Da constitucionalidade da convocação de juízes para compor temporariamente os colegiados de tribunais regionais federais e estaduais

03/08/2014 às 06:44
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A convocação de juízes de primeiro grau para compor temporiamente os Colegiados dos Tribunais aos quais estejam vinculados caracteriza ofensa ao princípio do juiz natural?

 

DA CONSTITUCIONALIDADE DA CONVOCAÇÃO DE JUÍZES PARA COMPOR TEMPORARIAMENTE OS COLEGIADOS DE TRIBUNAIS REGIONAIS FEDERAIS E ESTADUAIS.

1. INTRODUÇÃO

                        O presente trabalho pretende enfrentar a constitucionalidade, ou não, das normas que autorizam a convocação de juízes para compor os Colegiados de Tribunais Regionais Federais e Estaduais em período de férias de seus Desembargadores, bem como a validade das decisões proferidas por esses juízes, tendo como premissa eventual ofensa ao princípio constitucional do juiz natural.

2.  DESENVOLVIMENTO E FUNDAMENTAÇÃO

 O princípio do juiz natural está proclamado no artigo 5º, incisos XXXVII e LIII, da Constituição Federal de 1988, que veda a instituição de juízo ou tribunal de exceção e prevê que as pessoas somente serão processadas e julgadas por autoridade competente na forma da lei, garantindo, desse modo, a imparcialidade do julgador e a segurança dos jurisdicionados contra abusos estatais.

Essa imparcialidade assegurada pelo princípio do juiz natural consiste na solução dos conflitos com base na lei e na livre convicção dos magistrados.  Já a segurança dos jurisdicionados refere-se à proteção contra os abusos verificados no passado mediante o uso de tribunais de exceção criados, não para fazer justiça, mas sim para defender interesses escusos de determinada classe dominante de plantão, em flagrante afronta ao Estado Democrático de Direito.

Segundo Ihering, o Estado Democrático de Direito “só pode existir quando a justiça sabe brandir a espada com a mesma habilidade com que manipula a balança".  (Ihering, 2005, p. 27).  No Brasil, Ada Pellegrini Grinover leciona que, sem o princípio do juiz natural, não há que se falar em jurisdição, pois aquele é o elemento essencial desta: "Sem o juiz natural, não há função jurisdicional possível”. (GRINOVER, 1997, p. 63).

No caso em análise, no que se refere especificamente à  substituição de desembargadores federais por juízes de primeiro grau ela está amparada pela Lei 9.788/99,  notadamente no seu artigo 4º abaixo reproduzido:

Art. 4o Os Tribunais Regionais Federais poderão, em caráter excepcional e quando o acúmulo de serviço o exigir, convocar Juízes Federais ou Juízes Federais Substitutos, em número equivalente ao de Juízes de cada Tribunal, para auxiliar em Segundo Grau, nos termos de resolução a ser editada pelo Conselho da Justiça Federal.

Esse artigo foi regulamentado pelo Conselho da Justiça Federal, por meio da Resolução nº 210/99, e também pelo Conselho Nacional de Justiça, em sua Resolução nº 17/06, que definiu os parâmetros para a escolha de juízes que irão substituir desembargadores, da seguinte forma:

 

Art. 1º. (...) substituição dos membros dos Tribunais será realizada por decisão da maioria absoluta de seus membros, nos termos do art. 118 da Lei Complementar nº 35/79, com adoção de critérios objetivos que assegurem a impessoalidade da escolha.

O  E. Supremo Tribunal Federal, por sua vez, em reiterados julgados, concluiu pela constitucionalidade dessa norma, conforme se pode observar nos precedentes abaixo reproduzidos:

EMENTA Habeas corpus. Constitucional. Recurso de apelação julgado por turma composta majoritariamente por juízes federais convocados. Nulidade. Alegada ofensa ao princípio do juiz natural. Não ocorrência. Precedentes da Corte. Ordem denegada.

1. O princípio do juiz natural não apenas veda a instituição de tribunais e juízos de exceção, mas também impõe que as causas sejam processadas e julgadas por órgão jurisdicional previamente determinado a partir de critérios constitucionais de repartição taxativa de competência, excluída qualquer alternativa à discricionariedade.

2. A convocação de juízes de primeiro grau de jurisdição para substituir desembargadores não malfere o princípio constitucional do juiz natural, autorizado no âmbito da Justiça Federal pela Lei nº 9.788/99. Não se vislumbra, no ato de designação do juiz convocado, nenhum traço de discricionariedade capaz de comprometer a imparcialidade da decisão que veio a ser exarada pelo órgão colegiado competente.

3. Habeas corpus denegado.

(STF - Habeas Corpus HC 101487/DF, Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Data de Publicação: 23 de Agosto de 2011)

Ementa: ÓRGÃO DE TRIBUNAL COMPOSTO MAJORITARIAMENTE POR JUÍZES DE PRIMEIRO GRAUCONVOCADOS – PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL – PRECEDENTE DO PLENÁRIO. O Supremo, no Recurso Extraordinário nº 597.133/RS, assentou a inexistência de violação ao princípio do juiz natural no julgamento de apelação por órgão composto por juízes de primeiro grau convocados – Ressalva de entendimento pessoal.

( STF. 754188/AGR/SP- São Paulo Ag. Reg. no Agravo de Instrumento, Rel. Min. Marco Aurélio Melo, Julgamento: 18/09/2012 - Órgão Julgador: Primeira Turma).

 

Pelo que  se depreende das decisões do Supremo Tribunal Federal,  são válidos os julgamentos realizados por juízes federais de primeiro grau que estejam substituindo desembargadores em conformidade com a respectiva  legislação.

3. CONCLUSÃO

Nesse contexto, não há que se falar em inconstitucionalidade das  normas que autorizam a convocação de juízes de primeiro grau para compor os Colegiados dos respectivos Tribunais Regionais Federais e Estaduais aos quais estejam vinculados, porque esse procedimento está amparado em normas, gerais e abstratas, previamente estabelecidas e em conformidade com a Constituição de nossa República de 1988.

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4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 nov. 2012.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil7ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 2002, vol. I.

CONTEÚDO JURÍDICO. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/vade-mecum-brasileiro,cnj-resolucao-no-17-de-19-de-junho-de-2006-define-parametros-a-serem-observados-na-escolha-de-magistrados-par,23224.html>.  Acesso em: 17 fev. 2013.

GRINOVER, Ada Pellegrini in PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil2ª tiragem. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 1997.

IHERING, Rudolf Von. A Luta pelo DireitoColeção a obra-prima de cada autor. São Paulo: Martin Claret, 2005.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 11. ed.rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora. Método, 2007.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2001.

NERY JR., Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 7ª. ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – STF. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 15 fev. 2013.

TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002.

Sobre o autor
Roberto Carlos Sobral Santos

Advogado desde 1996, com passagem pelo Departamento Jurídico do Banco do Brasil S.A no cargo de advogado entre 1998 a 2006. Procurador da Fazenda Nacional desde 2006. Pós-Graduado em Direito Constitucional em nível de Especialização.

Informações sobre o texto

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