade de seu país, Agamben mostra que inexistia na Itália previsão normativa, legal ou constitucional, para que o chefe do executivo emitisse atos com efeitos legislativos, quando o fenômeno ocorreu em 1848 por meio de decreto com força de lei para conter sedições internas, que obteve do Poder Judiciário decisão positiva que sufragou a sua legalidade ao argumento de urgência, tanto que a utilização do ato excepcional foi incorporada ao sistema jurídico pelas mãos da ditadura fascista na Lei n. 100 de 1926, posteriormente à Constituição italiana de 1947.[23] A legislação de coloração fascista ainda previa que somente o Parlamento poderia fazer o controle dos requisitos de “necessidade urgente e absoluta”, subtraindo do Judiciário a atribuição.[24] Após um período de pouca utilização, os atos executivos com força de lei ressurgiram durante a década de 1970 na experiência italiana e, para falar com Giorgio Agamben, a prática da legislação governamental por meio de decretos-lei tornou-se, então, a regra.

Isso significa que o princípio democrático da divisão dos poderes hoje está caduco e que o poder executivo absorveu de fato, ao menos em parte, o poder legislativo. O Parlamento não é mais o órgão soberano a quem compete o poder exclusivo de obrigar os cidadãos pela lei: ele se limita a ratificar os decretos emanados do poder executivo. (...) E é significativo que semelhante transformação da ordem constitucional, que hoje ocorre em graus diversos em todas as democracias ocidentais, apesar de bem conhecida pelos juristas e pelos políticos, permaneça totalmente despercebida por parte dos cidadãos. Exatamente no momento em que gostaria de dar lições de democracia a culturas e tradições diferentes, a cultura política do Ocidente não se dá conta de haver perdido por inteiro os princípios que a fundam.[25]

A despeito da origem do instituto ter coincidência com os poderes transitórios conferidos ao executivo durante os períodos de guerra, a sua migração para combater as emergências econômicas e outras vicissitudes pôde ser comprovada pela prática da Suíça, país não integrante das forças combatentes na Primeira Guerra Mundial, mas cujo ato da Assembléia, em 1914, conferiu ao Conselho Federal o poder ilimitado de tomar as medidas necessárias para garantir a segurança, integridade e neutralidade do país, instituindo-se o estado de exceção permanente também naquelas plagas.

As guerras mundiais deixaram, no campo jurídico, a herança da progressiva expansão dos poderes do Poder Executivo, transformando os regimes democráticos em estados de exceção permanente, aparelhados pela autorização do uso pelo presidente de medidas executivas com força legislativa, transformação das medidas excepcionais em técnica contemporânea de governo.

Com o avanço da ampliação dos poderes do Executivo para legislar por meio dos atos com “força de lei”, G. Agamben observa que uma das práticas essenciais dos Estados atuais, inclusive dos intitulados democráticos, é a criação voluntária e artificial de um estado de emergência permanente, uma “guerra civil mundial”, quando o estado de exceção tenciona cada vez mais a se apresentar como um paradigma de governo dominante da política atual. O deslocamento de uma medida provisória e excepcional para uma técnica duradoura de governo transforma radicalmente a estrutura e o sentido da distinção tradicional entre os vários modelos de constituições. “O estado de exceção apresenta-se nessa perspectiva como um patamar de indeterminação entre democracia e absolutismo. (...) Em todo caso, é importante não esquecer que o estado de exceção moderno é uma criação da tradição democrático-revolucionária e não da tradição absolutista.”[26]

O autor estudado reconhece que o uso provisório, excepcional e controlado dos plenos poderes pelo executivo é até teoricamente compatível com as constituições democráticas, contudo o seu exercício sistemático e regular leva necessariamente à liquidação da democracia, na medida em que a progressiva erosão da função legislativa do Parlamento, que hoje se limita, com frequência, a ratificar disposições emitidas pelo Executivo, sob a forma de decretos com força de lei, tornou-se uma prática comum e confirmadora do estado de exceção em que vivemos atualmente.


