Idosos: violência, dependência e seu isolamento cada vez maior na sociedade

23/08/2014 às 17:32
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O artigo relata questões conceituais sobre os tipos de violência contra idosos e o isolamento cada vez maior da terceira idade perante a sociedade.

A aparência e o comportamento social dos idosos são objetos de estigma. O que se espera do idoso é que socialmente ele se coloque apenas dentro de uma esfera restrita de prazer e lazer, pouco se espera dele em termos produtivos ou se pensa que há outra produção a considerar: a experiência transmissível.

É a sociedade dos jovens que pensa a sociedade dos idosos e, por consequência não a tem em consideração enquanto fonte de experiência, mas sim enquanto desgaste e comportamento ultrapassado.

Em parte essa idéia nasce da rarefação da tradição, que nas sociedades atuais deixou de ser o paradigma central da organização social.

A fragilidade dos velhos é muitas vezes suficiente para separar os que envelhecem dos visos. Sua decadência os isla. Podem tornar-se menos sociáveis e seus sentimentos menos caloroso, sem que se extinga sua necessidade dos outros. Isso é o mais difícil: o isolamento tácito dos velhos, o gradual esfriamento de suas relações com pessoas a quem eram afeiçoados, a separação em relação aos seres humanos em geral, tudo o que lhes dava sentido e segurança. (ELIAS, 2002, p. 8).

O idoso do tipo passivo incapaz e do tipo dependente, como se classifica segundo a American Geriatric Society, se vê em uma situação acrescida do estigma improdutivo pelo simples fato de ser velho e não realizar os cuidados necessários consigo mesmo.

O estigma tem sua raíz no descrédito social que desqualifica o idoso para administrar seus bens materiais e imateriais. Ele é um processo gradativo que se inicia com a própria definição de velhice, com a estipulação de uma idade para se considerar alguém velho, e como é próprio de todo estigma, induz uma visão pré-concebida sobre a pessoa.

            O estigma consiste em atribuir certas qualidades e deficiências a um indivíduo e a partir dessa visão fixa e rígida lidar com ele de modo a preservar o lugar em que se o coloca. Trata-se de um processo sem retorno na grande maioria das vezes que ocorre. Do ponto de vista social, o estigma é imobilizador das forças individuais que se possa opor a ele, tal qual acontece com o idoso e com o apenado. A associação dessas duas condições parece enrijecer ainda mais a idéia pré-concebida, e tornar mais eficaz os efeitos da estigmatização.

            Apesar do estigma não funcionar da mesma maneira que a discriminação, que se nutre da injustiça, tem também efeitos próximos, como a segregação e a desvalorização das ações individuais.

            A violência contra idosos pode ser dividida em três principais formas: individual, quando cometida por um ou mais indivíduos, familiares ou não; institucional que diz respeito à instituição e aplicação de políticas públicas e estrutural que é definida pela desigualdade social e pela discriminação.

            A violência estrutural contra os idosos decorre especialmente dessa visão estigmatizada dos velhos associada a características individuais dos agressores e fatores socioeconômicos. A violência foi tipificada pelo Ministério da Saúde dentro da Política Nacional de Redução de Acidentes e Violência, e pode ser de diferentes tipos: físico, psicológico, financeiro, sexual, por abandono, por recusa ou omissão nos cuidados dos outros ou mesmo por recusa do próprio idoso em ter cuidados.

            A violência física se caracteriza pelo uso da força contra o idoso para levá-la o a agira contra a sua vontade, para ferir, provocar dor, incapacitá-lo ou matá-lo. A violência psicológica é mais conhecida por agressões verbais ou atitudes que amedrontam os idosos, humilha-nos ou privam da liberdade ou da convivência social.

            A violência financeira se dá por qualquer forma que implica em exploração imprópria ou ilegal dos recursos dos idosos ou uso não consentido de seus recursos financeiros e patrimoniais. Este tipo de violência é mais cometido por familiares, mas também pode ser por pessoas que cuidam ou por vizinhos, ou mesmo por agentes bancários ou de serviços que os idosos utilizam.

            A violência sexual ocorre por atos ou jogos sexuais de caráter homo ou heterossexual cometidos contra a vontade dos idosos que visam obter relações ou práticas eróticas não consentidas voluntariamente. Neste tipo de violência são encontrados comportamentos do agressor de aliciamento, ameaças e violência ou constrangimento físico.

            A violência por abandono implica na ausência ou deserção de autoridades institucionais ou familiares na prestação de amparo e socorro ao idoso que dela necessita.

            A violência por recusa ou omissão de cuidados se constitui em parte na omissão e em parte nos maus tratos. Pode ser acompanhada de abusos como traumas físicos, emocionais ou sociais quando o idoso depende ou está incapacitado e não pode reagir.

            O idoso pode ter um comportamento de recusa em relação aos cuidados de si que ameace a sua saúde ou integridade; ou ainda, sua segurança. Este tipo de violência auto imposta pode ocorrer por inúmeros motivos pessoais.

            No caso da violência no âmbito familiar, segundo Laks et al. (2006) há uma prevalência geral em torno de 0,3% a 4% contra mulheres e 8% para os atos violentos como um todo. “A prevalência ao longo da vida varia de 8% a 22% e o uso de drogas é uma associação encontrada, embora não se possa conferir a essa associação nenhum nexo de causalidade” (LAKS et al. 2006).

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            Este tipo de violência que ocorre no âmbito familiar em geral se apresenta sob a forma psicológica, física ou sexual e também pode ser correlata de situações que ocorrem na escola ou no trabalho. Ela está ainda referida à condição sociodemográfica como, por exemplo, com famílias que residem em regiões dominadas pelo narcotráfico.

            Segundo ainda Laks et. al. (2006) os casos de abuso ocorrem com idosos dementes com maior frequência.

Assim, o risco de abuso ou violência física é maior para os idosos que apresentam demência e que vivem com familiares devido às oportunidades aumentadas de contato interpessoal, gerando conflitos e tensões. O abuso econômico é mais frequente contra idosos que moram sozinhos e que sofrem isolamento social; este, por si só, já é outra forma de violência.

A principal psicopatologia do perpetrador está associada ao alcoolismo e à depressão, além de uma relação de dependência econômica com o idoso. Interessante notar que o idoso dependente de cuidados é quem detém, muitas vezes, o poder econômico-financeiro na família. (Laks et al., 2006, s.p).

            Por fim, a violência simbólica é um conceito antropológico que indica uma forma de coação a partir de uma relação desigual. Este tipo de violência ocorre no espaço social a partir de um discurso dominante que indica quem e o que deve ter reconhecimento social.

            É o exercício de certo poder que existe de forma simbólica na construção das relações sociais e que implica em uma constante dominância e reconhecimento de determinadas posições sociais, que trazem em si a condição de dominância pela imposição de valores, hábitos e comportamentos.

            Trata-se de uma forma de imposição que funciona socialmente através dos signos, não pressupõe a violência física entre as pessoas, e cuja raiz estaria no reconhecimento tácito de uma autoridade no agressor.

REFERêNCIAS

ELIAS, Norbert. A solidão dos moribundos. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

FONSECA, M. M e H. S. GONÇALVES. Violência contra o Idoso: Suportes Legais para a Intervenção. Publ na Rev. Interação em Psicologia, 2003, 7(2), p.121-128.

GONÇALVES, Célia Afonso. Idosos: abuso e violência. Rev Port Clin Geral 2006;22:739-45.

LAKS, Jerson; WERNER, Jairo; MIRANDA-SA JR., Luiz Salvador de. Psiquiatria forense e direitos humanos nos pólos da vida: crianças, adolescentes e idosos. Rev. Bras. Psiquiatr.,  São Paulo,  2010.

MINAYO,  Maria Cecília S. Violência contra idosos. O avesso do respeito à experiência e à sabedoria. Brasília: Secretaria Especial de Direitos Humanos, 2005. Disponível em:   <http://www.observatorionacionaldoidoso.fiocruz.br/biblioteca/_livros/18.pdf>. Acesso em 10 abr. 2014.

PASINATO, Maria Tereza; CAMARANO, Ana Amélia; MACHADO, Laura. Idosos Vítimas de Maus-Tratos Domésticos: Estudo Exploratório das Informações dos Serviços de Denúncia.  Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambú- MG – Brasil, de 20- 24 de Setembro de 2004.

SILVA, Lucilene Dahiane Carvalho da: Carvalho, Patrícia de; BELCHIOR, Valéria da Silva. Abrigo de Idosos: aplicação do Estatuto do Idoso. Rev Intertemas, Vol. 1, No 1 (2008) 1º Semestre de 2008

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