O sistema penitenciário brasileiro.

A discriminação da sociedade e a ineficácia da ressocialização

22/09/2014 às 14:03
Leia nesta página:

O artigo mostra a realidade do sistema carcerário, buscando alertar a sociedade sobre o tratamento desumano e degradante em que os presos são submetidos. Aborda também a falta de eficácia das leis positivadas no sistema gerando violação dos direitos.

Introdução

O sistema penitenciário tem por finalidade o cumprimento da pena, com o objetivo da ressocialização dos indivíduos. Portanto, o que ocorre efetivamente com os presos brasileiros é o inverso, a prisão deixou de ser uma medida de ressocialização para ser um ambiente de torturas, tratamentos desumanos e desprezando os direitos básicos.

A insuficiência de recursos e investimentos no sistema carcerário não contribui para ressocialização dos presos, pois dentro das penitenciárias eles ficam revoltados com a vida que levam e quando retornam à vida social cometem crimes novamente. A população vivencia cada dia mais a violência nas ruas e, por não acreditarem na justiça, querem fazer a justiça com as próprias mãos.

  1. O sistema penitenciário Brasileiro

O Brasil ocupa a quarta posição na lista de maiores populações penitenciarias do mundo, após de sua capacidade tendo um déficit de 199.657 vagas.

Com a superlotação dos cárceres e a precariedade do sistema, os detentos sofrem uma dupla penalidade, a primeira é a privação de liberdade em função da pena. A segunda é o desrespeito aos seus direitos fundamentais devidas às péssimas condições carcerárias, como: exposição à doenças graves, falta de assistência médica, etc.

O Estado que tem o dever de assegurar os direitos e garantias dos detentos, infelizmente acaba se tornando o violador das leis e dos direitos. Conforme o artigo 5º, inciso III da Constituição Federal “

  1. Discriminação da sociedade

A principal finalidade do sistema penitenciário é a organização dos serviços destinados à execução penal, tendo como objetivo a regeneração dos condenados, readaptando-os à vida social, entretanto o que ocorre é diferente, os detentos sofrem castigos severos, são tratados piores que animais abandonados numa condição sub-humana, onde também sofrem agressões físicas e são torturados pelos próprios presos e também por agentes penitenciários e policiais.

            Um caso importante e recente que ocorreu no Brasil é dos “Degolados no Maranhão”, que mostra o absurdo das condições penitenciarias no Estado. No dia 17 de Dezembro de 2013 o Sindicato dos Servidores Penitenciários receberam um vídeo contendo cenas de três presos do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, que foram degolados por rivais de facções criminosas.

Após relembrar esse fato desumano, também não posso deixar de mencionar os atos cometidos pelos “justiceiros” no qual são chamadas as pessoas que fazem justiça com as próprias mãos, ou seja, é um grupo de pessoas agindo por meios próprios para tentar garantir a segurança nas ruas. A população está insatisfeita com a insegurança e a impunidade do crime, entretanto cometer esses atos só pioraram cada vez mais a situação lastimável em que a sociedade vive. Como disse João Pedro Pádua[1], advogado criminalista e professor de Processo Penal da UFF (Universidade Federal Fluminense), acredita que é justamente a descrença na lei que move a lógica do justiçamento no país. "A lei é um instrumento que é mal visto como regulador social no Brasil. Para os amigos, tudo, para os inimigos, a lei [...]”.

A frase citada esboça a realidade das agressões que estão se agravando a cada dia, na mídia presenciamos as barbáries contra os infratores que estão sendo espancados, amarrados em postes, dentre outras agressões impostas. A sociedade discrimina os “bandidos” por medo, por insegurança, infelizmente para algumas pessoas a única saída para a sobrevivência é o mundo do crime, pois não tiveram uma estrutura desde pequenos ou acabaram caindo no crime por meio das drogas. Existem casos de pessoas que não aceitam o convívio com um ex-presidiário, por achar que ele não merece uma segunda chance, por achar que bandido bom é bandido preso. A maioria dos ex-detentos não conseguem empregos por carregarem esse fardo, para qualquer lugar que forem sua ficha sempre estará suja, acarretando no fechamento de portas e de oportunidades e de maneira preconceituosa a sociedade sempre o tachará como “ex-detentos” e não uma pessoa comum.

 

  1. A ineficácia da ressocialização

A ressocialização do preso consiste na humanização da própria execução penal, mas para que essa realidade tão “sonhada” aconteça precisamos ter mudanças radicais no sistema, fazendo com que os presos sejam respeitados como pessoas humanas, que tenham atividades nos presídios, diminuindo a corrupção dos funcionários que permitem a entrada de drogas e celulares, fornecendo um sistema competente de saúde para essas pessoas, dentre outras mudanças necessárias.

A prisão além de não ressocializar ela estigmatiza. A prisão deixa uma marca para sempre. O que está acontecendo em São Paulo ultimamente é somente a visibilidade maior do que já estava acontecendo há muito tempo. A polícia sempre matou, se a policia está matando de forma mais cruel é porque a violência também está mais cruel. Isso é só uma evolução de muitos anos. O PCC e essas outras organizações de presos nasceram por pura e simples inoperância do Estado. Pense numa escola, numa sala de adolescentes, diga para eles que não vão mais ter recreio, que vão ter que ficar presos em sala de aula por mais tempo além do horário normal, eles vão se rebelar, vão se reunir, faz parte da natureza humana. Essas comunidades carcerárias abandonadas há anos nada mais fizeram do que se organizarem. A gente imagina o crime organizado formado de ricos, no estilo mafioso. Mas o crime organizado é miserável, porque a penitenciária só tem pobres. A polícia não invade um apartamento nos Jardins, mas sim a favela, e tem drogas nos Jardins. O crime organizado só tem esse nome porque o Estado mesmo é cada vez mais desorganizado, incapaz de funcionar como ente que deve promover justiça.[2]

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Com a ineficácia da ressocialização, em média de 90% dos ex-presidiários que acabam retornando à sociedade voltam a cometer crimes e novamente retornam a prisão. Visando a maneira como os presos são tratados, eles jamais conseguirão voltar à viver em sociedade sem nenhuma sequela do que viveu na prisão. O artigo 88 da Lei  nº 7.210, 11 de Julho de 1984, postula que o condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório, mas a realidade é apenas diferente,os detentos dormem uns em cima dos outros, geralmente em redes e até mesmo no chão, em alguns presídios do Brasil, os banheiros ainda são somente buracos no chão, os chamados “boi”. Sendo assim, temos uma lei positivada com plena ineficácia.

Considerações Finais

Conforme o assunto mencionado, buscamos com pesquisas trazer a realidade vivida nos presídios brasileiros, mostrando que além de serem condenamos e terem a privação da liberdade, são tratados em condições assustadoras, sem o mínimo de dignidade humana e sem os direitos fundamentais.

Lembrando que os detentos também são seres humanos, pensantes, que possuem característica passíveis de erros. Quando se vive numa sociedade totalmente desigual, desestruturada, desorganizada como a nossa, podemos esperar qualquer coisa da sociedade.

Portanto, para que possamos acabar com a ineficácia é preciso fazer uma reforma no sistema com urgência, assim fazendo valer todos os tratados assinados pelo Brasil e principalmente a Constituição Federal, que está positivada para serem respeitados por nós cidadãos e pelo Poder Legislativo, Executivo e Judiciário do nosso país.

  • Referências

CASTILHO, Ricardo. Direitos Humanos. 2 ed. São Paulo. Saraiva, 2013.

ASSIS, Rafael Damasceno de. A Realidade atual do sistema penitenciário do Brasil. Disponível em: <http://www2.cjf.jus.br/ojs2/index.php/revcej/article/viewFile/949/1122> Acesso: Dia 01 de Maio de 2014

VASCONCELOS, Emerson Diego Santos de. A precariedade no sistema penitenciário brasileiro – violação dos direitos humanos. Disponível em: <http://ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10363&revista_caderno=3> Acesso: Dia 03 de Maio de 2014

CICONELLO, Alexandre. O desafio de eliminar o racismo no Brasil: a nova institucionalidade no combate à desigualdade social.
Disponível em: <http://www.ceap.br/material/MAT30102013180019.pdf > Acesso: 03 de Maio de 2014

MIRABETE, Julio Fabbrini.Manual de direito penal: parte geral. 24 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

NETO, Nilo de Siqueira Costa. Sistema penitenciário brasileiro: a falibilidade da prisão no tocante ao seu papel ressocializador. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/24073/sistema-penitenciario-brasileiro-a-falibilidade-da-prisao-no-tocante-ao-seu-papel-ressocializador> Acesso: 05 de Maio de 2014

NETO, Jose Francisco. Estão faltando cadeias ou estão prendendo demais?. Disponível em: <http://www.brasildefato.com.br/node/12147>

Causa Operária Online. Toda prisão no Brasil é ilegal. Porque se a prisão que está na lei não existe, a que aplicamos na realidade é ilegal. Disponível em: <http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/os-problemas-do-sistema-carcerario-brasileiro> Acesso: 03 de Maio de 2014.


  1. Disponível em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/02/140214_justiceiros_rio_jp.shtml Acesso: Data 03 Maio. 2014

2 O Juiz da Vara de Execuções Penais no Amazonas e doutorando em Criminologia pela USP, membro da Associação de Juízes para a Democracia e da LEAP-Low Enforcement against Proibition (Agentes da Lei contra a proibição das drogas) fala do sistema carcerário brasileiro, do novo código penal numa entrevista dada a Causa Operária.

Sobre o autor
Pamela Medonecky

Estudante de Direito na Faculdade Escola Paulista de Direito

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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