Resumo: Este trabalho trata do tráfico internacional de mulheres. Procura, a partir de uma vertente de violação dos direitos humanos, analisar as consequências jurídico-sociais das mulheres que foram traficadas. Para tanto, a abordagem metodológica foi a qualitativa, além do método de abordagem dedutivo. Também foi feito uso do método jurídico de interpretação sistemático e no que diz respeito à classificação da pesquisa, foi empregada a pesquisa explicativa utilizando como procedimento técnico a pesquisa bibliográfica. Concluiu-se que este tipo de tráfico é caracterizado por apresentar um baixo grau de perigo para quem o pratica e também que os enfrentamentos em relação a este fenômeno ainda se encontram em total desenvolvimento, sendo necessário um preparo mais eficaz para que as vítimas que têm seus direito humanos violados possam lutar contra este mal que lhes atingiu. É fundamental a conscientização das organizações governamentais para estabelecerem o combate a esta forma de tráfico e a ajuda psicológica e social às vítimas do tráfico de pessoas, além da criação de manobras de prevenção e punição para o combate do tráfico internacional de mulheres.
Palavras-Chave: Tráfico Internacional de Mulheres; Direitos Humanos; Protocolo de Palermo.
Introdução
Embora o surgimento do tráfico internacional de mulheres tenha iniciado já há um bom tempo, com base em conceitos etnocêntricos e economia de produção escravista, o fenômeno vem assumindo proporções gigantescas e inquietantes nos últimos anos, além de ter diversificado as suas formas de atuação, sendo praticado agora com fins cruéis de exploração sexual comercial, trabalho forçado, servidão por dívidas, matrimônio servil e também de extração de órgãos.
É nesse complexo cenário que o tráfico internacional de mulheres, ou a assim chamada “escravidão moderna”, se insere. De forma sucinta, compreendemos a escravatura como tendo sido uma prática social que conferia direitos de propriedade a um ser humano sobre outro, tendo sido comum na antiguidade em várias regiões do mundo. A expansão européia e a formação do sistema mundo iniciada nos finais dos séculos XV facultou o tráfico de escravos realizado através de rotas intercontinentais.
De acordo com os dados históricos, do século XVI ao século XIX o comércio de escravos resultou em milhões de africanos exportados para vários países para exploração, inclusive o Brasil, sendo este o último país na América a abolir a escravidão (1888). Entretanto, o fenômeno de tráfico, que envolve as redes organizadas e informais de fornecimento de mão de obra de trabalho barata e outras formas de exploração, começou a ser estudado e enfrentado no Brasil apenas por volta de 1990.
O tráfico internacional de mulheres é considerado atualmente um fenômeno multifacetado, tendo suas determinações não somente na violação de direitos, mas em grande parte nas relações macro-sociais, sendo intimamente relacionado com o mercado globalizado e seus impactos na precarização do trabalho, na migração, na expansão do crime organizado e na exploração do trabalho. É válido ressaltar que esta forma de tráfico também está ligada às relações culturais e valores da sociedade pautados em discriminação de gênero, classe e etnia.
Esta modalidade de trafico é uma das formas mais antigas de violação de direitos e de ameaça à vida e dignidade humana. Trata-se de um dos problemas mais remotos da história, não obstante não tendo desaparecido, assumiu novas formas e incorporaram renovadas características e dimensões ao passo que a população mundial, o capital e a informação se locomovem com facilidade, rapidez e agilidade. Por envolver a locomoção de pessoas através de meios violentos, de dolo ou de coerção, com o propósito de recrutamento para o trabalho forçado, servidão por dívidas ou práticas similares à escravidão, tornou-se de uma das atividades criminais mais rentáveis no mundo, perdendo somente para o tráfico de drogas e de armas, e gera bilhões de dólares de lucro através da exploração de suas vítimas em todo o planeta.
O Brasil é uma fonte de venda de mulheres para rotas domésticas e internacionais com fins de exploração sexual. Meninas e jovens mulheres são os alvos preferenciais dos aliciadores/recrutadores, com objetivo de serem enviadas para outros países na América do Sul, Caribe, Europa Ocidental, Ásia e Oriente Médio para serem exploradas sexualmente, através de redes organizadas.
O presente artigo tem como objetivo geral analisar a violação de direitos humanos enfrentados pelas vítimas do tráfico internacional de mulheres.
Para o desenvolvimento desta pesquisa utilizamos o método dedutivo, partindo de uma visão geral sobre o tema, e a seguir, chegamos ao tema específico, de forma que o raciocínio dedutivo parte de princípios considerados verdadeiros e indiscutíveis para chegar a conclusões de maneira puramente formal.
É uma pesquisa qualitativa, pois a nossa finalidade não foi analisar dados estatísticos, e sim analisar conceitos, acrescentar conhecimentos relacionados ao tráfico internacional de mulheres.
E, no que diz respeito à classificação da pesquisa com relação ao objeto geral, empregamos a pesquisa explicativa utilizando como procedimento técnico a pesquisa bibliográfica, utilizando para isto amplo material de livros sociológicos e jurídicos, sites de internet e artigos científicos.
1 Definição de tráfico internacional de mulheres
O tráfico internacional de mulheres é uma das espécies de tráfico internacional de pessoas mais praticada na atualidade. É um fenômeno que se estende desde o século XIX, apresentando um enorme crescimento e sustentando redes internacionais de prostituição. (BRASIL,2010)
De acordo com o principal instrumento internacional de enfrentamento ao tráfico de pessoas, o Protocolo Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas (também conhecido como Protocolo de Palermo), da ONU, no seu artigo 3º, alínea “a”, Tráfico de Pessoas é definido como:
O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos.
A Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República do Brasil conceitua o Tráfico de Mulheres e seu enfrentamento à Violência contra as Mulheres baseando-se em uma abordagem focada na perspectiva dos direitos humanos das mulheres e no Protocolo de Palermo, apresentando 3 (três) elementos centrais: 1. movimento de pessoas, seja dentro do território nacional ou entre fronteiras; 2. uso de engano ou coerção, incluindo o uso ou ameaça da força ou abuso de autoridade ou situação de vulnerabilidade; e, 3. a finalidade de exploração (exploração sexual; trabalho ou serviços forçados, incluindo o doméstico; escravatura ou práticas similares à escravatura; servidão; remoção de órgãos; casamento servil).
Em decorrência do que foi exposto acima, toda vez que houver movimento de pessoas por meio de engano ou coerção com o fim último de explorá-la estar-se-á diante de uma situação de tráfico de pessoas. É de suma importância ressaltar que para fins de identificação do tráfico de pessoas, o uso de engano ou coerção inclui o abuso da “situação de vulnerabilidade”, mencionada na definição do Protocolo de Palermo. Em traços mais detalhados, isso significa dizer que não importa que a pessoa explorada tenha consentido em se transportar de um local a outro, desde que esteja em seu local de origem em situação de vulnerabilidade que a faça aceitar qualquer proposta na busca de encontrar uma oportunidade de superá-la.
No Protocolo de Palermo, encontra-se a seguinte definição: “abuso de situação de vulnerabilidade é entendida como significando qualquer situação em que a pessoa em causa não tem outra alternativa real e aceitável senão submeter-se ao abuso em questão”.
Portanto, uma mulher pode consentir em migrar para trabalhar como doméstica ou prostituta ou para trabalhar irregularmente em outro lugar, mas isso não significa que ela tenha consentido em trabalhar de formas forçadas e desumanas ou em condições similares à escravidão, bem como em ser explorada, e, se isso acontecer, fica caracterizado o tráfico de mulheres. Daí se deduz que o consentimento é irrelevante para a caracterização do tráfico de pessoas, em outras palavras sem o consentimento o tráfico será caracterizado, pois a mesma não sabia que o sonho de ter um trabalho e salário maior lhe levaria a sofrimento e dor, através do trabalho forçado e exploração sexual entre outros. A compreensão do tráfico de pessoas não se limita à sua relação com a exploração sexual, pois ele não se destina apenas a este fim, mas também a outros tipos de exploração baseadas no do papel feminino de submissão construído socialmente. Há várias modalidades de exploração de mulheres em situação de tráfico de pessoas, quais sejam: exercício forçado de trabalhos que não correspondem às expectativas e se revelam desumanos; a promessa não concretizada de permissão de residência e trabalho regular no exterior; vida sob constante ameaça, sem possibilidade de desligar-se do trabalho assumido; cerceamento de liberdade, nos casos de casamento com estrangeiros; prostituição forçada; trabalho doméstico forçado; casamento servil.
