É sabido a estranha relação de amor e ódio que a sociedade vive em relação ao advogado criminalista.
A área criminal exerce um fascínio nas pessoas, nem que seja só por curiosidade. Desde a Universidade, o Direito Penal é a matéria que prende a atenção em sala de aula.
Violência e impunidade fazem parte do nosso cotidiano. Os telejornais estão recheados de pseudos juristas e a sociedade se manifesta a respeito disso.
Um fato que tem me chamado a atenção nos últimos dias é a revolta de alguns pelo suposto “serial killer” (preso em Goiânia), ter um advogado para defendê-lo.
Parei para ler os comentários nas reportagens divulgadas na rede social e me deparei com frases tipo: “deveriam prender ele e o advogado”; “como alguém defende ele”; “advogado é advogado do diabo” e outras pérolas...
É preciso entender que dentro da ciência forense não existe apenas o criminoso habitual, existe o criminoso que sofre de alguma psicopatia, que muitas vezes aparentemente vive uma vida normal, porém esconde uma anomalia psíquica que pode transformá-lo em “monstro”.
Desde Al Pacino, a figura do advogado, principalmente o criminalista está ligada ao célebre filme “ADVOGADO DO DIABO”.
Sim. Lidamos com o inferno todos os dias. E visitamos sua sala de visitas, denominado parlatório (local onde os advogados podem falar com seus clientes no presídio).
O problema é que até a comparação é errônea. Lucífer, ou diabo, era na verdade um anjo de luz que caiu por almejar o trono do Criador.
No entanto, é o filho de Deus, JESUS, que é comparado ao advogado. As escrituras dizem que Ele, Jesus, é o nosso advogado diante do Pai. Irônico não?
Anjos ou demônios? Quem somos, afinal?
Somos operadores do direito. Defendemos o direito que cada indivíduo tem. Não defendemos o crime, não defendemos o ato, defendemos que cada um responda de acordo com sua culpabilidade, defendemos o não retrocesso, defendemos que todos sejam julgados e que tenham o direito a defesa, defendemos a abolição das fogueiras midiáticas e lutamos por um Estado Democrático de Direito.
A sociedade precisa entender que não existe julgamento sem advogado, desde o primeiro esboço da carta magna o mundo luta por isso. A verdade é que a TV não mostra toda verdade. Existe um sistema dentro do sistema. O sistema prisional é falido, “depósito de gente” não faz do mundo um lugar melhor para se viver.
Já vi vidas serem ceifadas, já vi garotos entrarem no crime por revolta, por medo, por falta de opção e também por livre escolha.
O problema é que sempre buscamos “fórmulas mágicas”, buscamos uma receita infalível para tudo, mas isso não existe. Cada caso é um caso. Infelizmente não se importa se foi feito justiça e sim se alguém está preso.
Criminalista não tem “sangue de barata”. Sim, corre sangue em nossas veias. Somos bem pagos sim, lidamos com “caixa de marimbondo” todos os dias, defendemos o direito de culpados e de inocentes, somos odiados e amados. Se para Sobral, advocacia não é profissão de covarde, advocacia criminal então nem se fala.
Assim como nos lembramos da fome apenas quando ela aperta, também só lembramos de quem está preso quando um dos nossos estão lá e ninguém vive em uma redoma de vidro, o amanhã é imprevisível.
Julgamentos insanos, teorias ignorantes, recheiam a sociedade. Ninguém quer transformar demônio em anjo, ninguém está aplaudindo o criminoso, lutamos apenas para que esse criminoso tenha um julgamento justo.
Não é a toa que nossa deusa da justiça é cega. Pois ela deve olhar para a lei. Ser imparcial.
Há bons e maus profissionais em toda profissão. O ego na nossa classe realmente as vezes ultrapassa os limites do tolerável. Mas o verdadeiro advogado criminalista vê em sua profissão um sacerdócio.
Uma parte da história precisa ser contada, nem sempre quem está no banco dos réus é o único culpado, algumas vezes nem culpado é. Vimos várias vezes notícias de pessoas que ficaram presas por crimes que não cometeram. O problema é que o jornalista e o cinegrafista que filma a cara de quem está na delegacia, não volta no Fórum para filmar no dia que essa pessoa foi absolvida.
Já fui muito bem paga, mas também já advoguei de graça, quando vi diante de mim uma injustiça contra alguém que não tinha condições de pagar por uma boa defesa. Já tirei preso torturado de presídio, já fui admirada e odiada. Já enxuguei lágrima de mães e já tive que dar más notícias...
A sociedade precisa entender de uma vez por todas que o advogado criminalista não é inimigo da sociedade, ao contrário, apenas exercemos uma profissão árdua, e atuamos em uma área que são para poucos, que não se nasce sabendo, mas que além do conhecimento técnico é necessário o dom.
E para quem nasce para exercer essa profissão, saiba que todos odeiam o advogado criminalista, mas só até o dia em que precisarem de um.