Análise objetiva do dano psicológico para o arbitramento do quantum indenizatório

23/02/2015 às 12:41
Leia nesta página:

Trata-se de estudo acerca da possibilidade de perícia técnica para a comprovação do dano psicológico e sua extensão para fins de condenação ao pagamento de indenização.

Para a classificação do dano, o psicólogo forense pode utilizar nos seus documentos de apenas duas variáveis acerca do atual quadro psíquico da vítima: gravidade da psicopatologia e possibilidade de reversibilidade.

Nesse caso, a classificação é divida em três categorias:

  • Leve: o dano não requer tratamento de forma permanente e não compromete a vida de forma significativa. 
  • Moderado o dano necessita de tratamento não inferior a um ano.

Ex.: depressão, pânico, fobias, obsessões, etc. 

  • Grave – o quadro é irreversível e inibe a adaptação da vítima. 

Estes três níveis atribuídos ao dano psicológico variam de acordo com a patologia diagnosticada, e são trazidos pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM:

“Segundo o DSM-IV, algumas dessas características estão relacionadas  os  Transtornos de Estresse Pós-Traumático (309.81). Podem ser classificados em: a)  agudo: se a duração dos sintomas é inferior a 3 meses; b) crônico: se a duração dos  sintomas é superior a 3 meses. E se teve início tardio, quando ocorre pelo menos 6  meses após o evento estressor (DSM-IV, p.211, 2003)” [1]

 Estes parâmetros pré-estabelecidos são capazes de auxiliar o magistrado no momento de quantificar eventual condenação imposta ao agressor, de acordo com a extensão e o tempo de tratamento para a cura das sequelas causadas.

            Além disso, a categorização do dano psicológico, através do amadurecimento da jurisprudência, delimita o julgador para condenar o autor do dano em um quantum indenizatório mínimo e máximo. Uma vez enquadrado o dano psicológico em determinado grau lesivo, o valor da indenização se torna, também, um caráter objetivo da demanda.

 Possibilidade de responsabilização civil do agressor

Tanto a literatura estrangeira como a realidade nacional é favorável a responsabilização do agressor acerca do dano psicológico, independente do nível de vulnerabilidade da vítima antes do trauma.

Nesse sentido, considerando a ação ou omissão um ato ilícito praticado pelo autor da agressão, este é passível de indenização de caráter civil, forma do artigo 186 do Código Civil vigente.

            Diferentemente do dano moral, não há previsão expressa do dano psíquico na legislação pátria. No entanto, este instituto é igualmente tutelado no âmbito civil, considerando que qualquer ato capaz de ocasionar dano e violar os principais princípios e normas, é passível de reparação civil.

            No que tange ao ilícito civil, este não esta rigidamente atrelado à legislação, como nos casos de ilícitos penais, que necessitam de previsão legal para a sua aplicação, em razão do princípio da tipicidade penal.

            O Ilustre Professor Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme explicita este entendimento em uma de suas obras:

“Portanto, ilícito civil não requer a previsão específica e literal, basta que haja violação dos princípios relativos à matéria, já que são tipo abertos, de modo que, violados os principais princípios e normas pertinentes à sua sistemática, o agente o terá praticado.” [2]

Além disso, é importante destacar que a decisão final sobre a existência ou não do nexo de causalidade não é dada pelo perito, mas sim pelo juiz. De acordo com o livre convencimento do juiz, este não está obrigado à atender a conclusão o laudo pericial, sendo certo que este é somente o meio pelo qual se atribui maior capacidade técnica ao juízo para apreciação da matéria fática dos autos, para que sejam aplicados os direitos inerentes a

A Confusão na aplicação do dano psicológico.

            Não obstante a nítida diferença entre o dano psicológico e o dano moral, a jurisprudência aparece um tanto quanto confusa, vejamos:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE PATOLOGIA DE ORDEM PSICOLÓGICA ADQUIRIDA APÓS A OCORRÊNCIA DE ASSALTOS A BANCO. TRABALHO EM AGÊNCIA BANCÁRIA - ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896, c, da CLT, quanto à indenização por danos morais decorrentes de assaltos a banco, dá-se provimento ao agravo de instrumento, para melhor análise da arguição de violação do art. 927 do Código Civil, suscitada no recurso de revista. Agravo de instrumento provido.”[3]

           A análise da expressão  “Indenização por danos morais decorrentes de patologia de ordem psicológica adquirida após a ocorrência de assaltos a banco”, contida na ementa do julgado supra transcritoa frase, demonstra que a jurisprudência adota o dano moral como gênero, enquanto dano psicológico como espécie.

Entretanto, tal tratamento é, com todo o respeito, demasiadamente equivocado. O dano moral é uma das espécies de dano imaterial, assim como o dano psicológico, estando, ambos, em patamares identicos.

Os julgados abaixo demonstram, de maneira inequívoca, a necessidade de reaequação do Poder Judiciário quanto à matéria jurídica ora abordada. Isso porque o dano moral não é passível de perícia técnica, sendo certo que o quantum indenizatório é arbitrado subjetivamente pelo magistrado. Entretanto, o mesmo não deve ocorrer quanto se tratar de dano psicologico, visto que este deve ser comprovando através de perícia técnica, importando, tambem, e sua extensão e grau de gravidade, para ser quantificado o quantum  indenizatório à vitima. 

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“RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE.DANO MORAL DECORRENTE DE ASSALTO. O assalto é situação passível de causar ao trabalhador dano moral, o qual se caracteriza pela própria circunstância do crime e da violência a ele inerente, capaz de gerar na vítima angústia e ansiedade. Devida a indenização por danos morais caracterizada pelo abalo psicológico causado pelo assalto. Recurso provido para acrescer à condenação o pagamento de indenização por dano moral. HONORÁRIOS ASSISTENCIAIS. Declarada pelo reclamante sua insuficiência econômica, são devidos honorários assistenciais ao seu procurador, nos termos da Lei 1.060/50, aplicável ao processo do trabalho aos que carecerem de recursos para promover sua defesa judicial. Não se pode mais entender que a assistência judiciária fica limitada ao monopólio sindical. Recurso provido.”[4](grifou-se)

                                              ************

Indenização por danos morais. Seqüelas sofridas pela empregada em virtude de assalto ocorrido no local de trabalho.No que concerne ao pedido de pagamento de indenização por danos morais decorrentes do assalto ocorrido no local de trabalho, entendo que, ainda que o laudo pericial tenha concluído pela existência de nexo de causalidade entre o crime cometido por terceiros e o aborto sofrido pela reclamante,é certo que a reclamada não concorreu com culpa ou dolo para a ocorrência dos fatos relatados. Não há comprovação de que a empresa tenha cometido qualquer ato ilícito in casu (artigo 186 do Código Civil). Não aplico à situação em comento a teoria da responsabilidade objetiva,pois, nas relações de trabalho, a regra é a adoção da teoria da responsabilidade subjetiva, já que a primeira incide nas hipóteses em que há expressa previsão legal, conforme exigência manifesta no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, sendo defeso o emprego indiscriminado.Se a empregadora não deu causa ao assalto, pois foi ato praticado por terceiro,não há que se falar em responsabilidade de sua parte,já que se trata de uma fatalidade. Honorários Periciais.Sucumbência. Entendo que devem ficar a cargo da reclamada,eis que sucumbente no objeto da perícia, em obediência à previsão inserta no artigo 790-B da CLT. Provimento parcial do apelo apenas para determinar que a reclamada seja encarregada do pagamento dos honorários periciais.”[5] (grifou-se)

                **************************************

 

“DO DANO MORAL DECORRENTE DE DOENÇA OCUPACIONAL. REDUÇÃO DO VALOR ARBITRADO DA INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE - É notório que o descaso com a saúde dos trabalhadores ocasiona a considerável perda da capacidade produtiva e o enfraquecimento emocional destes, violando o megaprincípio da dignidade humana, agasalhado constitucionalmente. Por tal constrangimento gerado ao reclamante deve indenizá-lo, na forma do art. 927 do CC. Insta destacar, ainda, que as normas laborais preservam não só a estabilidade econômica do obreiro, mas, principalmente, sua dignidade e integridade profissional, não havendo, sequer, falar em redução do valor da indenização fixada. Recurso da reclamada que se nega provimento.(...)”[6]

 

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. DANOS MORAIS. FUNDAÇÃO CASA. INSTITUIÇÃO DE RECUPERAÇÃO DE MENORES. LESÕES PSICOLÓGICAS DECORRENTES DE REBELIÕES E CONDUTA OMISSIVA DA RECLAMADA. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. VALOR DA INDENIZAÇÃO. Não demonstrada violação dos dispositivos indicados, não há como admitir o recurso de revista. Agravo de instrumento desprovido.” [7]

 

 

“Tal tênue linha defensiva, contudo, não pode prevalecer ante o teor do laudo pericial de fls. 224/234, noticiando a mantença do afastamento do trabalhador, com percepção de benefício previdenciário, por ainda ostentar as patologias diagnosticadas nos idos de 2005, que lhe conferem invalidez parcial, compatíveis com o estresse a que se submeteu nas ocasiões descritas na petição inicial, apresentando episódios depressivos graves, transtornos fóbicos e de adaptação, exigentes de tratamento medicamentoso que - nada obsta concluir - repercute nos atos hodiernos da vida social.’’ [8]


[1] Estudos e pesquisas em psicologia, UERJ - RJ, ano 5, n.2, 2° semestre de 2005 – pg. 122 - http://www.revispsi.uerj.br/v5n2/artigos/aj06.pdf - Acessado em 23.10.2014

[2] GUILHERME, Luiz Fernando do Vale de Almeida. Responsabilidade Civil II. São Paulo: Editora Fiuza, 2013, pg. 85

[3] TST - RR: 14181020105030035  1418-10.2010.5.03.0035, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 06/02/2013, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 15/02/2013

[4] TRT-4 - RO: 00012019620115040004 RS 0001201-96.2011.5.04.0004, Relator: ANA LUIZA HEINECK KRUSE, Data de Julgamento: 21/08/2013, 4ª Vara do Trabalho de Porto Alegre

[5] TRT-2 - RECORD: 627200344502004 SP 00627-2003-445-02-00-4, Relator: DELVIO BUFFULIN, Data de Julgamento: 26/11/2009, 12ª TURMA, Data de Publicação: 18/12/2009

[6] TRT-1 - RO: 966004220075010016 RJ , Relator: Mario Sergio Medeiros Pinheiro, Data de Julgamento: 30/01/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: 05-03-2013

[7] TST - AIRR: 199009420075020081  19900-94.2007.5.02.0081, Relator: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 07/12/2011, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 16/12/2011

[8] TST - AIRR: 199009420075020081  19900-94.2007.5.02.0081, Relator: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 07/12/2011, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 16/12/2011

Sobre a autora
Nicolle Duek Silveira Bueno

Advogada inscrita na OAB/SP sob o n° 368.004, graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Associada à Lee, Brock, Camargo Advogados Associados, atuante em Direito Eletrônico no Brasil.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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