DA REJEIÇÃO E DO NÃO RECEBIMENTO DA PEÇA ACUSATÓRIA

23/03/2015 às 13:17
Leia nesta página:

O ARTIGO DISCUTE A DECISÃO QUE REJEITA A DENÚNCIA E A ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA.

DA REJEIÇÃO E DO NÃO RECEBIMENTO DA PEÇA ACUSATÓRIA.

ROGÉRIO TADEU ROMANO

Procurador Regional da República aposentado

Estuda-se a questão da rejeição da peça acusatória.

Diante do artigo 395 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 11.719/2008, aponto as causas para rejeição da denúncia:

a)      Quando a denúncia for manifestadamente inepta;

b)      Faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal;

c)       Falta justa causa para o exercício da ação penal.

Anoto que a rejeição prevista no artigo 395, caput, corresponde aquilo que grande parcela da doutrina e da jurisprudência chamava de ¨não recebimento¨, com a finalidade de distinguir o ato de ¨rejeição¨, por razões de mérito(materiais), do indeferimento da inicial fundado em aspectos processuais(formais ou preliminares de mérito). Era o que se tinha da Súmula 60 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região quando se dizia: ¨da decisão que não recebe ou que rejeita a denúncia cabe recurso em sentido estrito.¨ Não é, à toa, que, ainda na vigência do antigo artigo 43 do Código de Processo Penal, antes da edição da Lei 11.719/08, muitos faziam a dicotomia: não recebimento(recurso em sentido estrito); rejeição(apelação).

 O mais correto é: encerrando-se o feito, seja por decisão terminativa, seja por decisão definitiva(que enfrenta o mérito), o recurso é apelação. Tal se vê da decisão que rejeita a denúncia ou queixa nos Juizados Especiais(artigo 82 da Lei 9.099/95).

O antigo não-recebimento – agora rejeição – sempre foi insuscetível de gerar coisa julgada material. Assim, sanado o vício, era perfeitamente possível a repropositura da demanda, tantas vezes quantas necessárias fossem. É o que  se via, por exemplo, com relação a pouca atenção dada à descrição da conduta dos acusados, como a falta de menção às características que compõem a narrativa dos fatos. Era o caso, outrossim, da descrição genérica na conduta dos acusados, nos crimes societários.

Toda decisão que rejeita a peça acusatória será uma decisão interlocutória mista.

Com a redação que se deu ao artigo 395 do Código de Processo Penal, a peça acusatória será rejeitada por questões processuais; já quando a questão for de mérito(atipicidade e extinção da punibilidade), o dispositivo da decisão indicará absolvição sumária, que será impugnável pelo recurso de apelação(artigo 416, CPP). Não se rejeita a denúncia por questões de mérito: absolve-se.

 A antiga rejeição – hoje, absolvição sumária – faz, atualmente, como antes fazia, coisa julgada material, como se dá com o julgamento antecipado do mérito(artigo 330 do Código de Processo Civil), impedindo a rediscussão dos fatos após a preclusão da sentença ou o exaurimento das vias recursais. Era o caso da atipicidade de conduta, a existência de obstáculo à ilicitude ou à culpabilidade, a extinção da punibilidade – por morte, reparação do dano, pagamento de tributo, nos crimes tributários, onde a acusação não poderia reiterar em nova demanda o pedido de condenação.

Penso ser mister atentar para tais distinções.

A esse respeito, pronunciou-se o Ministro Sepúlveda Pertence:

EMENTA: Inquérito policial: decisão que defere o arquivamento: quando faz coisa julgada.

A eficácia preclusiva da decisão que defere o arquivamento do inquérito policial, a pedido do Ministério Público, é similar à daquela que rejeita a denúncia e, como a última, se determina em função dos seus motivos determinantes, impedindo – se fundada na atipicidade do fato – a propositura ulterior da ação penal, ainda quando a denúncia se pretenda alicerçada em novos elementos de prova.

Recebido o inquérito – ou, na espécie, o Termo Circunstanciado de Ocorrência – tem sempre o Promotor a alternativa de requisitar o prosseguimento das investigações, se entende que delas possa resultar a apuração de elementos que dêem configuração típica ao fato (C.Pr.Penal, art. 16; L. 9.099/95, art. 77, § 2º).

Mas, ainda que os entenda insuficientes para a denúncia e opte pelo pedido de arquivamento, acolhido pelo Juiz, o desarquivamento será possível nos termos do art. 18 da lei processual.

O contrário sucede se o Promotor e o Juiz acordam em que o fato está suficientemente apurado, mas não constitui crime.

Aí – a exemplo do que sucede com a rejeição da denúncia, na hipótese do art. 43, I, C.Pr.Penal – a decisão de arquivamento do inquérito é definitiva e inibe que sobre o mesmo episódio se venha a instaurar ação penal, não importa que outros elementos de prova venham a surgir posteriormente ou que erros de fato ou de direito hajam induzido ao juízo de atipicidade.

(HC 80.560-4/GO, rel. Min. Sepúlveda Pertence, T1, 20.02.01; DJ 30.03.2001)

Passo a discussão sobre a justa causa.

A justa causa è a necessidade de lastro mínimo para o exercício da ação, onde se exigem indícios[1] de autoria e de materialidade, que são coligidos, geralmente de inquérito policial aberto para tanto, ou ainda um procedimento, como, por exemplo, investigação ministerial.

Se o crime deixar vestígios é necessário que a petição inicial se faça acompanhar de laudo pericial. Não sendo possível a sua utilização a hipótese é de apresentação de prova testemunhal.

Para NUCCI,[2] o ideal, na redação do artigo 395 do Código de Processo Penal, teria sido reduzir todo o quadro da rejeição a um só parâmetro: falta de justa causa para a ação penal que abrangeria todas as situações relevantes.

Discute-se o recurso para combater a rejeição da denúncia.

O recurso cabível para combater a rejeição da denúncia ou queixa, como se lê do artigo 581, I, do Código de Processo Penal, é o recurso em sentido estrito. Se for recebida, caberá da parte do réu a impetração de habeas corpus, se for o caso, objetivando trancar o processo.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

No caso de denúncias ajuizadas, perante os Juizados Especiais Criminais, caberá, a teor do artigo 82 da Lei 9.099/95, o ajuizamento de recurso de apelação.

Já no que concerne às denúncias ajuizadas perante os tribunais de justiça ou ainda os tribunais regionais federais, a teor da Lei 8.038/90, caberá, seja se houver violação a norma infraconstitucional(recurso especial) ou violação a constituição(recurso extraordinário).

Lembro a Súmula 709 do Supremo Tribunal Federal para que salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale pelo recebimento dela.

Por sua vez, o artigo 397 do Código de Processo Penal aproxima-se do que temos no Processo Civil, com o julgamento antecipado da lide. É  a absolvição sumária.

O juiz recebe a denúncia ou queixa e determina ao réu que faça a sua defesa. Este oferece em sua argumentação documentos ou preliminares de conteúdo convincente para que o juiz possa absolvê-lo sumariamente.

Antes de tomar tal decisão, deve o juiz determinar a oitiva do órgão acusatório, garantindo-lhe a aplicação do contraditório.

Estamos diante das seguintes situações:

a)  Existência manifesta de excludente de ilicitude(artigo 23 do Código Penal);

b)  Existência manifesta de exclusão de culpabilidade;

c)   Fato narrado evidentemente não constitui crime: trata-se de atipicidade, evidenciado em solido argumento de prova documental;

d)  Extinção da punibilidade: para NUCCI[3], lembrando a aplicação do artigo 61 do CPP, que determina que o juiz pode, em qualquer fase do processo, reconhecer a extinção da punibilidade, se trata de decisão declaratória de extinção da punibilidade e não uma hipótese de absolvição.

É o julgamento antecipado da  lide no procedimento penal.

A sentença que reconhece a absolvição sumária, de cunho tipicamente declaratório, é sentença definitiva que faz coisa julgada material ao contrário da decisão que rejeita a peça acusatória. É decisão de mérito que se dá diante de prova indiscutível.

Da decisão que absolver sumariamente o acusado cabe apelação.


[1] Indícios são certas circunstâncias que permitir chegar à verificação da existência de um fato. Indício é uma circunstância certa e que se realizou ao passo que na presunção considera como realizado um fato não provado, fundando-se, entretanto, na experiência. Por um raciocínio intelectual a partir de um fato conhecido e demonstrado(indício), chega-se, por presunção, à demonstração de outro fato. 

[2] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, 10ª edição, São Paulo, RT, pág. 751.

[3] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado, 10ª edição, São Paulo, RT, pág. 769. 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos