Há Juízes em diversos rincões deste país, que estão condicionando à homologação da composição dos danos cíveis no JECRIM ao cumprimento integral da avença, o que vem sobremaneira desvirtuando o quanto estatuído pela Lei 9099/95 (Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais), especificamente em seu art. 74.
Com efeito, em princípio, necessário observar que a eficácia da transação (acordo) está condicionada à sentença declaratória de homologação, de modo que é legal pensarmos que, em verdade, ao não realizar a quitação do acordo, não houve o seu descumprimento, haja vista que não foi observado o ato necessário para atribuição de sua eficácia.
Juridicamente e legalmente é flagrantemente ilegal tal condicionamento, já que o descumprimento do quanto acordado sequer adquire força executiva, o que, por óbvio, só acontece depois de devidamente homologado.
Esta atitude dos Magistrados, talvez tentando reparar à Legislação, literalmente vem criando e acescentando indevidamente um novo dispositivo legal à Lei 9099/95, configurando-se uma verdadeira aberração jurídica.
No Estado do Rio de Janeiro inclusive, às Turmas dos Juizados Criminais, em um de seus encontros, já deliberaram acerca do tema e realizaram à única interpretação possível para o quanto específicado no art. 74 da Lei 9.099/95 através do enunciado 31:
Enunciado 31 do IIEJJE – O Juiz não pode recusar a homologação do acordo cível extintivo do processo penal, competindo a sua execução judicial ao Cível.
Com efeito, cabe agora ao FONAJE, ante ao crescente desvirtuamento do art. 74 da Lei 9099/95, realizar, no mesmo sentido, a sua própria interpretação, já que pensar de outra maneira é suprimir à competência Legislativa, quebrando, portanto, o princípio republicano da separação de poderes.
O Magistrado não pode se sobrepor à escolha da vítima e autor do fato, ainda mais quando estas estão na companhia de seus respectivos patronos, os quais, sabem de antemão das consequencias do não cumprimento do quanto avençado.
Ademais, a sentença homologatória é meramente declaratória, fazendo com que à única hipótese de negativa de homologação seja à prova de que ocorreu alguma ilegalidade na transação.
Por outro lado, acaso o Legislador quisesse determinar a homologação do acordo de composição dos danos cíveis ao prévio cumprimento do acordo, assim teria feito. No entanto, os Magistrados e também alguns operadores do direito podem até achar estranho tal entendimento na esfera penal, mas a norma estatuída na Lei 9099/95 tem um inédito efeito civil, de modo que não imaginamos nesta última esfera um acordo homologado a posteriori do seu efetivo cumprimento. Portanto, o Legislador seguiu o mesmo parâmetro para ambas as materias.
Nesse sentido, é imprescindível que os Juizes apliquem a Lei da forma como ela foi posta pelo Legislador, sob pena de flagrante supressão de competência, haja vista que não lhe é dado o direito de desvirtuá-la por entender ideologicamente mais consentânea aos interesses de terceiros, o que, por conseguinte, acaba transgredindo um outro princípio, qual seja: o da imparcialidade.
Portanto, não PODE E NÃO DEVE o Juiz condicionar à homologação da composição dos danos cíveis ao cumprimento da obrigação assumida pelo autor do fato, pois isto inibiria a extinção imediata de sua punibilidade, em razão da renúncia legal, por parte da vítima, do direito de representação ou queixa, nos delitos em que a ação penal é pública condicionada a representação ou privada, consoante determina o parágrafo único do art. 74 da Lei 9099/95.
Referências:
Silva, Luiz Cláudio. Manual de Processo e Prática Penal / Luiz Cláudio Silva, Franklyn Roger Alves Silva. - 6ª Ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2013;
Mini Código Saraiva, Processo Penal, Lei 9099/95;
www.amperj.org.br/sobre/jurisprudencia/tjrj/en_criminais.pdf. Acesso em 22 de agosto de 2014, às 10h20min.