Direitos humanos: a questão afro-descendente no tratamento da Constituição Federal de 1988

26/04/2014 às 14:21
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O presente estudo tem como objetivo geral discutir a questão afrodescendente no Brasil, tendo como fulcro os Direitos Humanos e a Constituição Federal brasileira de 1988.

Resumo: O presente estudo tem como objetivo geral discutir à questão afrodescendente no Brasil, tendo como fulcro os Direitos Humanos e a Constituição Federal brasileira de 1988. Tem como objetivos específicos: traçar uma distinção entre racismo e discriminação; identificar na Declaração Universal dos Direitos Humanos elementos que ratificam a igualdade entre as raças; e analisar como a Constituição Federal brasileira de 1988 contempla a questão do racismo no Brasil. Este estudo encontra-se ancorado nas concepções teóricas de estudiosos como: Teodoro (2009), Lusci e Araújo (2005), Nascimento (2007), dentre outros. Assim tem em vista responder à seguinte problemática: como a Constituição Federal brasileira de 1988 contempla o racismo no país? Na tentativa de responder a esse questionamento, adotou-se como metodologia pesquisa bibliográfica, descritiva, de natureza qualitativa. Aponta como resultados encontrados que a Constituição Federal brasileira de 1988 contempla o racismo no país, tendo por base os direitos humanos, ostentados na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Isso porque verificou-se que a questão racial tem tratamento na Constituição Federal de 1988, como um fenômeno social de cunho jurídico. Traz como sugestão que os legisladores implementem cada vez mais políticas de ação afirmativa e de caráter reparatório a fim de reverter a produção da desigualdade social, que tanto assola a população afrodescendente em todo o solo nacional. Além disso, que implementem ações concretas que garantam o acesso de pessoas afrodescendentes ao trabalho, à educação, à promoção profissional, em pé de igualdade com as demais pessoas, pondo em prática a orientação dos direito humanos de que todos são iguais.

  Palavras-Chave: Direitos Humanos. Constituição Federal. Afrodescendente.

 

Abstract: This study aims to discuss the general question of African descent in Brazil, with the fulcrum Human Rights and the Federal Constitution of 1988. Its specific objectives are: to draw a distinction between racism and discrimination; identify the Universal Declaration of Human Rights elements that confirm the equality between the races, and analyzes how the Brazilian Federal Constitution of 1988 considers the issue of racism in Brazil. This study is grounded in the theoretical conceptions of scholars such as Theodore (2009), Lusci and Araújo (2005), Birth (2007), among others. Thus aims to answer the following problems: how the Brazilian Federal Constitution of 1988 considers racism in the country? In an attempt to answer this question, it was adopted as a methodology literature, descriptive, qualitative. Points to findings that the Brazilian Federal Constitution of 1988 considers racism in the country, based on human rights, sported the Universal Declaration of Human Rights. That's because it was found that the racial issue is treated in the Constitution of 1988, as a social phenomenon of legal nature. Brings as a suggestion that lawmakers increasingly implement affirmative action policies and reparatory character in order to reverse the production of social inequality that plagues both the population african descent throughout the national soil. Furthermore, to implement concrete actions that ensure access for people african descent work, education, career advancement, on an equal basis with others, putting into practice the guidance of human rights that all are equal.

Key-Words: Human Rights. Federal Constitution. African descent.

 

1 INTRODUÇÃO

O racismo é um fenômeno social que tem acompanhado a humanidade em sua trajetória. Contudo, não se tem notícias de uma raça que mais tenha sido discriminada do que a raça negra. Note-se que a pratica do racismo contra a população negra remonta ao período do Imperialismo europeu, onde países do “Velho mundo”, como a Inglaterra, a França, Portugal, Holanda e Espanha, dentre outros, subjugaram os povos negros do continente africano e o tomaram como escravos. Desde então a história da raça negra é marcada por um racismo que não se justifica seja qual for o argumento que seja erigido em seu favor.

Tenha-se por certo que o Brasil é um dos paises da América do Sul em que durante muito tempo imperou a discriminação e o preconceito racial, segregando a raça negra de seu contexto social, político e histórico. Note-se a título ilustrativo que ainda que os povos indígenas tenham sofrido e sofram discriminação étnica e racial é com os afro-descentes que esse preconceito e discriminação têm perdurado e apresentado maior persistências e tenacidade entre o povo brasileiro. Muito embora se possa dizer hoje, que uma das maiores conquistas até então tenha sido o reconhecimento da cultura negra no país e com ele a admissão de que os negros ajudarão na construção do país, ainda assim o preconceito e a discriminação racial têm afetado essa parte da população brasileira na tentativa de criar motivos geradores que reforcem a divisibilidades na miscigenação racial do país.

