Lei da palmada e o conflito social

27/05/2015 às 15:27
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Ainda é permitido aos pais utilizarem punições moderadas nas crianças e nos adolescentes com o intuito de educar, exercendo o instituto do jus corrigendi. Porém essa liberdade ou instituto vem sendo tratado na Lei 13010/14, famosa Lei da Palmada.

INTRODUÇÃO

No ambiente familiar as crianças e adolescentes, por diversas vezes, são tratadas como objeto de domínio, em que os pais e ou responsáveis possuem direitos de castigar seus filhos por atos por eles. A violência física ainda é muito utilizada dentro do seio familiar, para a punição dos filhos por alguma ação reprovada pelos pais.

O presente trabalho busca identificar em seu primeiro capítulo o que seria o poder familiar e até que ponto a Lei da palmada interferia nesse poder, ou o chamado “pátrio poder” expressão que foi muito utilizada, mas que agora foi modificado devido seu significado que dava ao pai todo esse poder familiar; tenta-se demonstrar a evolução do conceito de poder familiar e como ele se desenvolve. Vindo desde as civilizações antigas como Grécia e Roma, passando pelo Império de Constantino, chegando até o Brasil, expondo assim o inicio desse pátrio poder. Esse poder que antes era dado somente ao pai foi se modificando aos poucos, iniciando com a Lei n° 4.121 de 1962 (Estatuto da mulher casada) dando a mãe também esse direito, tornando assim o pátrio poder direito de ambos os pais, sendo depois confirmada o conteúdo desta Lei, com o advento da Constituição Federal de 1988.

Ainda no primeiro capítulo tenta-se explanar o conceito do poder familiar, demonstrando a visão de vários doutrinadores, conceituando as características desse poder como o múnus público, irrenunciabilidade, inalienabilidade, imprescritividade com a tutela e a relação de autoridade, demonstrando a proteção que os pais têm que ter com os filhos, através do principio da proteção integral e do Estatuto da criança e do adolescente.

No segundo capítulo, busca-se demonstrar até onde esse poder familiar poder ir, os seus limites, conceituando não só os direitos e deveres dos pais, mas também demostrando que os mesmos têm um limite, e que quando ultrapassam esse limite existem sanções e até a perda desse poder. Há ainda no segundo capítulo um breve histórico da educação através da punição no Brasil e como é a violência física nas relações familiares.

 Por conseguinte no terceiro capitulo conceitua-se o castigo, e o que seria castigo moderado, já que o Código Civil no seu artigo 1.638, inciso I, trata apenas do castigo imoderado. Será tratado também no terceiro capitulo, a respeito da linha tênue que existe entre a educação e a agressão.

O quarto e último capítulo trata de um assunto muito criticado no país, a aprovação da Lei 7672 de 2010, a chamada “Lei da Palmada” que discute a violência usada nas crianças e nos adolescentes e a lacuna existente no artigo 1638, I, do Código Civil, que é a não proibição do castigo moderado. Tenta-se no neste ultimo capitulo mostrar o objetivo da lei, como estar o seu trâmite para o julgamento, os posicionamentos favoráveis e antagônicos sobre o assunto. Essa pesquisa busca os efeitos que a Lei da palmada vai ter sobre o poder familiar e as modificações desse poder.

O presente trabalho tem ainda o intuito de discutir acerca da possibilidade de os pais poderem castigar fisicamente seus filhos menores. Para a realização da monografia foi utilizada uma extensa legislação, sobretudo, a Constituição Federal, o Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente, tendo como base capítulos que tratam do poder familiar, dos deveres dos pais e dos direitos da criança e adolescentes.

1   DO PODER FAMILIAR

O instituto do poder familiar sofreu várias transformações. As mudanças realizadas nesse instituto estabeleceram direitos e deveres que asseguram a harmonia do meio familiar.

1.1 CONCEITUANDO PODER FAMILIAR

O novo Código optou por designar esse instituto como poder familiar, pecando gravemente ao se preocupar em retirar da expressão a palavra “pátrio”, por relacioná-la impropriamente ao pai, do que cuidar para incluir na identificação o seu real conteúdo, antes de poder, como visto, representa uma obrigação do pais, e não da família, como sugere o nome proposto. (GONÇALVES, 2011).

Para Luis da Cunha Gonçalves (1955, cit., p. 308), aos pais fora atribuída uma função semi-pública, chamada poder familiar, entende-se que os filhos adquirem direitos e bens desde seu nascimento e cabe aos pais administrar esses bens.

Os filhos adquirem direitos e bens, sem ser por via de sucessão dos pais. Há, pois, que defender e administrar esses direitos e bens; e para este fim, representa-los em juízo ou fora dele. Por isso, aos pais foi concedida ou atribuída uma função semi-pública, designada poder parental ou pátrio poder, que principia desde o nascimento do primeiro filho, e se traduz por uma série de direitos-deveres, isto é, direitos em face de terceiros e que são, em face dos filhos, deveres legais e morais.

O poder familiar pode ser entendido como um conjunto de direitos e obrigações, à pessoa do filho menor, exercido, por ambos os pais, com o intuito do melhor interesse dos filhos visando a proteção. (DINIZ, 2007)

Poder Familiar nasce com a formação da família sendo criado de forma natural, desse modo não podendo ser renunciado, é, portanto irrenunciável, não podendo ter transação, tornando-se indelegável, não podendo os pais transmitir, ou delegar para outra pessoa. É também imprescritível, não perdendo sua aplicabilidade com o decorrer do tempo, possuindo os pais ate durar a maioridade, ou nos caso de extinção do Poder Familiar, expresso na Lei. (FRIGATO, 2011)

Como bem coloca o artigo 1.630 do Código civil

Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores. Assim, temos que a menoridade cessa aos 18 (dezoito) anos completos, extinguindo nessa idade o poder familiar, ou antes, se ocorrer a emancipação em razão de alguma das causas indicadas no parágrafo único, do artigo 5º, do Código Civil.

Independente do conceito dado ao poder familiar, em todo tempo, nota-se a explícita proteção que os pais exercem sobre os filhos durante certo período de tempo, essas definições dão aos pais algumas atribuições para que detenham o poder familiar como, ter os filhos em sua companhia ou guarda, dirigir a criação e educação dos filhos, concede-lhe ou nega-lhe consentimento para casarem, exigir que lhe preste obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição; representá-los, até os 16 anos, nos atos da vida civil, assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem parte, suprindo-lhes o consentimento; reclamá-los de quem ilegalmente os detenha e nomear tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou sobrevivo não puder exercer. (SILVA, 2010).

Assim como estabelece o artigo 1.634 do Código Civil no que tange à competência dos pais em relação aos filhos

Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

I - dirigir-lhes a criação e educação,

II – tê-los em sua companhia e guarda;

III  -conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV- nomear lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

V – representá-los, até aos 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo lhes o consentimento;

VI  - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; e

VII- exigir que lhes prestem obediência, respeito e Em os serviços próprios de sua idade e condição.

Observando o rol do artigo 1.634 do Código Civil o mais importante dever dos pais, é o de dirigir a criação e educação, pois cabe aos pais o devido zelo não apenas pelo sustento dos filhos, mas também pela sua formação, a fim de torná-los úteis a si, à família e à sociedade, a fim de que cresçam pessoas dignas e capazes de um bom convívio junto à sociedade. (GONÇALVES, 2011).

Além das atribuições expressamente previstas, têm-se aquelas de praxe do poder dos pais, que caberá a eles adotar todas as medidas necessárias para o melhor desenvolvimento físico, mental, social e intelectual da criança, para que possa se tornar um adulto apto para a vida cotidiana.

1.2  ESCORÇO HISTÓRICO

A antiga denominação de pátrio poder ou patria potestas era utilizada para indicar a autoridade de quem detinha o poder dentro do ambiente familiar. Era ele também quem exercia os poderes das funções sagradas, era considerado o chefe do culto religioso. O pai era visto como o chefe da casa. Exercia o poder de decidir sobre a vida de seus filhos e sobre a vida de sua esposa. O filho não possuía bens, nem mesmo aquele que trabalha, pois os lucros do trabalho eram também considerados do pai. (VERONESE, 2005).

O pátrio poder abarcava o interesse exclusivo do chefe de família, atribuía ao pai mais direito do que dever. Ele tinha o poder de decisão sobre a vida do filho e esposa, os filhos não podiam manifestar vontades, a mulher muito menos, pois eram tidos como um bem que o chefe de família possuía. (GONÇALVES, 2009).

O Código Civil de 1916 estabelecia em relação ao pátrio poder artigos que demonstravam o papel da mulher dentro do meio familiar, como auxiliar e não autoritária como o pai.

Art. 380. Durante o casamento, compete o pátrio poder aos pais, exercendo-o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores passará o outro a exercê–lo com exclusividade.

A mãe era vista apenas como coadjuvante do pai, não detinha poder sobre os filhos. A autoridade dentro do seio familiar pertencia somente ao homem. A mulher somente exercia o pátrio poder na falta do pai. Posteriormente os poderes do chefe de família foram restringidos. O pai perdeu a faculdade de dispor sobre a vida do filho. Como efeito dessa diminuição de autoridade, o pai, por exemplo, não podia mais determinar ações cruéis como matar seu filho ou vendê-lo. (GONÇALVES, 2009).

A situação começou a ser modificada com o advento da Lei nº. 4.121/626, conhecida como Estatuto da Mulher Casada, que atribuiu o exercício do pátrio poder ao pai e a mãe. Para que isso fosse possível à lei estabeleceu uma mudança no artigo 380 do antigo código civil de 1916, que possibilitava agora a mãe, recorrer ao juiz quando discordasse de alguma decisão do pai.

O artigo passou a ter a seguinte redação

Art. 380. Durante o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo-o o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê-lo com exclusividade.

Parágrafo único. Divergindo os progenitores quanto ao exercício do pátrio poder, prevalecerá a decisão do pai, ressalvado à mãe o direito de recorrer ao juiz, para solução da divergência.

Apesar de todas as mudanças em favor da mulher, a total igualdade em relação à titularidade e exercício do pátrio poder só foi concretizada com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que contemplou os pais como detentores do poder. (GONÇALVES, 2009)

A titularidade do poder familiar sofreu inúmeras alterações até chegar à definição dos dias de hoje. Tendo como marco definidor o Estatuto da Criança e do Adolescente, no seu artigo 21, e a Constituição Federal, no seu artigo 226, § 5º

Art. 21, ECA: O pátrio poder deve ser exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução de divergência.

Art. 226, § 5º, CF: Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

Assim a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece a igualdade entre o homem e a mulher, não sendo aceitável nenhum tipo de discriminação dentro do poder familiar, em relação ao pai e a mãe, sob pena de violação constitucional.

1.3 DO PÁTRIO PODER AO PODER FAMILIAR

Em busca da igualdade de condições entre o pai e a mãe, o Código Civil de 2002, também alterou o artigo 380 que tratava do pátrio poder. A nova redação do artigo passou a ser a seguinte

Art. 1.631: Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.

Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo.

Essa mudança no instituto do pátrio poder para poder familiar é justificada pela necessidade de igualar os pais como possuidores de poderes sobre os filhos. Essa alteração ocorre de acordo com a Constituição Federal de 1988, que em um dos seus artigos mais comentados, o artigo 5°, vem estabelecido no inciso I, “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”, nesse contexto não era mais possível existir diferença entre homem e mulher dentro do meio familiar.

A mãe passa então a ter poderes sobre o filho, adquire presença na vida dele bem como dentro do ambiente familiar. Agora não é tratada apenas como uma colaboradora, ou uma auxiliar, mas sim como uma integrante, uma detentora do lar.

O poder exercido em conjunto não é uma atividade fácil, podem acontecer conflitos entre os pais, divergências de vontades. Paulo Luiz Netto Lôbo (2010, p. 276) comenta que os principais conflitos esta dentro da educação escolar, moral e religiosa.

A vontade de um não pode prevalecer sobre a do outro. Não é fácil o exercício da co-parentalidade quando esses valores são substituídos pela imposição de um contra outro ou pela intransigência de um ou de ambos. Os móveis principais das divergências dizem respeito às opções educacionais, morais e religiosas, quando os pais não coincidem nelas.

Apesar da alteração do Código Civil com intuito de igualar os pais e estabelecer uma criação dos filhos em conjunto, essa mudança ainda sofre bastante crítica, não em relação ao fato de incluir mãe como titular do poder familiar, mas sim pelo fato do artigo dispor que o poder familiar ocorre durante o casamento e a união estável. (GONÇALVES, 2009).

Na união estável, não é raro presumir que os filhos não são dessa relação, é necessário o reconhecimento do genitor para estabelecer a filiação jurídica. Essa presunção ocorre somente no instituto do casamento. (GONÇALVES, 2009).

Reconhecida a filiação, o poder familiar se estende a todos os filhos, não sendo necessária estabelecer uma relação de casamento ou de união estável entre os pais para acontecer à constituição desse instituto. Ainda quando estão separados os pais exercem o poder familiar. Em famílias monoparentais, na falta de um dos genitores, o poder familiar é exercido com exclusividade pelo outro genitor. (GONÇALVES, 2009).

Antes mesmo de ocorrer à mudança de pátrio poder para poder familiar, já existia pátrio poder exercido por um único genitor. Assim na falta do registro do pai, o instituto foi exercido com exclusividade pela mãe, ou vice versa.

1.4  A INTERVENÇÃO DO ESTADO NO PODER FAMILIAR

Antes da atual constituição, as legislações que tratavam de menores, não definiam de forma clara a participação do Ministério Público no juízo privativo destes. Contudo os artigos 127 a 130 da Constituição Federal de 1988 definem o órgão autônomo, independente e forte que exercerá o papel de protetor dos menores. O Estatuto da Criança e do Adolescente determina o Ministério Público como defensor, porém não só das crianças e adolescentes, mas também da família.

O princípio da prioridade absoluta da natureza indisponível do direito da criança e do adolescente deve figurar, obrigatoriamente, entre as prioridades das autoridades públicas do país. O artigo 4º, parágrafo único do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê o que a garantia dessa prioridade absoluta compreende, in verbis

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Observa-se que o artigo 148 e o 201 do Estatuto da Criança e do Adolescente prevêem a responsabilidade do Poder Público perante esses indivíduos. Esse dever conferido aos Promotores de Justiça da Infância e Juventude, responsáveis pela defesa dessas crianças e adolescentes, é essencial e indisponível. Eles não detêm a alternativa de agir ou não, quando existe a ameaça ou a violação ao direito. Porém têm a discricionariedade de escolher qual o mecanismo mais eficiente para solucionar o caso, amparado pelos instrumentos que a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente lhes conferem. (CHAVES, ALVES e ROSEVALD, 2010).  

As funções do Ministério Público estão determinadas no artigo 129 e incisos do texto constitucional, assegura as ações judiciais e medidas administrativas e extrajudiciais que podem valer para a defesa dos valores das crianças e adolescentes.

A Promotoria da Infância e Juventude atende diariamente casos de crianças e adolescentes que têm seu direito violado, porém existem pouquíssimos inquéritos, denúncias e ações privadas com o objetivo de responsabilizar penalmente a conduta ilegal, seja ela dolosa ou culposa, dos genitores.

Por serem poucos os inquéritos dessas violências, os reflexos dessa impunidade levam esses jovens em situação de risco à prática de atos infracionais contra terceiros, posteriormente, em sua adolescência ou ate mesmo na juventude. Observa-se a provável ausência do meio familiar para ensiná-los a respeitar os limites e os valores do próximo. Porém, é dever dos pais educar, criar e possibilitar uma vida digna a seus filhos.

Com a omissão do poder de educar dos pais e conseguinte os atos infracionais causados por menores à outrem, cabe ao estado agir. Sendo seu dever como ente público a responsabilização dos pais pelo não cumprimento do poder familiar. O Estado deverá punir os pais ou responsáveis que descumpram suas obrigações decorrentes do poder familiar, por meio das infrações administrativas, conforme o artigo 249 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Contudo, ocorre que essa infração prevê como sanção o pagamento de multa, sendo, portanto, inviável o pagamento, haja vista a situação econômica precária e do consequente prejuízo de subsistência dessas famílias. (VARALDA, 2008).

Nos casos mais graves como, por exemplo, abandono completo da criança e do adolescente por seus genitores, o Código Civil Brasileiro e o Estatuto da Criança e do Adolescente preveem a possibilidade de suspensão ou destituição do poder familiar. Logo, o poder familiar se sujeita à fiscalização e ao controle do Estado, nos termos da lei. Na ocorrência de algum fato incompatível ao normal exercício do poder por genitores ou responsáveis. Tanto a suspensão como a destituição são formas de o Estado proteger a criança ou o adolescente daqueles pais que estão faltando com seus deveres em relação a seus filhos, sempre em prol do interesse do menor. Todavia, a principal diferença entre os institutos de suspensão ou de perda desse poder é a gravidade das faltas cometidas pelos pais. (COMEL, 2003).

São vários os artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente, do Código Civil e também da Constituição Federal que mencionam os deveres dos pais em relação aos filhos. As medidas impostas para o descumprimento desses deveres são a suspensão do poder familiar, ou a restrição do exercício da função, podendo ser parcial ou relativa.

Define Carlos Bittar (1992, p.83) o que seja suspensão do poder familiar em sua forma simplificada: “É a cessão temporária do exercício do poder, por determinação judicial, em processo próprio e sob motivo definido em lei”. Logo, a suspensão do poder familiar consiste em uma restrição judicial àquele que exerce o poder familiar, e venha abusar de sua função em prejuízo do filho, tornando-se impedido temporariamente de exercê-lo. Além disso, para Comel (2003), a suspensão do poder familiar persistirá enquanto perdurar a situação que ensejou essa medida, existindo a possibilidade de recuperação posterior do poder.

Então o estado por meio das varas e conselhos tutelares específicos para crianças e adolescentes, adentra o meio familiar a partir da omissão dos seus pais ou responsáveis, punem os atos causados pelos menores, chamados atos infracionais, ou ate mesmo atos causados pelos pais em relação aos filhos, para melhor convívio e bem estar social.

Através dos vários artigos existentes na legislação brasileira que conferem ao Ministério Publico e a outros institutos que visam a proteção da criança e do adolescente, o Estado adentra o meio familiar.

2  DIREITOS E DEVERES DOS PAIS EM RELAÇÃO AOS FILHOS

Hoje, pai e a mãe exercem juntos, com exclusividade, o instituto do poder familiar.

