Da ineficácia da cláusula de eleição de foro no NCPC

07/04/2015 às 17:39
Leia nesta página:

O Novo Código de Processo Civil (NCPC) traz regra nova a despeito da declaração de ofício, de incompetência, pautada em ação ajuizada com base na cláusula de eleição de foro.

O Novo Código de Processo Civil (NCPC) traz regra nova a despeito da declaração de ofício, de incompetência, pautada em ação ajuizada com base na cláusula de eleição de foro.

De início, importante entender como é a regra de competência no CPC/73 para então entender a alteração feita pelo legislador. Pois bem, o CPC/73, dentro da competência interna, estabelece quatro tipos de competências: i) competência em razão do valor; ii) competência em relação à matéria; iii) competência funcional (hierárquica); e iv) competência territorial. Sistemática, aliás, mantida no NCPC (art. 62 e 63).

Com efeito, a competência em razão da matéria e da hierarquia não se pode derrogar por convenção das partes, todavia a competência em razão do valor e do território permitem a derrogação, por meio de cláusula de eleição de foro (art. 111, CPC/73).

Nesse mesmo sentido, o NCPC estabelece a “competência determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função é inderrogável por convenção das partes” (art. 62), assim como as “partes podem modificar a competência em razão do valor e do território” (art. 63).

 Por conseguinte, tanto o CPC/73, quanto o NCPC, a competência é absoluta em razão da matéria e da pessoa ou função, sendo relativa em relação ao valor e território, situação em que poderá haver cláusula de eleição de foro. Contudo, o procedimento foi, corretamente, alterado, posto que a competência relativa é arguida por meio de exceção (art. 112, CPC/73), sendo no NCPC arguida em preliminar de contestação para ambos os casos (art. 64, NCP).

Assim não há mais a necessidade de em procedimento próprio, incidental ao processo principal, seja declarada a incompetência relativa, com a suspensão do processo principal. Oportuno esclarecer que em não sendo arguida a incompetência relativa em sede de preliminar de contestação, a mesma será prorrogada (art. 65, NCPC).

Destarte, a sistemática do CPC/73 é a de que, em regra, a incompetência relativa não pode ser declarada de ofício, posto que incumbe ao réu arguí-la (por meio de exceção), sob pena de prorrogação da competência (art. 114, CPC/73). Nesse mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 33, cujo teor estabelece que “a incompetência relativa não pode ser declarada de ofício”.

Todavia, a regra geral foi excepcionada pela Lei nº 11.280, de 2006, que inseriu o parágrafo único ao art. 114, CPC/73, determinando que a “nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu”.

Desta forma, a Lei nº 11.280/06, reconhecendo a prática jurisprudencial, permitiu a declaração de nulidade de cláusula de eleição, de ofício, em contrato de adesão, desde que por entendimento consolidado do STJ[1]: i) a parte não dispusesse, no momento de celebração do contrato, de intelecção suficiente para compreender o sentido e as consequências da estipulação contratual; ii) tal estipulação resultasse inviabilidade ou especial dificuldade de acesso ao judiciário; iii) se tratasse de contrato de obrigatória adesão, assim entendido o que tenha por objeto produto ou serviço fornecido com exclusividade por determinada empresa.

Por outro lado, em se tratado de relação de consumo, a cláusula de eleição de foro, poderá ser declarada nula de ofício, levando-se em conta o caráter impositivo das leis de ordem pública, no âmbito da lei consumerista, desde que haja abuso da cláusula contratual que estipula o foro para futura e eventual contenda entre as partes, subentendida como aquela que efetivamente inviabilize ou dificulte a defesa judicial do consumidor, ainda mais porque, nesses casos, a competência do juízo em que reside o consumidor é tida como absoluta[2].

Em síntese, no CPC/73, em regra, não se pode declarar de ofício a nulidade de cláusula de eleição de foro, sendo possível a declinação de competência com declaração de nulidade da cláusula de eleição, apenas em contrato de adesão, quando a cláusula for abusiva, ou em qualquer contrato quando se constar a existência de relação de consumo.

Todavia, o NCPC em seu § 3o, do art. 63, estabeleceu que “antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada ineficaz de ofício pelo juiz, que determinará a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu”.

Com efeito, referida regra altera a lógica do sistema processual, posto que a cláusula não é tida como nula, mas tão somente ineficaz, portanto, não poderá surtir efeito para as partes, e mais, basta a cláusula ser abusiva, não havendo necessidade de estar insculpida em um contrato de adesão, nesta senda, o NCPC adotou a regra (jurisprudencial) emanada do CDC.

Entretanto, referida regra, aparentemente, não se compatibiliza com o art. 10, do NCPC, pois essa estabelece que o “juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.

Contudo, a incompatibilidade é relativa, basta o juiz possibilitar que o Autor manifeste-se sobre a eventual ineficácia da cláusula de eleição de foro, lembrando que o réu não se manifestará, a priori, posto que ainda não foi citado.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Deste modo, a sistemática processual foi alterada pelo NCPC para que em sendo abusiva a cláusula de eleição de foro, nos casos de competência relativa, vale ressaltar em relação ao valor ou território, seja permitido ao juiz, de ofício, com a prévia oitiva do autor, declarar a ineficácia da cláusula com a declinação da competência.


[1] REsp 58.138/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, DJ de 22.05.1995.

[2] REsp 1.089.993/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Massami Uyeda, DJ de 08.03.2010.

Sobre o autor
Gabriel Barreira Bressan

Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Possui graduação pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor de Processo Civil na Faculdade de Direito da Universidade Santo Amaro - UNISA.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos