Trabalho decente e pleno emprego

25/05/2014 às 23:07
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O artigo trata da problemática relativa a contratação de trabalhadores sem vínculo de emprego, situação que afronta o trabalho decente e o pleno emprego.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) defende o “Trabalho Decente” que é definido como um "trabalho adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, capaz de garantir uma vida digna".

O trabalho decente representa uma missão da OIT, pautada em quatro objetivos estratégicos: [1]

1) liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva;

2) eliminação de todas as formas de trabalho forçado;

3) abolição efetiva do trabalho infantil;

4) eliminação de todas as formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação, a promoção do emprego produtivo e de qualidade, a extensão da proteção social e o fortalecimento do diálogo social.

A Constituição Federal de 1988 consagra no seu art. 170 que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os princípios elencados em seus incisos, dentre os quais a busca do pleno emprego  (inciso VIII).

Em que pesem os valores do pleno emprego e do trabalho decente serem reconhecidos como fundamentais para a dignidade do trabalhador e para sua emancipação social, verifica-se o constante desrespeito a um dos direitos mais básicos: o reconhecimento do vínculo empregatício.

Um dos maiores problemas que atingem o Direito do Trabalho contemporâneo é a fraude trabalhista efetivada por empregadores que contratam trabalhadores sem a formalização do contrato de emprego.

As situações de fraudes são variadas: desde a prestação de trabalho informal sem registro até a celebração de contratos escritos fraudulentos, que negam o vínculo de emprego, inobstante, na prática, o prestador de serviço labore como típico empregado.

Um dos expedientes mais utilizados para burlar a lei consiste na contratação de um empregado como prestador de serviço autônomo, para tentar mascarar a característica mais importante para a configuração de um vínculo empregatício: a subordinação jurídica do trabalhador em relação ao empregador.

Ou seja, relações empregatícias são mascaradas por contratos de prestação de serviços autônomos, de estágio, de serviço voluntário, cooperativas, “pejotizações”, sociedades e muitos outros tipos, inobstante o trabalhador trabalhe com subordinação, tal como um empregado.

O empregado foi transformado em mero “colaborador”,  e fica com sua CTPS em branco, sem FGTS, sem PIS e diversos benefícios sociais que um contrato de emprego pode gerar.

A fase contemporânea do Direito do Trabalho sofre o impacto de constantes transformações, decorrentes da evolução dos tempos: mudanças na economia brasileira e mundial, com destaque para a passagem de uma economia de inflação para uma economia de estabilidade resultante do Plano Real; desemprego; globalização; terceirização; fusões de empresas; multiplicação de sindicatos; livre negociação dos salários. [2]

Ainda, não podemos olvidar outras consequências da modernização, tais como a evolução tecnológica, a informática, o ingresso em massa da mulher no mercado de trabalho, o surgimento de novas profissões, bem como a extinção de antigos ofícios, que também repercutem no Direito do Trabalho.

De um país agrícola, o Brasil evoluiu para um país emergente e industrializado e que sente a competitividade.

Assim, surgem novos paradigmas para o Direito Laboral, que passa a ser desafiado por ideais neoliberais que objetivam desregulamentar os direitos trabalhistas.

Como efeito, cresce a contratação de trabalhadores sem vínculo de emprego, com o intuito de aumentar os lucros e evitar custos decorrentes da folha de pagamento, o que acaba deixando muitos trabalhadores à margem da formalidade, em situação que não se coaduna com os valores do trabalho decente e do pleno emprego.

Verifica-se um grande número de ações trabalhistas ajuizadas por trabalhadores que reclamam o vínculo de emprego e ao mesmo tempo denunciam fraudes trabalhistas. Em pleno século XXI é comum o trabalho escravo, que vem sendo denominado como “escravidão moderna”.

Enfim, a realidade é dura e mostra práticas no nosso cotidiano que afrontam os direitos humanos dos trabalhadores ao trabalho decente e ao pleno emprego, problema que atinge desde os operários mais humildes até os trabalhadores intelectuais, desde situações análogas a escravidão até a inclusão de trabalhadores como falsos sócios nas empresas de seus empregadores.

NOTAS:

[1] Organização Internacional do Trabalho. O que é trabalho decente? Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/content/o-que-e-trabalho-decente>  Acesso em 27 mar. 2014.

[2] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 22.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.p.56.
 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALVARENGA, Rubia Zanotelli de. Direito do trabalho como dimensão dos direitos humanos. São Paulo, LTr, 2009.

ALVES, Amauri Cesar. Novo contrato de emprego: parassubordinação trabalhista. São Paulo, LTr, 2004.

ARAUJO NETTO, Jose Nascimento. Liberalismo e Justiça do Trabalho: seis décadas de confronto. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

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BARZOTTO, Luciane Cardoso. Direitos humanos e trabalhadoresatividade normativa da Organização Internacional do Trabalho e os limites do Direito Internacional do Trabalho. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

CASSAR, Vólia Bonfim. Princípios trabalhistas, novas profissões, globalização da economia e flexibilização das normas trabalhistas. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.

CORREIA, Rosani Portela. Novos paradigmas do contrato de trabalho no Brasil. São Paulo: LTr, 2008.

FELICIANO, Guilherme Guimaraes. Curso crítico de direito do trabalho: teoria geral do direito do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2013.

MEIRELES. Edilton. O Novo Código Civil e o Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 2005.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 22.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

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PIOVESAN, Flavia; CARVALHO, Luciana Paula Vaz de. Direitos humanos e direito do trabalho. São Paulo: Atlas, 2010.

VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3. ed. São Paulo: Ltr, 2005.

Sobre a autora
Ellen Lindemann Wother

Advogada trabalhista. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – São Leopoldo/RS. Pós-graduada lato sensu (especialista) em Direito do Trabalho pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – São Leopoldo/RS. Mestranda em Direito pelo Centro Universitário Ritter dos Reis – Porto Alegre/RS.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Publicado no Blog Direito do Trabalho em Ação: ellenwother.blogspot.com.br

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