Nulidade do aval, do interveniente garante e outras garantias em cédula rural pignoratícia e hipotecária.

Aplicabilidade do artigo 60, parágrafos segundo e terceiro, do Decreto 167/1967

Leia nesta página:

Nulo é o aval, como também são nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, uma vez que as cédulas rurais pignoratícias e hipotecárias não podem ter outra garantia exceto a oferecida pelo próprio emitente.

Segundo o ordenamento pátrio, aquele que chama a si, no contrato, responsabilidade pelo cumprimento de todas as obrigações, principais e acessórias, é denominado de interveniente garantidor, devedor solidário ou mesmo de avalista.

Acontece que a garantia do aval ou interveniente garante exigida pelos bancos, é totalmente nula de pleno Direito, em conformidade com o quanto estabelecido no artigo 60, §§ 2º e 3º, do Decreto-lei 167/67:

"Art. 60. Aplicam-se á cédula de crédito rural, à nota promissória rural e à duplicata rural, no que forem cabíveis, as normas de direito cambial, inclusive quanto ao aval, dispensado porém o protesto para assegurar o direito de regresso contra endossantes e seus avalistas.

§ 2º. É nulo o aval dado em Nota Promissória Rural ou Duplicata Rural, salvo quando dado pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente ou por outras pessoas jurídicas.

§ 3º. Também são nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, salvo quando prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, por esta ou por outras pessoas jurídicas (Incluído pela Lei nº 6.754, de 17.12.1979)".

Independentemente da nomenclatura usada (devedor solidário, avalista ou interveniente garante), que na verdade quer dizer a mesma coisa, mas é nulo o aval, como também são nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, uma vez que a parte não é emitente das cédulas rurais, mas apenas avalista ou interveniente garante, ou seja, pessoas estranhas ao negócio jurídico e por isso a garantia é irremediavelmente nula, porque constituída em desrespeito à lei.

As cédulas rurais pignoratícias e hipotecárias e seus aditivos, não poderiam ter outra garantia exceto a oferecida pelo emitente, ressalvada a hipótese de a cédula ter sido emitida por pessoa jurídica, quando a lei admite que a garantia poderia ser prestada por seus sócios ou outras pessoas jurídicas.

Neste sentido precedente do Superior Tribunal de Justiça:

"São nulas as garantias, reais ou pessoais, prestadas por terceiros em cédula de rural hipotecária sacada por pessoa física (DL 167/67; art. 60,§ 3º) (REsp. 599545/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª T., DJ 23/08/2007, DJ 25/10/2007, p.166)".

Constou do bojo da decisão:

"A regra é a nulidade de quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, prestadas na cédula rural hipotecária, além da oferecida pelo emitente. Serão válidas apenas aquelas prestadas por pessoas físicas participantes da empresa sacadora, pela própria pessoa jurídica emitente ou por outras empresas.

Portanto, são nulas garantias, reais ou pessoais, prestadas por terceiros em cédula rural hipotecária sacada por pessoa física (DL 167/; Art. 60, §3º).

É nesse sentido REsp 23.723/SP, onde o e. Relator, Ministro Ruy Rosado, afirmou:

"A idéia que extraio do parágrafo 3º do art. 60, lido no seu contexto, é a de que a cédula de crédito rural hipotecária ou pignoratícia, isto é, essas que têm uma garantia real, não podem ter outra garantia senão aquelas oferecidas pelo seu emitente. Fica ressalvada hipótese de a cédula ter sido emitida por empresa, quando se admite a garantia dos seus sócios, ou por outra pessoa jurídica". (fl. 120).

O Tribunal de Justiça de São Paulo, em recente decisão (02/04/2014), nos autos de Apelação nº 00401-98.201.8.26.058, da Comarca de São José do Rio Pardo, Relatora MÁRCIA CARDOSO, decidiu da seguinte maneira:

"Cédula Rural Pignoratícia e Hipotecária emitida por pessoa física. Garantia hipotecária dada por terceiro. Inadmissibilidade (artigo 60, parágrafo 3º, do Decreto Lei nº 167/67). Nulidade da garantia reconhecida. Insubsistência da penhora que recaiu sobre o bem dado em garantia. Embargos de terceiro procedentes. Recurso improvido".

Em outra recente decisão, em demanda executiva que tramitou perante a Vara da Família e Sucessões da Comarca de Assis/SP (antiga 2ª Vara Cível) – feito n. 0000549-15.2013.8.26.0047 (n. ordem 92/2013) – AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reconheceu a ilegitimidade passiva, inclusive com extinção da execução em relação aos avalistas.

A Egrégia 14ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos do Agravo de Instrumento nº 2053502-63.2013.8.26.0000, Relator THIAGO DE SIQUEIRA, j. 28 de fevereiro de 2014, decidiu da seguinte maneira, conforme a ementa:

"Agravo de Instrumento Execução de Título Extrajudicial – Decisão que reconheceu a legalidade do aval prestado no título exequendo Cédula rural hipotecária Garantia dada por terceiros em título emitido por pessoa física Inadmissibilidade Nulidade que deve ser reconhecida, nos termos do art. 60, § 3º, do Decreto-Lei n. 67/67 Precedente do E. Superior Tribunal de Justiça Impugnação apresentada pelos avalistas que deve ser acolhida Recurso provido para tanto".

Constou do Acórdão:

"O presente agravo merece ser provido.

Os agravantes foram incluídos no polo passivo da execução em tela, como litisconsortes passivos, por figurarem na cédula rural hipotecária que lastreia a execução em tela, como avalistas. Não a integram, portanto, como garantes hipotecários, cuja intimação foi requerida na inicial da execução em tela, por terem prestado garantia real.

Em face disso, não se aplicaria, em relação aos agravantes, a regra do art. 68 do Decreto-Lei n. 167/67, referida pela douta Magistrada.

Os agravantes alegam a nulidade do aval que prestaram ao título exequendo invocando o art. 60, § 2º, do Decreto-Lei n. 67/67, que assim dispõe:

“Art. 60. Aplicam à cédula de crédito rural, à nota promissória rural é à duplicata rural, no que forem cabíveis, as normas do direito cambial, inclusive quanto ao aval, dispensado, porém, o protesto para assegurar o direito de regresso contra endossantes e seus avalistas.

§ 2º É nulo o aval dado em nota promissória rural ou duplicata rural, salvo quando dado pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, por esta ou por outras pessoas jurídicas”.

O § 3º acrescenta, por sua vez, que:

"Também são nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, salvo quando prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, por esta ou por outras pessoas jurídicas”.

Assim, é de se reconhecer, por força dos dispositivos legais supra apontados, a nulidade do aval prestado pelos agravantes no título que embasa a execução em tela, mesmo em se cuidando de cédula rural hipotecária e não de nota promissória rural.

Neste sentido já se pronunciou o E. Superior Tribunal de Justiça:

“RECURSO ESPECIAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL EMITIDA POR PESSOA FÍSICA. AVAL. GARANTIA PRESTADA POR TERCEIRO. NULIDADE. EXEGESE DO ARTIGO 60, §3º, DO DECRETO-LEI N.º 167/67.

1.- É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em Cédula de Crédito Rural emitida também por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do Decreto-Lei n. 167/67. Precedente da Terceira Turma.

2.- Recurso Especial improvido” (REsp n. 1.353.244-MS, Rel., Min. Sidnei Beneti, 3ª T., j. 28/05/2013, DJe 10/06/2013, RT 936/454).

A razão deste entendimento foi assim explicitada pelo eminente Relator, Min. Sidnei Beneti:

“10.- Da leitura do dispositivo em comento, percebe-se que o seu caput faz referência à Cédula de Crédito Rural (espécie de título tratada no presente processo), à Nota Promissória Rural e à Duplicata Rural.

O 2º da norma, ao tratar da nulidade do aval dado por pessoas físicas diversas das participantes da pessoa jurídica emitente, faz referência tão-somente à nulidade do aval dado em Nota Promissória Rural ou Duplicata Rural, mas não trata do aval dado na hipótese em que o emitente seja pessoa física como é o caso dos autos.

 Assim, o avalista na presente hipótese está inserido no 3º da referida norma, que trata da nulidade de "quaisquer outras garantias" reais ou pessoais, salvo quando prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, pela própria empresa ou por outras pessoas jurídicas.

Nesse sentido, já decidiu a Terceira Turma desta Corte:

PROCESSO CIVIL - AUSÊNCIA DE OFENSA AO ART. 535 DO CPC - PREQUESTIONAMENTO - INOCORRÊNCIA - CÉDULA RURAL HIPOTECÁRIA - EMITENTE PESSOA FÍSICA - NULIDADE DA GARANTIA DE TERCEIRO.

- Não há ofensa ao Art. 535 do CPC se, embora rejeitando os embargos de declaração, o acórdão recorrido examinou todas as questões pertinentes.

- Falta prequestionamento quando o dispositivo legal supostamente violado não foi discutido na formação do acórdão recorrido.

- São nulas as garantias, reais ou pessoais, prestadas por terceiros em cédula rural hipotecária sacada por pessoa física (DL 167/67 Art. 60, 3º).

(REsp 599545/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/08/2007, DJ 25/10/2007 p. 166).

Portanto, no caso, como bem decidiu o Acórdão, é nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, na Cédula de Crédito Rural emitida também por pessoa física, nos termos do disposto no art.60,3º, do Decreto-Lei n.1677/67.

11.- Ante o exposto, nega-se provimento ao Recurso Especial.”

Desse modo, não socorre o agravado alegar que a vedação do § 2º, supra citado, não se aplica à cédula rural hipotecária.

A irresignação dos agravantes merece, pois, ser provida para acolher a impugnação que apresentaram nos autos da execução em tela, reconhecendo, por isso, a nulidade do aval que prestaram no título que lastreia a execução em tela, impondo-se, em consequência disso, a sua extinção, em relação aos recorrentes, nos termos do art. 267, inc. VI, do CPC, combinado com o art. 598 deste mesmo Código. Caberá ao recorrido arcar com o pagamento dos honorários advocatícios dos recorrentes, arbitrados, por equidade, em 10% do valor atribuído à execução em tela".

No mesmo sentido:

"Embargos à execução - Cédula rural pignoratícia e hipotecária - Título emitido por pessoa física - Nulidade da garantia prestada por terceiros - Aplicação do art. 60, § 3º, do Decreto-Lei 167/1967 - Recurso provido (Ap. 0001541-93.2011.8.26.0063, 38ª Câmara de Direito Privado do TJSP, rel. Des. Renato Rangel Desinano, j. 13/06/2012)".

.......................

"EMBARGOS À EXECUÇÃO - Cédula rural pignoratícia e hipotecária - Título emitido exclusivamente por uma pessoa física - Garantia hipotecária prestada por outra pessoa física, proprietária do imóvel oferecido – Inadmissibilidade - Vedação expressa contida no artigo 60 do Dec.-lei 167/67 - Procedência decretada - Apelação não provida (Ap. 0002124-26.2009.8.26.0588, Rel. Des. Ulisses do Valle Ramos, 13ª Câmara de Direito Privado do TJSP, j. 15/09/2010)".

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Em Primeiro Grau de Jurisdição a posição jurisprudencial é a mesma. A Magistrada JULIANA DIAS ALMEIDA DE FILIPPO, da 1ª Vara Cível da Comarca de Cândido Mota/SP, nos autos do processo n. 00476-72.200.8.26.0120 – Ação de Execução de Título Extrajudicial, acatou QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA e extinguiu a demanda executiva em relação aos avalistas e intervenientes garantidores:

"O pedido é procedente.

Primeiramente, não prospera a alegação do banco-exequente ao afirmar que os requerentes não foram incluídos no polo passivo da presente demanda, pois da simples leitura da inicial se verifica o contrário, ou seja, a ação foi proposta contra (....) a fl. 03 é mencionado como executado e avalista. Em que pese tenha sido requerida a citação dos executados (...) é certo que também foi requerida a intimação dos demais para pagamento do débito, no prazo de 24 horas (fl. 04).

No mais, ao analisar a matéria alegada, de fato, a garantia prestada no título exequendo viola o disposto no artigo 60, § 3º, do DL 167/67, o qual prevê:

Art 60. Aplicam-se à cédula de crédito rural, à nota promissória rural e à duplicata rural, no que forem cabíveis, as normas de direito cambial, inclusive quanto a aval, dispensado porém o protesto para assegurar o direito de regresso contra endossantes e seus avalistas.

............

§ 3º Também são nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, salvo quando prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, por esta ou por outras pessoas jurídicas. (Incluído pela Lei nº 6.754, de 17.12.1979).

A redação supra não deixa dúvidas sobre a nulidade da garantia pessoal prestada nos presentes autos, culminando também com o reconhecimento da ilegitimidade passiva dos requerentes na presente execução.

(...)

Deste modo, como a cédula rural foi emitida por pessoa física, não há dúvidas quanto à nulidade das garantias prestadas por outra pessoa física, no caso (...).

Ante o exposto, decreto a nulidade do AVAL PRESTADO pelos requerentes (...), vinculado à cédula rural pignoratícia de fls. 11/14 e respectivo aditivo de retificação e ratificação a cédula rural pignoratícia n. 97/00482-0 (fls.15/16), título que embasa a presente execução".

Temos entendido que a questão da nulidade do aval, interveniente garante ou qualquer outra garantia, real ou pessoa, pode e deve ser apreciada e reconhecida por qualquer Juízo, Instância ou Tribunal, eis que trata-se QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA, sucestível de conhecimento de ofício.

Assim, a declaração de nulidade do aval, da interveniência garantidora, das demais garantias, reais ou pessoais, prestadas pela parte, em casos onde as cédulas rurais hipotecárias e pignoratícias forem emitidas por pessoa física, é medida de rigor e de conhecimento judicial, mesmo se já foram opostos embargos, exceções ou qualquer espécie de defesa, já que não pode a garantia ser prestada por terceiros, conforme vedação legal disposta no artigo 60, §§ 2º e 3º, do Decreto-Lei nº 167/67.

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