A Biotecnologia a partir de uma Perspectiva Ambiental: O Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado e o Desenvolvimento Tecnológico como Flâmulas Orientadoras da Contemporaneidade

Exibindo página 2 de 4
16/02/2014 às 19:04
Leia nesta página:

3 O Princípio do Desenvolvimento Sustentável como Flâmula Norteadora do Direito Ambiental

Inicialmente, quadra salientar que o corolário do desenvolvimento sustentável se apresenta como um dos robustos arrimos da tábua principiológica ostentada pela ramificação ambiental do Direito. Trata-se, com efeito, de preceito que busca dialogar e harmonizar vertentes distintas, cada qual dotada de complexidade, quais sejam: o crescimento econômico, a preservação ambiental e a equidade social. Nesta esteira de exposição, “importa frisar que o desenvolvimento somente pode ser considerado sustentável quando as três vertentes acima relacionadas sejam efetivamente respeitadas de forma simultânea”[17], como bem afiança Romeu Thomé. Quadra pontuar que o ideário de desenvolvimento socioeconômico em consonância com a preservação ambiental tem seu sedimento na Conferência Mundial de Meio Ambiente[18], realizada, em 1972, em Estocolmo, que se apresenta como verdadeiro marco histórico da discussão dos problemas ambientais.

É verificável, ainda, que o corolário em tela encontra respaldo na redação do artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988[19], notadamente quando dicciona que é imposição ao Poder Público e de toda a coletividade defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. “Constata-se que os recursos ambientais não são inesgotáveis, tornando-se inadmissível que as atividades econômicas desenvolvam-se alheias a esse fato”[20]. Desta feita, é observável que o núcleo sensível do corolário do desenvolvimento sustentável está alicerçado na coexistência harmônica entre economia e meio ambiente, sendo permitido o desenvolvimento, contudo, de maneira planejada e sustentável, a fim de evitar que os recursos existentes não se esgotem ou mesmo se tornem inócuos. Insta anotar, inclusive, que tais ponderações encontram identificação nos princípios segundo, quarto e quinto da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, consoante se extrai:

Princípio 2: Os recursos naturais da terra incluídos o ar, a água, a terra, a flora e a fauna e especialmente amostras representativas dos ecossistemas naturais devem ser preservados em benefício das gerações presentes e futuras, mediante uma cuidadosa planificação ou ordenamento.

Princípio 4: O homem tem a responsabilidade especial de preservar e administrar judiciosamente o patrimônio da flora e da fauna silvestres e seu habitat, que se encontram atualmente, em grave perigo, devido a uma combinação de fatores adversos. Consequentemente, ao planificar o desenvolvimento econômico deve-se atribuir importância à conservação da natureza, incluídas a flora e a fauna silvestres.

Princípio 5: Os recursos não renováveis da terra devem empregar-se de forma que se evite o perigo de seu futuro esgotamento e se assegure que toda a humanidade compartilhe dos benefícios de sua utilização[21].

Sobreleva frisar, deste modo, que o princípio do desenvolvimento sustentável agasalha a manutenção das bases vitais da produção e produção do homem e de suas atividades, assegurando, de igual forma, uma relação satisfatória entre os homens e destes com o seu meio ambiente, com o escopo de que as futuras gerações também tenham a oportunidade de utilizar os mesmos recursos existentes. Romeu Thomé pontua, em seu magistério, que “as gerações presentes devem buscar o seu bem-estar através do crescimento econômico e social, mas sem comprometer os recursos naturais fundamentais para a qualidade de vida das gerações subsequentes”[22]. Ora, o desenvolvimento sustentável resta consubstanciado quando faz face às necessidades das gerações sem que haja comprometimento da capacidade das gerações futuras na satisfação de suas próprias carências. A Ministra Carmem Lúcia, ao relatoriar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº 101/DF, no tocante ao dogma em apreço, manifestou que desenvolvimento sustentável é “crescimento econômico com garantia paralela e superiormente respeitada da saúde da população, cujos direitos devem ser observados em face das necessidades atuais e daquelas previsíveis e a serem prevenidas para garantia e respeito às gerações futuras”[23].

A Constituição Federal adotou o princípio do desenvolvimento sustentável, segundo o qual a preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado é necessária à manutenção da capacidade produtiva e à própria sobrevivência do ser humano, implicando no estabelecimento de limites ao exercício das atividades econômicas que geram transformação ou degradação dos recursos naturais. Impende destacar, ainda, com grossos traços e cores quentes, que a atividade econômica não pode ser exercida em desacordo com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção do meio ambiente. A incolumidade do meio ambiente, com realce, não pode ser embaraçada por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de âmago essencialmente econômico, ainda mais quando a atividade econômica, em razão da disciplina constitucional, estiver subordinada a um sucedâneo de corolários, notadamente àquele que privilegia a defesa do meio ambiente, o qual abarca o conceito amplo e abrangente de noções atreladas ao meio ambiente em suas múltiplas manifestações, quais sejam: o meio ambiente natural, meio ambiente cultural, meio ambiente artificial e meio ambiente do trabalho (ou laboral).

Verifica-se, assim, que os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental, considerado este em seu aspecto físico ou natural. Com perfeita consonância com as ponderações aventadas, até o momento, cuida transcrever o robusto escólio apresentado pelo Ministro Celso de Mello, ao relatoriar a Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº. 3.540/DF, em especial quando destaca que:

Concluo o meu voto: atento à circunstância de que existe um permanente estado de tensão entre o imperativo de desenvolvimento nacional (CF, art. 3º, II), de um lado, e a necessidade de preservação da integridade do meio ambiente (CF, art. 225), de outro, torna-se essencial reconhecer que a superação desse antagonismo, que opõe valores constitucionais relevantes, dependerá da ponderação concreta, em cada caso ocorrente, dos interesses e direitos postos em situação de conflito, em ordem a harmonizá-los e a impedir que se aniquilem reciprocamente, tendo-se como vetor interpretativo, para efeito da obtenção de um mais justo e perfeito equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, o princípio do desenvolvimento sustentável, tal como formulado nas conferência internacionais […] e reconhecido em valiosos estudos doutrinários que lhe destacam o caráter eminentemente constitucional […][24].

Prima, ainda, sublinhar que a compreensão do baldrame do desenvolvimento sustentável reclama a sua contextualização histórica, a fim de realçar a incidência de seus feixes principiológicos, porquanto, como é cediço, o liberalismo tornou-se um sistema inoperante diante do fenômeno da revolução das massas. “Em face da transformação sociopolítica-econômica-tecnológica, percebeu-se a necessidade de um modelo estatal intervencionista com a finalidade de reequilibrar o mercado econômico”[25]. Infere-se, desta sorte, a acepção conceitual do desenvolvimento, estruturados em um Estado de concepção liberal, modificaram-se, porquanto não mais encontravam arrimo na sociedade moderna. Ora, salta aos olhos que se passou a vindicar um papel ativo do Ente Estatal, precipuamente no que se refere ais valores ambientais, concedendo outra noção de conceito de desenvolvimento. Conferindo o realce que o preceito em testilha reclama, o Ministro Ari Pargendler, ao relatoriar o Agravo Regimental na Suspensão de Liminar e de Sentença Nº. 1.448/MA, manifestou-se no sentido que:

[…] Não é cabível a suspensão de decisão judicial que determinou a suspensão de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público a empresa privada que descumpriu continuamente normas ambientais na hipótese em que tal pedido é feito pelo Estado, sob a alegação de que tal decisão acarreta lesão à ordem administrativa e econômica estadual, consubstanciada na perda de empregos diretos e de arrecadação tributária propiciados pela empresa, pois a suspensão dos incentivos fiscais pode repercutir na economia estadual apenas de modo indireto, não podendo o Estado defender interesse econômico de empresa privada, sendo que o interesse público primário a ser protegido é justamente o tutelado pela decisão judicial impugnada que é a proteção ao meio ambiente e a promoção do desenvolvimento econômico sustentável[26].

A proteção do meio ambiente e o fenômeno desenvolvimentista, sendo arrimado na livra iniciativa, passaram a constituir um objetivo comum, pressupondo a confluência dos escopos das políticas de desenvolvimento econômico, social, cultural e de proteção ambiental. Trata-se, com efeito, da concatenação de elementos que enfatizam “a necessidade de mais crescimento econômico, mas com formas, conteúdos e usos sociais completamente modificados, com uma orientação no sentido das necessidades das pessoas”[27], materializada por meio da distribuição equitativa de renda e de técnicas de produção adequadas à preservação dos recursos. Ademais, não se pode olvidar que a conquista de um ponto de equilíbrio entre o desenvolvimento social, o crescimento econômico e a utilização dos recursos naturais carecem de um adequado planejamento territorial que considere os limites estabelecidos pela sustentabilidade. Como bem alardeia o articulista Vianna, “o princípio do desenvolvimento sustentável colima compatibilizar a atuação da economia com a preservação do equilíbrio ecológico”[28].

É perceptível, desta maneira, que o corolário em comento passou a gozar de robusta importância, eis que numa sociedade desregrada, despida de parâmetros de livre concorrência e iniciativa, o caminho inexorável para uma situação ambiental caótica se revela como uma certeza. “Não há dúvida de que o desenvolvimento econômico também é um valor precioso da sociedade. Todavia, a preservação ambiental e o desenvolvimento econômico devem coexistir, de modo que aquela não acarrete  a anulação deste”[29], como bem explicita Fiorillo. Sensível ao cenário fático contemporâneo, aprouve ao Constituinte de 1988 afixar que as atividades econômicas mereciam um tratamento novo, em consonância com os anseios e modificações apresentados. Nesta toada, a preservação ambiental passou a figurar como a flâmula norteadora, eis que a contínua degradação acarretaria a diminuição da capacidade econômica do País.

Desta feita, a livre iniciativa, que norteia as atividades econômicas, passou a assumir outra significação, sendo que a liberdade de agir, compreendida no Texto Constitucional, passou a ser compreendida de forma mais restrita. Objetiva-se, com efeito, a coexistência de ambos sem que a ordem econômica obste o meio ambiente ecologicamente equilibrado e sem que este embarace o desenvolvimento econômico. Tal argumento encontra guarida na premissa que a ordem econômica, alicerçada na livre iniciativa e na valorização do trabalho humano, imperiosamente será regida pelos ditames contidos na justiça social, atento ao corolário da defesa do meio ambiente. “É certo afirmar que a Constituição reconheceu como legítimo o desenvolvimento sustentável, sendo imprescindível para sua implementação o equilíbrio entre desenvolvimento econômico, meio ambiente e o social”[30]. O fortalecimento do corolário em comento passou a gozar de proeminência no cenário pátrio, notadamente quando se colhem entendimentos jurisprudenciais que afixam:

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Ementa: Processual Civil. Ação Civil Pública. Reparação de danos ao meio ambiente. Desmatamento ilegal na floresta amazônica. Área de propriedade particular. Legitimidade ativa do IBAMA. [...] 2. A preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, é uma exigência imposta ao Poder Público e à coletividade, os quais têm o dever de defendê-lo. Assim é que, embora seja imprescindível conferir efetividade ao desenvolvimento econômico do País, este, contudo, deve ocorrer de maneira sustentável e, por isso mesmo, sem agressão antijurídica ao meio ambiente. Ressalte-se que tal política pública constitui a positivação legislativa da máxima constitucional que prevê a necessidade da preservação ambiental para as presentes e futuras gerações (CF, art. 225, caput). […] (Tribunal Regional Federal da Primeira Região – Quinta Turma/ AC 0000774-52.2007.4.01.3902/PA/ Relator: Desembargador Federal Fagundes de Deus. Publicado no e-DJF1 em  26/08/2011, p. 159).

Ementa: Mandado de Segurança – Meio Ambiente - Art. 225 da Constituição da República - Decreto Estadual Nº 43.713, de 14 de Janeiro de 2004, art. 14, inciso II, alínea ""a"", regulamentador da Lei Estadual Nº 14.181, de 17 de Janeiro de 2002 - Pesca - Proibições – Direito ao lazer – Ausência de direito líquido e certo – Denegação da segurança. [...] A Constituição restringe a atuação do homem, dando parâmetros para seu desenvolvimento quando fala que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observado o princípio da defesa do meio ambiente (art.170 da CF/88). Portanto a defesa do meio ambiente, intrínseco interesse público, é ao mesmo tempo direito e obrigação da coletividade, sendo que o Estado não poderá se omitir de tal obrigação, caracterizando assim sua indisponibilidade. A questão ambiental requer comportamentos unilaterais e multilaterais, até mesmo independentes, mas sempre harmônicos entre si, que propiciem à atual e, sobretudo, às futuras gerações a oportunidade de viver num ambiente economicamente viável e ecologicamente sustentável. (Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – Corte Superior/ Mandado de Segurança Nº. 1.0000.04.406869-0/000/ Relator: Desembargador Carreira Machado/ Julgado em 27.10.2004/ Publicado no DJe em 24.11.2004).

Ementa: Ação Civil Pública – Pico do Ibituruna – Dano ao Meio Ambiente – Risco de incêndio e poluição visual – Princípio da precaução. [...] O princípio da prevenção está associado, constitucionalmente, aos conceitos fundamentais de equilíbrio ecológico e desenvolvimento sustentável; o primeiro significa a interação do homem com a natureza, sem danificar-lhe os elementos essenciais. O segundo prende-se à preservação dos recursos naturais para as gerações futuras. A ""Declaração do Rio de Janeiro"", votada, à unanimidade, pela Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (1992), recomendou a sua observância no seu Princípio 15. (Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – Sétima Câmara Cível/ Apelação Cível Nº 1.0000.00.295312-3/000/ Relator: Desembargador Wander Marotta/ Julgado em 10.02.2003/ Publicado no DJe em 27.03.2003).

Deste modo, objetivando satisfazer as necessidades da coletividade, o Direito Ambiental normas pautada na razoabilidade da utilização dos recursos naturais, visto que a preocupação com o meio-ambiente deve ser uma das molas propulsoras para o desenvolvimento sustentável, salvaguardando uma relação harmônica entre necessidade de preservar e o crescimento econômico por parte da sociedade. Ademais, fato é que o desenvolvimento é imprescindível, todavia deve ocorrer em observância e atinência com as limitações ecológica do planeta, evitando, por conseguinte, a destruição dos ecossistemas. Consoante exalta Facin, “há que se ter em mente que a proteção ambiental é parte integrante do processo de desenvolvimento, não podendo ser considerada isoladamente”[31]. Agindo em consonância com tais ideários, as presentes gerações permitem que aqueles que estão por vir possam utilizar do meio-ambiente como vetor de promoção da dignidade da pessoa humana, aliando satisfação de suas necessidades e conservação.

Sobre o autor
Tauã Lima Verdan Rangel

Mestre (2013-2015) e Doutor (2015-2018) em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especialista Lato Sensu em Gestão Educacional e Práticas Pedagógicas pela Faculdade Metropolitana São Carlos (FAMESC) (2017-2018). Especialista Lato Sensu em Direito Administrativo pela Faculdade de Venda Nova do Imigrante (FAVENI)/Instituto Alfa (2016-2018). Especialista Lato Sensu em Direito Ambiental pela Faculdade de Venda Nova do Imigrante (FAVENI)/Instituto Alfa (2016-2018). Especialista Lato Sensu em Direito de Família pela Faculdade de Venda Nova do Imigrante (FAVENI)/Instituto Alfa (2016-2018). Especialista Lato Sensu em Práticas Processuais Civil, Penal e Trabalhista pelo Centro Universitário São Camilo-ES (2014-2015).. Produziu diversos artigos, voltados principalmente para o Direito Penal, Direito Constitucional, Direito Civil e Direito Ambiental.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos