Terceira via do Direito Penal: Uma nova visão de proteção às vitimas de crimes.

26/02/2015 às 09:44
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Há muito tempo o Direito Penal se apresenta mais especificamente na defesa dos interesses dos autores de crimes.

Terceira via do Direito Penal: Uma nova visão de proteção às vitimas de crimes.

 

Há muito tempo o Direito Penal se apresenta mais especificamente na defesa dos interesses dos autores de crimes.

Houve uma época que parte da doutrina denominava o Direito Penal como Carta Protetora dos Delinquentes.

Até hoje o comportamento da vítima, em alguns crimes,  tem papel decisivo na aplicação da pena, ao autor do crime, conforme define o artigo 59 do Código Penal Brasileiro que trata das circunstâncias judiciais na primeira etapa de aferição, própria do sistema trifásico de Nelson Hungria, adotado no artigo 68 do Código Penal.

De um tempo para cá o ordenamento jurídico passou a volver suas atenções também para proteção a vítima, chamado de Direito Penal de Terceira Via, ainda em sede Direito Penal.

No 53º Concurso de ingresso para a carreira do Ministério Público em Minas Gerais, o examinador questionou:

 No tocante ao poder punitivo estatal, o que se entende por terceira via do direito penal? Vejamos o espelho de resposta da questão:

"A terceira via do Direito Penal, na concepção de Claus Roxin, é a reparação de danos , legitimada que está pelo princípio da subsidiariedade do direito penal. Isso porque, para além da pena e da medida de segurança, ela é uma medida penal independente, que alia elementos do direito civil e cumpre com os fins da pena. Para o consagrado doutrinador, a reparação substituiria ou atenuaria a pena naqueles casos nos quais convenha, tão bem ou melhor, aos fins da pena e às necessidades da vítima. A inclusão no sistema penal, sancionador da indenização material e imaterial da vítima, significa que o Direito Penal passa a se aproximar mais da realidade social".

Na concepção de Roxin, a reparação pode ser entendida como uma prestação de caráter autônomo. Essa prestação autônoma pode servir para alcançar os fins penais tradicionais das sanções, e, desde que os alcance, deve substituir a pena ou atenuá-la conforme o caso. Para o autor, a consideração da reparação no direito penal tem, enquanto sanção autônoma, um caráter próprio no qual se mesclam elementos civis e penais. Ao compensar o dano, tem caráter civil. De outra borda, se levados em conta os esforços do autor para a reparação, esta assume uma modificação que converge para o sentido jurídico-penal. No direito penal, é justamente a vinculação da reparação com os fins de prevenção geral e especial que a diferencia da indenização civil, assumindo como uma prestação dotada de características que difere da respectiva civil. A partir destas considerações, o autor afirma que a reparação deverá desenvolver-se mo âmbito das penas e das medidas de segurança como uma terceira via no direito penal. A legitimação jurídica dessa terceira via está no princípio da subsidiariedade. Este viria, assim, a legitimar a possibilidade de renunciar à pena, na medida em que fossem satisfeitas as necessidades preventivas através da realização de uma prestação positiva orientada à superação das consequências do delito, em que pese a existência da ameaça abstrata de pena. O princípio da subsidiariedade estende sua operatividade além dos limites tradicionais em que se havia confinado como limite ao legislador, isto é, como pauta contenedora que incide sobre a decisão judicial a respeito da concreta reação penal. Logo, o juiz deve atuar com vistas às finalidades político-criminais do direito penal, tendo especialmente em conta a reparação”. PRADO, Cláudio Amaral do. Despenalização pela reparação de danos: a terceira via. Leme: J.H. Mizuno, 2005, p. 166- 167. E deve ser dito que a reparação de danos não necessariamente precisa ser patrimonial, já que poderá ser de ordem moral, com uma retratação, pedido de desculpas, etc. Neste sentido: PALERMO, Pablo Galain. La reparación del daño como ‘tercera vía’ punitiva? Especial consideración a la posición de Claus Roxin. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, v. 13, n. 55, jul/ago. 2005, p. 189/191.

Já no âmbito Cível, pode a vítima se valer das normas e instrumentos do Direito Civil, em especial do artigo 186 do NCC.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Neste contexto de modificação, foi assim que aconteceu em 1995 quando da publicação da Lei dos Juizados Especiais Criminais, o que possibilitou a composição civil dos danos provocados, consoante artigo 74 da Lei nº 9.099/95, além de proporcionar condições de transação penal.

Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.

A mais recente modificação na legislação brasileira aconteceu em 2008, quando da publicação da Lei nº 11.719, de 2008, que determinou nova redação ao artigo 387 do Código de Processo Penal, que diz respeito aos requisitos necessários a prolação da sentença penal condenatória.

Assim, neste ambiente de mutação, o juiz ao proferir a sentença condenatória, fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido.

Também transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros, nos termos do artigo 63 do Código de Processo Penal.

 Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 do Código de Processo Penal, sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido.

Por fim, diante de todo o avanço na proteção dos direitos das vítimas de crimes, ainda é muito tímida a tutela dos seus direitos.

Diante dessa timidez, surgem para as vitimas de crimes, como alternativa viável, o legítimo interesse jurídico no âmbito da possibilidade jurídica, de promover  as ações de reparação de danos, porventura, sofridos contra o Estado, na chamada responsabilidade objetiva, artigo 37, § 6º, da Constituição da República, de 1988, por prestação deficiente de Segurança Pública, afirmação conclusiva diante do quadro coático e bagunçado em que vivenciamos nos dias atuais no Brasil.

Assim, provando a situação de vítima de crimes, o nexo de causalidade, consubstanciado na omissão e leniência estatal, e o evento danoso, resta-se ao Estado indenizar o lesado, inclusive, cumulando as indenizações por danos materiais e morais pelo mesmo fato, a teor da Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça.

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Essa omissão se evidencia, claramente, quando dados fornecidos pela Anistia Internacional demonstram um expressivo aumento de 157% dos caso de estupro no Brasil.

Isto se mostra claro também quando 53 mil pessoas são assassinadas, anualmente, no Brasil, a maior parte envolvida na guerra por disputa de limites territoriais do tráfico ilícito de drogas.

Claro também são os nefastos dados de 10 mulheres assassinadas diariamente no país, ou a cada dois minutos cinco mulheres são espancadas no Brasil, ou ainda quando o nosso país ocupa o segundo lugar do mundo onde a mulher fica mais vulnerável e suscetível a ser vítima de crime.

Assim, uma atividade que deveria ser essencial de Estado, tutela dos direitos fundamentais, notadamente, à segurança pública, infelizmente se mostra cada vez mais deficiente em função de falência legislativa, dos desvios de  recursos dos cofres públicos e ausência de compromissos com a sociedade.

Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

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