O tráfico internacional de mulheres é, ao mesmo tempo, causa e consequência de violações aos direitos humanos. É consequência de violações aos direitos humanos porque se origina na desigualdade social-econômica, na falta de perspectivas para profissionalização, e na falta de possibilidades para a realização de sonhos pessoais. Por outro lado, é causa de violação de direitos humanos, porque a sua finalidade é a exploração da mulher, pois degrada a sua dignidade e limita o seu direito de ir e vir. Por isso, o tráfico é comumente entendido como sendo uma das formas mais explícitas de escravidão moderna ligada ao fenômeno da globalização.
Finalmente, podemos dizer que o tráfico de mulheres deve ser entendido como uma das várias formas da violência contra as mulheres. O conceito de violência adotado aqui se baseia naquele estabelecido pela Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres que, por sua vez, fundamenta-se na definição da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – a Convenção de Belém do Pará, que considera as mais diferentes formas de violência contra as mulheres, tais como: a violência doméstica (que pode ser psicológica, sexual, física, moral e patrimonial); a violência sexual; o abuso e a exploração sexual de mulheres, adolescentes, jovens; o assédio moral; o tráfico de mulheres; a violência institucional e a sofrida pelas mulheres que exercem a atividade de prostituição.
O termo “enfrentamento” ao tráfico baseia-se na Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, que inclui as dimensões da Prevenção, do atendimento às vitimas e da repressão ao crime organizado e responsabilização de seus autores. Apesar de serem áreas de enfrentamento distintas com focos, objetivos, ações e públicos específicos, esses três eixos de ação devem sempre se relacionar, abordando os diferentes momentos e fases do tráfico de pessoas, com intuito de realizar a prevenção e o atendimento às vítimas.
2 Tráfico internacional de mulheres, aliciadores e vítimas
Os traficantes de mulheres utilizam métodos muito variados para transportarem as suas vítimas, por vezes operam através de agências de emprego, agências de viagens, empresas de lazer e agências matrimoniais. As mulheres são abordadas pelos traficantes através de anúncios em jornais, procurando bailarinas, empregadas de mesa, animadoras de clubes noturnos, ou por recrutamento direto em bares e discotecas, ou seja, são atraídas pelas falsas promessas de dinheiro que para quem estar em estado de pobreza se torna um grande atrativo às vítimas do tráfico.
Há caso de mulheres que têm ciência que vão trabalhar como prostitutas, porém, não sabem que serão mantidas em condições próximas da escravatura, sendo incapazes de escapar dos seus exploradores. Logo após a exportação para o país de destino, as mulheres são forçadas a trabalhar como prostitutas, pois constituíram uma grande dívida com os traficantes, tendo em vista, que elas são obrigadas a reembolsar o que eles gastaram com a emissão dos documentos e passaportes, bem como todos os gastos extras que fizeram antes de embarcar, criando assim um processo de endividamento com as vítimas. (LEAL, 2002)
As vítimas do tráfico são ameaçadas com violência, sofrem maus tratos e violações, algumas são sequestradas para evitar que fujam. Os meios de coerção realizados pelos traficantes deixam as vítimas sem saída, pois elas e seus familiares são ameaçadas, geralmente as vítimas sentem que caíram em uma armadilha, porque existem organizações criminosas que controlam toda a cadeia, desde o recrutamento, passando pelo transporte e terminando no próprio local da exploração sexual.
Atualmente, o tráfico de mulheres é considerado um mercado forte e lucrativo, no qual a mercadoria é o prazer do homem, esta mercadoria é a oferta da intimidade da mulher, e o que é alienado é a intimidade, o que é mais grave que a escravatura, pois se vende o trabalho e não a intimidade. Este mercado funciona com a oferta e a procura, sendo que a oferta é realizada pela mulher que se vende, e a procura é realizada por parte os homens que as compram. Este crime se tornou comercial, com começo, meio e fim.
