Possibilidade de citação por hora certa no rito previsto na lei dos juizados especiais cíveis e criminais

24/04/2014 às 10:14
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Muito se tem discutido acerca da possibilidade se aplicar a modalidade de citação por hora certa nos feitos que tramitam perante os juizados especiais. No presente texto procuramos esclarecer o ponto de divergência, bem como justificar a tese exposta.

O inciso I, do artigo 98, da Constituição Federal de 1988 trouxe a previsibilidade de os Entes Federativos estabelecerem, com a edição de Lei Federal, os juizados especiais, com vistas à apreciação e julgamento de causas cíveis entendidas como de menor complexidade e as infrações penais de menor potencial ofensivo.

O próprio texto constitucional deixou explícito que os Juizados Especiais deveriam seguir procedimentos que os tornassem mais rápidos que o procedimento Sumário, denominando-os como Sumaríssimos. E, ainda, se desenvolveriam de forma oral, com facilitação à transação e com julgamentos de eventuais recursos por Turmas formadas pelos próprios juízes de primeiro grau.

A Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, seguindo o comando constitucional, trouxe as disposições acerca dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais.

O legislador, não destoando do que já previsto pela Constituição Federal, elencou os princípios norteadores dos Juizados Especais, quais sejam: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, bem como a busca pela conciliação e transação.

De acordo com o artigo 2º da Lei nº 9.099/1995, dentre os princípios norteadores dos procedimentos sumaríssimos, como citado acima, estão os da economia e celeridade processuais, bem como o princípio da conciliação e transação.

Sabemos que a Lei do Juizado Especial Estadual é norma especial, cuja disposição acerca de seu procedimento abrange quase toda a parte procedimental das causas de sua competência. No entanto, são perfeitamente aplicáveis aos procedimentos do Juizado as normas gerais dispostas no Código de Processo Civil, desde que com ela não haja conflito.

Com efeito, não havendo incompatibilidade expressa ou lógica (implícita), o Código de Processo Civil é perfeitamente aplicado subsidiariamente aos processos que tramitam perante ritos previstos por legislações especiais, assim como o rito da Lei nº 9.099/1995.

O Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942, intitulado Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, traz regras e princípios básicos acerca da aplicação e interpretação das normas nacionais, em sentido amplo e geral.

E, nessa esteira, o artigo 4º do Decreto-Lei acima citado, prevê a possibilidade de aplicação de dispositivos de normas diversas para suprir lacunas de determinada lei, aplicando-se o instituto da Analogia. Vejamos:

Art. 4º. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. (destacamos)

No que diz respeito à Citação do demandado, o Código de Processo Civil estabelece que nos casos em que o réu não for encontrado em seu domicílio e houver suspeita de que o mesmo está se ocultando, proceder-se-á a citação por hora certa (artigos 227 a 229). Vejamos:

Art. 227. Quando, por três vezes, o oficial de justiça houver procurado o réu em seu domicílio ou residência, sem o encontrar, deverá, havendo suspeita de ocultação, intimar a qualquer pessoa da família, ou em sua falta a qualquer vizinho, que, no dia imediato, voltará, a fim de efetuar a citação, na hora que designar.

Art. 228. No dia e hora designados, o oficial de justiça, independentemente de novo despacho, comparecerá ao domicílio ou residência do citando, a fim de realizar a diligência.

§ 1o Se o citando não estiver presente, o oficial de justiça procurará informar-se das razões da ausência, dando por feita a citação, ainda que o citando se tenha ocultado em outra comarca.

§ 2o Da certidão da ocorrência, o oficial de justiça deixará contrafé com pessoa da família ou com qualquer vizinho, conforme o caso, declarando-lhe o nome.

Art. 229. Feita a citação com hora certa, o escrivão enviará ao réu carta, telegrama ou radiograma, dando-lhe de tudo ciência.

O artigo 18 da Lei nº 9.099/1995 dispõe os meios pelo qual serão feitas as Citações. Trata-se de rol não exaustivo, pois pode ser estendido pelos demais meios e hipóteses legais que não conflitem com seus interesses. Vejamos:

Art. 18. A citação far-se-á:

I - por correspondência, com aviso de recebimento em mão própria;

II - tratando-se de pessoa jurídica ou firma individual, mediante entrega ao encarregado da recepção, que será obrigatoriamente identificado;

III - sendo necessário, por oficial de justiça, independentemente de mandado ou carta precatória.

§ 1º A citação conterá cópia do pedido inicial, dia e hora para comparecimento do citando e advertência de que, não comparecendo este, considerar-se-ão verdadeiras as alegações iniciais, e será proferido julgamento, de plano.

§ 2º Não se fará citação por edital. (destacamos)

§ 3º O comparecimento espontâneo suprirá a falta ou nulidade da citação.

Conforme se bem pode observar do dispositivo legal, a Lei dos Juizados Especiais previu alguns meios pelos quais se farão a citação, dispondo, da mesma forma, dos meios pelos quais não se realizarão a citação.

O parágrafo 2º do citado artigo estabelece claramente que nos procedimentos que tramitarem perante o Juizado Especial Estadual não se fará citação por Edital. Ou seja, quando se quis excluir determinada hipótese a própria lei o fez.

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No que diz respeito à Citação por Hora Certa, não há qualquer proibição pela Lei nº 9.099/1995. Houve somente a vedação pela citação por Edital (Art. 18, § 2º).

Ademais, se sabe que a Citação chamada de Por Hora Certa, também é um meio de citação que, embora definida como ficta, é procedido por Oficial de Justiça, semelhante ao estabelecido no inciso III do artigo 18 da Lei.

Desse modo, é perfeitamente possível a Citação por Hora Certa nas causas que tramitam perante os Juizados Especiais Estaduais. Nesse sentido, pedimos vênia para citar o ensinamento do Ilustre Dr. Ricardo Cunha Chimenti:

Em havendo suspeita de ocultação, o oficial de justiça deverá formalizar a citação por hora certa (arts. 227 e 228 do CPC), que nada tem de incompatível com o rito da Lei n. 9.099/95 e que pode ser efetivada no endereço residencial ou comercial do requerido. [1]

Com efeito, não é de hoje o debate acerca da possibilidade de citação por hora certa nos processos que tramitam pelo rito da Lei nº 9.099/1995, sendo que no Encontro Nacional de Coordenadores de Juizados Especiais, restou consignado o seguinte:

É cabível a citação por hora certa em sede de Juizados Especiais Cíveis. [2] (destacamos)

Mister mencionar o entendimento contrário à tese aqui exposta. De mesma sorte que diversos magistrados aplicam referida modalidade de citação, outra grande gama de juízes entendem incompatível com o rito do Juizado Especial Cíveis e Criminais a citação por hora certa.

O Enunciado nº 13 do Comunicado nº 116/2010 do Conselho Supervisor do Sistema de Juizados Especiais, publicado em 07/12/2010, dispõe o seguinte: “Não é cabível a citação com hora certa nos Juizados Especiais Cíveis”.

Não obstante, importante mencionarmos, também, a recente decisão do Excelentíssimo Desembargador do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, Doutor Reis Kuntz, que decidiu ser aplicável ao juizado especial estadual a modalidade de citação por hora certa, vejamos:

Ocorre que, na espécie, havendo suspeita de ocultação, é praticável a citação do acusado por hora certa (artigos 362 do CPP e 227 a 229 do CPC), que nada tem de incompatível com o rito da Lei nº 9.099/95 [3]

Ante o Exposto, concluímos ser perfeitamente possível a aplicação do Art. 227 do Código de Processo Civil nos feitos que tramitam perante o rito processual do Juizado Especial Cíveis e Criminais, tendo em vista não haver proibição legal, assim como por existir exclusão taxativa somente em relação à citação por Edital e ser aplicável o instituto da analogia (Art. 4º do Decreto-Lei nº 4.657/1942).

[1] Teoria e Prática dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais, pag. 140 (destacamos)

[2] II Encontro Nacional de Coordenadores de Juizados Especiais, Cuiabá, dezembro de 1997, Conclusão nº 10.

[3] Conflito de Competência nº 164095-0/0 – Voto nº 17735 – data

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