Fase de habilitação dos créditos no processo de falência

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A referida pesquisa procurou analisar a fase de habilitação dos créditos no processo de falência, tendo em vista que é a fase mais longa e complexa do processo, onde irá definir os credores e o total do passivo do insolvente.


 

RESUMO

A referida pesquisa procurou analisar a fase de habilitação dos créditos no processo de falência, tendo em vista que é a fase mais longa e complexa do processo, onde irá definir os credores e o total do passivo do insolvente. No trabalho buscou desenvolveruma interpretação sistemática e crítica, Buscando entender e encontrar falhas na lei com a finalidade de desenvolver soluções pragmáticas e céleres, efetivando o princípio da celeridade processual e o da economia processual. Embora a reforma ocorrida na LRE no dia 19 de fevereiro de 2005, tendo sido de suma importância para uma legislação mais efetiva, priorizando o princípio da recuperação da empresa e de forma implícitao princípio da função social da empresa previsto pelo ordenamento legal cujo fundamento está inserido no bojo da Constituição Federativa do Brasil, em seu Artigo 5º, inciso XXIII que enfatiza que “a propriedade atenderá a sua função social” (BRASIL, 2010), ainda em seu Artigo 182, § 2º que prevê que “a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor” (BRASIL, 2010). E, por fim, no Artigo 186 que pontua que “a função social da propriedade rural é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei [...]” (BRASIL, 2010), bem como no código Civil, em seus Artigos 421, que determina que “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato” (BRASIL, 2011) e Artigo 1.228 § 1º, que rege que o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas (BRASIL, 2011), a fase de habilitação dos credores e dos créditos é um enorme prejuízo para os credores, estado e funcionários da empresa, pois neste momento processuala lei permite impugnações de todos os créditos, podendo deflagrar inúmeras sentenças e recursos, protelando o processo por vários anos, violando todos os princípios acima destacados.O trabalho ainda se utilizou de pesquisa bibliográfica da ciência do Direito e de artigos encontrados na internet relacionados com o tema.

Palavras-chave: Lei de Falência e Recuperação de Empresas. Empresa em crise. Insolvente. Créditos.

ABSTRACT

Thatresearchwas to analyzethequalification phaseof the claimsin the bankruptcy proceedingswith a viewthatis thelong and complexprocedure,whichwilldefine thecreditors andthe totalliabilitiesof the insolvent. In thestudy aimed todevelop asystematiccritical interpretation, seeking to understand andfind flawsin the lawin order todeveloppragmaticand rapidsolutions, making the principleofspeedy trialandtheprocedural economy. Althoughthe reformoccurred in theLREonFebruary 19, 2005, and was of great importancefor more effectivelegislation, prioritizing the principle ofthe company'srecovery andimplicitlythe principleof the social functionof the companyprovidedby thelegal systemwhosefoundation isinsertedin the wakeof the FederalConstitution of Brazil, in its Article5, paragraphXXIIIwhich emphasizesthat"property must fulfillits social function" (BRAZIL, 2010), stillin its Article182,§ 2which states that "urban property performsits social function whenit meets the fundamentalrequirementsofthe cityorderingexpressedin the Master Plan"(BRAZIL, 2010). Finally, Article 186points out that"the social function of ruralproperty ismet when the ruralpropertycomplies simultaneously, according to criteria andstandards prescribedby law[...]" (BRAZIL, 2010), as well asthe Civilcode,in its Articles421,which states that "freedom of contract shall be exercisedby reasonand within the limitsof the social functionof the contract" (BRAZIL, 2011)andArticle1228§ 1, which governs theright to propertymustbe exercisedin accordance withtheir economic and socialpurposes andso that they arepreservedin accordancewith the provisionsof special laws, the flora,the fauna, the natural beautythe ecological balanceandthehistorical and artistic heritage, andavoidedpollutionairand water(BRAZIL, 2011), the qualification phaseof creditorsand debtorsis a hugeloss to thecreditors, state andcompany officials, as thisprocedurallawandnowallowsappealsof all claimsand maytriggernumeroussentencesand resourcesstallingthe processfor several yearsin violation ofall theprinciplesoutlined above. The work alsowas usedbibliographical researchof the science oflaw andarticles foundon the Internetrelated to the topic.

Keywords:LawofBankruptcyand Corporate Restructuring. Companyin crisis.Insolvent.Credits.

1. INTRODUÇÃO

            A falência na qualidade de execução concursal do devedor empresarial insovente, tem como finalidade reunir os credores (massa falida subjetiva), arrecadar todos os bens (massa falida objetiva). A massa falida sujetiva se dá com o procedimento da verificação e habilitação dos créditos,

            Poucos temas são mais espinhosos que as habilitações de crédito nos processos falimentares e de recuperação de empresas, sendo que é a fase mais longa e complexa do processo falimentar. Normalmente custosas e por vezes acompanhadas de longos trâmites judiciais, as habilitações causam perplexidades até mesmo aos maiores especialistas.

            Os estudantes e aqueles que buscam uma colocação profissional no complexo mundo jurídico também não estão livres do contato com as habilitações de crédito, dada a frequente necessidade de empresários e credores de natureza civil postularem seus direitos em tais procedimentos. Isso tudo envolve o trabalho de advogados, juízes, promotores e outros operadores jurídicos. Daí porque algumas das mais recentes provas (incluindo a segunda fase do último exame da OAB) passaram a exigir do candidato o conhecimento desta matéria.

            Confirmando-se pela decretação da falência, concessão da recuperação judicial ou homologação do plano de recuperação extrajudicial, a situação de crise econômico-financeira de uma entidade empresária, passa-se a lidar com uma nova situação de fato, na qual a primeira constatação relevante é a de que o patrimônio do devedor (= a totalidade de seu ativo) é insuficiente para satisfazer a pretensão de seus credores (= seu passivo exigível).

            Nessas circunstâncias, a atuação individual de cada credor, de forma isolada e sem controle dos pares, com o fim de atender unicamente a seu interesse individual, pode prejudicar a satisfação dos interesses do grupo.

            Diante disso, buscando o melhor interesse da coletividade de credores, a legislação falimentar obriga a que o desenvolvimento do processo de verificação do passivo e realização do ativo do devedor falido ou em recuperação se desenvolva em condições de interação conjunta do grupo de credores (que devem ter tratamento paritário), mediante controle unitário (única jurisdição e administração no juízo da falência ou recuperação).

            Uma das características mais comuns do passivo de uma entidade empresarial é sua indeterminação ecomo efeito, enquanto uma atividade empresarial é exercida, faz-se necessário ao seu titular (empresário individual ou sociedade empresária) assumir diversas obrigações e dívidas. Algumas delas são inerentes ao prosseguimento da atividade (p.ex.: as dívidas trabalhistas, os débitos tributários e as obrigações com fornecedores); outras, constituem-se em passivos destinados a financiar o empreendimento (p.ex.: a contratação de empréstimos, a emissão de debêntures, etc.).

            Qualquer que seja o fundamento da existência do passivo, na prática ele é dificilmente determinado. O próprio empresário (certamente quem mais conhece seu negócio) muitas vezes não tem noção exata de quanto deve a terceiros. Frequentemente, surgem passivos dos quais não havia notícia (v.g.: uma autuação ambiental por descumprimento de legislação não conhecida, a imposição de um encargo trabalhista que se entendia indevido, a sujeição a um tributo cuja incidência era desconhecida, etc.).Além de serem indeterminadas quanto à existência, muitas dívidas são incertas também quanto a seu montante, cujos juros e correções que incidem sobre o  principal fazem com que o valor devido mude constantemente.

            A dificuldade de determinação do passivo é ainda maior quando este deva ser investigado por terceiro alheio à atividade empresarial. Não é por outro motivo, aliás, que nos processos de reorganização societária (fusões, aquisições, incorporações, etc.), nos chamados procedimentos de duediligence e nas tarefas concernentes à auditoria externa independente, uma das atividades mais importantes (e dispendiosas) a se realizar é o mapeamento do passivo empresarial.

            Em relação ao devedor falido ou em recuperação, o fenômeno aludido não é diferente. Ao contrário, muitas vezes é ainda mais complicado, pois, não raro, depara-se com fraudes e procedimentos que visam a ocultar o passivo empresarial ou torná-lo maior do que efetivamente seja.

            É nesse contexto, visando a determinar e tornar preciso o montante do passivo, que se inserem as habilitações de créditoindividuais de cada credor e o procedimento geral de verificação dos créditos.

            De fato, já nos dizia Carvalho de Mendonça:

                                      Para que a falência atinja seu objetivo, precisam ser medidas, com a maior exatidão, as forças do passivo, isto é, fixadas a importância real dos créditos e a graduação deles no concurso. Surge, pois, a necessidade de apreciar e determinar os direitos de cada credor individualmente considerado, e de conhecer a composição da massa dos credores, analisando-a, não já no seu todo exterior, como coletividade, porém, nos seus elementos vivos, positivos, reais. (Tratado de Direito Comercial Brasileiro, v. 8, livro V, 1959, p. 97).

            O Processo falimentar embora tenha passado por formaçõesimportantes, verifica-se que o lapso temporal de conclusão do devido processo não é razoável, haja vista que as dificuldades de se obter uma real dimensão sobre os bens do insolvente é um processo que requer tempo e cautela.

1.NATUREZA JURÍDICA

            Antes de entrar em detalhes sobre a disciplina das habilitações e do procedimento geral de verificação no qual as habilitações estão inseridas, é necessário verificar qual sua natureza jurídica, ou seja, é preciso determinar sua essência para o Direito.Esse, porém, é um dos pontos mais controvertidos na doutrina.

            Boa parte dos comercialistas entende que as habilitações de crédito se constituem em incidentes processuaisno bojo do processo falimentar  e de recuperação ou mesmo em demanda autônoma de caráter contencioso em que o credor que pretende sua admissão ajuíza ação em face da massa falida ou do devedor em recuperação.

            Nesse sentido, a lição de Sampaio de Lacerda:

O processo de verificação de créditos é, de fato, verdadeira demanda judicial, é um processo contencioso. Há quem conteste esse característico por faltar a citação. Mas o conceito de ação não parte da citação, pois esta não é elemento essencial da ação. Há, até, no processo comum, ações que começam por medidas drásticas, sem que a parte contrária seja ouvida. É o caso por exemplo do embargo de obra nova ou das ações possessórias quando se iniciam pela concessão liminar do pedido. Por outro lado, não se pode negar haja citação, nessa fase das declarações de crédito, conquanto seja uma citação com forma toda especial. Os credores, com a decretação da falência, dela tem ciência e prazo para apresentarem as declarações. (Manual de Direito Falimentar. Freitas Bastos, 1978, p. 187).

            No mesmo sentido, Rubens Requião, citando as lições de Liebman e de juristas italianos, concluindo que se trata de um procedimento incidental, constituindo-se a declaração de crédito em “pedido que o credor dirige ao juiz, solicitando sua admissão ao concurso de credores” (Curso de Direito Falimentar, Saraiva, v.1., 1993, p. 257-8).

            O insigne Pontes de Miranda, porém, dá ao instituto da habilitação de crédito natureza completamente distinta. Para o jurista mencionado, o credor que tempestivamente declara seu crédito não faz pedido, não postula, mas somente atende ao chamamento ou ao convite (invitatio ad declarandum) realizado com a sentença defalência (ou de recuperação) ou com a publicação de editais pelo administrador judicial. O ilustre tratadista sustenta que, no rito das habilitações de crédito quem faz pedido é quem impugna o pedido do credor habilitante, inaugurando, aí sim, a ação de impugnação do crédito declarado. Também haveria pedido na opinião de Pontes de Miranda (e, portanto, demanda judicial) nas habilitações de crédito intempestivas (retardatárias), nas quais o credor habilitante não atende ao chamamento inicial para se habilitar, vindo a, posteriormente, pleitear a inclusão de seu crédito.

            Credores retardatários são credores que foram convidados e não compareceram. Em vez de as suas declarações de crédito serem simples comunicações de conhecimento, que se entregam à periferia da relação jurídica processual falencial, são elementos da postulação.

            A lógica defendida por Pontes de Miranda, que de certa forma inverte o entendimento tradicional, parece-nos, com todo o respeito aos que entendem o contrário, mais acertada, e explica melhor, a nosso ver, a natureza jurídica da habilitação.

2.PROCESSO DE VERIFICAÇÃO E HABILITAÇÃO DOS CRÉDITOS.

                        A formação da massa falida subjetiva se dá com o procedimento de verificação e habilitação dos créditos, para qual a lei LRE trouxe uma importante inovação com o objetivo de proporcionar uma maior celeridade ao processo falimentar

                        Segundo a atual lei de recuperação de Empresa a a fase da habitação deverá ser analisado de forma extrajudicial, pelo Administrador Judicial, conforme descreve o artigo o art. 7:

Art. 7.  A verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, com base nos livros contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apresentados pelos credores, podendo contar com o auxílio de profissionais ou empresas especializadas.

O juiz ao prolatar a sentença que decreta a falênciafixauma prazo de 15 dias para os credores se habilitarem junto ao processo falimentar, conforme o artigo 7, $ 1 da LRE.

            O procedimento de verificação e habilitação de créditos prevalece tanto para a recuperação judicial como para a falência de empresas, pois a citada lei as tratam em capítulo único intitulado de "Disposições Comuns à Recuperação Judicial e à Falência".

            A verificação dos créditos nada mais é do que realizar um levantamento dos créditos contra o devedor (talvez ficasse mais completo dizer dos débitos do devedor), ou seja, do que ele está efetivamente devendo. Esse levantamento é tarefa do administrador judicial que para cumpri-la deverá ter por base os documentos que lhe forem apresentados pelos credores, livros contábeis, documentos comerciais e fiscais do devedor, podendo contar com auxílio de profissionais ou empresas especializadas. Com base nessas informações, o administrador fará publicar edital contendo a relação nominal dos credores legalmente habilitados.

            Já a habilitação de crédito consiste no procedimento para admissão de credores junto ao processo de recuperação judicial ou de falência, após a primeira verificação de crédito. A habilitação é uma obrigação processual realiza após a verificação dos créditos, que nasce com o deferimento do processamento da recuperação judicial ou com a decretação da falência, conforme estampado no artigo 52, § 1º, III da Lei nº 11.105/2005 (recuperação judicial) e no artigo 99 da Lei nº 11.105/2005 (falência), in verbis:

Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato:

(...)

§ 1º O juiz ordenará a expedição de edital, para publicação no órgão oficial, que conterá:

(...)

III – a advertência acerca dos prazos para habilitação dos créditos, na forma do art. 7o, § 1o, desta Lei, e para que os credores apresentem objeção ao plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor nos termos do art. 55 desta Lei.

(...)

Art. 99. A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras determinações:

(...)

IV – explicitará o prazo para as habilitações de crédito, observado o disposto no § 1o do art. 7o desta Lei;

(...)

            A verificação dos créditos e habilitação dos credores junto ao processo é de extrema importância, pois só depois de verificar cada crédito específico é que o Juiz poderá dá continuidade ao processo.

3. PUBLICAÇÃO DO EDITAL

            Após o período de habilitação dos créditos o administrador judicial, com base nas informações fornecidas pelo devedor e nos documentos apresentado pelos credores que se habilitaram, terá um prazo de 45 (quarenta e cinco dias) para publicar o edital contendo a relação dos credores, com conforme assevera o artigo 7, $ 2 da LRE.

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  § 2o O administrador judicial, com base nas informações e documentos colhidos na forma do caput e do § 1o deste artigo, fará publicar edital contendo a relação de credores no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, contado do fim do prazo do § 1o deste artigo, devendo indicar o local, o horário e o prazo comum em que as pessoas indicadas no art. 8o desta Lei terão acesso aos documentos que fundamentaram a elaboração dessa relação.

            Caso algum credor, o próprio devedor, Ministério Público ou sócio verifique algum equívoco na relação apresentada pelo administrador Judicial, poderão apresentar impugnação ao Juiz.

