In dubio pro societate
O autor explica a inviabilidade da condenação do reu para “benefício social” quando houver dúvida quanto à autoria do crime/delito. Afirma que tal princípio é incompatível com a Sociedade Democrática de Direito. A dúvida não pode autorizar nemn legitimar uma condenação.
O autor segue com a afirmação de que o ônus probatório é do Estado (autor) e não do investigado (réu). Se há dúvida, o autor (Ministério Público) não logrou êxito na colheita de provas ou ao convencer o juiz.
Fala-se sobre o livre convencimento de um júri, mas tal convencimento é também exdrúxulo à Sociedade Democrática de Direito, uma vez que tal convencimento é mais válido que provas, tal convencimento, mesmo com suas dúvidas, produzirá efeitos assim que se manifestar em voto/decisão.
Noutro giro, cabe também a crítica à revisão criminal. Diante de uma ação desconstitutiva criminal, se há dúvida, não pode haver condenação. Não é obrigação do réu provar a sua inocência, mas sim do acusador de mostrar a culpa do réu.
O princípio que deve imperar é o constitucional: in dubio pro reo. E esse princípio – ressalta o autor – deve ser atemporal, ou seja, deve ser aplicado em qualquer fase do processo penal. Se surgir qualquer circunstância/prova/evidência que gere dúvidas numa condenação ou num processo ainda em andamento, não pode haver condenação desse réu. A decisão, então, deverá ser reformada, devido ao fato superveniente que causou dúvida quanto à condenação/culpa.
Contraditório e momentos da prova
O autor defende que o contraditório é o direito que ambas as partes possuem de serem ouvidas no curso do processo penal. Defende ainda que o contraditório é observado quando se criam condições ideais de fala e oitiva das partes, ainda que elas não queiram se utilizar de tal faculdade.
Afirma também que contraditório pode se confundir com direito de defesa, mas não são a mesma coisa. O contraditório engloba todo o processo. Ele é responsável pela legitimidade de uma decisão. Numa decisão em que ambas as partes foram ouvidas, sem nenhuma distinção entre as suas oitivas, ocorreu o contraditório. Ele é tamb´me responsável pela demanda que as partes levam ao juiz. Ambas as partes podem debater entre si e levar suas demandas e questionamentos perante o juiz. Essa possibilidade de igualar as participações dentro do processo é o princípio do contraditório.
O direito de defesa pode ser instaurado sem haver o contraditório. É possível cercear o direito de defesa, por meio de alguns instrumentos processuais e, mesmo assim, não violar o contraditório. Pela pequena diferença entre esses princípios, uma parte da doutrina costuma aplicar o direito de defesa como parte integrante do princípio contraditório.
O autor afirma que o contraditório deve ser observado nas quatro etapas do processo penal:
- Postulação: pode-se postular provas em igualdade de condições
- Admissão: pode-se impugnar decisão do juiz que admite uma prova
- Produção: as partes podem participar e assistir à produção da prova
- Valoração: controle da racionalidade da decisão (fundamentada), que pode ser impugnada (recurso)
O contraditório é um direito necessário para evitar também a manipulação da prova pelo juiz, uma vez que as partes participam ativamente da produção de provas, podendo impugnar aquelas que lhes parecerem ilegítimas.
Provas e direito de defesa
Devem ser observadas (e garantidas) no processo penal as duas espécies de defesa: técnica e pessoal.
A defesa técnica consiste na presença de um defensor para o réu. Esse defensor deve estar presente em todos os atos da instrução, ou seja, deve ser abominada a hipótese de colheita de provas pelo juiz sem a presença do réu ou seu defensor.
É indisponível, além de ser uma exigência para manter o equilíbrio entre defesa e acusação. Serve também para regular a hipossuficiência do acusado perante o promotor/policial/juiz.
A defesa técnica é uma exigência da sociedade, pois o acusado pode defender-se pouco ou mesmo nem se defender. Esse posicionamento, no entanto, não exclui o interesse social da verificação da autoria do delito (interesse coletivo na correta apuração do fato). É fundamental ao emparelhamento das partes e ao distanciamento do juiz (quanto mais atuantes e eficientes forem as partes, o juiz será mais imparcial).
A defesa pessoal consiste na resistência pessoal do réu às pretensões acusatórias. Ela pode ser positiva ou negativa. Positiva é quando o réu pratica atos que colaboram com a comprovação da sua inocência, como a submissão a exames periciais. A negativa é quando o réu se abstém de “colaborar” com o julgamento (não produzir prova contra si).
Valoração das provas
O autor explica os três sistemas básicos de decisão e colheita de provas: sistema legal de provas, íntima convicção e livre convencimento motivado.
O sistema legal de provas consiste na valoração que a lei dava às provas. Nesse sistema, o juiz não poderia interferir para determinar, em cada caso concreto, o real valor das provas. Ele deveria seguir a taxação legal e aplicar os pesos que a lei determinava. Não havia espaço para a sensibilidade do julgador na acareação de provas.
Em oposição a esse sistema, surge o da íntima convicção. Nesse sistema, o juiz pode dar julgamento independente das provas. Basta ao magistrado que sua íntima convicção o direcione para uma sentença. Apesar de haver provas explícitas, o juiz poderia decidir de maneira divergente ao que era “provado”, se assim desejasse.
Balanceando esses dois sistemas, veio o sistema de convicição motivada. Nele, o magistrado dará sua sentença observando as provas e a sua convicção íntima, porém, sua decisão precisará ter fundamentos. Não pode o magistrado decidir apenas pela sua íntima convicção ou utilizar isso como fundamento para a decisão. No entanto, a realidade é um pouco diversa: muitas decisões são feitas com todos os requintes legais, mas nem assim, são “justas”, pois os fundamentos podem ser utilizados para mascarar a íntima convicção do juiz.
Deve o juiz basear suas decisões não em julgamentos apriorísticos, mas em uma detalhada, pensada e embasada análise dos fatos, argumentos e provas constantes no processo penal.
Identidade física do juiz
Segundo esse princípio, o juiz que instruiu o processo deve proferir a sentença. Isso viabiliza uma decisão mais profunda. O juiz que presidiu a coleta de prova e teve contato com as testemunhas possui uma visão mais ampla do caso penal. No entanto, tal princípio também pode se tornar um inconveniente, uma vez que o magistrado pode decidir contaminado por seus pre-julgamentos, não ponderando as provas colhidas nem julgando com serenidade.
Tal princípio pode trazer mais vantagens que desvantagens, segundo o autor. Na medida em que se pensa que o processo penal é o instrumento pelo qual as partes buscam a captura psíquica do juiz, para convencê-lo de seus argumentos, pensar que um juiz diferente do que colheu as provas dará a sentença é impossibilitar, em parte a complexidade da decisão, ensejada num processo tão complexo quanto o processo penal.
Há que se falar também na substituição dos juízes. O art. 132 do CPC indica que quando houver sucessão de juízes, cabe, facultativamente, ao sucessor o reexame das provas. É uma faculdade do juiz, mas que pode, porém, prejudicar o julgamento caso não seja observada.
Vale dizer que o princípio da identidade física do juiz é essencial para o julgamento, uma vez que esboça toda a complexidade do processo penal. As partes, enquanto seres humanos, possuem suas complexidades que o texto, por mais requintado que seja não consegue captar na sua totalidade. Nesse vértice, pode-se dizer que a presença física do juiz na audiência e o julgamento da causa por esse juiz que estava presente na audiência é essencial para garantir que essa complexidade não se perca. Garante também que a decisão proferida contenha toda a profundidade necessária ao caso, o que não ocorre quando proferida por um juiz extremamente “estranho” às partes.