Malgrado no âmbito do Congresso Nacional a Câmara dos Deputados e o Senado Federal terem competência concorrente para a proposição tanto de Proposta de Emenda à Constituição como de Projeto de Lei Ordinária, hodiernamente, sob o aspecto da iniciativa legislativa, a Câmara Federal tem trazido para si a responsabilidade de condução do processo de Reforma Política no país.
E são diversos fatores que assim predeterminam a louvável ação da Câmara dos Deputados.
De partida, não se olvida que o clamor legitimamente proclamado nas manifestações populares recentes afigurou-se como elemento primário da reação legislativa.
Todavia, secundariamente, a iniciativa unilateral da Câmara ganhou campo fértil de realização no atual cenário político nacional, em que o Executivo Federal, pelo resultado das Eleições passadas, sofreu um incomum processo de sub-representação, dada sua apertada vitória no sistema majoritário, desqualificada essa pela grande abstinência do eleitorado nacional no segundo turno.
Não é por outra razão que está havendo uma virada histórica na forma de condução do Governo do Estado, em que sempre no passado, pela sistemática do presidencialismo de coalização, o Executivo teve o domínio da pauta de trabalho do Legislativo.
De toda a forma, a mudança está preste a acontecer, sendo anunciado de maneira pública e reiterada pelo Presidente da Câmara que as votações em torno da Reforma Política se iniciaram em maio naquela Casa de Leis.
Para tanto, desde o início dessa legislatura, fora formada, respeitando a própria necessidade de representação partidária proporcional, uma Comissão Especial, que resolveu reunir todas as Propostas de Emenda à Constituição e Projetos de Lei sobre Reforma Política, trilhando em linha linear um plano de trabalho democrático de interlocução e diálogo com diversos setores do Estado e da sociedade civil.
Em seu pano de fundo, será objeto da Reforma Política, em linhas gerais, a alteração dos sistemas eleitorais, dos modelos de financiamento de campanhas, a fixação de coincidência de Eleições, fim da reeleição, mudança na duração dos mandatos, estabelecimento de voto facultativo, consagração da fidelidade partidária e criação de diversas cláusulas de barreira para contenção da ploriferação de partidos políticos no país.
Nada obstante em discurso de posse a Presidência tenha prometido a realização de plebiscito ou mesmo referendo para participação direta popular na condução do processo de Reforma Política, como visto aqui e pela toda a realidade que nos circunda, será o Congresso Nacional protagonista dessa mudança.
Nesse diapasão, deve ser lembrado que é exatamente nos termos da Constituição que o poder emana do povo, poder este soberano exercido através da eleição de representantes.
Outrossim, o conceito de democracia não se conforma apenas com o aspecto procedimental da participação do povo na eleição de seus representantes. Muito pelo contrário, a realização da democracia demanda uma constante persecução do delegatário do poder popular ao atendimento da vontade coletiva, tornando substancialmente viva a representação democrática.
Mas para tanto, tal como se está bem a fazer a Câmara dos Deputados, alteração legislativa de significância geral como da Reforma Política, demanda, para captação dessa vontade coletiva, exatamente essa interlocução e dialogo democrático com setores do Estado (cujo poder central é fracionado entre suas Instituições) e principalmente com grupos da sociedade civil (grupos de pressão, mídia e Partidos Políticos), que representam, individual e coletivamente, os próprios anseios da vontade coletiva.
Em arremate, é somente a partir e através do debate político sincero, amplo, técnico e imparcial, que será possível a formação de um acordo semântico em torno dos melhores ditames da Reforma Política a ser implementada no país.
Ainda assim, o Legislador constituinte derivado ou ordinário deve ter em consideração o respeito ao projeto propalado pelo Legislador constituinte originário, que, captando aqueles valores essenciais da vontade coletiva, relacionados á dignidade humana, e realização de um Estado democrático, estabeleceu na Constituição o arcabouço normativo e político do Estado.
Assim, na implementação da Reforma Política, necessária é a compatibilização de seus termos com o sentimento constitucional emergido da nossa Lei das Leis, que, diga-se em passante, consagra como cláusula pétrea, então insuscetível de supressão por quem quer que seja, os direitos políticos, e ainda estabelece vasto conteúdo dirigente, como programas de atuação do Estado para implementação das promessas da modernidade.