6. O panorama brasileiro

As sementes políticas de matriz autoritária encontraram no Brasil um terreno fértil para se desenvolverem, na medida em que se verificava aqui – melhor dizendo, ainda se verificam – todas as condições apontadas pelos três autores estudados para que a democracia degenere em demagogia, modernamente em um estado de exceção, mesmo após a promulgação da Constituição de 1988, formalmente democrática.

Para conferir na prática as lições de Aristóteles, constatamos que as causas para instalação da demagogia, quiçá de um governo totalitário, encontra-se presentes no Brasil, na medida em que há a existência de grupos de privilegiados que gozam de benefícios não acessíveis à grande massa da população, bem assim há crescimento da classe social menos favorecida, com exacerbação da desigualdade social e indigência, condições que possibilitam a manipulação da opinião pública para a utilização de atos executivos com efeitos legislativos pelo governante de ocasião, tomando-se o cuidado de conduzir os decretos ao povo, “porque o povo é senhor de tudo, e eles próprios são senhores da opinião da turba, que só a eles obedece.”[27]

O Brasil recepcionou o estado de exceção por meio da Constituição de 1937, outorgada por Getúlio Vargas, cujos artigos 12, 13, 14 e 180, concediam ao Presidente da República poderes para emitir decretos-lei, com autorização do Congresso Nacional, cujo assentimento parlamentar nunca foi solicitado por Getúlio Vargas, que implantou o regime totalitário instrumentalizado pelos atos executivos com força de lei. Também a ditadura militar instalada em 1964 valeu-se dos mecanismos dos atos executivos para subtrair do legislativo suas funções típicas, submetendo também o Poder Judiciário.

José Afonso da Silva recorda que na América Latina tanto o Poder Executivo como militares golpistas recorreram aos mecanismos de estado de exceção mais para criar condições para a implantação de ditaduras e regimes totalitários, do que defender as constituições e o regime democrático. E aqui se verificou várias vezes a utilização do expediente, por exemplo, quando o regime ditatorial de Getúlio Vargas foi implantado, declarando em todo país o estado de emergência, e com maior nitidez durante o regime militar apoiado pelos Atos Institucionais que autorizaram a perseguição dos adversários políticos, fecharam o Legislativo, cassaram mandatos populares, demitiram funcionários públicos, suspenderam direitos políticos e puniram magistrados e militares, cujos efeitos maléficos ecoaram até a Constituição de 1988, que além do estado de sítio recolheu o estado de defesa, idêntico ao estado de emergência do regime militar de exceção.[28]

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A despeito da experiência traumática com os antigos decretos-leis, por meio dos quais o Poder Executivo inovava primariamente na ordem jurídica, a Constituição de 1988 manteve a possibilidade de emissão de atos legislativos pelo Poder Executivo em duas oportunidades: por meio das leis delegadas e das medidas provisórias.

A medida provisória é filha dos decretos-lei do período ditatorial e neta dos atos de exceção da ditadura de Getúlio Vargas.

Carmem Arias promoveu estudo no qual mostra o crescimento vertiginoso da publicação de medidas provisórias pelo Executivo desde a redemocratização do país, constatação que revela a dificuldade do Estado brasileiro de limitar e distribuir poder, mormente após a recente superação do período de regime autoritário. Por isso que a especificidade da nossa arena institucional, que se caracteriza pela tênue divisão entre os poderes Legislativo e Executivo, e por uma relação tipicamente desigual entre estes poderes, “contribui para que o Executivo continue mantendo a sua supremacia sobre o Legislativo no Brasil.”[29]

A referida professora defende que diante dos amplos poderes legislativos do Presidente da República, os quais se materializam pelo uso excessivo, crescente e fora das hipóteses constitucionais das medidas provisórias, há elementos que indicam uma continuidade da atual democracia com o regime militar, na medida em que a prática das medidas provisórias pouco se diferencia dos decretos-leis do antigo regime. Pensamos nós que efetivamente as atuais medidas provisórias em nada diferem dos mecanismos dos governos autoritários, salvo a maquiagem que recebeu com a nova nomenclatura que lhe atribuiu a Constituição Federal de 1988, porém na essência manteve-se como um mecanismo de superposição do Poder Executivo[30], chegando ao ponto de Celso Antônio Bandeira de Mello classificar as medidas provisórias de sobrevivência piorada do antigo decreto-lei.[31]

Mas somente é possível a utilização desmensurada dos atos executivos com efeitos legislativos nas democracias que não possuem um Poder Judiciário consistente, na medida em que, formalmente, é papel do último fazer o controle dos atos executivos que exorbitem de sua parcela de poder, retomando a máxima dos freios e contrapesos a que nos referiu Montesquieu. Ocorre que, no Brasil, não há Corte Constitucional com legitimidade popular – como ocorre em algumas democracias mais desenvolvidas – e, além de tudo, o Supremo Tribunal Federal não desempenha sua função de jurisdição constitucional, pois não examina os atos concretos dos outros poderes; prefere, como a sua jurisprudência demonstra, omitir-se na análise do mérito das medidas provisórias e também “engavetar” centenas de mandados de injunção propostos para regulamentar direitos fundamentais, já havendo ocasião de seu Presidente defender que o papel da Corte era garantir a governabilidade democrática.[32]

Precavendo-se de possível fortalecimento do Judiciário, com a substituição paulatina de seus membros – e com renovação da mentalidade democrática – o poder político já cuida de retirar do STF os poderes de jurisdição constitucional[33] e também restringir os poderes investigativos dos diversos órgãos do Estado.[34]

O Poder Executivo submete o Poder Legislativo brasileiro em razão de uma série de mecanismos constitucionais, legais e políticos. Do primeiro grupo fazem parte a utilização ampla das medidas provisórias, a possibilidade de veto jurídico e político dos projetos de lei, a iniciativa legislativa privativa de algumas matérias pelo Executivo e a prerrogativa de realizar pedidos de urgência durante o trâmite legislativo, institutos que interferem nas atividades legiferantes típicas, manipulando a pauta do Congresso.[35]

Entre os mecanismos políticos utilizados está a centralização do processo de tomada de decisões dentro do parlamento nos líderes partidários, que são responsáveis pela escolha e indicação dos políticos que ocupam as posições centrais nas comissões deliberativas. A maioria governista formada nas comissões do Congresso Nacional tem o poder de evitar que determinada matéria que contrarie os interesses do governo do momento chegue à votação em plenário, quando a pressão popular é mais suscetível de gerar resultados contrários ao interesse do Poder Executivo.

Também por controlar uma grande variedade de recursos e a nomeação de cargos não suscetíveis de concurso na máquina administrativa, desde a distribuição de Ministérios entre os partidos que cooperem na sustentação do governo até os cargos de menor escalão, loteamento de estatais, o Poder Executivo utiliza, conforme analistas políticos já confirmaram[36], do expediente de liberação de crédito, concessões de rádio e televisão, execução de emendas parlamentares individuais, licitações, para obter apoio político e construção de maioria parlamentar para aprovar os projetos de seu interesse.

O então Senador Fernando Henrique Cardoso, que se tornaria o Presidente que mais utilizaria do expediente das medidas provisórias, criticava o seu uso em artigo semanal que escrevia no Jornal Folha de São Paulo em 1990. Em uma das ocasiões atribuiu a culpa pelo uso desmedido das medidas provisórias à relação promiscua que existia entre Executivo e Legislativo, acrescentando que:

O Executivo abusa da paciência e da inteligência do país, quando insiste em editar medidas provisórias sob o pretexto de que, sem sua vigência imediata, o Plano Collor vai por água abaixo, e, com ele, o combate à inflação. Com esse ou com pretextos semelhantes, o governo afoga o Congresso numa enxurrada de "medidas provisórias". O resultado lamentável: a Câmara e o Senado nada mais fazem que apreciá-las aos borbotões. É certo, porém, que, seja qual for o mecanismo, ou o Congresso põe ponto final no reiterado desrespeito a si próprio e à Constituição, ou então é melhor reconhecer que no País só existe um Poder de verdade, o do Presidente. E daí por diante esqueçamos também de falar em “democracia”.

