A inconstitucionalidade da cobrança da taxa pela utilização potencial do serviço de segurança pública no Estado de Minas Gerais

24/05/2015 às 23:06
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Este artigo tem por finalidade abordar a cobrança da taxa pelos serviços de segurança pública prestados no Estado de Minas Gerais, tributo este definido na Lei Estadual n. 6.763/75 definido como Taxa de Segurança Pública.

RESUMO

Este artigo tem por finalidade abordar a cobrança da taxa pelos serviços de segurança pública prestados no Estado de Minas Gerais, tributo este definido na Lei Estadual n. 6.763/75 definido como Taxa de Segurança Pública. O problema a ser debatido está afeto a inconstitucionalidade da cobrança da taxa pela utilização potencial do serviço de segurança pública. Ao ser provocado a dizer o direito sobre o tema, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais apresentou posicionamento divergente sobre a constitucionalidade da cobrança, ora posicionando de forma favorável, ora de forma contrária. A celeuma alcançou a Corte Suprema que se posicionou pela inconstitucionalidade da cobrança da taxa de segurança pública uma vez que o serviço possuía a característica uti singuli e ainda, por faltar-lhe os elementos de especificidade e divisibilidade, elementos estes de presença obrigatória nos temos da Constituição Federal. A norma combatida possui quatro elementos que definem o fato gerador do tributo, contudo, as decisões deixaram lacunas as quais serão discutidas e oportunizarão um debate sobre a incoerência da decisão que provocou a suspensão da cobrança e a revogação de um dos incisos da lei que definia como fato gerador a cobrança da taxa de segurança em eventos de qualquer natureza que envolva reunião ou aglomeração de pessoas e demandem a presença de força policial, realizados no âmbito do Estado.

INTRODUÇÃO

 

A taxa de segurança pública instituída em diversos Estados brasileiros foi, e continua sendo alvo de diversos estudos, pesquisas e debates jurídicos diante da generalidade da construção legislativa quando da instituição deste tributo diante dos serviços que sendo colocados à disposição do cidadão, acarretam custos ao Estado.

 

Para a compreensão do tema, necessário se faz buscar o direcionamento constitucional que lhe é dado nos termos do Título VI da constituição onde, em seu primeiro capítulo estão presentes os princípios que regem o Sistema Tributário Nacional. Foi neste caminho que pautou o Estado de Minas Gerais em taxar os serviços de segurança pública que colocados a disposição do cidadão, no entendimento do Estado obedecia aos critérios basilares para a instituição da taxa traduzidos na especificidade e divisibilidade.

 

A cobrança alcançou o Poder Judiciário em suas diversas instancias sendo possível a verificação de posicionamentos e decisões que ora negavam, ora afirmavam a constitucionalidade da cobrança da taxa de segurança pública, causando assim certa insegurança jurídica frente ao tema enfrentado e ainda, demonstrando a sua complexidade.

 

Assim, o trabalho busca provocar a discussão frente ao tema apresentado diante do entendimento da Corte Suprema de que a Taxa de Segurança Pública não atende aos critérios de especificidade e divisibilidade, fator que a torna inconstitucional, onde, a abordagem das facetas que cercam tal tributo serve para sustentar posicionamentos diversos ao defendido pelo Supremo Tribunal Federal.

 

2. DEFINIÇÃO DE TRIBUTO, COMPETÊNCIA PARA TRIBUTAR E SUA DIVISÃO EM ESPÉCIES

A previsão normativa constitucional do sistema tributário nacional demonstra a existência dos princípios norteadores das regras do ramo do Direito Tributário, bem como, as limitações do poder de tributar e as espécies de tributos possíveis.

A tributação se traduz no sistema de arrecadação pelo Estado de recursos para alcançar os objetivos deste e sustentar as demandas coletivas, onde, no Estado Brasileiro, tais objetivos estão insculpidos no art. 3º da carta magna. Assevera Machado (2010, p. 30) que “a tributação é sem sombra de dúvida, o instrumento de que se tem valido a economia capitalista para sobreviver. Sem ela não poderia o Estado realizar os seus fins sociais, a não ser que monopolizasse toda a atividade econômica”.

