A ratificação judicial de protesto formado a bordo sofreu modificações com o advento do novo CPC.
Os procedimentos para a ratificação estão previstos nos artigos 782 a 786 do novel diploma processual.
“O protesto é um dos meios de que se serve o capitão do navio para comprovar quaisquer ocorrências no curso da viagem, seja em relação a carga, aos passageiros ou ao próprio navio. Representa o registro de qualquer acidente ocorrido em viagem, constando, pois, de uma declaração ou relato feito pelo capitão relativo às circunstâncias da viagem, às tempestades (borrascas) suportadas pelo navio, aos sinistros e acidentes supervenientes que o obrigaram a procurar outro porto e aí se refugiar (arribada forçada), a própria conduta do capitão a respeito de qualquer medida que julgou ser de seu dever tomar. É outrossim, o ato escrito do capitão do navio, tendente a comprovar sinistros, avarias ou quaisquer perdas sofridas pelo navio ou sua carga, ou ambos, e que tem por fim eximir o capitão pelos casos fortuitos ou de força maior (...). A ratificação judicial é condição de validade do protesto marítimo. Os protestos, quando confirmados pela ratificação sumária, têm fé pública e fazem prova em juízo, salvo prova em contrário.”(in, Gilbertoni, Carla Adriana Comitre Teoria e Prática do Direito Marítimo, 1a. Ed., Livraria e Editora Renovar, Rio de Janeiro, 1998, pp. 261/262).
O vocábulo protestar nem sempre significa discordar. Protestar é também manifestar, de forma solene, o desejo de fazer prova de um fato ou de alguma coisa.
As avarias, sinistros ou quaisquer perdas, na antiga sistemática legal, deveriam ser comunicadas à autoridade competente do porto de chegada dentro das primeiras 24 (vinte e quatro) horas da chegada do navio ao porto (Artigos 505 do C.ComB c/c artigos 725 a 729 do CPC/39, que foram mantidos em vigor pelo CPC/73). Tal procedimento foi corroborado pela nova sistemática procedimental.
Estabelece o art. 505 do Código Comercial, norma de direito material que rege o protesto, verba legis:
“Todos os processos testemunháveis e protestos formados a bordo, tendentes a comprovar sinistros, avarias, ou quaisquer perdas, devem ser ratificados com juramento do capitão perante a autoridade competente do primeiro lugar onde chegar; a qual interrogará o mesmo capitão, oficiais, gente da equipagem e passageiros sobre a veracidade dos fatos e suas circunstâncias, tendo presente o Diário de Navegação, se houver sido salvo”.
Regulando a matéria, no ordenamento anterior, assim estabeleciam os artigos 725 a 729 do CPC/39 mantidos em vigor por força do art. 1.218, inc. VIII do CPC/73, vejamos:
Art. 1.218. Continuam em vigor até serem incorporados nas leis especiais os procedimentos regulados pelo Decreto-lei no 1.608, de 18 de setembro de 1939, concernentes:
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VIII - aos protestos formados a bordo (arts. 725 a 729); (Incluído pela Lei nº 6.780, de 12.5.1980)
Art. 725. O protesto ou processo testemunhável formado a bordo declarará os motivos da determinação do capitão, conterá relatório circunstanciado do sinistro e referirá, em resumo, a derrota até o ponto do mesmo sinistro, declarando a altura em que ocorreu.
Art. 726. O protesto ou processo testemunhável será escrito pelo piloto, datado e assinado pelo capitão, pelos maiores da tripulação – imediato, chefe de máquina, médico, pilotos, mestres, e por igual número de passageiros, com a indicação dos respectivos domicílios.
Parágrafo único. Lavrar-se-á no diário de navegação ata, que precederá o protesto e conterá a determinação motivada do capitão.
Art. 727. Dentro das vinte e quatro (24) horas úteis da entrada do navio no porto, o capitão se apresentará ao juiz, fazendo-lhe entrega do protesto ou processo testemunhável, formado a bordo, e do diário de navegação.
O juiz não admitirá a ratificação, se a ata não constar do diário.
Art. 728. Feita a notificação dos interessados, o juiz, nomeando curador aos ausentes, procederá na forma do art. 685.
Art. 729. Finda a inquirição e conclusos os autos, o juiz, por sentença, ratificará o protesto, mandando dar instrumento à parte.
Desejando eximir-se de responsabilidade, prevenir a conservação e ressalva de seus direitos, deve o Capitão do navio, à luz dos novos ditames da lei processual, comparecer em juízo para relatar os fatos ocorridos a bordo, notadamente os tocantes aos casos fortuitos e de força maior, ocorridos durante a derrota da embarcação.
Dentro da nova sistemática do CPC, todos os protestos e os processos testemunháveis formados a bordo lançados no livro Diário da Navegação deverão ser apresentados pelo Comandante ao juiz de direito do primeiro porto, nas primeiras vinte e quatro horas de chegada da embarcação, para sua ratificação judicial.
A petição inicial conterá a transcrição dos termos lançados no livro Diário da Navegação e deverá ser instruída com cópias das páginas que contenham os termos que serão ratificados, dos documentos de identificação do Comandante e das testemunhas arroladas, do rol de tripulantes, do documento de registro da embarcação e, quando for o caso, com cópia do manifesto das cargas sinistradas e a qualificação de seus consignatários, traduzidos, quando for o caso, de forma livre para o português.
A petição inicial deverá, ainda, ser distribuída com urgência e encaminhada ao juiz, que ouvirá, sob compromisso a ser prestado no mesmo dia, o Comandante e as testemunhas em número mínimo de duas e máximo de quatro, que deverão comparecer ao ato independentemente de intimação.
Tratando-se de estrangeiros que não dominem a língua portuguesa, o autor deverá fazer-se acompanhar por tradutor, que prestará compromisso em audiência. Caso o autor não se faça acompanhar por tradutor, o juiz deverá nomear outro que preste compromisso em audiência.
Aberta a audiência, o juiz mandará apregoar os consignatários das cargas indicados na petição inicial e outros eventuais interessados, nomeando para os ausentes um curador para o ato.
Inquiridos o Comandante e as testemunhas, o juiz, convencido da veracidade dos termos lançados no Diário da Navegação, em audiência ratificará por sentença o protesto ou o processo testemunhável lavrado a bordo, dispensado o relatório. Independentemente do trânsito em julgado, determinará a entrega dos autos ao autor ou ao seu advogado, mediante a apresentação de traslado.
O protesto é, por excelência, o meio para declaração de avaria grossa[1] e arribada forçada (artigo 743 do CComB).
Somente o protesto, devidamente ratificado pela autoridade judicial competente, é capaz de elidir as responsabilidades civil (artigos 1.056 a 1.058 do CCB) e tributária (artigos 664[2] do Decreto 6.759/2009 – RA e Artigo 32, II e 60 do Dec. Lei 37/66) tanto do transportador como do seu agente marítimo.
No que pertine aos protestos ratificados judicialmente, como elemento ensejador das excludentes de responsabilidade, de forma lúcida, assim se posicionam nossos tribunais:
TRF-3 - APELAÇÃO CÍVEL AC 97459 SP 93.03.097459-0 (TRF-3)
Data de publicação: 25/04/2007
Ementa: TRIBUTÁRIO - IMPOSTO SOBRE IMPORTAÇÃO - AUTO DE INFRAÇÃO - AVARIA - DEFASAGEM NO PESO DA MERCADORIA IMPORTADA - CASO FORTUITO NO TRAJETO - PROVA INEQUÍVOCA - HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL DE RATIFICAÇÃO DE PROTESTO MARÍTIMO - INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR. 1. Ausência de comprovação acerca da correspondência do peso total da mercadoria descrita nas D.I.s (Declarações de Importação) com o peso conjunto das sacas de arroz efetivamente internalizadas por meio das três operações de importação ensejadoras das autuações. 2. Consoante o disposto no artigo 480, do Decreto n. 91.030 /85, antigo Regulamento Aduaneiro, o legislador eximiu de responsabilidade o transportador que, mediante "protesto formado a bordo de navio ou de aeronave" e "ratificado pela autoridade judiciária competente" materializar prova de caso fortuito ou força maior. 3. Demonstração, por meio de Processos de Homologação Judicial de Ratificação de Protesto Marítimo, que os navios utilizados para o transporte das mercadorias importadas foram surpreendidos, em seu percurso, por incidentes de ordem natural decorrentes de mau tempo enfrentado em alto mar. 4. Eventuais perdas decorrentes do entrechoque das sacas de arroz nos porões dos navios nenhuma responsabilidade poderiam acarretar à empresa transportadora frente à Administração Aduaneira. 5. Ausência de amparo ao procedimento de constituição do crédito tributário sobre a importação de mercadorias cuja internalização, a despeito de declarada e despachada, deixa de ocorrer por circunstâncias alheias à vontade do importador. 6. "Ex vi" do artigo 3º do Código Tributário Nacional , tributo não tem natureza sancionatória de ato ilícito.
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TRF-3 - APELAÇÃO CIVEL 265841 AC 59982 SP 95.03.059982-2 (TRF-3) - Data de publicação: 23/05/2006
Ementa: II. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CASO FORTUITO NO TRAJETO. PROVA INEQUÍVOCA. RATIFICAÇÃO DE PROTESTO MARÍTIMO LAVRADO A BORDO. EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR. VERBA HONORÁRIA AFASTADA. 1. Reexame necessário não conhecido, em razão do § 2º , do artigo 475 , do CPC . 2. A embargante fez prova inequívoca, através da juntada, dos autos da ação de Ratificação de Protesto Marítimo Lavrado a Bordo, e postulada pelo Capitão do navio, em atenção ao disposto no artigo 505 do Código Comercial , de que a avaria e o extravio da mercadoria (xarope em garrafas) que ensejaram o lançamento do II consubstanciado na CDA, decorreu de caso fortuito, evento da natureza, imprevisível e inevitável, qual seja, ventos de excessiva velocidade ocorrentes no trajeto de longo curso, que deslocaram os containers transportados. 3. Trata-se de evento que obsta a responsabilização do transportador (embargante) pelo pagamento dos tributos devidos em relação às faltas de mercadoria apuradas pela Fiscalização Aduaneira, em consonância com o disposto no artigo 480, inciso I, do Decreto n. 91.030 /85. 4. A alegação de que o transportador só estaria excluído da responsabilidade se tivesse comunicado à Fiscalização, no ato da vistoria, em 18/12/1.991, a existência da ação retro citada, postulada em 05/11/1.991, data em que o navio atracou no primeiro porto brasileiro, numa análise conjunta do § 1º com o § 2ºdo artigoo vertente, não procede, isso porque, o segundo parágrafo apenas faculta a produção de prova no curso da vistoria, não obstando que seja ela produzida em outro momento, e tampouco tornando sua comunicação, no ato, pressuposto à excludente citada. 5. O artigo 480 do Regulamento Aduaneiro é claro, exige apenas a ratificação do protesto por autoridade competente, e condiciona a exclusão da responsabilidade à prova da ocorrência de caso fortuito, condições inexoravelmente cumpridas pela embargante, através do Capitão do navio que fez o transporte da mercadoria, e que deu estrito...
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Processo: REEX 200281000120745 - Relator(a):
Desembargador Federal Fernando Braga
Julgamento: 11/03/2014 - Órgão Julgador: Segunda Turma
Publicação: 14/03/2014
Ementa - TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. AUTO DE INFRAÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA. AGENTE MARÍTIMO. CIRCUNSTÂNCIA DE FORÇA MAIOR EXCLUDENTE DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 480. DECRETO 91.030/85. SÚMULA 192 DO EX-TFR. INAPLICABILIDADE.
1. De acordo com o art. 32 do Decreto-Lei 37/66, com a redação conferida pelo Decreto-Lei 2.472/88, tratando-se de fatos geradores ocorridos em fevereiro de 2001, relativos ao imposto de importação, é possível eleger o agente marítimo como responsável tributário quando o transportador da mercadoria importada for estrangeiro. Atribuição de responsabilidade nos termos do inciso II do parágrafo único do art. 121, e do art. 128, ambos do Código Tributário Nacional.
2. O enunciado da Súmula 192 do extinto Tribunal Federal de Recursos, segundo a qual "O agente marítimo, quando no exercício exclusivo das atribuições próprias, não e considerado responsável tributário, nem se equipara ao transportador para efeitos do decreto-lei 37, de 1966", não subsiste para os fatos geradores ocorridos após a edição do referido Decreto-Lei 2.472/88, porquanto tal entendimento foi consolidado quando não havia previsão legal de responsabilidade tributária solidária do representante do transportador de mercadoria estrangeira. Precedente do Superior Tribunal de Justiça julgado sob o rito dos recursos repetitivos e deste Tribunal (REsp 1129430, Min. Luiz Fux, AC 562737/AL, Relator Desembargador Federal Francisco Cavalcanti).
3. Ressalte-se que embora o julgado do STJ acima transcrito tenha destacado, em seu item 16, não estar firmando posição se o agente marítimo é representante do transportador estrangeiro, a jurisprudência pátria vem se mostrando pacífica quanto a este enquadramento desde a época da edição da própria Súmula 192 do extinto Tribunal Federal de Recursos.
4. A existência de circunstância de força maior que ensejou a avaria dos produtos importados, provada através de Protesto Marítimo ratificado por decisão da 9ª Vara Cível de Fortaleza, é causa de exclusão da responsabilidade do agente marítimo, nos termos do art. 480 do Regulamento Aduaneiro (Decreto 91.030/85).
5. Não se pode exigir, como pretende a Fazenda Pública, amparando-se no parágrafo 2º do referido art. 480, que a ratificação judicial do Protesto Marítimo, para efeito de exclusão da responsabilidade tributária, ocorra antes do término do processo administrativo fiscal.
6. O contribuinte não pode ser prejudicado pela demora do Poder Judiciário em fornecer-lhe o provimento jurisdicional requerido dentro do prazo legal. Demais disso, a redação vigente do dispositivo que afasta a responsabilidade tributária do agente marítimo não exige mais que as provas excludentes de sua responsabilidade sejam produzidas no curso da vistoria, razão pela qual se permite a aplicação da legislação mais benéfica, nos termos do inciso II do art. 106 do Código Tributário Nacional.
A ratificação judicial do protesto marítimo deve ser não só uma preocupação do transportador como também de seu agente marítimo, tendo em vista o entendimento de alguns tribunais que, de acordo com o art. 32, II do Decreto-Lei 37/66[3], com a redação conferida pelo Decreto-Lei 2.472/88, tratando-se de fatos geradores ocorridos a partir da edição da Medida Provisória nº 2158 -35, de 2001, relativos ao imposto de importação, é possível eleger o agente marítimo como responsável tributário quando o transportador da mercadoria importada for estrangeiro TRF5 - REEX 200281000120745). Atribuição de responsabilidade atribuída nos termos do inciso II do parágrafo único do art. 121, e do art. 128, ambos do Código Tributário Nacional.
O protesto marítimo depois de ratificado numa corte de justiça produz os mesmos efeitos do protesto judicial. O protesto marítimo ratificado, pois, se valida como notificação que se faz dirigida erga omnes diante da necessidade de se prevenir responsabilidade e prover a conservação e a ressalva de direito.
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[1] Para se iniciar a regulação de uma avaria grossa, teremos de considerar o conjunto de valores carregados, juntamente com o valor do navio, assim como o valor dos danos sofridos e das despesas extraordinárias feitas no decorrer das fainas e reparos.
Advindo, assim, a necessidade de, juntando à exposição dos fatos, o protesto marítimo (...) – ( Filho, Olavo Caetano Corrêa, Avaria Grossa de Navio, ADCOAS, 2001, p. 61).
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A regulação pode ser dividida em três etapas:
Etapa preparatória - Em que se faz a ratificação do Protesto Marítimo; a vistoria do navio e da carga, para verificar as avarias sofridas, e neste momento são estabelecidos o valor do navio e carga que entrarão nos cálculos da regulação; e o inquérito da Capitania dos Portos, que dirá se o caso foi fortuito, culposo etc...( http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1553/As-avarias-e-o-Direito-Maritimo - Samyr Cruz)
[2] Art. 664. A responsabilidade a que se refere o art. 660 pode ser excluída nas hipóteses de caso fortuito ou força maior. (Redação dada pelo Decreto nº 8.010, de 2013).
Parágrafo único. Para os fins de que trata o caput, os protestos formados a bordo de navio ou de aeronave somente produzirão efeito se ratificados pela autoridade judiciária competente. (Incluído pelo Decreto nº 8.010, de 2013)
[3] Decreto Lei nº 37 de 18 de Novembro de 1966
Dispõe sobre o imposto de importacao, reorganiza os serviços aduaneiros e dá outras providências.
Art. 32. É responsável pelo imposto: (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01/09/1988)
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II - o representante, no País, do transportador estrangeiro; .(Redação dada pela Medida Provisória nº 2158 -35, de 2001)