Em relação à submissão do Poder Judiciário verificam-se diversos atos de exceção em que o Poder Executivo desconsidera regras constitucionais e efetivamente impõe o seu poder fático ao argumento contemporâneo de crise econômica mundial a que nos aludiu Giorgio Agamben em sua lição. O artigo 95, III, da Constituição garante aos magistrados a irredutibilidade dos subsídios, o que é alcançado pela determinação de revisão geral anual, conforme artigo 37, X, do mesmo diploma.

Também os artigos 96 e 99 da Constituição garantem ao Poder Judiciário autonomia administrativa e financeira, incumbindo aos Tribunais elaborarem as suas propostas orçamentárias, dentro dos limites fixados pela lei de diretrizes orçamentárias, com posterior remessa ao Poder Executivo para consolidação da proposta e remessa ao Poder Legislativo. O artigo 99, § 4°, prevê que o Poder Executivo está autorizado a ajustar o orçamento do Judiciário apenas no caso da proposta recebida não observar o limite da lei de diretrizes orçamentárias. Mas, exorbitando a atribuição constitucional, em 2011 e 2012 o Poder Executivo desconsiderou as propostas encaminhadas pelo Poder Judiciário, a pretexto do quadro de incerteza econômica mundial[37], deixando de encaminhar a proposta orçamentária judicial para a apreciação do Poder Legislativo, o que na prática gerou violação da separação dos poderes, da autonomia orçamentária do Poder Judiciário e do direito dos juízes à revisão anual dos subsídios para reposição das perdas inflacionárias, submetendo-os ao seu poderio fático.

E o mecanismo autoritário de submissão do Poder Legislativo pela utilização amiúde de medidas provisórias, em subtração de sua parcela de poder, e do Judiciário por intermédio da manipulação de sua proposta orçamentária, impondo-o arrocho, é aparelhado pelo Poder Executivo por meio do mecanismo de manipulação da opinião pública ao falacioso e genérico argumento de estado de emergência econômica, ao mesmo tempo em que os números mostram crescimento contínuo da arrecadação, em verdadeira demagogia a que nos ensinou Aristóteles, contemporaneamente azeitada pelo controle indireto dos meios de comunicação, bem remunerados por verba pública, tendo o Poder Executivo como seu principal anunciante.

A Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República consolidou e divulgou os dados referentes aos valores gastos com programações publicitárias do executivo federal (administração direta, indireta e as estatais) no lapso de 2000 a 2012, de cuja análise verifica-se a expressividade e o aumento paulatino do investimento com propaganda, por exemplo, o valor gasto de R$ 1.239.117.647,19 no ano 2000 saltou para R$ 1.797.848.405,13 em 2012, tendo alcançado o pico de R$ 2.036.014.994,72 no ano de 2009, apenas na esfera federal.[38] A arrecadação da Rede Globo de Televisão em relação às verbas recebidas pelo executivo federal saltou de R$ 370.429.555,35 no ano 2000 para R$ 495.270.915,28 em 2012, passando pelo pico de R$ 563.164.795,19 em 2009.[39], enquanto o Poder Judiciário não possui sequer rubrica para publicidade.

Sobre o autor
André Araújo Molina

Doutorando em Filosofia do Direito (PUC-SP), Mestre em Direito do Trabalho (PUC-SP), Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual Civil (UCB-RJ), Bacharel em Direito (UFMT), Professor da Escola Superior da Magistratura Trabalhista de Mato Grosso e Juiz do Trabalho Titular na 23ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOLINA, André Araújo. A democracia brasileira enquanto estado de exceção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3641, 20 jun. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24758. Acesso em: 24 abr. 2024.

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