O Código Tributário Nacional[1] traz a definição legal de tributo como toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. Vitorio Cassone (2011, p. 6) em explanação doutrinária, diz que tributo “é certa quantia em dinheiro que os contribuintes são obrigados a pagar ao Estado quando praticarem certos fatos geradores previstos pelas leis tributárias.” Por sua vez o professor Luciano Amaro (2005, p. 25) define tributo como “a prestação pecuniária não sancionatória de caráter ilícito, instituída em lei e devida ao Estado ou a entidades não estatais de fins de interesse público.

Ao agregar os elementos dos conceitos emerge uma definição mais precisa onde é possível definir tributo como sendo uma prestação pecuniária não sancionatória de caráter ilícito, instituída em lei e devida ao Estado ou a entidades não estatais de fins de interesse público quando da ocorrência de certos fatos geradores previstos nas leis tributárias.

Da definição de tributo tem-se que é a Lei a base regulamentar para a instituição deste, o qual, uma vez instituído, irá recair a determinado ente político ou entidade não estatal de fins de interesse público responsável pela arrecadação, ou seja, o órgão com competência tributária, onde assevera Machado (2010, p.44) que “o princípio da competência obriga a que cada entidade tributante se comporte nos limites da parcela do poder impositivo que lhe foi atribuída.”

Para a efetivação do exercício da competência tributária demonstra o professor Luciano Amaro que:

Obviamente, ainda que referidas na Constituição as notas que permitem identificar o perfil genérico do tributo (por exemplo, “renda”, “prestação de serviço” etc) a efetiva criação de tributo sobre tais situações depende de a competência atribuída a este ou àquele ente político ser exercitada, fazendo atuar o mecanismo formal (também previstos na Constituição) hábil à instituição do tributo: a lei (AMARO, 2010, p. 121, grifo nosso).

 

Assim, competência tributária se traduz na prerrogativa para a instituição dos tributos onde a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios a detém, podendo tais entes federativos instituir o mesmo tributo, sendo esta capacidade reconhecida como competência concorrente, ou, do contrário, se somente um ente federativo poder instituir determinado tributo estará presente a competência originária.

 

2.1 A DIVISÃO DOS TRIBUTOS EM ESPÉCIES

 

A compreensão das espécies de tributos é fator necessário à compreensão do Direito Tributário, pois, é por meio desta divisão que será possível entender as regras atinentes ao regime jurídico aplicável e à competência tributária.

 

Geraldo Ataliba ao dissertar sobre o tema reforça a idéia pontuando que

Conforme um tributo se configura como inserto numa ou outra categoria, as conseqüências são diferentes. No Brasil, é de fundamental importância proceder com rigor na tarefa de identificar as peculiaridades de cada espécie, porque a rigidez do sistema constitucional tributário fulmina de nulidade qualquer exação não obediente rigorosamente ao moldes constitucionais estritos. (ATALIBA, 1999, p. 110).

 

Ao definir as espécies tributárias, Ataliba propõe como caminho a classificação constitucional dos tributos, classificação esta doutrinariamente reconhecida como tripartida (ou tricotômico), onde se tem os Impostos, Taxas e Contribuições de melhoria.

 

Dissertando sobre o tema o professor Werther Spagnol (2004) menciona o art. 4º do Código Tributário Nacional – CTN como fonte legal definidora dos critérios de identificação da natureza específica do tributo:

Art. 4º. A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevante para qualificá-las:

I – a denominação e demais características formais adotadas pela lei;

II – a destinação legal do produto da arrecadação.

 

Assim, demonstra Spagnol (2004, p. 15) que o legislador indicou três balizas para a condução da distinção entre espécies de tributo, ou seja:

1) A distinção é feita fundamentalmente pela análise do fato gerador da obrigação; 2) o nome dado pelo legislador ao tributo é irrelevante; 3) a destinação dada em lei ao produto da arrecadação igualmente desimporta.

 

A identificação do fato gerador como fonte principal de reconhecimento de diferenciação entre as espécies tributárias é algo severamente criticado por Werther Spagnol onde pontua que não se pode pretender, que á luz da teoria tributária, o fato gerador da obrigação seja o único critério de identificação de uma espécie tributária, nem tão pouco desconsiderar, em face do texto maior, o destino dado ao produto da arrecadação tributária.

Verifica-se que a busca pela definição das espécies tributárias é tema que não encontra conformidade entre os doutrinadores, uma vez que emergirá autores que defendem a teoria bipartite os quais classificam as espécies sob a ótica da vinculação do fato gerador a determinada atuação estatal; outros que a demonstraram como teoria tripartide conforme descrição do texto constitucional; teoria quadripartite a qual faz acrescentar às espécies da teoria tripartite a contribuição de melhoria e, por final a teoria pentapartite que por sua vez reconhece as contribuições especiais.

Importante que se reconheça que a teoria pentapartite é a adotada pelo Supremo Tribunal Federal, vez que, segundo sua jurisprudência, os empréstimos compulsórios (Recurso Extraordinário nº 111.954/PR, DJU 24/06/1988) e as contribuições especiais (AI-AgR 658576/RS, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, Julgamento em 27/11/2007; AI-AgR 679355/RS, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, Julgamento em 27/11/2007) são espécies tributárias autônomas, ostentando natureza jurídica própria que as distingue dos impostos, taxas e contribuições de melhoria.

Assim, ao adotar a teoria pentapartite é possível apontar como espécies tributárias os impostos, as taxas e contribuições de melhoria (competência concorrente), bem como, empréstimo compulsório e contribuições sociais (competência privativa).

 

Conforme asseverado, o reconhecimento das teorias de definição das espécies tributárias é de suma importância para que se entenda qual o tributo se amolda a determinado fato gerador e, com isto, fará oportunizar ao Estado sua cobrança.

 

É com base em uma destas espécies tributárias que o estudo ira visar a abordagem de certa celeuma que busca discutir a aplicabilidade da cobrança do tributo quando da utilização potencial do serviço de segurança pública prestados pelo Estado de Minas Gerais diante de determinada situação, qual seja, eventos de qualquer natureza em que haja cobrança para o cidadão nestes adentrar.

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3 O TRIBUTO TAXA E AS ESPECIFICIDADES QUE AMPARAM SUA COBRANÇA

 

A Constituição da Republica Federativa do Brasil ao tratar o sistema tributário nacional, demonstrando as espécies de tributos, em seu art. 145, inciso II diz que caberá à União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituir os seguintes tributos:

Art. 145 (...)

II – taxa, em razão do exercício do poder de policia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição.

 

Em análise a norma infraconstitucional que regula o sistema nacional tributário, em que pese sua vigência anterior a CF/88, é possível verificar que o conceito legal de taxa se faz alinhado com a norma constitucional, pois, o fato gerador se demonstra caracterizado pelo exercício regular do poder de polícia, ou à utilização efetiva ou potencial, de serviço público especifico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto a sua disposição.

 

Disciplina Eduardo Sabbag (2011, p. 413) que “a taxa é um tributo imediatamente vinculado á ação estatal, atrelando-se à atividade pública, e não à ação do particular”. Comenta ainda o autor que apesar da simplicidade da abordagem é de se considerar que a hipótese de incidência esta relacionada à atividade da Administração Pública, que se refere, direta e indiretamente, ao contribuinte, destinatário daquela investida.

 

Considerando as duas possibilidades de incidência do tributo taxa, conforme a atuação estatal, quais sejam: a) pelo exercício regular do poder de polícia; ou b) utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto a sua disposição; leciona Luciano Amaro (2005, p. 31) que:

As diversas teorias sobre as taxas ora sublinham a existência de um benefício ou vantagem para o contribuinte, dando a elas um caráter contra-prestacional, ora as vêem como reembolso do custo da atuação estatal, ora as caracterizam meramente como tributo ligado à atuação especifica do Estado, abstraídas eventuais vantagens que possam ser fruídas pelo contribuinte.

 

As teorias apontadas levam a classificação doutrinária da taxa como taxa de polícia ou taxa de serviço, onde interessa ao estudo a taxa de serviço uma vez que se volta para a aquela em que o fato gerador esta diretamente ligado a prestação de serviço público específico e divisível prestado ao contribuinte ou posto a sua divisão.

 

Não obstante a aparência descomplicada de aplicação ou incidência do tributo taxa conforme o fato gerador prestação de serviço público, o tema é fruto de divergências quando da análise e dissecação dos elementos que o constituem.

 

O primeiro que chama a atenção é o conceito de serviço público para o qual Hugo de Brito Machado (apud Eduardo Sabbag, 2011, p. 420) o define dizendo ser “toda e qualquer atividade prestacional realizada pelo Estado, ou por quem fizer suas vezes, para satisfazer, de modo concreto e de forma direta, necessidades coletivas”.  De mesma sorte, caminhando na mesma esteira, Di Pietro (2011, p. 103) leciona onde diz ser “toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente as necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público.” Importante abstrair dos conceitos é que o serviço público tem por objetivo a satisfação de necessidades coletivas.

 

Ainda sobre os elementos constitutivos, além de ser o serviço de caráter público, este deve ser específico e divisível. Diz o CTN[2] que os serviços são específicos quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade públicas, e divisíveis quando suscetíveis de utilização separadamente, por parte de cada um de seus usuários. Diante da definição legal MACHADO (2010, p. 451) faz a seguinte observação:

Seja como for, certo é que as definições legais em referência praticamente em nada contribuem para a solução dos problemas práticos relativos às taxas. Constituem, porém, indicações úteis, a serem trabalhadas pela doutrina e pela jurisprudência.

Quando se trate de atividade provocada pelo contribuinte, individualmente, como acontece, por exemplo, no caso do fornecimento de certidões ou da prestação de atividade jurisdicional, parece induvidoso o caráter específico e divisível do serviço. Por outro lado, serviço como o de iluminação pública, por exemplo, não nos parece ser específico nem divisível, posto que é usufruível por todos de forma indistinta.

Ao analisarmos o exemplo do autor conforme a cobrança sobre a taxa de segurança pública é possível fazer a abstração deste e verificar sua realidade, pois, não há como definir aqueles que usufruem do serviço público de iluminação pública visto que todos indistintamente que circulam pela via pública são beneficiários do serviço, assim, eliminado esta o caráter divisível do conceito da taxa.

Importante ainda pontuar que a prestação do serviço de iluminação pública é realizada indistintamente, não havendo possibilidade de demandar o particular pela realização do serviço e obter com esta prestação de serviço vantagem pessoal, ou seja, não se pode onerar o cidadão que tem à frente de sua residência um poste de iluminação pública uma vez que não somente ele se beneficia do serviço.

Mas o que dizer do serviço de segurança pública realizado em eventos promovidos por pessoa física ou jurídica onde estas, ao exigirem o pagamento de ingressos para acesso ao evento obtêm lucro e demandam o Estado a executar a atividade de segurança no local do evento? Estaria neste caso também afastado a possibilidade da cobrança da taxa de serviço? Sofreria o serviço de segurança pública um desvio de sua finalidade e com isto traria consigo a característica de serviço específico e divisível?

É por meio destes questionamentos que a problemática alcançou o poder judiciário uma vez que os promotores de grandes eventos buscaram a não taxação pelo serviço que demandavam ao estado diante da realização de eventos privados onde, para acesso do público, é cobrado ingresso.

 

4 a cobrança da taxa de segurança pública instituída pelo estado de Minas Gerais sob a ótica constitucional

 

Conforme já demonstrado, é a Lei o pilar necessário para que se possa instituir o tributo, previsão esta de ordem constitucional, e, sendo assim, em âmbito federal é a Lei 5.172 de 25 de outubro de 1966 que estabelece os princípios de ordem infraconstitucional e de direito tributário que são aplicáveis à União, Estados Membros, Distrito Federal e Municípios.

 

Neste diapasão, ao exercer sua competência tributária concorrente, o Estado de Minas Gerais, por meio da Lei Estadual 6.763 de 26 de dezembro de 1975 regulou o sistema tributário Estadual de sua competência obedecendo assim o princípio da legalidade tributária.

 

Ao definir a espécie do tributo “taxa”, a legislação estadual em comento criou subespécies deste tributo onde se abstrai a Taxa de Segurança Pública como exação prevista diante da prestação de serviços de segurança pública realizados no âmbito do Estado de Minas Gerais.

 

Como exemplo desta exação é possível citar os serviços visando à preservação da segurança, da tranqüilidade, da ordem, dos costumes e das garantias oferecidas ao direito de propriedade, ou ainda, eventos que envolvam a reunião ou aglomeração de pessoas, os quais, sendo o Estado demandado a realizar o policiamento de tal natureza estaria concretizado o fato gerador, onde, segundo Eduardo Sabbag (apud AMARO, 2008, p. 31), diz que “o fato gerador da taxa não é um fato do contribuinte, mas um fato do Estado. O Estado exerce determinada atividade e, por isso, cobra a taxa da pessoa a quem aproveita aquela atividade”.

 

Estando assim previsto a taxa referente aos serviços de segurança pública previstos na legislação estadual, conceituada como taxa de segurança pública, passou o Estado a exigir o pagamento diante da demanda apresentada.

 

A taxação gerou questionamentos junto ao poder judiciário quanto à constitucionalidade e legalidade do tributo instituído no Estado de Minas Gerais conforme a Lei Estadual 6.763/75, especialmente aquele referido no inciso II da lei que dizia:

Art. 113. A taxa de segurança pública é devida:

(...)

II – em razão de eventos de qualquer natureza que envolvam reunião ou aglomeração de pessoas e demandem a presença da força policial, realizados no âmbito do estado.

 

O Egrégio Tribunal do Estado de Minas Gerais foi demandado a posicionar-se sobre o assunto conforme Ação Direta de Constitucionalidade - ADIN de número 102.059-3, onde, extraiu-se o entendimento naquela oportunidade de que o policiamento realizado em evento particular extrapolava o dever de segurança garantido na Constituição da República, sendo revestido de especificidade e divisibilidade. No mesmo sentido caminhou o julgamento dos Embargos de Declaração de nº 1.0699.06.059859-5/002 - TJMG, de relatoria do Desembargador Armando Freire:

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM REEXAME NECESSÁRIO - TAXA DE SEGURANÇA PÚBLICA - MODALIDADE POLICIAMENTO – LEI ESTADUAL N. 6763/75 - ARTIGO 113, INCISO II - SERVIÇO PÚBLICO DIVISÍVEL E ESPECÍFICO - CONSTITUCIONALIDADE - PRECEDENTE DA CORTE DO TJMG - HIPÓTESE DE ISENÇÃO NÃO VERIFICADA (ARTIGO 114, III) - MULTA - LEGALIDADE DA APLICAÇÃO – QUESTÕES APRECIADAS E DECIDIDAS - INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO - REDISCUSSÃO - VIA PROCESSUAL INADEQUADA – EMBARGOS REJEITADOS. (Minas Gerais, Tribunal de Justiça, ED. 1.0699.06.059859-5/002, Rel. Des. Armando Freire, grifo nosso).

 

De outra sorte, ao ser o mesmo Tribunal demandado sobre a matéria ora discutida, em sede de Apelação Civil sob o nº 1.0313.08.241109-8/02, posicionou-se a 8ª Câmara Cível à época de forma divergente, ou seja, entendeu que não era devido a cobrança da taxa de segurança pública nos termos do art. 113, inciso II por faltar os elementos de especificidade e divisibilidade:

EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO – APELAÇÃO CIVEL – MANDADO DE SEGURANÇA – TAXA DE SEGURANÇA PÚBLICA – EVENTO ESPORTIVO – POLICIAMENTO – NÃO CABIMENTO DA COBRANÇA. Sendo a segurança púbica dever do Estado e direito de todos, deveria a respectiva atividade do Estado, a cargo da Polícia Militar, ser custeada através de impostos e não de taxas, que se dão em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados aos contribuintes ou postos a sua disposição, conforme a redação do artigo 145, incido II, da CR/88 e art. 77 do CTN. (Minas Gerais, Tribunal de Justiça, Ap. Cível. 1.0313.08.241109-8/02, Rel. Des.(a) Teresa Cristina da Cunha Peixoto)

 

Tais decisões ora mencionadas demonstravam as divergências sobre o tema, pois, embora tenha o Egrégio Tribunal decidido em sede de ADIN pela constitucionalidade da cobrança do tributo, posicionou-se a 8ª Câmara Cível do mesmo Tribunal à época de forma contrária.

 

A despeito do controle abstrato de constituci

DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AGRAVOS REGIMENTAIS EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TAXA DE SEGURANÇA PÚBLICA. ADI ESTADUAL. LEI ESTADUAL 6.673/75, MODIFICADA PELA LEI ESTADUAL 12.425/96. POLÍCIA OSTENSIVA. EVENTOS. REUNIÃO OU AGLOMERAÇÃO DE PESSOAS. INCONSTITUCIONALIDADE. ADIs 1.942-MC/PA e 2.224/CE.onalidade realizado pelo TJMG, a matéria alcançou a Corte Suprema por meio do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 269.374 – MG, sob a relatoria da Ministra Ellen Gracie onde se abstraiu o seguinte julgado:

 

1.      Impossibilidade de cobrança de taxa de segurança pública de eventos abertos ao público, ainda que tal serviço seja solicitado por particular para sua segurança ou para terceiros. Visto que incumbe ao Estado prestá-la a toda a população, essa atividade somente pode ser sustentada por imposto. Precedentes.

 

2.      Agravos regimentais a que se nega provimento

 

Da decisão apontada é possível apartar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre a cobrança da Taxa de Segurança Pública, onde cita as ADIs 1.942-MC/PA E 2.224/CE como precedentes da Corte sobre o assunto. Todavia, é importante que se diga que no Estado de Minas Gerais taxa de segurança pública é gênero onde são espécies desta conforme a Lei Estadual 6763/75:

Art. 113 - A Taxa de Segurança Pública é devida:

 

I - pela utilização de serviços específicos e divisíveis, prestados pelo Estado em órgãos de sua administração, ou colocados à disposição de pessoa física ou jurídica cuja atividade exija do poder público estadual permanente vigilância policial ou administrativa, visando à preservação da segurança, da tranqüilidade, da ordem, dos costumes e das garantias oferecidas ao direito de propriedade;

 

II - em razão de eventos de qualquer natureza que envolvam reunião ou aglomeração de pessoas e demande a presença de força policial, realizados no âmbito do Estado;"[3]

 

III - pela utilização de serviços prestados pelo Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, quando o interesse particular predominar sobre o interesse público.

 

IV - pela utilização potencial do serviço de extinção de incêndios.

 

Em que pese à declaração de inconstitucionalidade do inciso II do art. 113 da Lei Estadual 6763 de 1975, é necessário que se observe a base jurisprudencial em que se apóia a relatora do processo Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 269.374 – MG que cita a manifestação do Ministro Ricardo Lewandowiski no RE 636,381/RS, DJe 10.05.2011 onde assim entendeu que:

“O Supremo Tribunal Federal possui jurisprudência predominante no sentido de que, ressalvados os serviços de prevenção, combate e extinção de incêndios, a atividade de segurança pública só pode ser custeada pela receita de impostos, conforme se pode observar do julgamento da ADI 1.942-MC/PA, Rel. Min. Moreira Alves.”

 

Em breve análise é possível verificar que do rol das espécies da Taxa de Segurança Pública, conforme entendimento do STF, apenas se reveste de constitucionalidade e legalidade aquela relativa aos serviços de prevenção, combate e extinção de incêndios.

 

O entendimento emanado pela Suprema Corte provocou no Estado de Minas Gerais a revisão da legislação estadual e com isto, a revogação do inciso II, do art. 113 o qual trazia consigo a especificidade em taxar eventos de qualquer natureza que envolvesse reunião ou aglomeração de pessoas e demandasse a presença de força policial, realizados no âmbito do Estado.

 

Apesar da revogação do inciso II, do art. 113 da Lei Estadual Tributária, observemos o que diz o inciso I do mesmo instituto legal:

Art. 113 - A Taxa de Segurança Pública é devida:

 

I - pela utilização de serviços específicos e divisíveis, prestados pelo Estado em órgãos de sua administração, ou colocados à disposição de pessoa física ou jurídica cuja atividade exija do poder público estadual permanente vigilância policial ou administrativa, visando à preservação da segurança, da tranqüilidade, da ordem, dos costumes e das garantias oferecidas ao direito de propriedade.

 

Os argumentos que sustentam não ser possível a taxação do serviço de segurança pública por lhe faltar os elementos de especificidade e divisibilidade foram suficientes para provocar a revogação de apenas uma das espécies definidas, mas, e quanto às demais espécies previstas e vigentes no Estado?

 

Admitir a utilização do serviço público pelo particular quando este, ao demandar o Estado a prestar-lhe o serviço, fazendo com o intuito de lucrar com a atividade, trazendo assim prejuízo a ordem coletiva diante do desvio de recursos públicos como, por exemplo, em eventos privados em que há cobrança de ingresso ou entrada para os possíveis participantes é algo que soa dissonante, pois, não se pode aceitar, apesar do respeitável entendimento do Supremo Tribunal Federal, que o serviço de segurança realizado pelo Estado no interior de tais ambientes de eventos abarca a coletividade e o interesse público, retirando assim o caráter da especificidade e divisibilidade do serviço prestado.                          

Tal divergência pode ser compreendida ao analisarmos o vigente inciso III, do art. 113 da Lei Estadual 6763/75 que demonstra ser possível a taxação do serviço pela utilização de serviços prestados pelo Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, quando o interesse particular predominar sobre o interesse público. Ora, não se pode sustentar que em eventos privados com cobrança de ingressos ou entradas, onde o particular obtém lucro com a prestação do serviço de segurança estadual predomina o interesse público sobre o interesse privado.

