As construtoras sempre podem atrasar a obra em 180 dias, sem que devam reparar os consumidores por perdas e danos?

04/03/2015 às 15:08
Leia nesta página:

Neste breve ensaio realizamos uma reflexão sobre a validade e eficácia da cláusula que informa sobre o prazo estimado para entrega do imóvel e respectivo prazo de carência, de acordo com o momento em que a venda do imóvel é realizada para o consumidor.

É comum a ocorrência de atraso na execução de obras de grande porte, sendo, portanto, de praxe a estipulação de um período de tolerância de 180 dias para que a construtora possa atrasar a entrega da obra, e o judiciário tem considerado válida tal cláusula.

Ocorre, todavia, que a questão deve ser melhor analisada e refletida de acordo com as peculiaridades de cada caso. Durante a execução de uma obra, na medida que ocorrem atrasos no cronograma de uma determinada etapa, imediatamente, a construtora possui condições de recalcular o prazo final, no qual acredita será concluída a obra.

Geralmente, as construtoras começam a vender as unidades imobiliárias de um empreendimento antes do início, durante e após o término da obra. Antes da obra se iniciar elas estipulam de forma bem fundamentada um prazo para entrega, que é informado para quem deseja comprar naquele momento, todavia, já durante a execução da obra, principalmente na fase final, elas têm condições de saber que o cronograma inicialmente previsto não é possível ser cumprido, ou seja, já sabem que o prazo previsto para entrega da obra é outro, todavia, as construtoras omitem propositalmente tais informações, e, durante todo o período de construção, informam aos compradores, sempre o mesmo prazo, conquanto em muitos casos já tenha ela conhecimento que inexiste possibilidade de conclusão no prazo estipulado antes do início das obras.

    Assim sendo, devem ser melhor analisadas a validade e eficácia da cláusula que informa o prazo estimado para entrega do imóvel e respectivo prazo de carência, de acordo com o momento em que a venda do imóvel é realizada para o consumidor.

    Se uma construtora realiza a venda de um imóvel quando já tenha conhecimento de que a previsão para conclusão da obra não corresponde ao inicialmente previsto, deve obrigatoriamente agir com transparência e boa-fé, informando ao consumidor qual é a sua expectativa real para conclusão da obra, naquele momento, sob pena de, não o fazendo, induzir o consumidor em grave erro, informando algo que sabidamente não iria cumprir.

     Se a construtora informar o novo prazo (correto) ao consumidor, em que realmente acredita irá ser concluída a obra, dependendo das circunstâncias, de acordo com o planejamento de vida e anseios do consumidor, este poderá optar por outro imóvel que realmente seja entregue em um momento anterior.

       Interessante relembrar que o art. 51, XV, do CDC dispõe que são nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos que estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor.

         Diante do raciocínio acima desenvolvido, entendemos que a cláusula contratual que exime a construtora de qualquer responsabilidade civil, pelos prejuízos causados ao consumidor, pelo atraso de até 180 dias poderá ser absolutamente nula, se, no momento da venda do imóvel para o consumidor, a construtora já tiver condições técnicas de saber que a estimativa real para entrega da obra não coincide com a informada.

Sobre o autor
Leandro Marmo Carneiro Costa

Advogado. Especialista em Direito do Consumidor. Pós-graduado em Processo Civil pelo Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos