Visão sobre o documentário “Notícias de uma guerra particular”

03/03/2015 às 11:32

Resumo:


  • O documentário "Notícias de uma Guerra Particular" retrata a realidade violenta do Morro Santa Marta no Rio de Janeiro, mostrando o cotidiano dos moradores, policiais e traficantes.

  • A relação entre moradores e traficantes é complexa, com os traficantes muitas vezes vistos como provedores de segurança e recursos, em contraste com a ausência de apoio do poder público.

  • A ação policial é desafiadora e muitas vezes ineficaz devido à falta de recursos e corrupção, criando um ciclo de violência e desconfiança entre a polícia e a comunidade.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Notícias de uma Guerra Particular é um documentário brasileiro, produzido pelo cineasta João Moreira Salles e pela produtora Kátia Lund. Elaborado nos anos de 1997 e 1998, o referido trabalho relata a triste realidade do cotidiano dos moradores do Morro.

INTRODUÇÃO

 Notícias de uma Guerra Particular é um documentário brasileiro, produzido pelo cineasta João Moreira Salles e pela produtora Kátia Lund.

Elaborado nos anos de 1997 e 1998, o referido trabalho relata a triste realidade do cotidiano dos moradores do Morro Santa Marta no Rio de Janeiro e mostra a finco a dura realidade da convivência dos moradores com os traficantes que travam uma luta diária com a Polícia na Guerra contra o Tráfico.

O trabalho teve como método de pesquisa entrevistas feito com pessoas ligadas ao tráfico, além de moradores do Morro, policiais e os traficantes que deram depoimentos acerca da realidade vivida por todos.

Cabe ressaltar, que o título conferido ao documentário vem de uma fala do ex – capitão do Batalhão de Operações Especiais do Rio de Janeiro (BOPE), Rodrigo Pimentel, que reporta a este combate ao tráfico, como uma verdadeira Guerra Civil interminável.

1 – Relação Moradores/Traficantes

Como já suscitado, o documentário é baseado unicamente de dados obtidos junto à Polícia Militar do Rio de Janeiro e, principalmente por meio de entrevistas concedidas.

Assim, pode-se dizer que o trabalho realizado, denota de uma pesquisa etnográfica, onde são utilizados os três atos cognitivos da etnografia, o olhar, o ouvir e o escrever, pois para se fazer um trabalho de tamanha importância, estes três fatores tem que ser observados, como pontua Oliveira (1998, p. 31 – 32):

Como procurei mostrar desde o início, essas “faculdades” do espírito têm características bem precisas quando exercitadas na órbita das ciências sociais e, de um modo todo especial, na Antropologia. Se o olhar e o ouvir consistem a nossa percepção da realidade focalizada na pesquisa empírica, o escrever passa ser parte quase indissociável do nosso pensamento, uma vez que o ato de escrever é simultâneo ao de pensar.

Desta forma, foi possível colher dados impactantes e assustadores. É de ressaltar, que a maior queixa vinda por parte tanto dos moradores, quanto dos traficantes, está no que tange a falta de oportunidades na vida, ou seja, a ausência de estudos, de emprego, de uma forma de vida mais digna do ser humano.

Os “garotos” que hoje estão no mundo do crime, alegam que só estão nesta vida pelo fato de não terem tido uma educação de qualidade, ou até mesmo uma oportunidade para desenvolver alguma atividade “lícita”, longe do mundo da criminalidade.

Cabe frisar, que muitos também admitiram, não querer trabalhar, para ganhar apenas um salário mínimo no final do mês que à época correspondia a pouco mais de R$ 150,00 (Cento e cinqüenta reais), ao passo, que no tráfico, eles “levantavam” cerca de R$ 300,00 (Trezentos reais) por semana.

Com isso, cabe observar dois pontos, o primeiro no que tange a impotência do Poder Público em conferir políticas mais eficazes de assistencialismo, incentivar as crianças a estudarem, oferecendo condições para tanto, não criar tanto empecilho para o jovem encontrar o seu primeiro emprego.

Como pontua, Misse e Kant (2011, p. 274):

Ao governo, com seus instrumentos, assim como às instituições encarregadas de administrar conflitos, cabe promover a igualdade de oportunidades e a sua resolução sistemática, zelando pela previsibilidade da vida social. A igualdade prevalece sobre a liberdade.

Ou seja, nada mais do que qualificar estas pessoas para que elas possam vislumbrar um futuro mais digno, longe da pobreza e do mundo do crime.

A partir deste paradigma, passa-se a traçar a relação dos moradores “aqueles que não estão envolvidos com o tráfico” e os traficantes propriamente ditos. Os moradores, cansados de tanta desigualdade e falta de oportunidade, passaram a respeitar mais os traficantes do que os policiais, isto ocorre pelo simples motivo que fora alegado de que os traficantes proporcionam para estes moradores oportunidades que o Poder Público não oferece.

Os traficantes conferem, por exemplo, aos moradores do Morro, segurança, o que não ocorre muitas vezes por parte da polícia, além do que, o dinheiro arrecadado com o tráfico ajuda as famílias que vivem naquele lugar, transformando esta prática em uma forma de economia “rentável”, para o Morro.

Com isso, o traficante que possui o “Poder” do tráfico no Morro é respeitado e venerado por grande parte dos moradores, pelo fato de ser visto como um verdadeiro “líder comunitário”.

Porém, para chegar a este “Poder”, a Guerra entre as quadrilhas é intenso e muitas vezes vários inocentes acabam sofrendo e perdendo suas vidas, neste conflito, é por este motivo que o Poder Público deve intervir com políticas que realmente dêem resultado, para evitar que mais e mais vidas se vão inutilmente.

2 – A Ação Policial

Como o Poder Público não é capaz de realizar medidas para acabar com a criminalidade, cabe à Polícia ter que intervir e “tentar” fazer com que essa disputa pelo poder do tráfico acabe com o fim de evitar que se ceifem mais vidas inocentes.

A Polícia é um instituto do Poder Público, que como relatado no documentário “Ganha pouco para trabalhar muito” e, muitas das vezes a atuação dos policiais acaba sendo desvirtuada pelas tentações do fácil mundo do crime.

O que muitas vezes impede o fim da criminalidade é a corrupção policial, que muitas vezes culmina com atos violentos, dignos de Guerra, pois as chamadas milícias estão espalhadas por todo o país e os policiais, muitas das vezes visando o dinheiro fácil acoberta ações dos traficantes, deixando-os livre para atuar.

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Porém, a Polícia, por estar de fato no poder, às vezes tem prerrogativas que os traficantes não têm e utilizam de meios para que seus próprios atos fiquem acobertados, como exterminar vários grupos de traficantes visando evitar uma possível delação de sua ação corrupta.

 É por isso, que os moradores do Morro, respeitam mais os traficantes do que os policiais, porque para eles os traficantes são mais “Confiáveis” do que aqueles que detêm o poder de punir.

Cabe, contudo pontuar que não são todos os policiais que agem desta forma, pois se assim fosse, a criminalidade no Brasil estaria com índices mais alarmantes ainda.

É de ressaltar que mais uma vez, nosso Poder Público peca neste ponto, pois cabe ao Estado promover às Polícias treinamentos mais eficazes, conferir a estes materiais de uso tão combativos quanto o dos bandidos. Pois, como relata o documentário, não adianta de nada a Polícia entrar no Morro munida de “Revólver 38, ao passo que os bandidos vão recebê-la de pistola ponto 40”.

Quanto à nossa atual legislação, não adianta nada prender um bandido hoje, pois, se ele mesmo sabe que amanhã estará solto, então a reforma do Código Penal é de suma importância para que garanta com mais eficácia a promoção da paz social.

A respeito, versa Misse e Kant (2011, p. 275):

Os conflitos, nesse modelo, significam uma inconformidade com a ordem estabelecida, uma desarrumação da ordem, uma tentativa de ruptura institucional. Devem, assim, ser evitados ou suprimidos a todo custo, pois representam uma ameaça à paz social. Aqueles que ousarem provocá-los e explicitá-los devem ser punidos publicamente. A sua administração deve ser feita através da repressão, visando sua extinção ou forçando-se a conciliação entre as partes em litígio.

A Polícia do Rio de Janeiro, faz um brilhante trabalho na prevenção do crime, mesmo com todas as dificuldades enfrentadas, pois, nas palavras do ex – capitão do BOPE, Rodrigo Pimentel “(...) nós fazemos a segurança do Estado, temos que manter os excluídos sob controle”.

3 – CONCLUSÃO

Cabe concluir, que o documentário, mesmo sendo de 1999, ou seja, do Século passado ainda se mostra bem atual, perante a realidade que vivemos no Brasil.

É de ressaltar, com o que foi dito que, é imprescindível que se criem novas políticas de atendimento básico à população, principalmente no que tange proporcionar oportunidades para os jovens, pois a prevenção começa desde cedo, ao incentivar as crianças a possibilidade de se “Formar” menos traficantes é grande.

Quanto à atuação policial, cabe ao Governo como já foi dito, proporcionar mais capacitação aos nossos policiais, vez que não se pode culpá-los de não conseguir prevenir o crime, se estes não estão aptos para tamanha responsabilidade.

Essa capacitação, não está só no que tange a um armamento mais qualificado, mas também passa por um acompanhamento psicológico, pois estes policiais que travam uma Guerra diária precisam fazer um trabalho neste aspecto, sendo uma forma de prevenção da corrupção que infelizmente ocorre dentro da Polícia.

Somente com novas perspectivas de mudança na área de incentivo à educação, esporte, trabalho, cultura, é que podemos vislumbrar um futuro mais digno para a população brasileira.

Ademais, se não forem tomadas tais providências essa Guerra nunca terá fim, pois o meio eficaz para acabá-la é prevenindo o seu começo, como já temos um início cabe aos nossos governantes propiciar à esta população de baixa renda perspectivas para uma futuro melhor.

.REFERÊNCIAS

MISSE, Michel. KANT, Roberto de Lima. Acesso à Justiça e Processos Institucionais de Administração de Conflitos e Produção da Verdade Jurídica em uma Perspectiva Compara. In: Ensaios de Antropologia e de Direito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O trabalho do Antropólogo, olhar, ouvir e escrever. In: O trabalho do Antropólogo. São Paulo: Unesp, 1998.

Sobre o autor
Edvaldo do Carmo Silva

Advogado Civilista, atuante nas áreas de direito bancário, família, consumidor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

É de ressaltar, com o que foi dito que, é imprescindível que se criem novas políticas de atendimento básico à população, principalmente no que tange proporcionar oportunidades para os jovens, pois a prevenção começa desde cedo, ao incentivar as crianças a possibilidade de se “Formar” menos traficantes é grande.

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