Há uma considerável convergência do Código Civil de 2002 com o Estatuto da Criança e do Adolescente quanto ao exercício conjunto do poder familiar. O Estatuto disciplina os deveres do pai, como estabelecido, por exemplo, no seu artigo 22 “o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores”, já o Código Civil disciplina as extensões do exercício desse poder. Assim, o Código e o Estatuto passaram a dispor acerca do poder familiar de forma conjunta. (LÔBO, 2009).

O poder familiar é representado por um conjunto de regras que englobam direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos menores. Quando se observa a definição feita por Gonçalves (2009), conclui-se que é de inteira responsabilidade dos pais a pessoa de seu filho menor.

O Código Civil não estabelece deveres à família como na Constituição Federal, porem demonstra claramente sobre a responsabilidade dos pais em seu artigo 1.634 e incisos. O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, também elenca em seu artigo 22 os deveres dos pais em relação às crianças e aos adolescentes. Para Lôbo (2009), os poderes assegurados pelo Código Civil somam-se os deveres fixados na legislação especial e na própria constituição.

A Constituição Federal estabelece no seu artigo 227, um conjunto de deveres cometidos à família, em favor do filho, quando criança e adolescente. Entre esses direitos dos filhos estão o direito à saúde, direito à vida, à alimentação, à educação, ao lazer, a profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar. Ainda nesse sentido estabelece o artigo 229 da Constituição Federal, “os pais tem o dever de assistir, criar e educar os filhos menores”. Esses direitos possuem um único titular que é o filho. (LÔBO, 2009).

A criança, enquanto menor, num contexto familiar deve ser sempre preservado, a legislação segue no sentido de resguardar o interesse, a proteção, o desenvolvimento das crianças e adolescentes. Para garantir essa proteção dos pais para com seus filhos menores o Estado exerce um importante papel de controle sobre eles. (LÔBO, 2009).

Para Gonçalves (2009) o dever de educar possui um dos maiores encargos, dentre os deveres dos pais com os seus filhos. O dever de dirigir a criação e educação dos filhos, como estabelece o artigo 1.634, inciso I, do Código Civil, é o mais importante de todos.

A educação estabelecida no Código e em outros dispositivos legais, como a Lei Nº 9394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, não é só aquela educação escolar, aprendida na escola, mas também na sociedade, na família, e em várias outras situações. Mas também se trata da educação moral, política, religiosa, profissional, cívica, toda educação que contribua para o desenvolvimento e formação do filho. (LÔBO, 2009).

O artigo 1° da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

Art. 1º. Abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil nas manifestações culturais.

E também a constituição em seu artigo 205, trata do referido assunto

Art. 205. Educação é direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece em seu artigo 55, acerca da educação: “os pais ou responsáveis tem o dever de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”. Pois é a obrigação dos pais e responsáveis fornecerem educação aos seus filhos.

O Código Penal em seu artigo 246 determina pena de detenção aos pais que não cumprem seus deveres sobre educação. E conseguinte em seu artigo 247, pena aos pais que agem de forma inadequada em relação a alguns bons costumes.

Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar:

Pena - detenção, de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa.

Art. 247 - Permitir alguém que menor de 18 (dezoito) anos, sujeito a seu poder ou confiado à sua guarda ou vigilância:

I - freqüente casa de jogo ou mal- afamada, ou conviva com pessoa viciosa ou de má vida;

II - freqüente espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender-lhe o pudor, ou participe de representação de igual natureza;

III - resida ou trabalhe em casa de prostituição;

IV - mendigue ou sirva a mendigo para excitar a comiseração pública:

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa.

Nesse mesmo contexto, pertence aos pais à decisão acerca da escola, se ela será pública ou privada, para isso devem-se observar as condições financeiras, a possibilidade de renda que possui para custear os estudos. (LÔBO, 2009).

Aos pais cabe o poder de decidir sobre a vida de seus filhos, e decidirem em conjunto sobre sua criação, a forma de disciplina, sobre suas escolhas, dentre outros deveres. Enfim, por todos os atos praticados por seus filhos menores.

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 Para Denise Damo Comel (2003, p. 62) não se questiona que o poder familiar seja efetivamente uma função, um verdadeiro encargo atribuído aos pais para que acompanhem, dirijam e protejam os filhos durante toda a menoridade, proporcionando-lhes, cada qual na sua medida, as melhores condições de desenvolvimento e amadurecimento na formação do caráter e da cidadania, sempre na defesa de seus interesses, até que cheguem à maturidade.

O direito-dever é de ambos os pais. Não há diferenciação entre um e outro, os dois possuem os mesmos direitos. Na situação de separação de fato, o filho deve manter seu statu quo, até que o juiz sentencie quem terá melhores condições para exercer a guarda. (GONÇALVES, 2009).

Fica claro que o rol de deveres e direitos conferidos aos filhos é de inteira responsabilidade de ambos os pais, não havendo diferenciação entre eles. As crianças deverão dentro de o contexto familiar ser sempre preservada e resguardada, quanto ao interesse de proteção e desenvolvimento.

Um dos principais deveres conferidos aos pais é o da educação, e é também um dos mais difíceis. Uma vez que educação é um termo abrangente e não está apenas restrita a educação escolar, e sim a vários tipos de educação, a pessoal, ambiental, sexual e a social.

2.1 BREVE HISTORICO DA EDUCAÇÃO ATRAVES DA PUNIÇÃO NO BRASIL

Quando se fala em subordinar os filhos a serviços próprios da sua idade e condição, o artigo 1.634, inciso VII, trata da vulnerabilidade dos filhos menores.

Essa regra ou costume surgiu em contexto histórico diferente, no qual a família era considerada, também, unidade produtiva e era tolerada pela sociedade a utilização dos filhos menores em trabalhos não remunerados, com fins econômicos. A interpretação em conformidade com a constituição apenas autoriza aplicá-la em situações de colaboração nos serviços domésticos, sem fins econômicos, e desde que não prejudique a formação e educação dos filhos, mas nunca transformá-los em trabalhadores precoces. (LÔBO, 2009).

O fato de uma mãe impor à sua filha a limpeza da casa ou das louças, ou ao filho de lavar o canil e cuidar do jardim, podem ser utilizados como forma de educação, como trabalho, uma forma de estabelecer obrigações aos filhos para os ajudarem no entendimento da vida cotidiana, e auxiliarem sobre responsabilidade, sem que para isso o menor se transforme em um trabalhador precoce.

O trabalho doméstico seria utilizado apenas para auxiliar na educação dos filhos uma vez que os pais são os responsáveis por assegurar a educação moral e civil. Porém o trabalho doméstico está em conformidade com a constituição.

Para Sergio Adorno (1998, p. 9), a sociedade brasileira tem uma história social e política de violência, pois são seculares “as agressões cometidas silenciosa e cotidianamente no mundo doméstico contra mulheres, velhos e crianças”.

Situando-se a punição corporal doméstica como uma forma de violência, temos o castigo físico em crianças. Cristiano da Silveira Longo (2005) traz em seu trabalho que o mesmo foi introduzido no Brasil, no século XVI, pelos padres jesuítas. “Os indígenas desconheciam o ato de bater em crianças. Porem os jesuítas via a correção vista como uma forma de amor, sendo que a punição corporal inseria-se no âmbito da Pedagogia do Amor Correcional”. (Cristiano da Silveira Longo, 2005).

Segundo a historiadora Mary Priore (1999, p. 96), “no cotidiano colonial a boa educação implicava os castigos físicos e as tradicionais palmadas”.

A correção era vista como uma forma de amor. O muito mimo devia ser repudiado. Fazia mal aos filhos. O amor de pai devia inspirar-se naquele divino, no qual Deus ensinava que amar é castigar e dar trabalhos. Vícios e pecados, mesmo cometidos por pequeninos, deviam ser combatidos com açoites e castigos.

Mary Del Priore (1996, p.12) em um de seus trabalhos afirma que “a formação social da criança brasileira passa pela violência explícita ou implícita. Já no século XVI, apresentavam duas representações infantis: a da criança mística e a da criança que imita Jesus”.

No Brasil quem desenvolveu uma psicologia infantil para a educação e disciplina das crianças foram os jesuítas. Para Mary Del Priore (1996) “essa psicologia significava valorizar a criança, protegê-la, para que ela entendesse o objetivo de Deus na terra, e seguisse os mesmos caminhos”.

A autoridade do pai no período colonial brasileiro era sentido em toda a sua família, em particular nos filhos. A pessoa do pai transmitia medo, temor, pois era ele quem mandava, colocava ordem, dava deveres e obrigações aos filhos, então desde pequenos os filhos respeitavam e tinham esse receio na parte paterna.

Segundo Emília da Costa, (2007, p. 156) as crianças eram acostumadas por meio de castigos brutos a obedecer-lhes aos pais.

Acostumavam-se, por meio de castigos físicos extremamente brutais, a não duvidar de sua prepotência. Os espancamentos com palmatórias, varas de marmelo (às vezes com alfinetes na ponta), cipós, galhos de goiabeira e objetos de sevícias do gênero, ensinavam-lhes que a obediência incontinenti era o único modo de escapar à punição. A justiça concedia ao pai o direito de castigar escravos, filhos e mulheres, “emendando lhes das más manhas”, conforme ditavam as Ordenações do Reino.

Os jesuítas pregavam sobre a necessidade de punir as crianças, e então essas praticas eram exercidas nos primeiros colégios brasileiros. Para Cristiano da Silveira Longo (2005, p. s/n).

A pedagogia jesuítica pregava abertamente a necessidade de punições corporais para bem educar as crianças. Isso era posto em prática nas primeiras escolas e colégios brasileiros, e tais concepções pedagógicas estendiam-se ao âmbito doméstico, conformando um universo cultural de práticas e representações comuns àquele tempo histórico. A partir da segunda metade do século XVIII, com o estabelecimento das chamadas Aulas Régias, a palmatória era o instrumento de correção por excelência.

Os primeiros manuais de orientação a educadores foram escritos, no Brasil, no século XVII, e voltavam-se às práticas escolares, estendendo-se, posteriormente, à esfera familiar, doméstica. Gilberto Freyre (1994, p. 466) em uma de suas obras diz “Condenava-se severamente o uso de se açoitarem os meninos nas nádegas, prática perniciosa, própria para fomentar costumes funestos”.

Para o mesmo autor as mais variadas formas e instrumentos de suplícios estiveram sujeitos os meninos no Brasil Colônia, independente de estarem em casa ou no colégio.

As várias espécies de palmatórias, a vara de marmelo, às vezes com alfinete na ponta, o cipó, o galho de goiabeira, o muxicão, o cachação, o puxavante de orelha, o beliscão simples, o beliscão de frade, o cascudo, o cocorote, a palmada. Ciente é o fato de que havia certo paralelismo entre as formas punitivas adotadas na escola e em casa. Isso é perfeitamente compreensível se observadas que as práticas punitivas educacionais, elaboradas pelos mestres jesuítas, certamente influenciavam pais e educadores fora do âmbito estritamente escolar, e estendiam-se ao âmbito doméstico. (FREYRE, 1994, p. 466).

Através da medicina social incluída na metade do século XIX, as famílias foram inseridas numa educação mais requintada incluindo a elas bons hábitos e excluindo a pratica de usos severos na hora de educar os filhos.

Mas foi na segunda metade do século XIX que a Medicina Social, por meio de sua política higiênica, submeteu a família da elite a uma tutela, reduzindo a família oitocentista brasileira a um estado de dependência dos saberes e orientações médico-higiênicas. Nesse contexto, os manuais de orientação a pais e educadores começam a exercer maior peso sobre a família, que passa a ser considerada incapaz de proteger a vida dos adultos e, principalmente, das crianças. Cabia a criança da época à educação higiênica a instalação de bons hábitos. Como um homem que cultiva plantas adequadamente, a criança deveria ser cultivada desde cedo pelos preceitos médico-higiênicos da época, tanto nos colégios como no âmbito doméstico. (Jurandir Freire Costa, 1983, p. 171).

Para (Jurandir Freire Costa, 1983, p. 171) esta educação inserida através da medicina social visava excluir os castigos físicos e criar, moldar o individuo para ser bem educado.

A educação higiênico-moral visava, entre outras coisas, a extinguir das casas e colégios a violência punitiva dos castigos físicos coloniais, criando a figura do indivíduo contido, polido, ‘bem educado’, cuja norma ideal é o comportamento reprimido e disciplinado do gentleman, do petit-bourgeois europeu. O castigo físico passa a ser considerado um recurso degradante, do mau educador. A moral higiênica via nas qualidades firmes, retas, justas e equilibradas do educador o antídoto eficaz contra a punição física. Toda a moralidade dos colégios deveria ir contra a prática de castigos corporais. A punição degradava as crianças sem obter nenhum resultado positivo. O medo aos castigos físicos tornava-as mentirosas, hipócritas, pusilânimes e temerosas.

Os efeitos dessa mudança na educação trouxeram pontos positivos na educação das crianças, essas mudanças foram moldadas com o passar dos séculos, é o que se entende alguns autores usado por Longo (2005) em seu artigo sobre punições corporais na infância.

A punição moral tinha melhores efeitos sobre as crianças do que as punições corporais. Essas observações vão ao encontro da tendência ao abrandamento ou humanização das penas a partir de fins do século XVIII e início do XIX no continente europeu. Embora esse movimento pedagógico-higiênico tenha como ponto de aplicação os colégios burgueses, seus preceitos, aos poucos, adentraram o espaço privado do ambiente doméstico. Somente a partir do século XX, mais expressivamente a partir de sua segunda metade, que foram publicados e editados, no Brasil, livros de orientação a pais e educadores, traduções de edições inglesas e norte-americanas, e de outros países.  (Michel Foucault, 1984)

A história da educação é pensada, nesse contexto, sendo usada a violência como ato inicial para manter uma disciplina das crianças e elas então crescerem corretas e educadas como manda as normas jesuíticas, porem logo mais tardar, sendo a higienização entendida e adaptada à época e tendo um melhor resultado, ou seja, um resultado mais requintado, mais adequado. Sendo entendido também como um modo de disciplina.

2.2 VIOLÊNCIA FÍSICA NAS RELAÇÕES FAMILIARES

Para Maria Amélia e Guerra, Viviane Nogueira de Azevedo (1995, p. 36) “A violência física, de maneira simplificada, pode ser entendida como aquela que atinge o corpo de alguém, causando maior ou menor intensidade de dor física”.

Todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e/ou adolescentes que - sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico à vítima – implica de um lado, uma transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, de outro, numa coisificação da infância, isto é, numa negação do direito que crianças e adolescentes têm de serem tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento.

A família é o lugar da violência doméstica. Violência esta, usada muitas vezes para reprimir os menores de algum ato considerado errado aos olhos dos pais. Violência que se usada de forma descontrolada poderá vir a causar danos maiores. Justifica Sergio Adorno (1988, p. 10), que

A intervenção agressiva dos pais é visando corrigir o comportamento e eliminar as condutas consideradas indesejáveis. Para ele crê-se que a imposição de limites às crianças deve necessariamente ser acompanhada de reprimendas, aplicadas ‘moderadamente’, ou seja, está incluso as agressões físicas.

O Estado, incumbido de fiscalizar esta violência por meios de vários institutos como o Código Civil brasileiro e até mesmo o Estatuto da Criança e do Adolescente, fecha-se os olhos para a intensidade e a regularidade com que tais ‘reprimendas’ são praticadas.

O lugar da violência de natureza física, por não rara as vezes é a família, mas não é só a física que prevalece a psíquica e as palavras torturantes também causam efeitos negativos aos menores. Cristiano da Silveira Longo (2005) comenta “Há vários nomes na psicologia para designar o fenômeno da violência doméstica física contra crianças e adolescentes: síndrome da criança espancada, abuso físico, maltrato físico, violência física, abuso-vitimização física.”  

O ato disciplinador, como o uso da violência por parte dos pais pode variar de uma simples palmada até uma surra. “Quando se fala em bater nos filhos, ao nível do senso comum, duas costumam ser as respostas mais frequentes”, é o que diz Maria Amélia e Guerra, Viviane Nogueira de Azevedo (1995, p. 36)

Como para discipliná-los, isto é, para controlá-los, submetendo-os a certa ordem que convém ao funcionamento do grupo familiar ou da sociedade em geral; para castigá-los, ou seja, puni-los por faltas reais ou supostamente cometidas.

Para Cristiano da Silveira Longo (2005, p. s/n), a intenção de disciplinar é uma prevenção a algo negativo que virá.

Disciplinar, do latim disciplinare, significa sujeitar ou submeter à disciplina; fazer obedecer ou ceder; acomodar, sujeitar; corrigir. Pode significar também castigar com disciplinas, correias com que monges e devotos se açoitavam por penitência ou castigo.” Por isso disciplinar significa controlar, submeter a uma ordem util. A intenção em disciplinar é, portanto, uma ordem preventiva.

Para Cristiano da Silveira Longo (2005, p. s/n), punir ou castigar alguém é algo mais corpóreo por motivo errôneo cometido por este.

Por sua vez punir, do latim punire, significa “infligir pena a”, castigar. Castigar por sua vez é o ato que atinge o corpo por algo cometido erroneamente. Pressupõe, portanto, culpabilidade ou presunção de culpa, tendo uma intenção punitiva.

            A criança dentro da sociedade brasileira é menorizada em relação aos outros (adultos), por se tratar de questões obvias como força, capacidade, noção, dentre outros. Por isso ela é alvo de violência dentro do seio familiar, como já dito antes, não só violência física, mas também psíquica e sexual. A cultura brasileira trouxe esta violência há séculos atrás e até hoje se vê resquícios desse mau comportamento, comportamento usado pelos pais para com seus filhos com a intenção de melhor educá-los.

3 EDUCAÇÃO E CASTIGO

O castigo em geral tem um caráter educativo, é utilizado para auxiliar na educação.

Há milênios o castigo é utilizado de forma coercitiva, é uma punição a algo considerado errado. Essa punição pode ser corporal, chamada também de castigo físico. É utilizado para auxiliar na educação, para impor limites. A própria Bíblia Sagrada dispõe versículos[1] que tratam do castigo como uma punição a ser aplicada como forma de disciplinar. “Não poupes ao menino a correção: se tu o castigares com a vara, ele não morrerá; castigando–o com a vara salvarás sua vida da morada dos mortos”. (Lidia Natalia Dobrianskyj Weber, 2004, p. s/n).

São vários os ditados populares que indicam essa punição corporal como método para educar uma criança. Provérbio Russo: “ama as crianças com o coração, mas educa-as com a tua mão”. Provérbio Grego: “quem não foi bem castigado com a vara, não foi bem educado”. Esses castigos corporais como forma de educar, vêm sendo transmitido ao longo de muitas gerações, como modelos a serem seguidos pelos pais na educação de seus filhos. (Lidia Natalia Dobrianskyj Weber, 2004, p. s/n).

É necessário estabelecer as formas de aplicação desse castigo, que será usado na forma a auxiliar o pai no dever de educar seus filhos. Os pais com a intenção de educar os filhos, usam da sua função correcional, o direito de castigar seus filhos, o jus corrigendi.

Para Denise Damo Comel (2003, p. 93) é reconhecido aos pais o livre arbítrio na decisão do poder familiar, de exigir respeito, impor educação, dentre outros.

Aos pais se reconhece, pois, o arbítrio no que tange ao exercício do poder familiar, no plano da licitude e da responsabilidade, por óbvio, que alcança, inclusive, o de exigir respeito, obediência e colaboração, e o poder – dever de educar, inclusive utilizando das medidas corretivas necessárias.

O dever de corrigir é necessário na educação e formação do caráter do filho. Esse dever aprova o fato, de que os pais são as melhores pessoas para a convivência e aprendizado para o crescimento dos filhos. (COMEL, 2003).

O dever de educar os filhos se relaciona com o direito de castigar-los. A educação gera uma permanente necessidade de limitar os filhos. Impor limites é uma tarefa de difícil realização se os pais não possuem direitos, não possuem poder sobre eles.

Denise Damo Comel (2003, p. 126) assegura que não seria possível aos pais desempenhar uma função paterna sem utilizar de meios que impõem obediência e respeito. Desta forma, a responsabilidade do pai de educar e criar seu filho depende do direito de fazer exigências ao filho.

Muitos pais utilizam do castigo físico, moral e psicológico para estreitar as vontades dos filhos ou para puni-los quando descumprem alguma ordem. Para Denise Damo Comel (2003, p. 106) “É constante a necessidade de corrigir o filho, impondo-lhes os limites necessários à adequação do comportamento, ora censurando, ora repreendendo e, também, quando necessário, aplicando-lhe castigos”.

Dentro dessa função correcional, o castigo adquire maior destaque entre as formas de correção. Para Denise Damo Comel (2003, p. 106) “O castigo é visto como a melhor forma do pai se impor diante do filho, assumindo um destaque na função correcional.”

Para constatar o castigo como forma de os pais educarem seus filhos é necessário estabelecer uma diferença entre as formas de castigo. O castigo não pode ser exercido com intuito de machucar, fazer o filho sofrer, tanto fisicamente como psicologicamente, somente pode ser aplicado na forma de educar o filho, dentro do âmbito do poder familiar, nunca extrapolando esse direito-dever, ou seja, aplicado e usada de forma moderadamente.

3.1 A LINHA TÊNUE ENTRE A EDUCAÇÃO E A AGRESSÃO

           

O castigo moderado é conceituado como o castigo controlado, aquele utilizado de forma restrita, prudente, brando, sem exageros ou excessos, usado também de maneira ou caráter educativo.

            Denise Damo Comel (2003, p. 106) explica a definição de castigo moderado.

É o castigo que não põe perigo a saúde física ou mental do filho e que não o priva do necessário à subsistência, podendo consistir em advertências, privações de regalias e, até, de correção física, conforme alguns, embora ela seja bastante questionável, tanto no aspecto de violação da integridade física e psíquica do filho (porque o castigo físico também pode consistir em violação psíquica), assim também quanto à sua eficiência pedagógica.

Há uma ampla discussão na doutrina para situar se o castigo moderado seria aceito como forma dos pais disciplinarem seus filhos, uma vez que não é propago na lei. Para Denise Damo Comel (2003, p.106) o castigo é visto também como correção aos filhos, porem deve ser limitado para não extrapolar o poder familiar.

O castigo assume uma importante função correcional, já que na lei há proibição somente do castigo imoderado, dessa forma, autoriza, ainda que implicitamente, o castigo de forma moderada, desde que seja praticado dentro dos limites permitidos para o exercício do poder dever, sob pena de perda do poder familiar.

Sabe-se ainda que o castigo aparece como um vestígio do pátrio poder. Paulo Luiz Netto Lôbo (2009, p. 285) acredita que o Código Civil deixou abertura quando tratou de castigo moderado, já que não o conceituou ou apenas limitou seu uso.

O código civil, quando inclui a vedação do castigo imoderado, admite implicitamente o castigo moderado. Sob o ponto de vista estritamente constitucional não há fundamento jurídico para o castigo físico ou psíquico, ainda que “moderado”, pois não deixa de consistir violência à integridade física do filho, que é direito fundamental inviolável da pessoa humana, também oponível aos pais.

O art. 227 da Constituição determina que é dever da família colocar o filho a salvo de toda violência. Todo e qualquer castigo físico configura violência. No pátrio poder era aceitável o poder de castigar fisicamente o filho, já no poder familiar fundado nos princípios constitucionais, como o da dignidade da pessoa humana, não há como admiti-lo. Para Paulo Luiz Netto Lôbo (2009, p. 285) “O poder disciplinar, contido na autoridade parental e no jus corrigendi, não inclui, portanto, a aplicação de castigos que violem a integridade do filho”.

Essa violência gerada pelo castigo entra em conflito com o dever dos pais de colocar as crianças e adolescente a salvo de todo e qualquer tipo de violência. O difícil é estabelecer se seria possível aos pais exercerem essa função de correção sem que para isso utilizassem do castigo. Não há ainda critérios configurados para o exercício da função de correção. O castigo moderado é aceito implicitamente em nosso ordenamento jurídico, como forma de aplicação do jus corrigendi, direito dos pais de castigar seus filhos, com intuito de propiciar a eles uma sólida educação.

Atualmente as crianças gozam de direitos e proteção, que visam, sobretudo, o melhor interesse deles. Porém, nem sempre foi assim. No Direito Romano, o filho sempre era subordinado ao pai, era tido como objeto e não como sujeito de direitos. Cabia ao pai o poder de decidir sobre a vida dos filhos, e detinham um poder de propriedade sobre eles. Para Paulo Luiz Netto Lôbo (2009, p. 273). “O patria potestas dos romanos antigos era muito extenso, ao início, pois abrangia o poder de vida ou morte”.

Para Rodrigo da Cunha Pereira (2004, p. s/n) “Nos séculos XII e XIII, o pátrio poder era imposto sem limitação, o pai detinha todo o poder sobre a vida dos filhos, era autoritário e possuía o domínio sobre os filhos menores.” Nessa época o castigo imoderado era exercido sem restrição. O pai instituía a forma de castigar seu filho.

O castigo imoderado é o castigo físico ou corporal, que é atinge a pessoa de maneira cruel ou brutal, “tomando, assim, não o caráter de um corretivo, que é da índole da punição, mas, de uma tortura do excesso ou do desmedido da ação punitiva.” (DE PLÁCIDO e SILVA, 2002, p. 160).

O castigo cruel e degradante utilizado pelos pais de maneira imoderada em relação aos filhos não é mais permitido no nosso ordenamento jurídico. Assim estabelece o artigo 1638, I, do Código Civil:

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

I - castigar imoderadamente o filho

[...]

A proibição sobre o uso do castigo imoderado é expressa no Código Civil. A lei sobre esse tema e a extrapolação deste demonstra o que os pais sofrerão, no caso de castigarem imoderadamente seus filhos.

A violência ou agressão exagerada não é incluída no jus corrigendi, não pode ser empregada na maneira corretiva para auxílio da função educativa. Deste modo, para que seja considerado como castigo imoderado deve haver o animus de mal tratar, machucar, a simples correção não configura o castigo imoderado. Assim, prevalece nas jurisprudências de nossos tribunais, como se pode observar em voto proferido pelo Desembargador Marco Antônio Barbosa Leal

(...) Omissis

À clareza, inexistente o animus de mau-tratar fisicamente o ofendido, mas tão-só a intenção de corrigi-lo. É evidente, castigos corporais episódicos dominados pelo jus corrigendi, exercidos com moderação e de forma adequada, conquanto causadores de parcas escoriações e hematoma, não ingressam na órbita de ingerência da atividade comportamental penalmente censurável gizada no art. 136 do Diploma Repressivo. (Apelação Crime nº 70002813897 - TJRS).

Para o Desembargador acima citado o animus de mal-tratar deve estar presente para configurar o castigo imoderado, e é exercido por varias pessoas da família, não só apenas pelo pai e mãe. Este pode ser praticado por várias pessoas.

Já a destituição do poder familiar somente pode ser efetuado em último caso. Se ocorrer abuso do meio de disciplina, excesso, extrapolação com utilização de meios de coerção abusivos. Então o poder familiar deverá ser destituído, para preservar os direitos da criança de ser tratada com zelo e dedicação, e de acordo com a Constituição e o principio da dignidade da pessoa humana.

Atualmente, os casos de destituição do poder familiar por abuso do poder coercitivo, de violência física contra crianças e adolescentes ocorrem em todas as classes sociais. Para configurar o castigo imoderado a Desembargadora Cristina Pereira Gonzales, afirmou que “é necessário à demonstração do elemento subjetivo, no caso a vontade de castigar, mesmo que com o intuito de educar.” (Recurso Crime nº 71002054161, TJRS).

Não são permitidos castigos que ultrapassam os limites da função educacional. Assim o Desembargador José Antonio Hirt Preiss

(...) não usou de meios moderados para exercer seu poder de correção e disciplina, abusando do emprego de violência e castigos corporais, razões restou configurado o delito tipificado no art. 136, caput, do Código Penal. (Apelação Crime. Nº 70024010993 - TJRS).

No voto do Desembargador José Preiss, foi constatado que o castigo corporal havia sido usado de maneira corretiva, entretanto, ocorreu um abuso na utilização da violência, o que gerou a extrapolação do jus corrigendi, motivo pelo qual o genitor foi tipificado no crime de maus–tratos.

Os sentimentos de stress, irritação, impaciência, depressão podem levar os pais a prática de agredirem fisicamente seus filhos sem motivos ou com a desculpa de educação. Porém não é esse o real motivo.  Em diversas situações, o castigo imoderado diferentemente do castigo moderado, não é justificado como um auxílio no dever do pai de educar seus filhos. O castigo imoderado surge como um excesso dos pais em relação aos filhos menores.

O excesso de poder do pai no exercício do direito de disciplinar seu filho não é autorizado pelo nosso ordenamento jurídico sendo repreendido no Código Civil, esse castigo imoderado não é admitido como um integrante do jus corrigendi

Assim, o Estado adentra o ambiente familiar visando assegurar os direitos das crianças e adolescentes, preservando a integridade física, com autonomia, quando os pais ou responsáveis extrapolam o direito-dever do poder familiar.

4   PROJETO DE LEI 7672/03, CONHECIDA COMO LEI DA PALMADA

Em 2010, o Poder Executivo, criou um projeto de lei que propõe alteração ao Estatuto da Criança e do Adolescente. O Projeto de Lei 7672/2010 visa estabelecer o direito da criança e do adolescente a serem educados e cuidados sem a utilização de castigos corporais ou de tratamento cruel degradante.

Com a alteração proposta no Projeto de Lei n° 7672/2010, serão acrescentados mais três artigos ao Estatuto da Criança e do Adolescente. O artigo 17 passará a ser dividido em 17A, acrescido de um parágrafo único e dois incisos e 17B. Será acrescido também ao Estatuto o artigo 70A, e seus cinco incisos, e, um parágrafo único será acrescido ao art. 130.

Dessa forma, assim ficará o artigo 17A

Art. 17-A. A criança e o adolescente têm o direito de serem educados e cuidados pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar, tratar, educar ou vigiar, sem o uso de castigo corporal ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação, ou qualquer outro pretexto. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, considera-se:

I - castigo corporal: ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso da força física que resulte em dor ou lesão à criança ou adolescente.

II - tratamento cruel ou degradante: conduta que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize a criança ou o adolescente.

No presente Estatuto há somente o artigo 17, que dispõe

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.

O artigo 17A determina a proibição de qualquer tipo de punição corporal e de qualquer tipo de tratamento cruel degradante, mesmo que sejam aplicados com o intuito de educar, de limitar os filhos, ou mesmo para impor algo. Em seus incisos, foi incluso o conceito de castigo corporal e de tratamento cruel degradante, para evitar interpretações subjetivas acerca dos conceitos do que seria considerado como castigo moderado e imoderado.

A redação do artigo 17B prevê sanção aos pais ou responsáveis no que foi previsto no artigo anterior, ou seja, aos que praticarem qualquer tipo de punição corporal as crianças, ainda que seja com fins pedagógicos ou educativos, sofrerão as medidas impostas no artigo 129 do mesmo Estatuto.

Segue a redação dada ao artigo 17-B

Art. 17-B. Os pais, integrantes da família ampliada, responsáveis ou qualquer outra pessoa encarregada de cuidar, tratar, educar ou vigiar crianças e adolescentes que utilizarem castigo corporal ou tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação, ou a qualquer outro pretexto estarão sujeitos às medidas previstas no art. 129, incisos I, III, IV, VI e VII, desta Lei, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.

As medidas tratadas no artigo 129 estão sujeitas aos pais que descumprirem o imposto na redação do artigo 17-A que trata de qualquer tipo de violência contra as crianças e adolescentes, encaminhamento dos pais a tratamento psicológicos, á programas de proteção à família, advertência, encaminhamento da criança a tratamento especializado. Como dispõe

Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:

I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;

(...)

III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;

IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;

(...)

VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;

VII – advertência;

No mesmo âmbito, a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios adquirem com o artigo 70A, a função de proteção, em que deverá promover políticas de conscientização para toda a população acerca dos direitos fundamentais das crianças, a fim de evitar a utilização de castigo corporal e de tratamento cruel degradante. Para isso, as ações de como deve acontecer essas políticas públicas.

Art. 70-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios atuarão de forma articulada na elaboração de políticas públicas e execução de ações destinadas a coibir o uso de castigo corporal ou de tratamento cruel ou degradante, tendo como principais ações:

I - a promoção e a realização de campanhas educativas e a divulgação desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos;

II - a inclusão nos currículos escolares, em todos os níveis de ensino, de conteúdos relativos aos direitos humanos e prevenção de todas as formas de violência contra a criança e o adolescente;

III - a integração com os órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, do Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente nos Estados, Distrito Federal e nos Municípios, Conselhos de Direitos da riança e do Adolescente, e entidades não governamentais;

IV - a formação continuada dos profissionais que atuem na promoção dos direitos de crianças e adolescentes; e

V - o apoio e incentivo às práticas de resolução pacífica de conflitos que envolvam violência contra criança e adolescente.

A última mudança proposta pela chamada “Lei da Palmada”, é a inclusão de um parágrafo ao artigo 130 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Hoje o presente artigo dispõe sobre medida cautelar que sofrerá quem agredir crianças e adolescentes. Desse modo, será aplicada sanção prevista neste artigo a todos que descumprirem de forma reiterada as medidas de proteção estabelecidas no artigo 17B do presente Projeto de Lei.

Assim é a atual redação

Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum.

Parágrafo único. Da medida cautelar constará, ainda, a fixação provisória dos alimentos de que necessitem a criança ou o adolescente dependentes do agressor.

Com a inclusão do novo parágrafo a medida cautelar será ainda mais ampla, segue o seguinte novo parágrafo.

Parágrafo único. A medida cautelar prevista no caput poderá ser aplicada ainda no caso de descumprimento reiterado das medidas impostas nos termos do art. 17-B.

O Projeto de Lei n° 7672/2010, diminuiu e limitou os poderes dos pais sobre os filhos. Dessa forma, o poder familiar, não poderá ser exercido da forma ampla como era antes. E sim, os pais terão que ter um cuidado ainda maior em relação aos castigos aplicados e a forma como educa seus filhos. A proibição da utilização de castigos físicos ou qualquer tipo de punição corporal e de tratamento cruel degradante serão vedados.

4.1 ARGUMENTOS FAVORÁVEIS E ANTAGÔNICOS AO PROJETO DE LEI 7672/2010

O Projeto de Lei utiliza de vários argumentos para que seja aceita sua aprovação. Um dos principais argumentos é o que se refere à punição corporal como uma afronta direta a integridade física e dignidade da criança e do adolescente, que goza de proteção especial.

A ex- deputada Maria do Rosário foi relatora do projeto, e justifica a necessidade de alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente com a comprovação de que as crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, sujeito este imposto pela Constituição Federal, à condição especial de desenvolvimento destas. O princípio da proteção integral asseguram as crianças e adolescentes de maneira peculiar.

 Rosário (2010) afirma ainda, que o Estatuto da Criança e do Adolescente consagra o princípio da proteção integral, resguardando as crianças e adolescentes de qualquer tipo de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Para a Deputada não seria permitido aos pais e responsáveis o uso de castigo físico e tratamento cruel ou degradante.

Ela defende em seu relatório que de todos os direitos relacionados à proteção das crianças e adolescentes, a cultura de bater para educar não foi rompida desde os padres jesuítas, sendo ainda permitida a violência física sob alegação de propósitos pedagógicos. Ainda acrescenta que a aprovação do referido Projeto de Lei é uma forma de enfrentar essa cultura, uma cultura violenta. Dessa forma Maria do Rosário (2010, p. s/n) dispõe em seu parecer

(...) prevalece no Brasil o costume de se recorrer a alternativas violentas para solução de conflitos, inclusive no que toca a conflitos domésticos. Essa cultura, contudo, pode e deve ser enfrentada por diversas vias, dentre elas a valorização da infância e da adolescência, a percepção da criança como um ser político, sujeito de direitos e deveres, e, ainda, o conhecimento e disseminação de métodos pacíficos de resolução de conflitos, incluindo a vedação do castigo infantil, ainda que moderado e para fins pretensamente pedagógicos. (Parecer da Comissão de Educação e Cultura, análise do projeto de lei n° 7672/2010).

A violência física imoderada é proibida de forma explicita, sendo subentendido que a violência física moderada é permitida. Rosário (2010, p. s/n), defende ainda que a permissão do castigo moderado gera dificuldade de limitar o uso desse castigo, já que a linha entre castigo físico moderado e agressão é tênue, então propicia abusos.

O principal objetivo do projeto de lei será aprofundar o direito que todas as crianças e adolescentes possuem de ser educados e cuidados sem o uso dos castigos físicos e do tratamento cruel e degradante como formas de correção, disciplina e educação ou sob qualquer outro pretexto. Esses direitos já são assegurados pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pela Convenção de Direitos das Crianças e propõem que qualquer tipo de punição corporal e de tratamento cruel ou degradante seja vedado.

Assim para Paulo Luiz Netto Lôbo (2009, p. 273) a aceitação do castigo moderado é um resquício do pátrio poder. “Não há fundamento jurídico para que o castigo físico ou psicológico seja aceito ainda que de forma moderada, corroborado com base no artigo 227, que a família tem o dever de colocar a criança e o adolescente a salvo de toda violência.”

 Nesse mesmo contexto, Maria Ignez Franco Santos (2010, p. s/n), que afirma o uso de castigo moderado ou imoderado significa a incapacidade dos pais de educar por meio da palavra. Para ela a forma de educar com a utilização do castigo pode ser um reflexo de frustrações e impaciências geradas pelo dia a dia, que são diretamente descontados nas crianças. Acrescenta ainda que mesmo com todos os anos de vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente, os pais e educadores não foram conscientizados quanto à forma de educar seus filhos menores.

Ainda, no intuito de erradicar todas as formas de castigo corporal, foi criada por um grupo de instituições formada por pessoas físicas, uma campanha em 2008 a favor dos Direitos das crianças e contra os castigos físicos humilhantes, denominada como “Não Bata, Eduque”. Essa rede contribuiu com o poder executivo para a elaboração do referido Projeto de Lei Define os castigos físicos e humilhantes como

É uma forma de violência aplicada por uma pessoa adulta com a intenção de disciplinar para corrigir ou modificar uma conduta indesejável. É o uso da força causando dor física ou emocional à criança ou adolescente agredido. É uma forma de violência contra a criança e uma violação de seu direito à dignidade e integridade física.

A proibição do castigo fere diretamente os princípios da integridade e da dignidade das crianças e adolescentes, para a campanha da rede “Não bata, Eduque” castigo físico é uma forma degradante e humilhante. Defende ainda, que os pais são responsáveis por proteger seus filhos e não por violarem seus direitos fundamentais, uma vez que são sujeitos de direitos.

Mas a grande pergunta de muitos pais é: É possível educar sem bater? Para administrador de empresas Ricardo Vieira Simplício, 38 anos, pai de um casal, a resposta é Sim! É isso também que prevê a Lei. Prevê que educar é pegar na mão e dialogar. Entende que na conversa e sob estado emocional equilibrado dos pais é que as crianças aprendem de fato e que tal ato abre um horizonte incrível de possibilidades. (MANGINI, 2011).

Para Jussara Mangini (2011, p. s/n) o castigo corporal não torna as crianças obedientes, porém o uso contínuo deste método podem ensina-las a usar a força em outras situações na vida cotidiana.

É verdade que o castigo corporal não torna as crianças obedientes, não promove a cooperação ou a internalização de valores morais, nem reduz a agressão ou o comportamento antissocial, mas o uso frequente desse método ensina para a criança que os conflitos e diferenças podem ser resolvidos com o uso da força e alimentam o ciclo de violência em nossa sociedade.

Muitas vezes, a violência física ou psicológica acaba acontecendo num rompante, e não por metodologia. Nesses momentos os pais podem sentar com seus filhos e serem sinceros com eles, explicando que perderam o controle e que se arrependem. Esse tipo de atitude, que é um ótimo exemplo de humildade e de respeito com o outro, é estimulada pela rede “Não bata, Eduque”, criada para provocar o debate no Brasil. (MANGINI, 2011).

Um dos primeiros países a banir o castigo físico da cultura foi a Suécia, em 1979. Hoje outras 28 nações, como Dinamarca, Espanha, Alemanha, Portugal, Uruguai e Venezuela, aprovaram medidas banindo a prática. (RODRIGUES, 2011).

Quase todos os pais já viveram a dúvida de bater ou não em seu filho. A palmada nos filhos é uma estratégia bastante utilizada, como uma medida de emergência ou quando julgam ter esgotado todos os meios de correção, só que os pais confundem palmada com impor limites e não notam que ela não funciona de fato. Para impor os limites não é necessário o uso de palmadas ou castigos corporais.

O “apanhar” tem efeitos colaterais bem sérios nas crianças, para Jussara Mangini (2011, p. s/n), “A surra alivia a culpa. A criança que leva uma palmada se sente livre para fazer a coisa errada novamente, pois ‘já pagou’ pelo erro anterior. Por outro lado, pode gerar na criança o sentimento de que é muito má e desobediente e, por isso, merece esse tipo de tratamento”.

 Não é à toa que a chamada Lei da Palmada ainda gera tanto debate entre especialistas e desaprovação de boa parte da população. A lei que veta castigos físicos a crianças foi reprovada por 54% dos 10.905 entrevistados pelo Instituto Datafolha[2] em julho do ano de 2010, e 36% revelaram ser favoráveis. A mesma pesquisa identificou que 72% dos que já eram pais haviam sofrido algum tipo de castigo físico, sendo que 16% disseram que apanhavam sempre quando crianças.

Em estudo publicado no “Canadian Medical Association Journal” revisou 20 anos de pesquisas sobre o tema e confirmou-se que o comportamento de crianças que sofrem castigos corporais, mesmo leves, com aquelas que afirmam nunca ter levado uma surra em casa, e foi observada uma clara tendência: as que não apanham são menos agressivas e mais propensas a resolver conflitos por meio do diálogo. (DEMÔRO, 2012)

Um dos principais opositores ao Projeto de Lei 7672/2010 é o deputado Jair Bolsonaro, ele afirma que o projeto desautoriza os pais e cria uma cultura de filhos que podem denunciar suas famílias, bem como prejudica a educação e favorece a delinquência e o crime, unido a ele está 54% dos brasileiros que defendem que o uso da palmada é essencial para impor respeito aos filhos e ate mesmo limitar suas ações quando estão desobedientes.

No mesmo contexto Cordeiro (2010), afirma que a lei da palmada afronta diretamente o direito dos pais de educarem seus filhos, e pode ser considerada inconstitucional se for interpretada de forma rigorosa.  Uma vez que a Constituição Federal incumbe aos pais o poder familiar e conseguinte o poder trazido pelo jus corrigendi, dando a eles a liberdade de educar seus filhos. Ainda acrescenta que a alteração do artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente é desnecessária uma vez que os abusos em relação aos meios de correção e de disciplina já são proibidos.

Os opositores a “lei da palmada” afirmam que o jus corrigendi[3], ficaria prejudicado com a aprovação da lei. Os pais não poderiam mais dar a tradicional palmada no seu filho com o intuito de educá-lo ou limitá-lo. O Estado teria a função fiscalizadora, para monitorar a possível violência doméstica. A constante fiscalização, em igualdade proporções, de uma toda sociedade, seria bem complicado. Assim dá-se a entender que o poder familiar seria controlado pelo Estado. 

O Estado assumirá, com a aprovação de lei, o dever de fiscalizar e punir palmadas que os pais praticarem contra seus filhos. As crianças e adolescentes não poderão mais sofrer qualquer tipo de violência física o que seria no ponto de vista dos opositores uma ofensa ao poder familiar. 

O desembargador Costa (2010) afirma que a nova lei não gera mudanças na relação dos pais com seus filhos. Para ele mesmo com a aprovação da lei os pais continuarão dando palmadas nas crianças e nos adolescentes, afirma ainda que a lei busca suprir necessidades sociais de forma ineficaz. Então defende que a lei não seria a solução para acabar com as palmadas, e sim a promoção de campanhas educativas na sociedade de forma que os pais possam encontrar outra forma de educa-los. Nesse sentido Maria Ignez Franco Santos (2010, p. 1-6)

O que se observa hoje é uma crença numa pretensa capacidade mágica da lei. A cada dia, surgem textos legais, buscando absorver todas as necessidades sociais e, ingenuamente, entendê-las por satisfeitas através da simples edição da norma. Basta ver alguns dispositivos legais que garantem o paraíso na terra (...)

Outro ponto levantado é que a palmada é ineficiente como método para ensinar a criança a não repetir o erro pelo qual está sendo punida. É importante enfatizar, que toda a ação que causa dor física numa criança, desde um simples tapa até o espancamento fatal, representa um conjunto de violência. O que deve ser entendido pela população que se manifesta contra o projeto aludido é que educar realmente dá trabalho, talvez por isso cada vez mais se empurre essa responsabilidade para a escola.

Segundo pesquisa do suplemento de educação do jornal The Times, que ouviu mais de 2 mil pais e mães ingleses, 49% acham que castigos dados por professores deveriam voltar para as escolas. A pesquisa foi lançada em um momento em que o secretário de Educação, Michael Gove, quis dar mais poder aos professores para repreender os alunos. Muitos professores não concordam. Desde 1984 a legislação inglesa veta castigos físicos nas escolas. (MANGINI, 2011)

No primeiro semestre de 2010, o Instituto da Criança, do Hospital das Clínicas de São Paulo, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) registrou 60 casos de maus-tratos infantis, 36% a mais que o ano anterior. De acordo com o pediatra da casa, Antônio Carlos Alves Cardoso, 75% das agressões acontecem com crianças menores de 2 anos. (MANGINI, 2011)

Em 60% dos casos a agressora é a mãe. De acordo com a tese de doutorado de Cardoso sobre o assunto, mais de 90% das que sofrem agressão terão sequelas físicas ou psicológicas. Mas bater é uma das formas de maus-tratos à criança. Existem outras tão ou mais graves como as agressões psicológicas, abuso sexual, síndrome do bebê sacudido e negligência. Essa, segundo Cardoso, responde por 60% das ocorrências, enquanto agressão física está em 25% dos registros. Geralmente estas famílias são descritas como hostil e permissiva.

Uma das coisas mais importantes para evitar ou diminuir os conflitos dentro de casa é conhecer as fases do desenvolvimento de uma criança, bem como suas características, limitações e os cuidados necessários em cada uma delas.

Sem conhecer esses limites dados pelo desenvolvimento, os pais tendem a se irritar com o que a criança faz ou não consegue fazer, passando a agredi-las de sobremaneira ao invés de educá-las de maneira coerente e tranquila. Então para a maioria dos opositores do projeto de lei conhecido como “Lei da Palmada” não é eficaz a aprovação da lei da palmada e sim a promoção de ideias e campanhas para a conscientização dos pais enquanto a educação dos filhos, para a melhora e mudança da cultura violenta dentro do seio familiar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Antes o pátrio poder dava ao pai total autoridade de decidir sobre a vida de seus filhos, sem nenhum pudor, ou seja, o pai poderia vender, aplicar qualquer punição para castiga-los, e ate mesmo matar o menor. A vida do filho era considerada propriedade e o papel da mãe, no ambiente familiar, era apenas como colaboradora.

Hoje, com o novo instituto chamado de poder familiar, é assegurado um amplo rol de Direitos às crianças e adolescentes, porém não é mais permitido aos pais castigar as crianças ou adolescentes de forma cruel ou degradante, nos moldes permitidos anteriormente. Hoje há no ordenamento jurídico brasileiro, artigos que asseguram uma proteção integral as crianças, protegendo-as até mesmo de seus genitores que abusam do poder que lhe é concedido, e nos casos mais graves há a previsão de perda do poder familiar.

No entanto, ainda é permitido aos pais utilizarem punições moderadas nas crianças e nos adolescentes com o intuito de educar, exercendo o instituto do jus corrigendi. Não rara às vezes os pais utilizam a palmada, chamada de palmada educativa, como forma de correção e de castigo.

A dúvida é, até que ponto a utilização da palmada como método de correção pode beneficiar ou prejudicar a formação do filho? Há corrente que defende a palmada educativa, e há também corrente que trata a palmada como prejudicial para a formação da criança e do adolescente.

Para Lídia Natalia Dobrianskvj Weber (2004, p. s/n) “A associação entre “amor e dor” faz parecer para as crianças que as pessoas que mais a amam também têm o direito de lhe infligir dor.” O menor não consegue distinguir aquele que o proteja daquele que o ameaça. Essa corrente ainda afirma que as crianças e adolescentes que apanham podem se tornar adultos violentos e também utilizarem de castigos físicos para educarem seus filhos, gerando uma rede de violência. Em divergência com essa teoria e a favor da lei da palmada encontra-se uma menor parcela da população brasileira[4].

O Brasil é reconhecido como um dos países com legislação avançada na área da infância e adolescência. A distância entre o que é descrito na lei e a realidade de milhões de crianças e adolescentes traz a sociedade ao debate acirrado como o da “aceitação” da Lei da Palmada. A discussão desafia a sociedade a ser mais decisiva na educação e a ter o cuidado de não usarem os castigos corporais ou de tratamento cruel ou degradante. A prática da lei vem acompanhada de argumentos de convencimento, insistência e de paciência.

A utilização da palmada educativa é algo cultural, integra o âmbito familiar brasileiro. Os pais e responsáveis estão acostumados a utilizar do castigo físico, de forma regular, para impor limites às crianças e aos adolescentes.

O projeto de lei contra maus-tratos causou um alvoroço de discussões no Brasil, tanto os pais quanto os legisladores entraram em divergência sobre o assunto.

Foi discutido em audiência pública promovida pela Comissão Especial da Educação (Sem Uso de Castigos Corporais), que analisa o Projeto de Lei 7672/10, e essa discussão trouxe opiniões diversas. Alguns equívocos criados em torno da lei foram esclarecidos, como o fato de que a lei não propõe restringir a liberdade de nenhum pai por aplicar uma simples palmadinha ao seu filho, é o que temem muitos pais. Até porque sanções previstas para agressões físicas e maus tratos, já estão elencadas em institutos jurídicos brasileiros como o Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente, podendo os pais, em casos extremos, obter a perda do poder familiar.

A principal causa do projeto é trazer reflexão ás famílias brasileiras que usam de práticas agressivas e automáticas, realizadas por impulso emocional de raiva, stress. E indicar a eles que não podem ser utilizados castigos corporais e tratamento cruel e degradante por nenhum pretexto.

A aprovação desse projeto de lei que estabelece a proibição da palmada educativa não mudará a forma dos pais educarem seus filhos menores. Pois não são muitos os registros de casos que chegam ao conselho tutelar, deduz disso, que as palmadas usadas pelos pais com o intuito de educar ou limitar seus filhos não geram neles um dano maior, e quando são gerados danos corpóreos ofensivos, estes já estão tipificados no ordenamento jurídico. Na verdade, entende-se que é necessária uma fiscalização maior nos excessos de castigo físico causados pelos pais ou responsáveis.

A Constituição Federal 1988 garante Direitos essenciais como saúde, educação, defesa dos direitos e o dever da fiscalização. O nascimento do Estatuto da Criança e do Adolescente e dos conselhos tutelares e conselhos municipais de direitos das crianças e adolescentes contribuíram para que os Direitos das crianças e adolescentes sejam conhecidos e praticados, ou seja, fiscalizados pelo estado.

Conclui-se que a simples palmada educativa não é capaz de gerar graves transtornos para a formação de crianças e adolescentes, o que gera um grave transtorno é a extrapolação da palmada educativa.  O Projeto de Lei 7672/2010, ressalta a relevância de que pais e mães não banalizem mais esse tipo de comportamento, ou seja, não extrapolem nesse tipo de punição que prejudica o desenvolvimento das crianças. Pois existem outras formas de educar.

Para punir a extrapolação do poder familiar, do jus corrigendi, o Código Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o próprio Código Civil já estabelecem sanções para os pais que extrapolam o exercício desse poder.

Deste modo, entende-se que não é necessária a aprovação de Projetos de Lei que interfiram de forma tão profunda no âmbito familiar. O Estado não poderá intervir no poder familiar que ele mesmo através da democracia, concedeu aos pais.

O Estado com seu poder fiscalizador possa adentrar o meio familiar através de programas e campanhas especializadas para melhorar a maneira de agir dos pais e responsáveis, descartando a utilização de punições corporais e, por conseguinte os pais terem a oportunidade de sucesso na proteção e educação de seus filhos menores. Já que as crianças e Adolescentes são protegidos de forma tão ampla pelo ordenamento jurídico e são assegurados por princípios como o da dignidade da pessoa humana e o da proteção integral das crianças e Adolescentes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADORNO, S. (Coord.). A criança menorizada: banco de referências bibliográficas. (Série Dossie NEV, 3). São Paulo: USP, Núcleo de Estudos da Violência. 2008.

Apelação Crime nº 70002813897, Relator Desembargador Marco Antônio Barbosa Leal, TJRS. Câmara Especial Criminal. Julgado em 28/08/2001.

Apelação Crime. Nº 70024010993, Relator Desembargador José Antônio Hirt Preiss. TJRS. Terceira Câmara Criminal. Julgado em 14/08/2008.

AZEVEDO, M. A. A pedagogia despótica e a violência doméstica contra crianças e adolescentes: onde psicologia e política se encontram. In M. A. Azevedo & M. S. Menin (Orgs.), Psicologia e política: reflexões sobre possibilidades e dificuldades deste encontro. São Paulo: Cortez; FAPESP. Ano. 2005.

AZEVEDO, M. A., & Guerra, V. N. A. Mania de bater. A punição corporal doméstica de crianças e adolescentes no Brasil. São Paulo: Iglu. 8ª Edição. Volume 4. Ano 2010.

BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Pátrio poder: regime jurídico atual. RT 676/83, São Paulo, fev. 1992.

Bíblia Sagrada, Provérbios 23:13-14

BRASIL. Lei N° 8.069, de 13 de Julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e da outras providências. D.O.U de 16/07/1990.

BRASIL. Decreto-Lei Nº 2.848. Código Penal Brasileiro. D.O.U de 31/12/1940

BRASIL. Lei N° 9394/96. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. D.O.U de 23/12/1993.

BRASIL. Lei N° 4.121 de 27 de agosto de 1962. Estatuto da Mulher Casada. D.O.U de 03/09/1962.

BRASIL. Projeto de Lei N° 7672, 2010. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=483933> Acesso em: 14 agosto de 2012.

BRASIL. Lei N° 3.071 de 1º de Janeiro de 1916. Código Civil Brasileiro (1916). D.O.U de 10/01/2002.

CAMARA DOS DEPUTADOS. Folha do Plenarinho, Brasília, 2011. Disponível em: <www.plenarinho.gov.br>. Acesso em 19 de agosto de 2012.

CORDEIRO, Aguiar Lara. Diário de ourinos. 2010 <http://www.pediatriaemfoco.com.br/posts.php?cod=226&cat=8>


[1] Bíblia Sagrada, Provérbios 23:13-14

[2] Pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Datafolha sobre a Lei da Palmada e projetos de lei que visam proibir palmadas nos filhos, e obter a opinião publica a respeito do projeto de lei. Publicada em São Paulo na data de 22 de julho de 2010

[3] Direito do pai de corrigir seu filho

[4] Pesquisa realizada pelo Instituto Data Folha em julho de 2010.

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Monografia de Conclusão de Curso de Direito do Centro Universitário Euro Americano, como requisito obrigatório para obtenção do grau de Bacharelado. Aprovado em Dezembro de 2012

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