Imprensa marrom

17/10/2014 às 06:06
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A grande mídia no Brasil tem a cor do burro quando foge.

~~A grande mídia no Brasil tem a cor do burro quando foge. Ainda bem que podemos avaliar a imparcialidade política do quarto poder no massacrômetro: http://www.manchetometro.com.br/ . Parece piada, mas não é. Em poucos países a mídia é tão serviçal ao capital e aos “Donos do Poder” (como diria Raymundo Faoro), quanto no Brasil. Um país policialesco de cultura provinciana, antidemocrática, coronelista, patrimonialista. Temos mais ou menos 30 Berlusconi pelo país afora: donos de veículos de comunicação que exercem o monopólio da (des)informação. Berlusconi foi Primeiro-Ministro da Itália e dono da Mediaset, um monopólio considerável na mídia televisiva e que é controlada pelo grupo Fininvest. Curiosamente, a financeira toma conta da mídia. Qualquer um que entrar na redação de um jornal ou de TV – com as rádios, idem –, de cara, será informado que o departamento comercial manda em tudo. Deturpando Chacrinha: “quem não anuncia, se trumbica”. Portanto, a degradação eleitoral de alguns, em detrimento da fortaleza erguida para blindar a corrupção de outros, é apenas um lance na história política de longa data. Donos de veículos de comunicação costumam fazer políticos, do nada; e políticos profissionais são donos de monopólios da comunicação. A mídia atua como Diário Oficial dos políticos contemplados e amparados pela chamada “versão positiva dos fatos”. O que não dizemos ao povo (eleitor) é que uma meia-verdade ainda é uma mentira inteira.
Com Collor foi assim: primeiro, foi eleito como candidato formado do pó, da insignificância política; depois, manipuladora de “caras pintadas”, a mídia o demoliu como anti-Cristo. Não que não fosse – todos sabiam que era –, contudo, Collor foi forjado no fogo do inferno do capitalismo tupiniquim. Na verdade, já na reta final da campanha presidencial de 1989, contra Lula (que ainda não era “paz e amor”), houve extrema manipulação: “O Armando Nogueira costuma dizer que o Collor ganhou de 3 a 2, e no “Jornal Nacional” apareceu 3 a 0. Não mostrou o gol do adversário. Um dia após o debate, a Folha me procurou e eu disse que não tinha gostado da edição. O dr. Roberto replicou dizendo que o Boni entende de TV, mas não entende nada de política”. Quem fala isso é José Bonifácio de Oliveira Sobrinho (o Boni: antigo chefe de tudo na TV Globo), e dr. Roberto é Roberto Marinho, que fez a Globo quando ganhou carta branca da Ditadura Militar, em 1964. Outra vítima dos “corvos” foi Getúlio Vargas, sob a verve quente de Lacerda; tudo devidamente publicado, é claro. A mídia – a Globo em destaque – não só implantou como revolucionou o Estado Sedutor (Regis Debray. Vozes, 1994). “As Revoluções Midiológicas do Poder” não foram revolucionárias quanto à política, mas na feitura do marketing do poder, sim. De forma quase absoluta, o eleitor foi transformado em consumidor de discursos vazios e empapados de saliva poderosa ou atraentes fisicamente. Não temos política, pois só fazemos pastiche: uma cópia marrom, sem qualquer “aura” da política como arte.
Pela expressão “Imprensa Marrom” vê-se que se trata de um apelido de priscas eras. Nos EUA, no século XIX, era usada para denunciar a “publicação sem escrúpulos” e quando só havia imprensa de papel, isto é, jornais e comunicação impressa. Hoje, há uma telemática: impressos, rádios, TVs, Internet, celulares. O que nos motiva a tratar como mídias, pois são muitos os suportes encontrados para a comunicação ou desinformação. Aliás, um belo romance é Ilusões Perdidas, de Honoré de Balzac (Companhia das Letras, 2002). O mal viria com o maniqueísmo próprio da modernidade: “Tudo é bilateral no domínio do pensamento”. Além, é claro, do Mal-Maior, que é a corrupção: “O jornal semanal que Dauriat acabava de comprar tinha o direito de tratar de política. Naquela época, a propriedade de um jornal era um privilégio concedido, tão ambicionado como a de um teatro” (Balzac, p. 119). Para que não fosse desse modo, a política teria que ser arte (ou techné: no grego) e não o equivalente ao preço da manchete na Primeira Página ou da boa chamada no horário nobre.
 

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Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Informações sobre o texto

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