3. ANÁLISE DA DEFINIÇÃO CORRENTE.
Diante da legislação, jurisprudência e doutrina colhidas, chegamos à seguinte definição preliminar: Grupo Econômico é o conjunto de empresas que, ligadas por vínculo de coordenação ou subordinação, atuam em sincronia com o intuito de lograr maior eficiência em sua atividade. Vejamos, parte por parte, em raciocínio analítico para depurarmos o conceito, estabelecendo definição com pretensão científica.
“CONJUNTO DE EMPRESAS”.
Conjunto, em noção originada em matemática, refere-se a uma reunião de elementos que tem a propriedade de ser considerada como um só. É uma classe capaz de abraçar diversos elementos que, devido a algum critério estabelecido, passam a ser representados por aquele conjunto. O tradicional exemplo é o Conjunto dos números Naturais.
Como no presente caso, estamos diante de duas ou mais empresas reunidos em torno de um vínculo, seja de subordinação ou de coordenação, o signo “conjunto” bem representa o objeto que estamos tratando.
O mesmo não acontece, entretanto, com o vocábulo “empresa”, que demanda certa reflexão.
Até pouco tempo atrás, os conceitos do Direito Comercial tinham difícil delimitação que despendiam dos pressupostos teóricos adotados por aquele que se propunha a estudá-los. Neste cenário de conceitos imprecisos, especificamente em 1942, o professor italiano Alberto Asquini elaborou a afamada Teoria Poliédrica da Empresa que defendia que a empresa poderia ser conceituada dependendo do ângulo sob o qual o jurista a apreciava.
Com base nesta premissa de perspectivas, quatro foram os perfis da empresa apresentados pelo Jurista Italiano: o subjetivo, como sujeito de direito, o objetivo, como um conjunto de bens, o funcional, como atividade econômica, e o corporativo, como um organismo hierarquizado. Este último aspecto é comumente ligado aos traços fascistas instituídos nas leis italianas daquela época que, insistentemente, remetiam a regulação de diversos assuntos às corporações, tal aspecto não encontra espaço, ao menos significativo, no direito brasileiro.
A constatação do Professor Italiano demonstra, como se não tivesse outro objetivo, o problema da vaguidade que aflige ao signo “Empresa” no cenário doutrinário, legislativo e jurisprudencial pátrio. Sem embargos, a análise da legislação comercial traz consigo conclusões que eliminam o problema, afinal, com a entrada em vigor do Código Civil (lei 10.406 de 2002) houve uma revolução no direito comercial pátrio, pois, além de promover a unificação do direito privado (ao menos em sua principal lei), também delimitou o conceito de empresa a um só dos aspectos apontados pelo jurista italiano.
Isso porque, no Brasil, a empresa não mais poderá ser considerada como um conjunto de bens, afinal, o artigo 1.142 foi preciso ao definir o aspecto objetivo da empresa como “estabelecimento”:
Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária.
Tampouco a palavra empresa poderá ser empregada o sujeito de direito (aspecto subjetivo), pois, o artigo 966 atribui nome específico para tal, a saber: “empresário” ou a “sociedade empresária” se assim preferir o empresário com a constituição de uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI ou, se for o caso de existir mais de um sócio, com as sociedades empresárias já tradicionais, sendo a mais afamada, a Sociedade por Cotas de Participação de Responsabilidade Limitada.
Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Desta forma, o único aspecto restante aceitável dentro do que estabelece o direito pátrio é o aspecto funcional da empresa, ou seja, no Brasil, tem-se por empresa, nos termos decorrentes do próprio art. 966 do Código Civil, “a atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”, sendo o empresário aquele que a exerce.
A Professora Maria Rita Ferragut, que travou raciocínio semelhante, salienta que não é o fato de registrar-se como empresária, nos termos do artigo 967 do Código Civil, que a caracteriza como tal, sendo necessário o exercício da atividade empresarial para tanto.[20]
Assim, tratando-se a empresa como atividade econômica organizada, ela será exercida por uma pessoa ou conjunto de pessoas ao qual a lei atribui responsabilidades pelas obrigações decorrentes da sua própria atividade ou, como preferiu denominar Tarsis Nametala Sarlo Jorge, como “vértice captador da responsabilidade”[21]. Tais entidades, formadas pelos empresários, recebem o nommen juris de “sociedades empresariais” e, por lei, têm a capacidade que lhes permite ser sujeito de direitos e obrigação de “personalidade jurídica”.
Ao considerar a empresa como “atividade economicamente organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviço” tal palavra se mostra inadequada ao conceito de Grupo Econômico, uma vez que, claramente, o que se busca salientar é a perspectiva subjetiva da empresa. Assim, ante a existência de vocábulo delimitado para tal aspecto, parece ser necessário a substituição do termo “conjunto de empresas” para conjunto de empresários ou sociedades empresárias.
“LIGADAS POR VÍNCULO DE COORDENAÇÃO OU SUBORDINAÇÃO”.
Ante as diversas espécies Sociedades Empresárias e Empresários, é possível ao observador agrupá-las de diversas formas, por exemplo, o conjunto daquelas caracterizadas pela limitação da responsabilidade dos sócios ou aquelas com feição pessoal, etc. No presente caso, a ligação que buscamos entre as empresas para colocá-las dentro do mesmo Grupo Econômico é exatamente a existência de vínculos entre elas que impliquem na subordinação de uma às outras ou na coordenação.
Desta feita, em uma primeira análise, estaria correto o critério de classificação exposto, entretanto, conforme visto no tratamento legislativo, em especial o previsto no Código de Defesa do Consumidor, a vinculação por coordenação e por subordinação tem efeitos práticos bem diferentes no que tange às delimitações de responsabilidade e, como a questão que se busca aqui é delimitar os grupos de empresários ou sociedades empresárias onde há efetivo controle e direção unitários para fins de responsabilização, faz-se mister uma delimitação.
Em verdade, independente de qual a relação travada entre as sociedades empresárias (coordenação ou subordinação), a questão que se põe em relevo é a unicidade de controle e direção do Grupo, não a forma como ele se dá, ou seja, buscamos na verdade relações de domínio político que, quando existir, ficará caracterizado como Grupo Econômico.
Diante do dito, melhor define a questão identificarmos esse critério, assim postulando: Grupo Econômico é o conjunto de empresários ou de sociedades empresárias que, sob controle unificado, atuam em sincronia para lograr maior eficiência em suas atividades.
Ademais, ante a necessidade de identificar a espécie de vínculo que enlaça as empresas do Grupo Econômico sobre o qual refira-se, a melhor saída a inclusão de palavra específica, delimitando a classe em Grupo Econômico por Coordenação, Grupo Econômico por Subordinação, etc.
“ATUAM EM SINCRONIA PARA LOGRAR MAIOR EFICIÊNCIA EM SUAS ATIVIDADES”.
Neste ponto, não há qualquer crítica cabível, afinal, não vislumbramos às sociedades empresariais outro objetivo se não o lucro, que somente será logrado com o máximo de eficiência nas atividades da sociedade. O vocábulo sincronia cumpre o papel de identificar a necessidade de certa relação entre a atuação das empresas, sob pena de confundir-se Grupo Econômico com a mera existência de duas empresas que tenham um mesmo administrador, o que não pode ser o caso, conforme deixa clara a definição.
DEFINIÇÃO PROPOSTA.
Desta forma, define-se Grupo Econômico como o conjunto de sociedades empresariais ou empresários que, sob controle político de um indivíduo ou grupo, atuem em sincronia para lograr maior eficiência em suas atividades.
CONCLUSÃO
· O conceito de Grupo Econômico carece de definição delimitada dentro do cenário doutrinário brasileiro, sofrendo com o problema da vaguidade, sendo esta entendida como espécie de instabilidade encontrada entre o signo e o objeto que busca representar, gerando insegurança na aplicação do vernáculo.
· A remédio para a vaguidade é a definição científica do termo, assim, como a Ciência do Direito é o estudo das normas (direito positivo) e é no direito positivo que estarão as linhas definidoras do objeto que se busca descrever, chegou-se em análise da lei, doutrina e jurisprudência ao seguinte conceito preliminar: Grupo Econômico um conjunto de empresas que, ligadas por vínculo de coordenação ou subordinação, atuam em sincronia com o intuito de lograr maior eficiência em sua atividade.
· Iniciada a análise crítico da citada definição, identificou-se também o vício da vaguidade no vocábulo empresa que, após estudo específico, foi alterado para sociedades empresárias e empresários, uma vez que este foram os vernáculos utilizados pelo legislador para identificar o aspecto subjetivo da empresa, aqui considerada como realidade multifacetada.
· As relações de subordinação e coordenação utilizadas pela Legislação Civil e Comercial para classificar os Grupos Econômicos foram consideradas inúteis para tanto, pois, por tratar-se de um trabalho visando traçar os limites da responsabilidade de cada sociedade membro do Grupo Econômico, o foco passa a ser o local de onde partem as decisões políticas que afetam ao Grupo. Ademais, eventual necessidade de classificar o grupo em coordenados ou subordinados recomenda o acréscimo de novo vernáculo delimitador, sendo, assim, espécie do gênero.
· Desta feita, construiu-se o conceito de que Grupo Econômico é “o conjunto de sociedades empresariais ou empresários que, sob controle político de um indivíduo ou grupo, atuem em sincronia para lograr maior eficiência em suas atividades.”
Bibliografia
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Notas
[1] KOURY, S. E. C., A desconsideração da personalidade jurídica (Disregard Doctrine) e os grupos de empresa. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 62.
[2] Cf. id. ibid., p. 139.
[3] CARVALHO, A. T., Curso de Teoria Geral do Direito. 2ª ed. São Paulo: Ed. Noeses, 2010. p. 49-50.
[4] BARROS CARVALHO, P. Curso de Direito Tributário. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 6.
[5] CARVALHO, A. T., Curso de Teoria Geral do Direito. 2ª ed. São Paulo: Ed. Noeses, 2010. p. 38.
[6] CARVALHO, A. T., Curso de Teoria Geral do Direito. 2ª ed. São Paulo: Ed. Noeses, 2010. p. 38.
[7] BARROS CARVALHO, P. Curso de Direito Tributário. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 11.
[8] CARVALHO, A. T., Curso de Teoria Geral do Direito. 2ª ed. São Paulo: Ed. Noeses, 2010. p. 68.
[9] JORGE, T. N. S. Manual das Sociedades Limitadas: uma abordagem interdisciplinar. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 22.
[10] ARAÚJO NETO, N. B. de. Os grupos econômicos: aspectos fáticos e legais do moderno fenômeno empresarial. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2795, 25 fev. 2011 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/18571>. Acesso em: 24 jun. 2012.
[11] PRADO, V. M. Grupo Societário: Análise do Modelo da Lei 6.404/1976. Revista DireitoGV, São Paulo, v. 1, n. 2, p. 005-028, jun–dez, 2005.
[12] PRADO, V. M., TRONCOSO, M. C. Grupos de Empresa na Jurisprudência do STJ. Revista Brasileira de Direito Bancário e Mercado de Capitais. São Paulo, n. 40, p. 97-120, abr.–jun., 2008.
[13] MUTCHNIK, S. Caracterização dos Grupos Econômicos de Fato e a Responsabilidade de seus Componentes em relação ao Estado Credor Social. São Paulo, 2009. p. 17.
[14] Op. Cit. p. 17.
[15] WALD, A. Algumas considerações sobre as sociedades coligadas e os grupos de sociedade na nova Lei de Sociedades Anônimas. Revista Forense, Rio de Janeiro, 258: 83-94, abr.-jun. 1977, p. 89.
[16] KOURY, S. E. C., A desconsideração da personalidade jurídica (Disregard Doctrine) e os grupos de empresa. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 62.
[17] Op. Cit. p. 159.
[18] MUTCHNIK, S. Caracterização dos Grupos Econômicos de Fato e a Responsabilidade de seus Componentes em relação ao Estado Credor Social. São Paulo, 2009. p. 14.
[19] ARAÚJO NETO, N. B. de. Os grupos econômicos: aspectos fáticos e legais do moderno fenômeno empresarial. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2795, 25 fev. 2011 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/18571>. Acesso em: 24 jun. 2012.
[20] FERRAGUT, M. R. Responsabilidade Tributária e o Código Civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Ed. Noeses, 2009. p. 3.
[21] JORGE, T. N. S. Manual das Sociedades Limitadas: uma abordagem interdisciplinar. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 19