Não será demais destacar o entendimento de que o preconceito e discriminação racial praticado por parte da população brasileira contra os afrodescendentes encontram representantes nos vários estratos e instituições sociais. Pode-se dizer presumir que a prática da discriminação racial existe, é velada e cometida de forma sutil e com efeitos nefastos para a população afrodescente brasileira. Contudo deve-se adiantar a percepção de que a Constituição Federal brasileira de 1988, baseando-se na Declaração Universal dos Direitos Humanos, tem coibido e combatido a prática da discriminação racial no país.

Tendo em vista observações como estas, pretende-se nos limites desse artigo científico discutir à questão afrodescendente no Brasil, tendo como fulcro os Direitos Humanos e a Constituição Federal brasileira de 1988. Para tanto, traçou-se uma distinção entre racismo e discriminação, identificou-se na Declaração Universal dos Direitos Humanos elementos que ratificam a igualdade entre as raças, analisando-se como a Constituição Federal brasileira de 1988 contempla a questão do racismo no Brasil. Desse modo, este estudo encontra-se ancorado nas concepções teóricas de estudiosos como: Teodoro (2009), Lusci e Araújo (2005), Nascimento (2007), dentre outros.

Assim, visa responder à seguinte problemática proposta no estudo, ou seja: como a Constituição Federal brasileira de 1988 contempla o racismo no país? Visando responder a esse questionamento, adotou-se como metodologia pesquisa bibliográfica, descritiva, de natureza qualitativa. Nesse contexto, cabe salientar que o presente estudo surgiu de minhas leituras em livros, revistas e artigos pertinentes ao assunto. Assim, compreende-se que a sua relevância reside na tentativa de pôr em evidência que a discriminação racial é um realidade no Brasil, e que os legisladores e doutrinadores vem envidando esforços para que essa prática nefasta seja desarraigada do seio da sociedade brasileira.

 

2 DISTINÇÃO ENTRE RACISMO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL

 Entende-se que para discutir à questão afrodescendente no Brasil, tendo como fulcro os Direitos Humanos e a Constituição Federal brasileira de 1988, torna-se essencial fazer uma distinção entre racismo e preconceito a fim que se entenda com perfeição o objeto do estudo. Nesse passo, principia-se por frisar de acordo como Becaria (2005, p. 1) que o racismo “[…] é a ideologia que postula a existência de hierarquia entre grupos humanos, que no caso em tela pode ser traduzida na pretensão da existência de uma certa hierarquia entre negros e brancos”.

De acordo com a citação supra o racismo é uma ideologia e esta postula a existência de hierarquia entre raças, sendo a raça negra apontada como inferior na pirâmide hierárquica. Em investigação ao léxico vai se encontrar na lição de Ferreira (2009, p. 551) que: “O racismo é a doutrina que sustenta a superioridade de certas raças, podendo representar ainda o preconceito ou discriminação em relação à indivíduos considerados de outras raças”. Mas não é só isso, na brilhante percepção de Silva (2008, p. 155):

O racismo é uma expressão mais ampla que abrange, além do preconceito, hostilidade, discriminação, segregação, e outras ações negativas manifestadas em relação a um grupo racial/étnico. Ele se manifesta basicamente em três níveis: individual, institucional e cultural. Individual, quando um membro de um grupo sente-se superior a outro de grupo diverso. Institucional, quando as instituições como o Estado, as igrejas, empresas, partidos políticos, escolas, limitam o acesso de determinado grupo de pessoas, como os negros. Cultural, quando uma determinada herança cultural é anunciada como sendo superior a outra.

Note-se por oportuno, que a questão racial, de acordo com as definições acima pode ser considerada um desafio ao ideário democrático e um entrave para a consolidação da democracia e do desenvolvimento econômico do país. Bem por isso a importância de se conhecer, também, a definição de preconceito para melhor entendimento do estudo.