            O administrador judicial sob a fiscalização do juiz e do comitê de credores, deve zelar pelo andamento célere do processo e pela observância da lei. Nessa direção, o elenco de prerrogativas, deveres, formalidades e prazos previstos na LRE. Sua função é conduzir finalisticamente o processo, arcando com o dever de plena transparência, no interesse dos credores e da empresa em recuperação.

            Sob a perspectiva de plena publicidade insere-se a publicação de editais, em particular o das relações de credores, antes e depois das impugnações, por determinação judicial. Em regra, a publicação desta é antecedente daqueles, o que não significa sua condição de validade. O administrador judicial cumpre a decisão judicial, não ficando adstrito à sua prévia publicidade.

Como explica o Min. João Otávio de Noronha, do STJ (REsp nº 1.163.143):

“No tocante à veiculação, em órgão oficial, do edital antes da publicação da decisão que recomendou aquele ato, não visualizo nenhum vício que dê ensejo à nulidade da publicação do edital contendo a relação de credores, muito menos do próprio edital.Se, de um lado, a Lei de Recuperação de Empresas e Falência é clara em prever que o juiz ordene a expedição do edital para publicidade, em órgão oficial, da relação nominal de credores (§ 1º, II, do art. 52 ) e, após as habilitações e objeções, que o administrador judicial faça publicar o edital com nova relação (§ 2º do art. 7º) para efeito da apresentação de impugnação (art. 8º), de outro lado, não se extrai da sobredita lei nenhuma exigência ou menção de que a divulgação dos editais não possa concretizar-se e tenha a eficácia obstruída por simples dependência da publicação do ato judicial que a determinou.”

            O administrador judicial e demais interessado, principalmente credor, sem apego à índole simples ou complexa da recuperação judicial ou da falência, deve buscar a prevalência, em todos os estágios procedimentais, de expedientes mais céleres e econômicos que, consentâneos com as normas de regência, possam legitimar o devido  deslinde desses especiais processos. Assim, se o legislador não exigiu certa rotina processual na condução da recuperação judicial ou da falência, seja a divulgação da relação de credores em órgão oficial somente após a publicação da decisão que a determinou, seja a necessidade de intimação do advogado simultânea com a intimação por edital, ao intérprete da lei não cabe fazê-lo nem acrescentar requisitos por ela não previstos.

4. HABILITAÇÕES TEMPESTIVAS: FASE ADMINSITRATIVA OU DESJUDICIALIZADA.

            Caso o credor tenha seu crédito integralmente incluído na primeira relação do administrador judicial, a rigor, sequer precisará praticar qualquer outro ato, uma vez que o crédito já se encontrará plenamente admitido. Na hipótese de estar incluído na primeira relação, mas divergir do teor desta (p.ex.: não concordar com a classificação dada ao seu crédito ou com o valor atribuído), poderá apresentar divergência ao próprio administrador judicial.

            Sendo apresentada divergência, cumpre ao administrador decidir favorável ou desfavoravelmente ao credor, apresentando a segunda relação de credores conforme sua decisão. Em qualquer caso, porém, não cabe ao administrador levar a questão ao conhecimento do juiz, uma vez que nesta fase não atua a jurisdição, deixando-se qualquer inconformismo do credor para eventual impugnação.

            Não sendo o credor incluído na primeira relação, a habilitação tempestiva de crédito se inicia com a apresentação, pelo credor, no prazo supracitado, de seu pleito de inclusão no processo falencial ou de recuperação, o qual deverá conter (art. 9o da Lei 11.101/05):

  • Nome, o endereço do credor e o endereço em que receberá comunicação de qualquer ato do processo;
  • Valor do crédito, atualizado até a data da decretação da falência ou do pedido de recuperação judicial, sua origem e classificação;
  • Documentos comprobatórios do crédito e a indicação das demais provas a serem produzidas;
  • Indicação da garantia prestada pelo devedor, se houver, e o respectivo instrumento;
  • Especificação do objeto da garantia que estiver na posse do credor.

            Nos termos do parágrafo único do artigo supracitado, os títulos e documentos que legitimam os créditos deverão ser exibidos no original ou por cópias autenticadas se estiverem juntados em outro processo.

            É importante dizer que, para habilitar-se, o credor não precisa que seu crédito esteja consubstanciado em um título executivo. A jurisprudência tem admitido a inclusão de créditos corporificados em outros tipos de documentos, desde que haja a discriminação do valor, da origem, da natureza, das garantias e do vencimento do crédito de que o declarante é titular

            Questão discutida na doutrina e na jurisprudência diz respeito à prova da origem do crédito, principalmente quando este seja corporificado em título de crédito dotado de abstração em relação ao negócio que lhe deu origem. A jurisprudência do STJ, mesmo antes da vigência da Lei 11.101/05, já vinha exigindo tal comprovação, como forma de evitar fraudes no processo falimentar ou de recuperação. Veja-se, nesse sentido, a decisão seguinte:

Processo REsp 890518 / SC

RECURSO ESPECIAL 2006/0213721-4

Relator(a) Ministra NANCY ANDRIGHI (1118)

Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA

Data do Julgamento 20/10/2009

Data da Publicação/Fonte DJe 17/11/2009

Ementa

Direito Empresarial. Recurso especial. Habilitação de crédito em falência. Nota Promissória. Ausência de demonstração da origem do crédito. Improcedência do pedido de habilitação reconhecida. - Nas habilitações de crédito regidas pelo Decreto-lei 7.661/45, é imprescindível que seja demonstrada a origem do crédito, mesmo nas hipóteses em que o valor reclamado encontra-se lastreado em título de crédito dotado de autonomia e abstração. Precedentes. - A exigência legal de demonstração da origem do crédito justifica-se pela necessidade de verificação da legitimidade dos créditos, com o intuito de impossibilitar que fraudes e abusos sejam cometidos em detrimento dos verdadeiros credores da falida. - Não indicado o negócio, o fato ou as circunstâncias da quais resultariam as obrigações do falido, impõe-se a improcedência do pedido de habilitação do crédito. Recurso especial provido. Ônus sucumbenciais redistribuídos.

            Consigne-se, porém, que há decisões que são menos rígidas com relação à prova de origem do crédito, admitindo sua inclusão no quadro geral sem prova de sua proveniência, desde não haja controvérsia a respeito ou se a origem for admitida plenamente pelo devedor falido ou em recuperação. Há ainda de se fazer a ressalva, como salienta Fábio Ulhoa Coelho, para os casos  de títulos cuja emissão não tenha um negócio de base, fundamentando-se na própria operação cambial:  “Se a origem é exclusivamente a operação cambial, é claro que nenhum outro negócio subjacente existe para ser informado” (Comentários à Lei de falências e de recuperação de empresas. Saraiva, 2005, p. 47).

            Recebidas as habilitações e as divergências, o administrador judicial deve fazer publicar a segunda relação (ou segunda lista) de credores. Como dissemos anteriormente, não há necessidade de o administrador fundamentar o acolhimento ou rejeição de qualquer crédito declarado ou divergência apresentada: simplesmente publica a lista contendo a coleção dos créditos admitidos, com seus detalhes respectivos. O inconformismo daí resultante deve ser discutido judicialmente por meio de impugnação. Cite-se novamente, nessa linha, a lição de Fábio Ulhoa Coelho (op. cit., p. 43):

            Se entender que a divergência suscitada procede, ele introduz a correção na republicação da relação de credores: caso a tome por improcedente, faz a republicação sem corrigi-la nesse particular. Veja-se que o administrador judicial não precisa dar qualquer resposta aos credores, nem levá-la ao juiz. Com a simples republicação da relação, contendo ou não a correção, saberão os habilitantes e os suscitantes de divergência se seus pontos de vista foram acolhidos ou não pelo administrador judicial.

            A habilitação de crédito deve ser individualizada por credor. Pode o credor requerer a habilitação de mais de um crédito que titularize, desde que os discrimine. Entretanto, não se admitem habilitações coletivas de crédito, contendo pretensões de mais de um credor em conjunto. Exceção a esta última regra é o crédito dos debenturistas, a respeito do qual se admite a habilitação conjunta, mediante representação do agente fiduciário.