O tráfico de mulheres é hoje uma indústria que movimenta milhões de reais e escraviza meninas e mulheres. O Brasil é visto como um dos atraentes roteiros sexuais do mundo. Este rótulo não é atual, mas está se tornando gigantesco, pois a procura está cada vez maior.
A necessidade de ganhos financeiros para a sobrevivência, e a violência intra-família, influenciam na decisão das mulheres em aceitar as ofertas ilusórias dos aliciadores, tornando a proposta aceitável e atrativa. Sendo assim, o lado financeiro da questão não é o único a ser levado em conta na decisão das mulheres. As propostas realizadas pelos aliciadores deixam as mulheres deslumbradas com a possibilidade de juntarem dinheiro no exterior, de conquistarem um emprego estável e com a possibilidade de rápido enriquecimento próprio e de seus membros familiares. Há ainda os casos em que os pais vendem suas filhas aos traficantes, colocando-as a disposição do tráfico porque querem dinheiro, mas também acreditam que elas estarão libertas da pobreza, pensamento este totalmente contrário da realidade que as esperam.
É evidente que, enquanto as mulheres não gozarem de oportunidades iguais em educação, moradia, alimentação, emprego e etc, vão continuar na lista das vítimas do tráfico. O tráfico internacional de mulheres traz irreversíveis conseqüências: de cada 100 mulheres traficadas, 24 adquiriram algum tipo de doença sexualmente transmissível, 3 contraíram o vírus HIV, 15 ficaram grávidas, 26 sofreram ataques físicos por parte dos clientes, 19 foram atacadas sexualmente e 9 sofreram algum tipo de ameaça ou intimidação. (BONJOVANI, 2004)
Devido à epidemia de HIV/AIDS que assola as mulheres, os traficantes têm mostrado preferência especial por meninas muito jovens, em geral sem experiência sexual anterior.
A rotina dessas mulheres, que são vítimas da exploração sexual, ocorre de forma contínua, as quais são obrigadas a vender seus corpos, e o dinheiro com a prostituição é entregue aos exploradores com a finalidade de quitar suas impagáveis dívidas adquiridas. Algumas delas conseguem fugir, porém, se deparam com a dificuldade de pedir ajuda, por não falar a língua local. Também têm o receio de serem punidas pela entrada ilegal no país. Elas também sentem medo da reação da sociedade, que as julgam erroneamente como prostitutas por opção. Infelizmente, a sociedade acredita que estas mulheres estão vendendo o seu próprio corpo por opção e não por que estão sendo obrigadas e ameaçadas.
Quando não conseguem ajuda, algumas delas se suicidam, enquanto outras são recapturadas e sofrem inúmeras torturas, para não tentar a fuga novamente, deixando-as amedrontadas. As máfias que comandam o tráfico mantêm um esquema bem articulado, no qual encara a mulher como uma mercadoria qualquer, e só consume esta mercadoria aquele que tem condições de oferecer o preço cobrado e estipulado pelos traficantes.
Os grandes financiadores do tráfico são os donos de boates, que são os responsáveis por financiarem as viagens, o sustento das mulheres na cidade da chegada, além do fornecimento de drogas e álcool e marcarem os primeiros programas. As aliciadas, nesse processo, ficam presas a eles até pagarem todas as suas dívidas de locomoção e de sobrevivência. A algumas é imposto o regime fechado, no qual as pessoas traficadas ficam presas na própria boate. Outras permitem que elas saiam sob constante vigia, desde que voltem diariamente e paguem pelo dia de trabalho.
O aliciador é o sujeito ativo do tráfico de mulheres, cuja conduta, na maioria das vezes, subsume-se a induzir a vítima a se submeter ao tráfico por meio de falsas promessas de emprego e condições de vida irreais. (PROJETO TRAMA, 2011)
Os riscos pelos quais os aliciados irão passar, quase sempre deixam de ser revelados pelo aliciador, pois, o lucro em questão se torna mais atrativo para se cometer o crime. Esse sujeito atrai as suas vítimas pela internet, por anúncios em jornais e por contato pessoal e direto. Para a consumação mais fácil do tráfico, o aliciador sempre procura o consentimento da vítima.
Em sua maioria os traficantes de mulheres estão, ao mesmo tempo, ligados a outros tipos delituosos, como o tráfico de armas, a falsificação de documentos, homicídios, tráfico de narcóticos, entre outros.
O tráfico pode ocorrer dentro de um mesmo país e entre diferentes países. As rotas são formadas pelos lugares por onde as vítimas passaram, desde o local de onde partiram até o destino final, sendo as cidades ou países por onde transitaram chamadas de locais de trânsito. Os pontos de partida são normalmente os países pobres e os de destino são os países ricos. (ILADH, 2010)
3 Diferença entre tráfico e imigrantes
A imigração dar-se para quem muda de estado ou de país por vontade própria e permanece concordando com as condições de vida em que se depara. No entanto, o tráfico surge quando um indivíduo é ludibriado com propostas de emprego ou de ganhos que não se cumprem e, frequentemente, acaba em cárcere privado, tendo o passaporte retido ou sendo escravizado por dívida.
Quem migra optou por uma vida nova longe de casa, em busca de uma melhoria de vida. Quem é traficado, também optou por uma vida nova longe de casa. Mas quando chegou lá, encontrou trabalho compulsório, salário aquém do esperado e exposição a diversas violências. Principalmente à violência de não poder regressar.
A imigração ainda apresenta outra diferença em relação ao tráfico, na qual percebemos que os imigrantes não obtiveram ainda a mesma atenção do governo brasileiro destinada ao tráfico de seres humanos. A Convenção Internacional para Proteção dos Direitos dos Trabalhadores Migrantes e de suas Famílias, de 1990, ainda não foi ratificada pelo governo. É um instrumento de particular valor, pois prevê a proteção e a defesa dos direitos dos trabalhadores imigrantes, sejam eles portadores de documentação ou sem documentos, tendo o objetivo principal reconhecê-los e os amparar como cidadãos pertencentes do mundo.
Mas este tipo de integração não é a realidade assim sonhada, ainda tem um bom tempo para que haja a concretização deste direito dos imigrantes trabalhadores. A tendência é que os países industrializados cada vez se fechem mais para a imigração, estimulando assim a ação do crime organizado em evidência o tráfico. Os traficados são vistos como vítima e os imigrantes sofrem discriminações.
O tráfico de migrantes não poderá ser confundido em hipótese algumas com tráfico de pessoas, ele envolve diretamente a promoção, com o objetivo de obter direta ou indiretamente um benefício financeiro ou outro benefício material, devido à entrada ilegal de uma pessoa num estado parte do qual essa pessoa não seja nacional ou residente permanente.
Existe também um Protocolo destinado à imigração que atende com o nome de Protocolo adicional à Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional, relativo ao combate ao tráfico de migrantes, também caracteriza como infração penal a elaboração, obtenção, fornecimento ou posse de documentos de viagem ou de identidade fraudulentos com o objetivo de possibilitar o tráfico de migrantes.
De acordo com o Protocolo de Palermo, no tráfico de pessoas, a principal fonte de renda estabelecida para os traficantes é produto da exploração das vítimas (na prostituição, trabalhos forçados, servidão). No tráfico de migrantes, essa renda é totalmente diferente do que é apresentado no tráfico, aquele provém dos valores pagos pelos migrantes. Além disso, o tráfico de migrantes é sempre transnacional e o tráfico de pessoas pode ou não ser. Embora o tráfico de pessoas e o tráfico de migrantes constituam delitos diferentes, há casos reais de sobreposição e intersecção que não poderão ser esquecidos. As discussões contemporâneas sobre migração e tráfico chamam a atenção para a proximidade de ambas problemáticas observando que, nos processos migratórios regulares, intimamente vinculados às desigualdades estruturais globais, os migrantes são vulneráveis tanto ao tráfico de migrantes, como ao engano e à coerção no movimento de deslocamento, e, posteriormente, à servidão por dívidas, à violência dos empregadores. E, quando as condições socioeconômicas nos locais de partida não se alteram, os migrantes que retornam voluntariamente ou deportados tentam partir novamente, sendo mais uma vez vulneráveis a ambos os tipos de tráfico, este processo ocorre de forma significativa.