Recorrendo-se ao léxico vai se encontrar, como salienta Ferreira (2009, p. 239) que: “Discriminação é a denominação atribuída a uma ação ou omissão violadora do direito das pessoas com base em critérios injustificados e injustos tais como: raça, sexo, idade, crença, opção religiosa, nacionalidade”. Mas não é só isso, deve-se ampliar esse termo esclarecendo que a discriminação é a manifestação do preconceito, sua materialização em atitudes que efetivamente impedem ou limitam o grupo discriminado, prejudicando-o (LUSCI; ARAÚJO, 2005).

Como se vê, a discriminação é geradora da omissão ou da ação violadora dos direitos da pessoa, sem que se justifiquem os critérios apresentados como motivos para tal. Desse modo, infere-se que a manifestação do preconceito racial (discriminação racial) cria a desigualdade racial. Sendo certa a interpretação de que a discriminação é um tratamento preconceituoso, dado a certas categorias sociais e raciais, como a afro-descente. Como não poderia deixar de ser as observações acima, levam à necessidade de se conhecer brevemente a luta dos afro-brasileiros contra o preconceito racial no Brasil.

 3 O RACISMO COMO DESIGUALDADE SOCIAL NO BRASIL

As desigualdades raciais no Brasil e no mundo têm sido um fato verificável a todo instante. No Brasil, esse fenômeno social e político têm se mantido presente em todas as esferas da sociedade, passando pelos gabinetes dos Ministérios e Governos de todos os Estados do país. Como resultante, encontra-se uma dissidência entre as várias etnias existentes na nação, sobressaindo-se aquela que relega a raça negra a uma situação de desigualdade em relação às demais etnias presentes no país. Em face de desigualdades raciais com viés sociopolíticos é que os movimentos sociais, mais nomeadamente os movimentos afro-brasileiros têm se insurgindo.

Sobre a questão do racismo no país, vale dizer que esse fato não surgiu há pouco tempo. A expectativa de arianizar o país vem desde o período Colonial, tornando-se agudo após implantação da República. “A classe dominante posto em dúvida o sucesso de tal arianização recorreu a diferentes processos para eliminar as populações negras e indígenas” (TEODORO, 2009, p. 21).

Muito embora a discriminação racial e o preconceito sejam hoje velados, ainda assim ele persiste e se posta como um ranço no seio social. Tendo em vista essa perspectiva, é que se tem observado que as minorias sociais, de modo específico, a população afro-brasileira, têm procurado intervir de modo satisfatório na dimensão política do país propondo temáticas de igualdade racial, que venham contribuir para a redução e/ou extinção do preconceito racial no Brasil, sobretudo no âmbito social, político e educacional. Diante dessa observação compreende-se necessário a intervenção e resposta satisfatória do Estado, através da implementação de políticas públicas educacionais com vistas a reduzir e mesmo acabar com o preconceito e discriminação social arraigado no tecido cultural do povo brasileiro. Embora se saiba que esse é um tipo de vício cultural predominante, ainda assim torna-se importante o insurgimento contra essa faceta social a fim de que se atenue essa discriminação.

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Isso porque a luta entre etnias é um fato histórico em todo o mundo. No Brasil, entende-se que o Estado não tem feito muito no que diz respeito a iniciativas que reduzam ou extingam o preconceito racial, sobretudo no âmbito social, político e educacional. Vale dizer mesmo, que o anseio que sente a parcela afro-descendente, no tocante a um maior desempenho por parte do Estado com relação ao preconceito racial não tem encontrado ressonância significativa nas atitudes do Estado. O que se tem notado é que, embora essa seja uma luta de maior trânsito no contexto social, tem sido ostentada sua característica política a fim de tornar improfícua sua viabilidade, já que se perde no aparelho burocrático e quer resvalar para o silêncio e invisibilidade. Atento a essa realidade, verifica-se que alguns movimentos sociais afro-brasileiros têm chamado para o debate os diversos segmentos sociais e políticos que se investe contra propostas de políticas públicas que venham a contribuir para a redução da desigualdade e preconceito racial no país. Sobre o assunto, é possível verificar que a história dos movimentos negros no Brasil, tem sido marcada por lutas e debates contemplando o direito de igualdade social e política para seus pares. Como exemplo, pode-se fazer menção ao Movimento Negro[1] que:

[...] no primeiro momento de sua atuação como movimento social, trabalhou – por quase um século – para que o racismo, o preconceito e a discriminação racial fossem reconhecidos pela sociedade e pelo Estado brasileiro como uma questão; e num segundo momento fez com que ganha-se espaço as propostas de políticas públicas de combate ao racismo, à discriminação e à desigualdade racial (NASCIMENTO, 2007, p. 2).

