O método probatório judicial constitui um conjunto de regras cuja função garantidora dos direitos das partes e da própria legitimação da jurisdição implica limitações ao objeto da prova, seus meios de obtenção, e, ainda, estabelece os procedimentos adequados à colheita da prova. Com isso, existem provas vedadas e, entre elas, as provas ilícitas.
A renomada processualista Ada Pellegrini Grinover entende por prova ilícita, a prova colhida com infringência às normas ou princípios colocados pela Constituição e pelas leis, frequentemente para a proteção das liberdades públicas e especialmente dos direitos de personalidade e mais especificamente do direito à intimidade[1].
Para alguns doutrinadores, o juiz que conhecer do conteúdo da prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou o acórdão, em razão da contaminação do juiz que toma conhecimento da prova ilícita. Para essa corrente, não basta a mera exclusão física dos autos das provas ilicitamente obtidas. Isso seria necessário, mas não suficiente.
Para outros, o entendimento retromencionado vai de encontro aos princípios da celeridade e simplicidade ao desfecho do processo, pelo fato de o juiz que fez toda a instrução processual ser substituído por um outro que nem sequer conhece o caso. Ademais, quando o processo não mais se encontra em primeira instância, mesmo que o magistrado conhecedor da prova inadmissível seja afastado da relatoria da matéria, poderá ter que proferir seu voto.
A discussão em torno da contaminação desconsidera a questão nuclear do problema que é a cabeça do julgador.
Não se pode mais desconsiderar que a sentença é um ato de sentimento, de eleição de significados. Sentenciar deriva de sententiando, gerúndio do verbo sentire. O juiz é alguém que julga com a emoção e a sentença é o reflexo desse complexo sentire[2].
Consequentemente, em muitos casos, a decisão deve ser anulada, ainda que sequer mencione a prova ilícita, pois não há nenhuma garantia de que a convicção foi formada exclusivamente a partir do material probatório válido. A garantia da jurisdição vai muito além da mera presença de um juiz (natural, imparcial, etc.): ela está relacionada com a qualidade da jurisdição. A garantia de que alguém será julgado somente a partir da prova judicializada e com plena observância de todas as regras do devido processo legal.
Daí porque não basta anular o processo e desentranhar a prova ilícita: deve-se substituir o julgador do processo, na medida em que sua permanência representa um imenso prejuízo, que decorre dos pré-juízos que ele fez.
Não é crível de se pensar que um mesmo magistrado, após julgar e ter sua sentença anulada pela ilicitude da prova possa julgar novamente o mesmo caso com imparcialidade e independência.
É ingenuidade tratar cartesianamente essa questão, como se a contaminação só atingisse a prova: o maior afetado por ela é o julgador, ainda que inconscientemente.
Diante do exposto, conclui-se que todo processo que contenha uma prova ilícita deve ser anulado, total ou parcialmente. Caso já tenha sentença, esta também deve ser anulada. Após, desentranha-se dos autos a prova ilícita, que será devidamente inutilizada. O ato seguinte consiste em refazer o processo ou proferir uma nova sentença, não se admitindo a participação do juiz (anteriormente) contaminado, sob pena de restar afastada a sua imparcialidade e independência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil brasileiro. vol. 2. São Paulo: Saraiva, 1997
GRINOVER, Ada Pellegrini. As nulidades no processo penal. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 1996.
______________________. Liberdades públicas e processo penal: as interceptações telefônicas. São Paulo: Saraiva, 1976.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de Direito Processual, 6 ed. Saraiva São Paulo: Saraiva, 1997 .
SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 1983.
SILVA, De Plácido. Vocabulário jurídico. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987.
[1] GRINOVER, Ada Pellegrini. As nulidades no processo penal. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 1996.
[2] SILVA, De Plácido. Vocabulário jurídico. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987.