4 Medidas de Controle
É importante ressaltar que o governo deve tratar as vítimas do tráfico de mulheres a partir de uma perspectiva de direitos humanos e não como criminosas. As medidas antitráfico não devem discriminar, criminalizar, estigmatizar ou isolar as mulheres, pois isso as torna mais vulneráveis a outras violações.
As mulheres que são vítimas do tráfico devem receber garantias de viver livres de perseguição ou do assédio de pessoas que ocupam posição de autoridade. O governo deve promover a adequação de sua legislação nacional aos instrumentos internacionais relativos ao tráfico de pessoas e implementar programas de ação para o enfrentamento do mesmo, que incluem medidas preventiva, repressivas e assistências. Devendo ainda, reforçar e capacitar as estruturas locais existentes no sentido de dar-lhes condições para reduzir a exploração sexual e o tráfico de pessoas. (JESUS, 2003)
O governo deve aplicar medidas para combater a prostituição e o trabalho escravo de mulheres e meninas existentes nas diferentes regiões do país, com intuito de permitir o planejamento de estratégias adequadas para a proteção das vítimas, a investigação dos crimes e a punição dos responsáveis.
Urge que o governo proporcione uma condenação para os traficantes, através da implementação de políticas e leis que permitam às vítimas obterem a total confiança necessária no sistema legal para que procurem ajuda, denunciem e, caso queira, prestem testemunho em juízo. Além de tomar as medidas necessárias para que as mulheres vítimas do tráfico tenham o direito de mover ação criminal contra os traficantes e outros indivíduos que tenham abusado delas.
Outro fator que o Governo deverá desempenhar é a realização de parcerias com a sociedade civil organizada para a criação de abrigos ou para a ampliação dos existentes, dando uma atenção maior e mais segura, de forma a aprimorar o atendimento às vítimas da exploração sexual e do tráfico de pessoas. Estes abrigos seriam responsáveis pela assistência para obter a reintegração e programas de suporte para as vítimas, de maneira a minimizar os problemas enfrentados na reintegração na comunidade, as quais foram sujeitas a se afastarem por intermédio dos traficantes.
5 Arcabouço jurídico protetivo
Na legislação brasileira, podemos destacar o capítulo V, do Código Penal Brasileiro, o qual está previsto: “Do Lenocínio e do Tráfico de Pessoas”, artigos 231 e 231-A, parte especial, a tipificação do tráfico de pessoas para fins de lenocínio, ou seja, fins de exploração sexual, alterados pela Lei 11.106/2005 que abrangeu a tutela para todas as pessoas e não apenas às mulheres, com era antigamente. (Secretária de Políticas para as Mulheres, 2011)
O nosso Código Penal não prevê em seu texto nenhuma outra forma de tráfico de pessoas que não a para fins de lenocínio (crime de favorecimento à prostituição ou a libidinagem), sendo que, em seu corpo, ficaria desamparado de proteção legal a outras formas desta atividade que não para exploração sexual, tais como o tráfico de pessoas para a retirada de órgãos, para o trabalho escravo, e outros que também não estão elencados no “Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo À Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial de Mulheres e Crianças”, como, por exemplo, o tráfico de crianças para adoção.
Depois de adentrar sobre o tema de lenocínio e tráfico de pessoas, chega-se a seguinte conclusão, que a legislação penal não comporta a realidade atual, porque o crime de tráfico está atrelado à tipificação de prostituição.
Esta forma de lacuna na legislação penal brasileira não condiz com a problemática internacional que se tornou o tráfico de pessoas, sendo uma ofensa à dignidade da pessoa humana não haver punição para todos os tipos de tráfico de seres humanos, pois não é apenas a exploração sexual que causa prejuízos psicológico e social, além de destrói a vida de milhares de pessoas traficadas e seus familiares todos os anos.
Já no que se refere a tratados internacionais que o Brasil se tornou signatário, podemos citar os inframencionados.
Um dos primeiros instrumentos internacionais ratificado pelo Brasil que diz respeito ao tráfico de pessoas foi a Convenção Interamericana Para Prevenir, Punir E Erradicar A Violência Contra A Mulher, “Convenção de Belém do Pará”, aprovada pelo Decreto n.°1.973, de 1º de outubro de 1996. Esta convenção foi responsável por definir as formas de violência contra a Mulher, elencando o tráfico de mulheres como sendo uma delas. (Secretária de Políticas para as Mulheres, 2011)
Em 30 de julho de 2002, o Brasil incorpora à legislação pátria o Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher através do Decreto nº 4.136. Houve então outra data em especial, em 13 de setembro do mesmo ano, o Decreto nº 4.377 aprova a própria Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres (1979).
Por fim, em 15 de novembro de 2000, foi adotado pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças, denominado Protocolo Anti-Tráfico de Pessoas da ONU, também conhecido como “Protocolo de Palermo”. O Protocolo é promulgado no Brasil em 12 de março de 2004, através do Decreto nº 5.017, passando a ter vigência interna.
Considerações finais
O tráfico internacional de mulheres é considerado atualmente uma atividade de baixos riscos e altos lucros. As mulheres traficadas podem entrar nos países com visto de turista e as atividades ilícitas são facilmente camufladas como agenciamento de modelos, garçonetes, dançarinas ou, ainda, mediante a atuação de agências de casamentos.
Observou-se, assim, que o tráfico internacional de mulheres tem um caráter multidimensional, onde as suas determinações não se encontram, somente, na violência criminal, mas, sobretudo, nas relações macrossociais do mercado globalizado de trabalho e seus impactos na precarização das condições e formas de trabalho no campo da exploração sexual comercial, fortalecendo o crime organizado, dentro e fora do País.
Compreendeu-se após este estudo para obter a conclusão desta pesquisa, que esta forma de tráfico trata-se de uma mutação da sociedade pós-moderna. Uma verdadeira reconstrução da barbárie.
Como observado, o conceito de tráfico internacional de mulheres envolve vários fenômenos e enfoques, como direitos humanos, globalização, migração, discriminação (racial e/ou de gênero), exploração sexual, prostituição, trabalho sexual, trabalho escravo, exploração de trabalho, direitos trabalhistas, escravidão moderna e crime transnacional.
Os direitos humanos das vítimas traficadas , pode-se confirmar que realmente existem alguns movimentos, mas, principalmente, governos, que dizem combater o tráfico internacional de mulheres, visando o combate à migração, à prostituição ou às redes criminosas internacionais e não a garantia dos direitos humanos.
Propor a análise dos direitos humanos tolhidos pelo tráfico internacional de mulheres é analisar uma seara onde a dignidade, a igualdade, a liberdade e a legalidade são princípios ignorados, esquecidos. É preciso se repensar as políticas públicas, provocando um diálogo com a sociedade civil e as instituições jurídicas para que se concretize ações mais eficazes para mitigação do tráfico internacional de mulheres, pois este crime impacta diretamente os direitos humanos destas mulheres que muitas as vezes foram esquecidas socialmente.
Referências
BONJOVANI, Mariane Strake. Tráfico internacional de seres humanos. São Paulo: Damásio de Jesus, 2004.
ILADH-INSTITUTO LATINOAMERICANO DE DEFESA E PROMOÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS. Manual de capacitação para o enfretamento ao tráfico de pessoas. Salvador, Bahia, ago. 2010. p. 14. Disponível em: <http://www.winrock.org.br/media/ Manual%20Agentes%20Multiplicadores%20Completo.pdf>. Acesso em: 16 maio 2014.
JESUS, Damásio de. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças-Brasil. São Paulo: Saraiva, 2003.
PROJETO TRAMA. Disponível em: <www.projetotrama.org.br>. Acesso em: 02 abr. 2014.
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES. Tráfico de Mulheres: Política Nacional de Enfrentamento, Brasília: Presidência as República, 2011.
SECRETARIA ESPECIAL DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES (SPM/PR). Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Brasília: Presidência da República, 2004.
SECRETARIA ESPECIAL DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES. II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Brasília: Presidência da República, 2008.