Assim, observa-se que a luta das minorias sociais, ainda que logre algum êxito defronta-se com o aparato do Estado, além de uma ideologia racista recrudescida no seio social. Desse modo, tem se verificado que o caminho o qual os movimentos sociais afro-brasileiros têm percorrido está direcionado para os contextos social, político e educacional do país. Fazendo alusão à luta dos movimentos afro-brasileiros, com relação à implementação das políticas públicas no âmbito da política, economia e educação com vista a reduzir ou dirimir o preconceito racial, deve-se dizer que ela não é estanque e estéril, tampouco possui dimensão egoística, basta ver que abre precedentes para as demais etnias lutarem por seus direitos sociais e políticos, além de confirmar que essa luta possui legitimidade.

A despeito de uma retórica que tente imputar aos movimentos afrodescendentes a responsabilidade dessas conquistas, deve-se colocar que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, como impera o art. 5º da Constituição Federa brasileira (BRASIL, 1988). Dessa forma, conclui-se que a luta pela discriminação e preconceito racial possui verve respaldada pela Constituição da República Federativa do Brasil (1988), mas que, porém, necessita lutar para que esses direitos sejam realizados. Tal realidade subsiste inclusive na forma em que se dará a interpretação da lei implementada. Isso porque, existem diferentes contextos que se interpenetram nos processos de elaboração e construção das políticas e, portanto, das leis. Até porque “Os textos das políticas são resultados de compromissos variados, de relações de força entre diferentes posições, o que os torna por vezes obscuros, omisso, incompletos e sempre abertos à significação” (ALVES, 2007, p. 3).

Nesse caso, cabe dizer que o luta pelo preconceito racial no Brasil é legítimo e requer respostas positivas que fortaleçam o direito de ser livre e com dignidade, um dos princípios constitucionais brasileiros. No entanto, um questionamento surge daí: como a Constituição Federal brasileira de 1988 tem contemplado o racismo no país tendo por base os direitos humanos, contemplados na Declaração Universal dos Direitos Humanos?

4 A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

 A Declaração Universal dos Direitos Humanos pode ser entendida como um avanço na história da humanidade. Nunca se alçou vôo tão altaneiro no tocante aos direitos da pessoa humana quanto nesta declaração, como se lê in verbes no seu preâmbulo:

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do homem comum, Considerando essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo Estado de Direito, para que o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra tirania e a opressão, Considerando essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações, Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla, Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a desenvolver, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos humanos e liberdades fundamentais e a observância desses direitos e liberdades, Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso, Assembléia Geral proclama: A presente Declaração Universal dos Diretos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, 1948, p. 1)

 

Pelo que se pode inferir, esta Declaração coloca em pé de igualdade todos os homens e mulheres, em todos os paises e nações. Consagra por isso, o direito de igualdade entre as etnias e raças, sem sobrelevar qualquer delas em detrimento de outras. É nesses termos que a referida Declaração preconiza em seu artigo I, que: “Todos nascem livres e iguais em direitos e dignidade e que sendo dotados de consciência e razão devem agir de forma fraterna em relação aos outros”. (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, 1948, p. 1) Mas esta Declaração não para por aí, em seu artigo II, declara que:

Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, 1948, p. 1)

Assim, fácil é notar que o texto da Declaração Universal dos Direitos Humanos tem o excelso entendimento de que a diferença de raça etnia, cor, não é motivo para a desigualdade entre os homens, podendo-se interpretar que esta Declaração possui os elementos primordiais que ratificam a igualdade entre as raças, como se observa logo em seus artigos I e II.  Aqui, tem real importância destacar ainda ao art. VII da Declaração em comento, uma vez que ele consagra de uma vez por todos que:

Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, 1948, p. 1)

Com efeito, a Declaração Universal dos Direitos Humanos além de preconizar tratamento igual a todos os seres humanos, sejam eles brancos ou negros, consagra ainda o direito à proteção contra qualquer tipo de discriminação, inserindo-se aí a discriminação racial, caso emblemático que pesa sobre a população afrodescendente no Brasil. Porém, tem se observado que a partir da instituição da Constituição Federal de 1988, verdadeira Carta Constitucional cidadã, este tipo de discriminação não encontra mais lugar comum diante da legislação brasileira.

5 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E A DISCRIMINAÇÃO RACIAL

 A constituição Federal de 1988, também é conhecida como Constituição Cidadã. Note-se que um dos fatores que justificam essa nomenclatura é a posição de destaque que recebe os direitos e garantias fundamentais. Isso porque enquanto outras constituições brasileiras ostentavam preocupação com temas como Estado, organização do poder, a Constituição de 1988 traz como primeiro grande tema a preocupação com a proteção dos direitos fundamentais.

A Constituição Federal de 198821 reservou um tratamento especial à questão do direito à igualdade e à vedação da discriminação. Nenhuma outra Constituição brasileira tratou a questão com tanto afinco e cuidado. Ao analisarmos as nossas Constituições anteriores, a primeira, de 1824, é sem dúvida a mais sui generis (única, especial), pois traz consigo um tratamento ambíguo do negro, como coisa e pessoa ao mesmo tempo. (LUSCI; ARAÚJO, 2005, p. 15)

A partir dessa idéia, sobreleva-se por importante mencionar que a Carta Magna brasileira de 1988, impera em seu art. 5º, que: " Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade […]" (BRASIL, 1988, p. 1). Diante deste artigo fácil é notar que ele traz subjacente o princípio da isonomia consagrado, onde todos são iguais perante a lei, sem distinção de raça, cor ou credo. Perceba-se que a Carta Maior está em sintonia com Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Oportuno registrar neste particular que a Constituição Federal brasileira de 1988, não deixou de estabelecer a proibição da tortura e da humilhação de todo e qualquer indivíduo, independente de sexo, raça, cor, idade, etc., como se deduz de seu art. inciso III, cujo texto dispara que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante (BRASIL, 1988). Em interpretação assente, é possível inferir que a discriminação racial não é aceita em solo nacional, o que torna possível interpretar que cabe ao Estado criar as condições para a dissolução da discriminação racial no país.

O Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Intolerância constata que estudos e pesquisas de diversos órgãos governamentais, dentre os quais os realizados pelo IPEA e o IBGE, apontam para a necessidade de uma guinada política que rompa com a realidade inversa da naturalização da desigualdade social: somente a implementação de políticas de ação afirmativa e de caráter reparatório poderão reverter a produção da desigualdade social. (LUSCI; ARAÚJO, 2005, p. 12)

Assim compreende-se que no tocante aos afrodescendentes, parte da população brasileira que sofre discriminação racial com constância, o princípio da isonomia deveria ser considerado um dos princípios pétreos constitucionais. Insiste-se em dizer, por importante, que só no artigo 5º, que trata dos direitos e deveres individuais e coletivos, há pelo menos 8 incisos aplicáveis no combate ao racismo.

Pode-se destacar aqui os dois principais que são: o inciso X, que se refere à inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas, e o inciso XLII, que atribui à prática do crime de racismo a inafiançabilidade, e a imprescritibilidade, igualando a proibição constitucional deste crime à concedida à ação armada contra o Estado Democrático de Direito. Perceba-se que o racismo, que anteriormente era considerado uma contravenção, passou a partir da Constituição de 1988 a ser um crime (com uma pena maior), com a possibilidade de aquele que o praticou ser condenado a qualquer tempo (LUSCI; ARAÚJO, 2005).

Atente-se para o fato de que em razão da Constituição Federal de 1988, foi criada a Lei 7.716/89. O art. 1º desta Lei é imperativo em dizer que: “Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” (BRASIL, 1989, p. 1). É passível o entendimento de que esta lei inova ao ampliar a previsão de crimes de discriminação ou preconceito, que agora, além de raça e cor, incluem etnia, religião, ou procedência nacional. Além disso, adequa a legislação nacional à convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial.

Outro mecanismo jurídico que tem supedâneo na Constituição Federal e nela encontra respaldo é o Código Penal, que em seu art. 140, que ao tratar do crime de injúria, diz que: § 3º - Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem. Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos e multa (BRASIL, 1940). Nesse passo, verifica-se a importância da Constituição Federal no tocante à instituição de mecanismos jurídicos coibindo o racismo no país e dando ênfase a criação de leis específicas como a Lei 7.716/89. Bem se vê, que ela possui muito da Declaração Universal dos Direitos Humanos, uma vez que vai em da instituição da igualdade de todos, dando tutela a minorias raciais a população afro-escendente que tanto sofre de discriminação racial no pais.

Sendo assim, convém inferir diante deste estudo que Constituição Federal brasileira de 1988 contempla o racismo no país, tendo por base os direitos humanos, ostentados na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Uma vez que a questão racial tem tratamento na Constituição Federal de 1988, como um fenômeno social de cunho jurídico, sobretudo, porque se encontra em seu art. 5º incisos LI e XLII, respectivamente que: “LI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”. (BRASIL, 1988, p. 1)

 6 METODOLOGIA

 Neste estudo adotou-se a pesquisa bibliográfica, porque segundo Alves (2010, p. 53): “Tem como vantagem cobrir uma ampla gama de fenômenos que o pesquisador não poderia contemplar diretamente”. Também é descritiva, porque concordando Gil (2010), procura descrever as características de um fenômeno, ou ainda estabelecer relações entre fenômenos. Nesse caso, sua abordagem é de natureza qualitativa, já que não se empreendeu estudo estatístico (LAKATOS; MARCONI, 2011). Para a coleta de dados, se buscou na literatura pertinente subsídios teóricos que fundamentassem a pesquisa em questão.

 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 O racismo é uma pratica de preconceito racial. Sem dúvida que fere os direitos da pessoa humana. É o que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, deixou claro quando instituiu que toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, etc. Nesse contexto insere-se todas as pessoas sejam elas brancas, negras, amarelas, pelo que se entende que a população afor-descendente também se encontra inserida nos termos desta Declaração. Também é assim na Constituição Brasileira de 1988, cujo art. 5º emana os Direitos e Garantias Fundamentais, tutelando todos os brasileiros e estrangeiro na forma da lei, sem distinção de raça, cor, sexo, etc. Esse artigo é imprescindível para o tratamento da questão dos afrodescendentes brasileiros.

Sendo assim, é possível dizer o estudo permitiu concluir que a Constituição Federal brasileira de 1988 contempla o racismo no país, tendo por base os direitos humanos, ostentados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, uma vez que se  verificou que a questão racial tem tratamento na Constituição Federal de 1988, como um fenômeno social de cunho jurídico. Isso porque se encontra em seu art. 5º incisos LI e XLII, respectivamente que: “LI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei” (BRASIL, 1988, p. 1)

Caro está que o Brasil tem interesse em combater o racismo, sendo a minoria afro-descendente no país aquela que mais vai ser tutelada, uma vez que é que mais sofre discriminação racial. Por óbvio que mesmo diante de todos os mecanismos jurídicos elencados na Carta Magna de 1988 e também na Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, ainda assim provavelmente subsistirá o racismo, na forma do preconceito e da discriminação, ferindo mulheres, homens e crianças afrodescentes em cada ponto deste país.

Nesse caso, não será demais sugerir que os legisladores implementem cada vez mais políticas de ação afirmativa e de caráter reparatório a fim de reverter a produção da desigualdade social, que tanto assola a população afrodescendente em todo o solo nacional. Além disso, que implementem ações concretas que garantam o acesso de pessoas afro-descendentes ao trabalho, à educação, à promoção profissional, em pé de igualdade com as demais pessoas, pondo em prática a orientação dos direito humanos de que todos são iguais independentes da raça, credo ou cor. Atente-se que os resultados encontrados, bem como as sugestões apresentadas não têm a pretensão de exaurir o assunto, mas contribuir para abrir, quem sabe, um universo de percepções que de alguma forma podem contribuir em estudos posteriores.

 REFERÊNCIAS

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______. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm. Acesso em: 09 abr. 2014.

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FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini dicionário da língua portuguesa. 6. ed. rev. e amp. Rio de Janeiro: Nova Fronteira 2009.

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[1] O Movimento Negro se define como o conjunto de entidades e grupos, de maioria negra, que têm o objetivo específico de combater o racismo e/ou expressar valores culturais de matizes africanas e que não são vinculados a estruturas governamentais (UNESCO, 1998).

Sobre o autor
João Henrique Ferreira Viana

Graduado em Filosofia pela Faculdade Evangêlica do Meio Norte (FAEME). Graduado em Pedagogia pela Faculdade Entre Rios do Piauí (FAERPI). Graduando em Direito (6º Período) pela Faculdade de Tecnologia do Piauí (FATEPI). Especialista em Doscência do Ensino Superior pela Faculdade Montenegro.<br>

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o presente estudo surgiu de minhas observações cotidianas acerca do racismo silencioso que existe contra a pessoa negra (afrodescendente) no pais. E teve como supedâneo minhas leituras em livros, revistas e artigos pertinentes ao assunto.

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