Planejamento urbano integrando sustentabilidade e legalidade

23/07/2014 às 12:07
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O objetivo desta pesquisa foi procurar uma visão contextual e atual de planejamento urbano, a partir de uma relação sistêmica com a sustentabilidade e legalidade.

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi procurar uma visão contextual e atual de planejamento urbano, a partir de uma relação sistêmica com a sustentabilidade e legalidade. A metodologia científica empregada foi qualitativa e exploratória. Foi possível inferir que o planejamento urbano é intimamente dependente da sustentabilidade e da legislação. Foi possível considerar que a qualidade de vida é um indicador de uma cidade sustentável.

Palavras-chave: cidade, vida, urbanismo, legislação.

ABSTRACT

Urban planning integrating sustainability and legality

The objective this search was to seek a contextual and actual vision of urban planning, from a systemic relationship to sustainability and legality. The scientific methodology was qualitative and exploratory. It was possible to infer that urban planning is dependent on sustainability and legislation. It was possible to consider the quality of life is an indicator of a sustainable city.

Keywords: city, life, urbanism, legislation.

INTRODUÇÃO

Planejamento urbano

Com o advento da Constituição Federal do Brasil (1988) os atores do planejamento urbano ficaram mais bem identificados e esta disciplina ganhou maior realce no cenário político e técnico nacional. Isso não significou, entretanto, que o planejamento urbano não era tratado antes desta Cara Magna, mas que alguns pontos ficaram mais claros expondo seus atores. Assim, cabe ao munícipio a realização do planejamento urbano, bem como a fiscalização do seu cumprimento.

Uma interpretação da Lei 10.257 (2001) (Estatuto da Cidade) pode permitir visualizar que existem regramentos para que o planejamento urbano se desenvolva de forma harmoniosa e efetiva; nessa lei, o estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) é um instrumento de planejamento urbano que busca equacionar os interesses entre particulares, bem como, entre particulares e públicos.

Tratar da cidade e do seu planejamento é tratar de um tema complexo, dinâmico e composto por inúmeras variáveis. A complexidade da cidade é tal que pode ser comparada a um organismo vivo. Existem várias correntes que tentam explicar a complexidade da cidade, como a que foi apresentada por Kennedy et al., 2011). Estes autores trataram do metabolismo urbano mostrando a complexidade da cidade com uma visão dinâmica onde fluxos de energia e massa são a base do seu funcionamento.

Tendo a cidade como seu objeto, o planejamento urbano relaciona-se com gestão urbana, urbanismo e desenho urbano. Porém, o planejamento urbano distingue-se desses termos por preconizar um olhar para o futuro, fazendo acontecer como se pretende, e não simplesmente focando em situações do presente. Para tanto, ele se consuma ao projetar para o futuro os componentes econômicos, físicos, sociais e culturais da realidade presente da cidade.

Para deixar claro o objeto desta pesquisa, há que se colocar discernimento entre urbanismo e planejamento urbano. Enquanto o planejamento urbano cuida da interação entre os quatro componentes da cidade, o urbanismo tem como foco básico o componente físico territorial, ou seja, o espaço urbano onde se desenvolve a vida.

Existem métodos para a elaboração do planejamento urbano, que estão em constante aperfeiçoamento, inclusive com o emprego de softwares cada vez mais sofisticados, mas todos eles dependem de um procedimento primário para ter sucesso. Esse procedimento primário é o diagnóstico para fins de planejamento. O diagnóstico para fins de planejamento urbano deve buscar estampar a realidade atual da cidade, e, mais do que isso, do município. É um levantamento de dados e, na prática, é uma interação dos dados levantados que deverá oferecer, de maneira simples, a realidade da cidade e do seu entorno. Muitas vezes é deixado de lado um aspecto importante desse tipo de diagnóstico, que é a história da cidade. Nesse contexto, ao se considerar a história da cidade pode-se aprender com os erros cometidos, o que poderá favorecer um planejamento urbano mais eficiente.

No cotidiano de uma cidade – no após planejamento urbano – ou mesmo quando da elaboração deste, podem ocorrer e geralmente ocorrem conflitos de interesses. Segundo Carvalho (2013) esses conflitos têm aumentado, destacadamente aqueles que envolvem a qualidade de vida e o interesse econômico.

Muitas vezes o cidadão vive alheio ao plano diretor da sua cidade (ou lei que o substitua), fazendo com que o seu exercício de cidadania seja distorcido. Se esquece, o cidadão, que é através do plano diretor que o planejamento urbano se materializa, podendo ou não melhorar a sua qualidade de vida. Corroboram com esta posição Silva e Aguiar Filho (2013) ressaltando o papel fundamental do plano diretor na melhoria da qualidade de vida.

Sustentabilidade ambiental legal

Sustentabilidade ambiental legal envolve a questão técnica da sustentabilidade e suas relações com as normas legais de um país nos seus níveis de organização.

Existem formas diferentes de conceber uma cidade sustentável em termos técnicos. Uma cidade seria cem por cento sustentável se fosse totalmente independente - nos seus componentes econômicos, físicos, sociais e culturais - da região onde está inserida, e isso não é provável que aconteça. Portanto, as cidades vão ser mais ou menos sustentáveis, inclusive podendo ser mais sustentáveis em algum componente e menos em outros. Assim, o conceito de cidade sustentável é relativo.

Na prática, assim como não é possível separar o conceito de sustentabilidade de uma cidade da relatividade, também não é possível dizer se uma cidade é sustentável (ou não) se não for incluído na análise as normas as quais ela está submetida. Nesse sentido, não se pensa somente nas normas legais da própria cidade, mas, também, naquelas que de algum modo influenciam o comportamento local. Isso abre a visão para uma perspectiva estatual e nacional de legalidade influenciando, logicamente, a sustentabilidade municipal.

O licenciamento ambiental para fins urbanos é um instrumento que pode favorecer a sustentabilidade da cidade. Araújo & Costa (2012) observaram que o licenciamento ambiental urbano pode não dar o devido espaço para se discutir os modelos de desenvolvimento urbano. Um agravante disso pode ser, e provavelmente o é, uma piora no planejamento urbano.

Segundo Brasil (2013), cabe a administração pública municipal defender a sustentabilidade local, conforme denotam as normas legais.

A qualidade de vida e a sustentabilidade mostram como uma cidade é conduzida, sendo, portanto, um meio de conhecer o seu planejamento urbano (ARAÚJO, M. & CÂNDIDO, G., 2014).

A relatividade da sustentabilidade pode ser constatada na prática de observação, não somente ao se analisar o processo em si, mas ao se constatar que uma cidade pode ser sustentável por motivos diferentes de outra. Nesse sentido, Childers et al. (2014) focam em um modelo de sustentabilidade urbana com base na comparação entre municípios.

A hipótese desta pesquisa investiga se há integração entre planejamento urbano, sustentabilidade (ambiental) e legislação brasileira na atualidade.

O objetivo desta pesquisa foi procurar uma visão contextual e atualizada do planejamento urbano a partir de uma relação sistêmica com a sustentabilidade e a legalidade.

METODOLOGIA CIENTÍFICA

Para o desenvolvimento deste trabalho foram realizadas pesquisas bibliográficas em normas legais, além de artigos científicos brasileiros e estrangeiros. O período experimental foi de 03 de abril a 23 de junho de 2014. Foi realizada uma pesquisa qualitativa segundo Marconi & Lakatos (2010) e exploratória com base em Gil (2010).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Planejamento urbano e sustentabilidade ambiental são temas que devem andar juntos, pois, atualmente, existe a necessidade prática de incluir no primeiro a premência executiva do segundo. No atual panorama mundial e nacional, não há mais possibilidade de realizar o planejamento de uma cidade sem se considerar a questão da sustentabilidade. Nesse diapasão, a expressão “planejamento urbano sustentável” pode ser interpretada como redundante, pois não existe como fazer o planejamento de uma cidade sem que este tenha como diretriz a sustentabilidade. Provavelmente, isso não seria perceptível há alguns anos quando a questão ambiental não era considerada tão importante e o desenvolvimento econômico era a única palavra de ordem.

É possível encontrar na literatura expressões como “sustentabilidade econômica”, “sustentabilidade social”, “sustentabilidade empresarial”, dentre outras. Considerando o foco do planejamento urbano, o conceito de sustentabilidade e meio ambiente se entrelaçam, não existindo o primeiro sem o segundo.

Resolvida a questão da vinculação entre planejamento urbano e sustentabilidade (ambiental), há a necessidade de se identificar, claramente, quem deve ser responsável pela execução desse planejamento. O munícipio é o responsável pelo planejamento urbano conforme a Constituição Federal do Brasil (1988) e todos, ainda interpretando a Carta Magna, são responsáveis pela proteção dinâmica ao meio ambiente, entendido aqui como sustentabilidade. A palavra “todos” significa o Estado e a coletividade, os moradores das cidades também. Além disso, a Lei 9.605 (1998) não deixa dúvidas de que tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica são responsáveis pelo meio ambiente.

A partir do entendimento da vinculação entre planejamento urbano e sustentabilidade ambiental, e a identificação dos protagonistas desses atos, questiona-se sobre a existência ou não de instrumentos para a realização dessa tarefa. O Estatuto da Cidade (2001) apresenta instrumentos para a realização de um planejamento urbano (sustentável), assim como a quem cabe fiscalizar desde a elaboração do plano diretor. O plano diretor é um alicerce desse planejamento, e como bem disseram Silva & Aguiar Filho (2013), esse instrumento ajuda a direcionar a cidade para o sentido de melhoria na qualidade de vida.

Dentre os instrumentos importantes para a elaboração do planejamento urbano (sustentável) encontra-se o estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV). Eis um ponto importante do EIV: dentre os conflitos que surgem na elaboração do planejamento urbano (sustentável) muitos advêm da colisão de interesses e até de direitos, estes geralmente pacificados pele Justiça ou pela Arbitragem.

Mas os conflitos não são somente em relação à vizinhança, pois na busca pela qualidade de vida o cidadão tem confrontado com os interesses econômicos. Muito se tem noticiado sobre o poder que têm os interesses econômicos, no mundo inclusive, não cabendo, aqui, mais polêmicas sobre isso; porém, a discussão enfatizada nesta pesquisa transborda: qual a força que tem a necessidade de qualidade de vida na cidade - em relação à saúde física e mental - frente aos interesses econômicos? Carvalho (2013) aponta nessa mesma direção, inclusive mostrando que os conflitos de interesses na cidade têm aumentado.

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Tudo o que já foi discutido até este ponto leva a uma interpretação realista sobre o planejamento urbano, ou seja, é um conjunto de atos formando um corpo complexo, e assim esta pesquisa está corroborando com Kennedy et al., 2011).

A dinâmica e delicadeza social da temática sustentabilidade de uma cidade justificam um pouco mais de cuidado com esse tema; também, não se deve esquecer-se da relatividade do conceito de cidade sustentável, conforme Childers et al. (2014) denotou. Enquanto não se tem mais dúvidas da vinculação entre planejamento urbano com a sustentabilidade, os detalhes dos efeitos desta sobre a cidade - lato sensu – merece mais análise e discussão.

A cidade gere a sustentabilidade através de dispositivos que autorizam ou não determinada atividade, sendo um deles o licenciamento ambiental. O licenciamento é o dispositivo (ou instrumento) que autoriza a execução de algo que antes não era permitido em uma cidade. Infelizmente, não se discute devidamente o licenciamento ambiental nas cidades brasileiras (Araújo & Costa, 2012), e isso pode ser observado no fracasso da participação da comunidade em audiências públicas. Não seria estranho, assim, que muitas vezes o planejamento urbano não seja uma legítima expressão de cidadania, ainda.

A qualidade de vida de uma cidade pode mostrar o quanto ela é sustentável e o quanto os seus administradores são competentes e comprometidos com o planejamento urbano. Enquanto realizar o planejamento urbano é uma ordem legal aos municípios, faze-lo de forma sustentável nem sempre é uma obrigação cumprida na amplitude da sua legalidade; não obstante, cabe à administração pública municipal defender a sustentabilidade local (Brasil, 2013), sendo a qualidade de vida um indicador de como ela é conduzida (ARAÚJO, M. & CÂNDIDO, G., 2014). Talvez, aqui fique um alerta aos políticos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados permitiram entender que existem grandes diferenças na interpretação do planejamento urbano associado à sustentabilidade, e essas diferenças parecem ser pouco reguladas pela questão legal. Isso provavelmente acontece porque a legislação não consegue fazer essa regulação pela presença de muitas variáveis no planejamento urbano (sustentável), ou em outra conotação, por ser esse tipo de planejamento um sistema complexo.

A perspectiva de planejamento urbano, sustentabilidade e legalidade apresentada neste trabalho permitiu considerar que o planejamento da cidade precisa ser aperfeiçoado para fazer cumprir as normas legais, e estas deveriam evoluir na mesma velocidade em que as cidades estão evoluindo.

Foi possível inferir que o planejamento urbano é intimamente dependente da sustentabilidade e da legislação, e que a qualidade de vida é um indicador de uma cidade sustentável.

REFERÊNCIAS

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Trata-se de uma pesquisa atualizada elaborada dentro da rigorosidade da metodologia científica, abordando um tema de importância atual. Esta pesquisa busca oferecer ferramentas para a área do Direito ampliando o conhecimento sobre planejamento urbano. Está dentro da política desta revista.

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