Ao ser o poder judiciário demandado a interpretar a norma caminhou em defender a inconstitucionalidade da cobrança da taxa de segurança pública, porém, o julgador generalizou a cobrança do tributo e deixou de adentrar em pormenores sobre o assunto que certamente trarão ainda questionamentos sobre a legalidade quanto à cobrança ou não da taxa de segurança pública quando o serviço for realizado em locais fechados que para seu acesso seja cobrada entrada ou ingressos e lucre a pessoa física ou jurídica organizadora.

 

É certo que não há que se falar na cobrança da taxa de segurança pública no Estado de Minas Gerais em razão de eventos de qualquer natureza que envolvam reunião ou aglomeração de pessoas e demande a presença de força policial diante da revogação do inciso II, do art. 113 da Lei Estadual 6.763/75, porém, não se pode afirmar que foi extinta a taxa de segurança pública uma vez que ainda estão vigentes algumas de suas subespécies previstas em Lei.

 

5. Conclusão

 

A abordagem doutrinaria do tema tributos permitiu conceituá-lo e ainda, compreender as regras previstas para sua instituição, competência e ainda as espécies previstas de ordem geral, onde, no que diz respeito à Taxa, a Constituição da República elegeu para a instituição deste tributo os critério de especificidade e divisibilidade conforme o serviço público que seria objeto da taxação.

 

Verificou-se ainda que possuem os Estados e Municípios a competência concorrente, ou seja, são estes entes federativos capazes de instituir em seu território a Taxa, sendo que no Estado de Minas Gerais há previsão conforme Lei Estadual da Taxa de Segurança Pública.

 

A cobrança do tributo Taxa de Segurança Pública pela prestação do serviço de segurança pública prestado em eventos de qualquer natureza que envolva reunião ou aglomeração de pessoas e demande a presença de força policial foi considerado inconstitucional pela Corte Suprema, fato este que levou a Assembléia Legislativa do Estado, por meio de lei, revogar o inciso II da Lei 6.763/75, todavia, permanece vigente a cobrança por demais serviços previstos.

Os argumentos defendidos para a declaração de inconstitucionalidade da taxa de segurança pública em eventos de qualquer natureza que envolva reunião ou aglomeração de pessoas e demande a presença de força policial é aceitável quando tais eventos estão abertos ao público e ali, não se pode mensurar a quem realmente o serviço alcança, pois, qualquer cidadão, indistintamente, poderá acessar o ambiente o qual reconhecidamente merece a conceituação de evento público, fator este que não abarca os critérios de especificidade e indivisibilidade.

 

De outra sorte, é inaceitável que em eventos de qualquer natureza que envolva reunião ou aglomeração de pessoas e demande a presença de força policial onde para acesso de tais ambientes há cobrança de ingressos, ou seja, em ambientes privados, com acesso limitado por cobrança financeira, onde o organizador visa o lucro, não se pode aceitar a utilização do serviço de segurança pública em benefício do particular sem que haja um mínimo de contrapartida para o Estado.

 

Por tudo isso, temos o posicionamento de que a cobrança da Taxa de Segurança pública pela utilização potencial do serviço de segurança pública em eventos de qualquer natureza que envolva reunião ou aglomeração de pessoas e demande a presença da força policial, sendo tais eventos realizados em prédios privados e com cobrança de entrada sejam passíveis de taxação.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

 

REFERÊNCIAS

 

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2010.

 

ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São Paulo: Malheiros, 1999.

 

CASSONE, Vittorio, Direito tributário. São Paulo: Atlas, 2011

 

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2010.

 

MEDEIROS, Luciano Lima de. A inconstitucionalidade da cobrança da taxa de incêndio pelo Estado de Minas Gerais. Governador Valadares: UNIVALE, 2010

 

SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2011

 

SPAGNOL, Werther Botelho. Curso de Direito Tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

 


[1] Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966.

[2]  Art. 79, inciso II e II do CTN

[3] Inciso Revogado pelo art. 30, III, e vigência estabelecida pelo art. 31, ambos da Lei nº 20.540 de 14/12/2012

Sobre o autor
Paulo Henrique Brant Vieira

Mestre em Direito. Especialização em Direito Público. Bacharelado em Direito e em Ciências Militares com ênfase em Defesa Social.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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