Leniência ou convivência?

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A Lei Anticorrupção foi criada para punir ou salvar empresas corruptas? Já é hora das atitudes confirmarem as palavras. A sociedade, maior interessada, agradece.

O jornal Folha de São Paulo publicou[1] matéria relatando que a Controladoria Geral da União (CGU) teria aguardado o término das eleições presidenciais para instaurar processo interno sobre a corrupção na Petrobras, muito embora já possuísse elementos hábeis para o seu início muito antes da disputa eleitoral.

Em declarações posteriores prestadas Jorge Hage (Ministro-Chefe da CGU à época) negou os fatos sob o argumento que o trabalho é anterior a novembro de 2014 e que precisava de dados consistentes e provas preliminares para dar início ao processo. Discussões à parte a questão principal é muito mais delicada.

Acompanhando tendência internacional a Lei anticorrupção (12.846/13) foi aprovada para punir a corrupção de empresas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Regulamentada com atraso superior a um ano (Decreto nº 8.420/15) e, mais recentemente, disciplinada por Portarias e Instruções Normativas da própria CGU, surgiram os procedimentos para sua efetiva aplicação como, por exemplo, a celebração do acordo de leniência (Portaria nº 910/15).

Mesmo diante de todas essas normas o grande questionamento deve ser direcionado ao Poder Legislativo (na qualidade de representantes da sociedade): até quando será permitido que questões como a celebração dos acordos de leniência, por exemplo, sejam controladas apenas pela CGU e pelos órgãos de confiança dos governos (estaduais e municipais) sem a possibilidade de fiscalização pelos órgãos que compõem o Poder Judiciário?

Do mesmo modo, até quando o acesso às informações sobre as linhas de crédito públicas (BNDES) será exclusivo do Executivo?

Vale lembrar que a Constituição Federal estabelece que a apreciação sobre lesão a direitos da sociedade não compete ao Executivo.

Ao contrário do que fizeram quando da criação da lei, já é tempo de sentar à mesa com os operadores do Direito e alinhar essa questão de grande relevância com o Conselho Nacional de Justiça, Conselho Nacional do Ministério Público, Advocacia Geral da União e Ordem dos Advogados do Brasil como feito recentemente para a “Operação Lava Jato”. Caso contrário continuaremos a nos questionar sobre a real aplicabilidade e transparência das leis no país.

A Lei Anticorrupção foi criada para punir ou salvar empresas corruptas? Já é hora das atitudes confirmarem as palavras. A sociedade, maior interessada, agradece.


[1] http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/04/1616369-tcu-e-oposicao-na-cpi-querem-ouvir-delator-do-caso-sbm-petrobras.shtml

Sobre o autor
Luís Fernando Diegues Cardieri

Advogado criminalista da Montgomery & Associados, em São Paulo.

Informações sobre o texto

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