Reforma política, democracia e sentimento constitucional

05/05/2015 às 19:40
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O presente Artigo busca chamar a atenção sobre a necessidade de melhor maturação democrática dos termos da reforma política que está por ser implementada no país.

Malgrado no âmbito do Congresso Nacional a Câmara dos Deputados e o Senado Federal terem competência concorrente para a proposição tanto de Proposta de Emenda à Constituição como de Projeto de Lei Ordinária, hodiernamente, sob o aspecto da iniciativa legislativa, a Câmara Federal tem trazido para si a responsabilidade de condução do processo de Reforma Política no país.

E são diversos fatores que assim predeterminam a louvável ação da Câmara dos Deputados.

De partida, não se olvida que o clamor legitimamente proclamado nas manifestações populares recentes afigurou-se como elemento primário da reação legislativa.

Todavia, secundariamente, a iniciativa unilateral da Câmara ganhou campo fértil de realização no atual cenário político nacional, em que o Executivo Federal, pelo resultado das Eleições passadas, sofreu um incomum processo de sub-representação, dada sua apertada vitória no sistema majoritário, desqualificada essa pela grande abstinência do eleitorado nacional no segundo turno.

Não é por outra razão que está havendo uma virada histórica na forma de condução do Governo do Estado, em que sempre no passado, pela sistemática do presidencialismo de coalização, o Executivo teve o domínio da pauta de trabalho do Legislativo.

De toda a forma, a mudança está preste a acontecer, sendo anunciado de maneira pública e reiterada pelo Presidente da Câmara que as votações em torno da Reforma Política se iniciaram em maio naquela Casa de Leis.

Para tanto, desde o início dessa legislatura, fora formada, respeitando a própria necessidade de representação partidária proporcional, uma Comissão Especial, que resolveu reunir todas as Propostas de Emenda à Constituição e Projetos de Lei sobre Reforma Política, trilhando em linha linear um plano de trabalho democrático de interlocução e diálogo com diversos setores do Estado e da sociedade civil.

Em seu pano de fundo, será objeto da Reforma Política, em linhas gerais, a alteração dos sistemas eleitorais, dos modelos de financiamento de campanhas, a fixação de coincidência de Eleições, fim da reeleição, mudança na duração dos mandatos, estabelecimento de voto facultativo, consagração da fidelidade partidária e criação de diversas cláusulas de barreira para contenção da ploriferação de partidos políticos no país.

Nada obstante em discurso de posse a Presidência tenha prometido a realização de plebiscito ou mesmo referendo para participação direta popular na condução do processo de Reforma Política, como visto aqui e pela toda a realidade que nos circunda, será o Congresso Nacional protagonista dessa mudança.

Nesse diapasão, deve ser lembrado que é exatamente nos termos da Constituição que o poder emana do povo, poder este soberano exercido através da eleição de representantes.

Outrossim, o conceito de democracia não se conforma apenas com o aspecto procedimental da participação do povo na eleição de seus representantes. Muito pelo contrário, a realização da democracia demanda uma constante persecução do delegatário do poder popular ao atendimento da vontade coletiva, tornando substancialmente viva a representação democrática.

Mas para tanto, tal como se está bem a fazer a Câmara dos Deputados, alteração legislativa de significância geral como da Reforma Política, demanda, para captação dessa vontade coletiva, exatamente essa interlocução e dialogo democrático com setores do Estado (cujo poder central é fracionado entre suas Instituições) e principalmente com grupos da sociedade civil (grupos de pressão, mídia e Partidos Políticos), que representam, individual e coletivamente, os próprios anseios da vontade coletiva.

Em arremate, é somente a partir e através do debate político sincero, amplo, técnico e imparcial, que será possível a formação de um acordo semântico em torno dos melhores ditames da Reforma Política a ser implementada no país.

Ainda assim, o Legislador constituinte derivado ou ordinário deve ter em consideração o respeito ao projeto propalado pelo Legislador constituinte originário, que, captando aqueles valores essenciais da vontade coletiva, relacionados á dignidade humana, e realização de um Estado democrático, estabeleceu na Constituição o arcabouço normativo e político do Estado.

Assim, na implementação da Reforma Política, necessária é a compatibilização de seus termos com o sentimento constitucional emergido da nossa Lei das Leis, que, diga-se em passante, consagra como cláusula pétrea, então insuscetível de supressão por quem quer que seja, os direitos políticos, e ainda estabelece vasto conteúdo dirigente, como programas de atuação do Estado para implementação das promessas da modernidade.

Sobre o autor
Helio Maldonado

Bacharel em Direito.<br>Especialista em Direito Público, Direito Eleitoral e Fazenda Pública em Juízo.<br>Mestrando em Direitos e Garantias Fundamentais. Advogado<br>Membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/ES.<br>Autor de livro, artigos jurídicos e professor palestrante.

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