Provas Processuais Penais

Interceptação telefônica e telemática na legislação brasileira e jurisprudência atual do Supremo Tribunal Federal

23/07/2014 às 18:37
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Discorre sobre as provas no âmbito processual penal, aprofundando sobre o tema com relação às interceptações das comunicações telefônicas e telemáticas. Quanta a estas, aborda as questões de maior relevo tratados na legislação e jurisprudência do STF.

PROVAS PROCESSUAIS PENAIS: INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA E TELEMÁTICA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E JURISPRUDÊNCIA ATUAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

Waldek Fachinelli Cavalcante

                                                                            

 

Brasília, 15 de fevereiro de 2014

 

 

 

 

 

            Por inúmeras razões, o tema provas no direito processo penal é dos mais instigantes, tornando acalorados os debates dogmáticos a sua volta, sendo sempre tema de divergências políticas, ideológicas, doutrinárias e jurisprudenciais.

Entre os motivos para isto, está a história de abusos na produção de provas; serem o cerne do processo penal, pois através delas o julgador reconstrói fatos passados, permitindo tomar uma decisão; o fim a que se destinam, pois uma pessoa pode ser duramente apenada, podendo levar à privação de liberdade, conforme a convicção que leve ao juiz; temos ainda a questão relativa ao conflito entre direitos fundamentais na busca de provas; a questão das provas ilícitas, entre outros fatores que geram discórdias.

Por tudo isto, o conhecimento do assunto deve ser o mais profundo possível, bebendo sempre o estudioso na fonte da Constituição e na teoria dos direitos fundamentais, para não serem repetidos erros do passado não tão distante.

No papel de meio para a reconstrução de fatos passados, o processo penal tem o fim de propiciar ao julgador saber o que aconteceu em um momento pretérito, sendo as provas os intrumentos através dos quais a história será recontada, convencendo o juiz.[1]

As provas exercem, assim, um papel destacado no decorrer do processo, em sua ritualística, legitimando a futura decisão judicial.

A palavra prova tem vários sentidos, podendo ser tomada como fonte, manifestação, atividade, resultado, meio de prova, meio de obtenção de prova entre outros.

Podem ser definidas como os meios utilizados pelos sujeitos processuais para demonstrar os fatos da causa, aqueles deduzidos pelas partes, é a verificação do tema a ser provado. Têm por objeto o acontecimento, o fato, a coisa a ser de conhecimento do juiz, com o fim de decidir. Por outro lado, meios de prova são todos os recursos utilizados para se conhecer a verdade dos fatos, sendo exemplos de meios de prova o depoimento de testemunha, as perícias, documentos, entre outros.[2]

Neste contexto, o Judiciário tem um papel fundamental na sua produção em juízo, fazendo-se respeitar os trilhos da lei e procurando ao máximo uma boa instrução, propiciando às partes o pleno direito à prova, para que possa emitir uma decisão justa.

Como garantia do devido processo legal, o direito à prova tem inúmeras faces: direito de requerer a produção da prova; direito a que o juiz decida sobre o pedido de produção da prova; direito a que, deferida a prova, esta seja realizada, tomando-se todas as providências necessárias para sua produção; direito a participar da produção da prova; direito a que a produção da prova seja feita em contraditório; direito a que a prova seja produzida com a participação do juiz; direito a que, realizada a prova, possa manifestar-se a seu respeito; direito a que a prova seja objeto de avaliação pelo julgador.[3]

A prova tem, desta forma, natureza jurídica de direito subjetivo constitucional de demonstrar a verdade dos fatos, possuindo como princípios a comunhão da prova, liberdade da prova, contraditório, imediatidade do juiz, não auto-incriminação, proporcionalidade, o livre convencimento e a inadimissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos.

O Código de Processo Penal brasileiro não faz distinção entre meios de prova e meios de obtenção de prova, diferentemente do português. O CPP português define como meios de prova a prova testemunhal, as declarações do arguido, do assistente e das partes civis, prova por acareação, prova por reconhecimento, reconstituição do fato, prova pericial, prova documental. Indica, ainda, os meios de obtenção de prova: exames (das pessoas, dos lugares e das coisas); revistas e buscas; apreensões e escutas telefônicas.

Pode-se, desta arte, definir os meios de prova tal qual as declarações, coisas ou pessoas aptas a provocar o entendimento de quem decide sobre a ocorrência ou não de um fato e como ele se deu. Enquanto os meios de obtenção de provas são meios para aquisição das coisas, declarações e pessoas que podem esclarecer a verdade.

Como cerne deste estudo, abordamos a interceptação das comunicações telefônicas e telemáticas, um meio de obtenção de provas, conforme a legislação brasileira e sua interpretação pela Suprema Corte.

A Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo 5º, inciso X, dispõe que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

No mesmo artigo 5º, inciso XII, a Lei Maior estabelece ser inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no ultimo caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou intrução processual penal.

Como se vê, a Constituição garante a inviolabilidade das comunicações telefônicas, contudo, abre exceções para o caso de investigação e intrução criminal, conforme disciplina a ser estabelecida em lei.

Sendo meio excepcional de investigação, os operadores do sistema de justiça criminal devem estar atentos para a busca do equilíbrio entre a liberdade e a garantia de direitos fundamentais, diante da luta pela repressão e prevenção do crime.[4]

Para disciplinar o disposto na norma constitucional, o legislador editou a Lei 9.296/1996, a qual estabelece em seu artigo 1º que a interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça. Seu parágrafo único explica que o disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.

Além de decorrência da garantia da livre expressão do pensamento, o sigilo das comunicações reflete a proteção do direito à privacidade e à intimidade. A inconfidência da comunicação, sua captura por terceiros, impede que o emissor estabeleça a quem quer que chegue suas informações.

A Constituição autoriza, isto em casos específicos, a quebra do segredo somente nos casos de comunicações telefônicas, o que poderia levar-se à conclusão de que outros tipos de correspondência não poderiam ser violadas. Porém, na verdade, mesmo sem permissão clara do constituinte, como não existem direitos absolutos, o direito ao sigilo de outros tipos de comunicação pode ser restringido.[5]

Para garantir a sobrevivência de outros direitos fundamentais, é possível restringir o direito ao segredo da correspondência postal, telegráfica, telemática e outras, isto conforme o princípio da concordância prática entre cláusulas constitucionais, fazendo-se a ponderação entre princípios, utilizando-se a proporcionalidade.

Logo, como a Constituição só autorizou expressamente a violação das comunicações telefônicas, nas demais hipóteses a ponderação terá que ser feita caso a caso, para, em um juízo de proporcionalidade, poder ser determinada a quebra do sigilo ou não.

Logo, como o parágrafo único do artigo 1º da Lei 9.296/1996 estende sua disciplina às comunicações telemáticas e informáticas, pode parecer que o legislador se excedeu, sendo o dispositivo inconstitucional.

Ocorre que as mudanças tecnológicas ocorridas no mundo desde o ano de 1988 não encontram precedentes. A popularização dos computadores pessoais, o advento da internet e sua difusão, o uso massificado da telefonia celular e agora dos smartphones e outras tecnologias conectadas à internet fizeram com que os diferentes tipos de comunicação se integrassem, havendo uma confluência de tecnologias que não mais justificam plenamente as distinções feitas pelo constituinte.

Veja-se o caso emblemático da tecnologia VOIP, voz sobre IP (internet protocol), na qual a fala humana é transmitida via internet, muitas vezes sem os interlocutores nem saberem que a comunicação está sendo feita pela internet, pois o aparelho que usam é o mesmo utilizado na tradicional comunicação telefônica.

O mesmo se diga do correio eletrônico, o qual nada mais é que uma comunicação epistolar por meio telemático, seja usando telefonia ou não.

Esta convergência de tecnologias é um desafio para o interprete da Constituição, pois impossível ao legislador constitucional prevê-la à época. Assim, há a necessidade de conhecer as tecnologias para bem aplicar o arcabouço jurídico.

Por isso, diante do estado atual da arte, deve-se entender que é permitida a interceptação das comunicações telemáticas nos casos estabelecidos pela Lei regulamentadora, apesar de certa polêmica na doutrina.[6]

Observe-se que o Supremo Tribunal Federal considerou ilegais as interceptações telefônicas feitas entre a promulgação da Constituição Federal de 1988 e o advento da Lei regulamentadora da quebra do sigilo telefônico, considerando que o dispositivo da Carta Magna necessitava de regulamentação antes de seu emprego.[7]

Interessante notar que a Lei 9.296/96 tratou apenas da interceptação das comunicações, hipótese na qual a captação do fluxo transmitido é feita por pessoa diferente dos interlocutores, deixando de normatizar outras formas de ruptura da confidencialidade, tal como, por exemplo, a recepção telefônica com gravação clandestina, quando é realizada por uma das partes da conversa sem o consentimento do outro.

A lei poderia ter regulado esta última hipótese, pois abrangida pela permissão constitucional, porém não o fez, deixando uma lacuna em nossa legislação.

O STF entende que é legítima a gravação telefônica realizada por um dos interlocutores de oferta de vantagem indevida em troca de ato de ofício seu, não sendo prova ilícita a gravação por um dos interlocutores de conversa telefônica na qual lhe é feita proposta de suborno, configurando corrupção ativa. Afirma que esta hipótese nem configura interceptação telefônica, nem implica violação da intimidade ou dever de sigilo. Neste julgado, o Supremo faz distinção entre interceptação e receptação telefônica.[8]

Interessante observar a existência de posicionamento que defende que no caso de infração penal sujeita a ação penal pública incondicionada, em caso de flagrante delito, sendo a comunicação telefônica instrumento para a prática de crime, poderia o fluxo ser interceptado e gravado sem necessidade de autorização judicial ou consentimento de interlocutores.[9]

Este posição encontra subsídio no fato de a inviolabilidade do sigilo ser instituída para guardar direitos fundamentais, não como ferramenta de crime, ainda que não fosse meio para a prática do crime, poderia ser efetuada a quebra em casos como o de um sequestro em andamento.

Assim, nos casos em que estejam presentes as excludentes de ilicitude, como a legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular de direito, afastada estaria a ilicitude da interceptação/gravação, nos casos de infração penal em curso. Ora, se se pode a qualquer hora entrar em uma residência na qual esteja a ocorrer um crime, com muito mais razão se pode captar conversas.

Passando-se às exigências e hipóteses legais para a autorização judicial  de interceptação telefônica, temos na Lei 9.296/96, artigo 2º, as seguintes disposições:

Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:

        I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;

        II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;

        III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.

        Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

Por conseguinte, o legislador adotou a técnica de dizer quando não cabe a interceptação telefônica.

Em uma visão integral das normas constitucionais e dos artigos 1º e 2º da 9.296/96, anunciam-se os seguintes pressupostos para a autorização judicial da interceptação telefônica e telemática: indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal; prova da existência de infração penal; impossibilidade de realização da prova por outros meios disponíveis; o fato investigado ser punido com pena de reclusão.

Estabelecem-se, ainda, os seguintes requisitos para a petição de quebra do sigilo: indicação precisa do fato investigado, desde que possível; esclarecimento de quem são os investigados; mostra de ser a diligência necessária à apuração de infração penal; como a diligência será realizada; forma escrita ou, excepcionalmente, verbal, sendo, porém, reduzida a termo.

A medida pode ser decretada de ofício pelo juiz ou a requerimento da autoridade policial, na investigação criminal, ou do membro do Ministério Público, na investigação ou instrução criminal.

É preocupante permitir-se a iniciativa do Judiciário na determinação da medida, melhor deixá-la a cargo da Polícia, da mesma forma, deixa preocupações a possibilidade de ser deferida no curso do processo, atos que podem macular a imparcialidade do julgador.

Com o fito de dirimir incongruências, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 59/2008 que disciplina e uniformiza as rotinas visando ao aperfeiçoamento do procedimento de interceptação de comunicações telefônicas e de sistemas de informática nos órgãos jurisdicionais do Poder Judiciário, fazendo-se importante transcrever, devido a relevância do teor, o disposto quanto a decisão judicial, verbis:

Art. 10. Atendidos os requisitos legalmente previstos para deferimento da medida o Magistrado fará constar expressamente em sua decisão:

 

I - a indicação da autoridade requerente;

 

II - os números dos telefones ou o nome de usuário, e-mail ou outro identificador no caso de interceptação de dados;

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III - o prazo da interceptação;

 

IV - a indicação dos titulares dos referidos números;

 

V - a expressa vedação de interceptação de outros números não discriminados na decisão;

 

VI - os nomes das autoridades policiais responsáveis pela investigação e que terão acesso às informações;

 

VII - os nomes dos funcionários do cartório ou secretaria responsáveis pela tramitação da medida e expedição dos respectivos ofícios, podendo reportar-se à portaria do juízo que discipline a rotina cartorária.

 

§ 1º. Nos casos de formulação de pedido verbal de interceptação (artigo 4º, § 1º, da Lei nº 9.296/96), o funcionário autorizado pelo magistrado deverá reduzir a termo os pressupostos que autorizem a interceptação, tais como expostos pela autoridade policial ou pelo representante do Ministério Público.

 

§ 2º. A decisão judicial será sempre escrita e fundamentada.

 

 

            Questão das mais relevantes e sempre motivo de debate é quanto à duração da medida de obtenção de prova sob estudo, a qual, conforme o disposto no artigo 5º da Lei 9.296/96, poderá durar quinze dias, prorrogáveis por igual período de tempo. Contudo, são comuns inúmeras prorrogações da medida, o que provoca polêmica no que tange à legalidade de várias dilações.

            Apesar da polêmica, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal confirmou o entendimento sobre a possibilidade de prorrogação do prazo de 15 dias para interceptação telefônica por períodos sucessivos, principalmente em casos complexos, não havendo que se falar em nulidade das escutas deferidas sucessivamente.[10]

            Sempre que a diligência de interceptação permitir a coleta de comunicações, estas deverão ser transcritas, devendo a autoridade policial encaminhar ao juízo competente os resultados, em auto circunstanciado, com um resumo das operações, sendo que, para a execução das diligências, poderão ser requisitados serviços e técnicos das concessionárias de serviço público, conforme artigos 7º e 8º da Lei em comento.

            Extremamente salutar foi a tipificação penal, inserida na mesma Lei 9.296/96, do ato de quem realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei, proteção adequada ao direito violado.

            Outro tema relevante, no que pertine a interceptação do fluxo de comunicações, é a descoberta de outros crimes durante a diligência e a possibilidade desta prova ser utilizada em outros processos.

            A doutrina tem, em geral, admitido a utilização da prova emprestada, entretanto, em diferentes graus.

            Há aqueles que defendem o aproveitamento da prova fortuitamente encontrada de outros crimes além do objeto de investigação, desde que sejam conexos com o crime investigado e de responsabilidade do mesmo autor, permitindo seu emprego até mesmo em processos cíveis.[11]

            Para outros, a prova pode ser utilizada amplamente, sejam os crimes conexos ou não, sejam os mesmos autores ou não, independentemente da espécie de pena, visto que a Lei de Interceptação promove restrição do uso da diligência em estudo aos crimes sujeitos a pena de reclusão.[12]

            O Supremo Tribunal Federal tem admitido a utilização da prova emprestada, inclusive para emprego em procedimento administrativo disciplinar, contra as mesmas pessoas investigadas ou outros cujos atos ilícitos tenham sido descobertos mediante o uso da medida de interceptação.[13]

            O que se percebe é que a utilização da prova emprestada dependerá, principalmente para utilização em processos não criminais, de juízo de ponderação de valores.

            Os aspectos acima abordados são aqueles de maior preocupação da jurisprudência e doutrina. Um meio de obtenção de prova tão invasivo deve ser usado com comedimento e, mesmo durante seu emprego, aplicado com respeito aos direitos fundamentais. A ética sempre pede passagem.

            No anexo, trazemos mais algumas decisões recentes do Supremo Tribunal Federal Brasileiro sobre o tema.

           

       

BIBLIOGRAFIA

ANDRADE, Manuel da Costa Andrade; DIAS, Jorge de Figueiredo Dias. Criminologia: O homem delinquente e a sociedade criminógena. Coimbra: Coimbra Editora, 1992.

BARROSO, Luís Roberto. Temas de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. A Constituição e o Supremo. 5. ed. Brasília: Secretaria de Documentação, 2012.

GOMES CANOTILHO, J.J. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7.ed. Coimbra: Almedina, 2008.

FEITOZA, Denilson. Direito Processual Penal: teoria, crítica e praxis. 7. ed. Niterói: Impetus, 2010.

FERNANDES, Antônio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7.ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

FELDENS, Luciano. Direitos fundamentais e direito penal: A Constituição penal. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.

JUNIOR, Aury Lopes. Direito Processual Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

VALENTE, Manuel Monteiro Guedes. Processo Penal. Tomo I. 3. ed. Coimbra: Almedina, 2010.

ANEXO

Consoante dispõe o inciso XII do art. 5o da CF, mostra-se inadequado o compartilhamento de prova que, no campo da exceção -- afastamento da privacidade --, implicou interceptação telefônica determinada por órgão judicial e para efeito específico, ou seja, investigação criminal ou instrução processual penal.” (Inq 3.014-AgR, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 13-12- 2012, Plenário, DJE de 23-9-2013.)

 “Elementos dos autos que evidenciam não ter havido investigação preliminar para corroborar o que exposto em denúncia anônima. O STF assentou ser possível a deflagração da persecução penal pela chamada denuncia anônima, desde que esta seja seguida de diligências realizadas para averiguar os fatos nela noticiados antes da instauração do inquérito policial. (...) A interceptação telefônica é subsidiária e excepcional, só podendo ser determinada quando não houver outro meio para se apurar os fatos tidos por criminosos, nos termos do art. 2o, II, da Lei 9.296/1996. (...) Ordem concedida para se declarar a ilicitude das provas produzidas pelas interceptações telefônicas, em razão da ilegalidade das autorizações, e a nulidade das decisões judiciais que as decretaram amparadas apenas na denúncia anônima, sem investigação preliminar.” (HC 108.147, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 11-12-2012, Segunda Turma, DJE de 1o-2-2013.)

"Decisão que autoriza interceptação telefônica redigida de forma sucinta, mas que se reporta ao preenchimento dos requisitos dos arts. 1o, 2o e 3o da Lei 9.296/1996 e ao conteúdo da representação policial na qual os elementos probatórios existentes contra os investigados estavam relacionados. Desfecho das interceptações que confirma a fundada suspeita que as motivou, tendo sido apreendidas drogas e revelada a existência de grupo criminoso envolvido na atividade ilícita. Invalidade patente não reconhecida." (HC 103.817, rel. min. Rosa Weber, julgamento em 15-5-2012, Primeira Turma, DJE de 29-5-2012.)

"Crimes de rufianismo e favorecimento da prostituição. Interceptação telefônica realizada pela Polícia Militar. Nulidade. Não ocorrência. Medida executada nos termos da Lei 9.296/1996 (requerimento do Ministério Público e deferimento pelo juízo competente). Excepcionalidade do caso: suspeita de envolvimento de autoridades policiais da delegacia local." (HC 96.986, rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 15-5-2012, Segunda Turma, DJE de 14-9-2012.)

"Nos termos do art. 7o, II, da Lei 8.906/1994, o Estatuto da Advocacia garante ao advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia. Na hipótese, o magistrado de primeiro grau, por reputar necessária a realização da prova, determinou, de forma fundamentada, a interceptação telefônica direcionada às pessoas investigadas, não tendo, em momento algum, ordenado a devassa das linhas telefônicas dos advogados dos pacientes. Mitigação que pode, eventualmente, burlar a proteção jurídica. Sucede que, no curso da execução da medida, os diálogos travados entre o paciente e o advogado do corréu acabaram, de maneira automática, interceptados, aliás, como qualquer outra conversa direcionada ao ramal do paciente. Inexistência, no caso, de relação jurídica cliente-advogado. Não cabe aos policiais executores da medida proceder a uma espécie de filtragem das escutas interceptadas. A impossibilidade desse filtro atua, inclusive, como verdadeira garantia ao cidadão, porquanto retira da esfera de arbítrio da polícia escolher o que é ou não conveniente ser interceptado e gravado. Valoração, e eventual exclusão, que cabe ao magistrado a quem a prova é dirigida." (HC 91.867, rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 24-4-2012, Segunda Turma, DJE de 20-9-2012).

"(...) imperioso concluir que a mera alusão ao 'requerimento' do Parquet e/ou da autoridade policial não se mostra suficiente para legitimar a quebra dos sigilos telefônico e bancário dos pacientes. A referência -- argumento de autoridade -- não passa pelo crivo da proporcionalidade, na medida em que não apresenta motivação idônea para fazer ceder a essa situação excepcional de ruptura da esfera da intimidade de quem se encontra sob investigação. Na espécie, em momento algum, o magistrado de primeiro grau aponta fatos concretos que justifiquem a real necessidade da quebra desses sigilos. (...) Nesse diapasão, por reputar que as decisões judiciais prolatadas pelo juízo de origem encontram-se destituídas da devida fundamentação -- o que as tornam desvestidas de eficácia jurídica --, entendo que as interceptações telefônicas e as informações financeiras obtidas constituem provas ilícitas, devendo, dessa forma, ser desentranhadas do processo." (HC 96.056, voto do rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 28-6-2011, Segunda Turma, DJE de 8-5-2012.) Vide HC 80.724, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 20-3-2001, Primeira Turma, DJ de 18-5-2001.

"Eventuais deficiências qualitativas na tradução do material degravado não invalidam a prova regularmente colhida, devendo o tema ser tratado no curso da instrução da ação penal, considerados os limites do habeas corpus." (HC 106.244, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 17-5-2011, Primeira Turma, DJE de 19-8-2011.)

"A alegação de que conversas telefônicas do paciente foram interceptadas por policiais civis sem autorização judicial vem isolada nos autos, havendo neles informação específica quanto ao procedimento autônomo instaurado perante o Juízo Corregedor da Polícia Judiciária do Estado de São Paulo, no qual a interceptação foi autorizada. É competente o Juízo da Vara das Execuções Criminais e Anexo da Corregedoria dos Presídios e Polícia Judiciária para conhecer de investigação e autorizar interceptações telefônicas, nos termos de regra de competência estadual. Demonstrado que o órgão da persecução penal obteve legitimamente novos elementos de informação a partir de fonte autônoma de prova -- que não guarde qualquer relação de dependência nem decorra de prova originariamente ilícita, com essa não mantendo vinculação causal --, tais dados probatórios revelar-se-ão plenamente admissíveis, porque não contaminados pela mácula de eventual ilicitude originária. Conjunto probatório que, ademais, não se resume às evidências colhidas ao longo da interceptação telefônica." (HC 101.584, rel. min. Dias Toffoli, julgamento em 5-4-2011, Primeira Turma, DJE de 10-5-2011.)

"O terminal telefônico criado internamente por operadora de telefonia, com o simples fim de efetuar desvio de chamadas de um terminal objeto de interceptação judicial, é alcançado pela medida constritiva incidente sobre este último." (HC 96.156, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 16-11-2010, Segunda Turma, DJE de 1o-2-2011.)

“(...) as decisões que, como no presente caso, autorizam a prorrogação de interceptação telefônica sem acrescentar novos motivos evidenciam que essa prorrogação foi autorizada com base na mesma fundamentação exposta na primeira decisão que deferiu o monitoramento.” (HC 92.020, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 21-9-2010, Segunda Turma, DJE de 8-11-2010.) No mesmo sentido: HC 100.172, rel. min. Dias Toffoli, julgamento em 21-2-2013, Plenário, DJE de 25-9-2013.

"(...) a Lei 9.296/1996 nada mais fez do que estabelecer as diretrizes para a resolução de conflitos entre a privacidade e o dever do estado de aplicar as leis criminais. Em que pese ao caráter excepcional da medida, o inciso XII possibilita, expressamente, uma vez preenchidos os requisitos constitucionais, a interceptação das comunicações telefônicas. E tal permissão existe, pelo simples fato de que os direitos e garantias constitucionais não podem servir de manto protetor a práticas ilícitas. (...) Nesse diapasão, não pode vingar a tese da impetração de que o fato de a autoridade judiciária competente ter determinado a interceptação telefônica dos pacientes, envolvidos em investigação criminal, fere o direito constitucional ao silêncio, a não autoincriminação." (HC 103.236, voto do rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 14-6-2010, Segunda Turma, DJE de 3-9-2010.)

"Interceptação realizada em linha telefônica do corréu que captou diálogo entre este e o ora paciente, mediante autorização judicial. Prova lícita que pode ser utilizada para subsidiar ação penal, sem contrariedade ao art. 5o, XII, LIV, LV e LVI, da CR." (HC 102.304, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 25-5-2010, Primeira Turma, DJE de 25-5-2011.) Vide HC 83.515, rel. min. Nelson Jobim, julgamento em 16-9-2004, Plenário, DJ de 4-3-2005.

"Ante o devido processo legal, cumpre acolher diligência visando a esclarecer a legitimidade de interceptações telefônicas." (HC 99.646, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 9-2-2010, Primeira Turma, DJE de 26-3-2010.)

"As rasuras ou borrões de números telefônicos que seriam objeto de interceptação não afastam, só por si, a legalidade da prova obtida no curso da investigação, mormente quando as diligências foram judicialmente autorizadas. Ademais, segundo consta dos autos, as rasuras foram apostas em cópias das decisões fornecidas pela Polícia Federal, após a realização das investigações, sendo que a relação completa dos números de telefones interceptados ficou à disposição da defesa, nos feitos preparatórios à ação penal, no cartório do Juízo. Observo da representação da autoridade policial para quebra de sigilo telefônico que a diligência requerida visava apurar o eventual envolvimento dos usuários das linhas telefônicas com o tráfico ilícito de entorpecentes e estava calcada em relatório de investigações realizadas pela Polícia Federal. No entanto, o referido relatório não foi juntado aos autos pelos impetrantes, o que inviabiliza a constatação dos nomes dos investigados." (HC 96.909, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 17-11-2009, Segunda Turma, DJE de 11-12-2009.)

"É lícita a interceptação telefônica, determinada em decisão judicial fundamentada, quando necessária, como único meio de prova, à apuração de fato delituoso. (...) É lícita a prorrogação do prazo legal de autorização para interceptação telefônica, ainda que de modo sucessivo, quando o fato seja complexo e, como tal, exija investigação diferenciada e contínua. (...) O ministro relator de inquérito policial, objeto de supervisão do STF, tem competência para determinar, durante as férias e recesso forenses, realização de diligências e provas que dependam de decisão judicial, inclusive interceptação de conversação telefônica. (...) O disposto no art. 6o, § 1o, da Lei federal 9.296, de 24-7-1996, só comporta a interpretação sensata de que, salvo para fim ulterior, só é exigível, na formalização da prova de interceptação telefônica, a transcrição integral de tudo aquilo que seja relevante para esclarecer sobre os fatos da causa sub iudice." (Inq 2.424, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 26-11-2008, Plenário, DJE de 26-3-2010.) No mesmo sentido: HC 99.619, rel. p/ o ac. min. Rosa Weber, julgamento em 14-2-2012, Primeira Turma, DJE de 22-3-2012; HC 103.418, rel. min. Dias Toffoli, julgamento em 18-10-2011, Primeira Turma, DJE de 14-11-2011; HC 106.244, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 17-5-2011, Primeira Turma, DJE de 19-8- 2011; HC 105.527, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 29-3-2011, Segunda Turma, DJE de 13-5-2011; HC 92.020, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 21-9-2010, Segunda Turma, DJE de 8-11-2010.

"Se o juízo que, originalmente, deferiu interceptação telefônica, remeteu, por incompetência reconhecida perante as investigações ulteriores, os autos do procedimento a outro órgão, não pode ser tido como coator em relação à ação penal subsequente, cuja denúncia se fundou nessa prova." (RHC 87.198, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 25-11-2008, Segunda Turma, DJE de 6-2-2009.)

"Não há interceptação telefônica quando a conversa é gravada por um dos interlocutores, ainda que com a ajuda de um repórter." (RE 453.562-AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 23-9-2008, Segunda Turma, DJE de 28-11-2008.)

"Processo é, acima de tudo, documentação, exigindo-se a forma escrita relativamente à prova. Daí serem os depoimentos inseridos em termo, o mesmo devendo ocorrer, uma vez bem sucedida a interceptação telefônica. Não bastasse essa premissa, vê-se que a Lei 9.296, de 24-7-1996, é categórica ao prever, no § 1o do art. 6o, que, no caso de a diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição. Assim, a formalidade imposta por lei é essencial à valia da prova, viabilizando-se, com isso, o conhecimento da conversação interceptada e, portanto, o exercício de direito de defesa pelo acusado, a atuação do próprio ministério público e do órgão julgador. Descabe cogitar, em substituição ao que previsto em lei, do acesso às fitas, da audição pelo órgão julgador na oportunidade de proferir sentença." (HC 83.983, voto do rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 4-12-2007, Primeira Turma, DJE de 23-5-2008.)

"Dados obtidos em interceptação de comunicações telefônicas e em escutas ambientais, judicialmente autorizadas para produção de prova em investigação criminal ou em instrução processual penal, podem ser usados em procedimento administrativo disciplinar, contra a mesma ou as mesmas pessoas em relação às quais foram colhidos, ou contra outros servidores cujos supostos ilícitos teriam despontado à colheita dessa prova." (Inq 2.424-QO- QO, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 20-6-2007, Plenário, DJ de 24-8-2007.) No mesmo sentido: HC 102.293, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 24-5-2011, Segunda Turma, DJE de 19-12-2011.

"Pedido de liminar para garantir à defesa do paciente o acesso à transcrição integral das escutas telefônicas realizadas no inquérito. Alegação de ofensa ao princípio do devido processo legal (art. 5o, LV, da CF): inocorrência: liminar indeferida. É desnecessária a juntada do conteúdo integral das degravações das escutas telefônicas realizadas nos autos do inquérito no qual são investigados os ora pacientes, pois bastam que se tenham degravados os excertos necessários ao embasamento da denúncia oferecida, não configurando, essa restrição, ofensa ao princípio do devido processo legal (art. 5o, LV, da CF). Liminar indeferida." (HC 91.207-MC, rel. p/ o ac. min. Cármen Lúcia, julgamento em 11-6-2007, Plenário, DJ de 21-9-2007.) No mesmo sentido: HC 117.000, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 13-8- 2013, Primeira Turma, DJE de 16-10-2013; Inq 2.774, rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 28-4-2011, Plenário, DJE de 6-9-2011; AI 685.878-AgR, rel. min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 5-5-2009, Primeira Turma, DJE de 12-6-2009.

"É possível a prorrogação do prazo de autorização para a interceptação telefônica, mesmo que sucessivas, especialmente quando o fato é complexo a exigir investigação diferenciada e contínua. Não configuração de desrespeito ao art. 5o, caput, da Lei 9.296/1996. A interceptação telefônica foi decretada após longa e minuciosa apuração dos fatos por CPI estadual, na qual houve coleta de documentos, oitiva de testemunhas e audiências, além do procedimento investigatório normal da polícia. Ademais, a interceptação telefônica é perfeitamente viável sempre que somente por meio dela se puder investigar determinados fatos ou circunstâncias que envolverem os denunciados. Para fundamentar o pedido de interceptação, a lei apenas exige relatório circunstanciado da polícia com a explicação das conversas e da necessidade da continuação das investigações. Não é exigida a transcrição total dessas conversas o que, em alguns casos, poderia prejudicar a celeridade da investigação e a obtenção das provas necessárias (art. 6o, § 2o, da Leo 9.296/1996). Na linha do art. 6o, caput, da Lei 9.296/1996, a obrigação de cientificar o Ministério Público das diligências efetuadas é prioritariamente da polícia. O argumento da falta de ciência do MP é superado pelo fato de que a denúncia não sugere surpresa, novidade ou desconhecimento do procurador, mas sim envolvimento próximo com as investigações e conhecimento pleno das providências tomadas. Uma vez realizada a interceptação telefônica de forma fundamentada, legal e legítima, as informações e provas coletas dessa diligência podem subsidiar denúncia com base em crimes puníveis com pena de detenção, desde que conexos aos primeiros tipos penais que justificaram a interceptação. Do contrário, a interpretação do art. 2o, III, da Lei 9.296/1996 levaria ao absurdo de concluir pela impossibilidade de interceptação para investigar crimes apenados com reclusão quando forem estes conexos com crimes punidos com detenção." (HC 83.515, rel. min. Nelson Jobim, julgamento em 16-9-2004, Plenário, DJ de 4-3-2005.) No mesmo sentido: HC 102.601, rel. min. Dias Toffoli, julgamento em 4-10-2011, Primeira Turma, DJE de 3-11-2011; HC 104.934, rel. p/ o ac. min. Luiz Fux, julgamento em 20-9-2011, Primeira Turma, DJE de 6-12-2011; AI 626.214-AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 21-9-2010, Segunda Turma, DJE de 8-10-2010. Vide HC 102.304, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 25-5-2010, Primeira Turma, DJE de 25-5-2011.

"Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado -- interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial --, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994, art. 7o, XIV), da qual -- ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas -- não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade. A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5o, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações. O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. Lei 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em consequência a autoridade policial de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório." (HC 82.354, rel. min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 10-8-2004, Primeira Turma, DJ de 24-9- 2004.) No mesmo sentido: HC 94.387, rel. min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 18- 11-2008, Primeira Turma, DJE de 6-2-2009.

"Interceptação telefônica: exigência de autorização do 'juiz competente da ação principal' (Lei 9.296/1996, art. 1o): inteligência. Se se cuida de obter a autorização para a interceptação telefônica no curso de processo penal, não suscita dúvidas a regra de competência do art. 1o da Lei 9.296/1996: só ao juiz da ação penal condenatória -- e que dirige toda a instrução --, caberá deferir a medida cautelar incidente. Quando, no entanto, a interceptação telefônica constituir medida cautelar preventiva, ainda no curso das investigações criminais, a mesma norma de competência há de ser entendida e aplicada com temperamentos, para não resultar em absurdos patentes: aí, o ponto de partida à determinação da competência para a ordem judicial de interceptação -- não podendo ser o fato imputado, que só a denúncia, eventual e futura, precisará --, haverá de ser o fato suspeitado, objeto dos procedimentos investigatórios em curso. Não induz à ilicitude da prova resultante da interceptação telefônica que a autorização provenha de juiz federal -- aparentemente competente, à vista do objeto das investigações policiais em curso, ao tempo da decisão -- que, posteriormente, se haja declarado incompetente, à vista do andamento delas." (HC 81.260, rel. min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 14-11-2001, Plenário, DJ de 19-4-2002.) No mesmo sentido: HC110.496, rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 9-4-2013, Segunda Turma, Informativo 701; HC 102.293, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 24-5-2011, Segunda Turma, DJE de 19-12-2011.

"Interceptação telefônica. Prova ilícita. Autorização judicial deferida anteriormente à Lei 9.296/1996, que regulamentou o inciso XII do art. 5o da CF. Nulidade da ação penal, por fundar-se exclusivamente em conversas obtidas mediante quebra dos sigilos telefônicos dos pacientes." (HC 81.154, rel. min. Maurício Corrêa, julgamento em 2-10-2001, Segunda Turma, DJ de 19-12-2001). No mesmo sentido: HC 74.116, rel. p/ o ac. min. Maurício Corrêa, julgamento em 5-11-1996, Segunda Turma, DJ de 14-3-1997.

"Não cabe anular-se a decisão condenatória com base na alegação de haver a prisão em flagrante resultado de informação obtida por meio de censura telefônica deferida judicialmente. É que a interceptação telefônica -- prova tida por ilícita até a edição da Lei 9.296, de 24-7-1996, e que contaminava as demais provas que dela se originavam -- não foi a prova exclusiva que desencadeou o procedimento penal, mas somente veio a corroborar as outras licitamente obtidas pela equipe de investigação policial." (HC 74.599, rel. min. Ilmar Galvão, julgamento em 3-12-1996, Primeira Turma, DJ de 7-2-1997.)

"O art. 5o, XII, da Constituição, que prevê, excepcionalmente, a violação do sigilo das comunicações telefônicas para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, não é autoaplicável: exige lei que estabeleça as hipóteses e a forma que permitam a autorização judicial. Precedentes. Enquanto a referida lei não for editada pelo Congresso Nacional, é considerada prova ilícita a obtida mediante quebra do sigilo das comunicações telefônicas, mesmo quando haja ordem judicial (CF, art. 5o, LVI). O art. 57, II, a, do Código Brasileiro de Telecomunicações não foi recepcionado pela atual Constituição, a qual exige numerus clausus para a definição das hipóteses e formas pelas quais é legítima a violação do sigilo das comunicações telefônicas. A garantia que a Constituição dá, até que a lei o defina, não distingue o telefone público do particular, ainda que instalado em interior de presídio, pois o bem jurídico protegido é a privacidade das pessoas, prerrogativa dogmática de todos os cidadãos. As provas obtidas por meios ilícitos contaminam as que são exclusivamente delas decorrentes; tornam-se inadmissíveis no processo e não podem ensejar a investigação criminal e, com mais razão, a denúncia, a instrução e o julgamento (CF, art. 5o, LVI), ainda que tenha restado sobejamente comprovado, por meio delas, que o juiz foi vítima das contumélias do paciente." (HC 72.588, rel. min. Maurício Corrêa, julgamento em 12-6-1996, Plenário, DJ de 4- 8-2000.) No mesmo sentido: HC 74.586, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 5-8-1997, Segunda Turma, DJ de 27-4-2001.

"O STF, por maioria de votos, assentou entendimento no sentido de que sem a edição de lei definidora das hipóteses e da forma indicada no art. 5o, XII, da Constituição não pode o juiz autorizar a interceptação de comunicação telefônica para fins de investigação criminal. Assentou, ainda, que a ilicitude da interceptação telefônica -- à falta da lei que, nos termos do referido dispositivo, venha a discipliná-la e viabilizá-la -- contamina outros elementos probatórios eventualmente coligidos, oriundos, direta ou indiretamente, das informações obtidas na escuta." (HC 73.351, rel. min. Ilmar Galvão, julgamento em 9-5-1996, Plenário, DJ de 19-3-1999.) No mesmo sentido: HC 69.912-segundo, rel. min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 16-12-1993, Plenário, DJ de 25-3-1994.


[1] JUNIOR, Aury Lopes. Direito Processual Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

[2] RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

[3] FERNANDES, Antônio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7.ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

[4] VALENTE, Manuel Monteiro Guedes. Processo Penal. Tomo I. 3. ed. Coimbra: Almedina, 2010.

[5] MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

[6] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

[7] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC nº 73.351/1996. Plenário. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Sessão 9/5/1996 . Diário da Justiça da União, Brasília, DF, 19 de março. 1999.

[8] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AGA nº 232123/SP. 1ª Turma. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Diário da Justiça da União, Brasília, DF, 9 de abril. 2001.

[9] FEITOZA, Denilson. Direito Processual Penal: teoria, crítica e praxis. 7. ed. Niterói: Impetus, 2010.

[10] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Notícias do STF. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=201926>. Acesso em: 15.10.2013.

[11] FERNANDES, Antônio Scarance. Processo Penal Constitucional. 7.ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

[12] FEITOZA, Denilson. Direito Processual Penal: teoria, crítica e praxis. 7. ed. Niterói: Impetus, 2010.

[13] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inq. 2.424 – QO- QO. Plenário. Relator: Ministro Cezar Peluso. Diário da Justiça da União, Brasília, DF, 24 de agosto. 2007.

Sobre o autor
Waldek Fachinelli Cavalcante

Mestre em Criminologia e Investigação Criminal; Especialista em Direito Constitucional; Especialista em Direito Ambiental e Urbanístico; Delegado de Polícia da PCDF.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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