            Note-se que a jurisprudência vem evoluindo em alguns casos para admitir habilitações coletivas de crédito, como no caso de sindicatos que representem trabalhadores individuais, desde que particularizados os créditos de cada qual. Nesse sentido, veja-se a decisão seguinte do TJSP:

Agravo de Instrumento n° 0191404-97.2010.8.26.0000

Comarca: RIO CLARO - 2ª VARA CÍVEL

VOTO N.° 15.829

EMENTA - Falência. Habilitação de crédito por sindicato, representando 218 trabalhadores, perfeitamente individualizados nos autos. Legitimidade da substituição processual. A legitimidade extraordinária conferida pela Constituição da República aos Sindicatos, para defesa em juízo ou fora dele dos direitos e interesses coletivos ou individuais, independentemente de autorização expressa do associado, se estende à liquidação ou execução da decisão judicial, hipótese em que deverá particularizar a situação jurídica de cada qual dos substituídos. Despacho agravado que já determinou que se particularizasse a situação jurídica de cada qual dos substituídos Agravo de instrumento não provido.

            Como previamente mencionamos, a doutrina é razoavelmente pacífica em que, tanto para a habilitação quanto para a apresentação de divergência, não é necessária a representação por advogado.

            Em não havendo impugnações, cabe ao juiz homologar, como quadro-geral de credores, a relação dos credores constante do edital de que trata o art. 7o, § 2o, da Lei 11.101/05 (art. 14), dispensada a publicação de que trata o art. 18 desta mesma Lei.

5. HABILTAÇÃO TEMPESTIVA: FASE JUDICIAL

            A intervenção do Poder Judiciário nas habilitações de crédito tempestivas só se inicia com a existência de impugnações. Como bem ressalta Manoel Justino Bezerra Filho:

Somente neste momento é que há acionamento da jurisdição, pois até então, os atos todos são praticados ante o administrador. Impugnado o crédito, será a petição de impugnação autuada em aparado, processando-se a impugnação da mesma forma, seja para a recuperação judicial, seja para a falência. (Nova Lei de Recuperação e Falências Comentada, Ed. RT., 5ª edição, 2008, p. 70).

            Como dissemos anteriormente, compartilhando da opinião de Pontes de Miranda, entendemos que a impugnação ao crédito possui natureza jurídica de açãoproposta pelo impugnante e não mera contestação do pleito de habilitação apresentado pelo credor. Assim sendo, na esteira do que pensa tal jurista, a petição deverá atender os requisitos do art. 282 do CPC e o impugnante deverá ser representado por advogado.

            No sistema adotado pela Lei 11.101/05, a impugnação pode ter efeito excludente ou minorante do crédito apresentado, bem como efeito inclusivo ou incremental de crédito não habilitado ou apresentado parcialmente à habilitação. Pode ainda ter efeito meramente retificatório da classificação ou posição hierárquica em que o crédito foi admitido.

            Por outras palavras, a impugnação pode ter o efeito de excluir um crédito indevidamente apresentado, de admiti-lo por valor menor, bem como de incluir crédito não constante da lista do administrador judicial ou de incrementar-lhe o valor. Pode também simplesmente modificar a classificação do crédito. Não é outro, aliás, o intuito da legislação, quando ressalta que o impugnante pode apontar a ausência de qualquer crédito (pleiteando, portanto sua inclusão) ou manifestar-se contra a legitimidade, importância ou classificação de crédito relacionado (para alterar seu valor ou classificação).

            Veja-se que a impugnação pode se referir a um crédito do próprio impugnante (p.ex., para pleitear sua admissão no quadro geral ou o aumento do valor) ou se referir a crédito titularizado por credor diverso (p.ex., com o fim de determinar sua exclusão, diminuição ou reclassificação).

            Estão legitimados a impugnar o Comitê, qualquer credor, o devedor ou seus sócios ou o Ministério Público.

            Quanto ao Comitê, o devedor (empresário individual ou sócio da sociedade falida ou em recuperação) e o Ministério Público, não há maiores dúvidas quanto à legitimação para impugnar. Quanto ao credor, porém, surgem alguns problemas de legitimação, que passaremos a analisar.

            Para impugnar, é necessário que o credor se habilite tempestivamente. Mais uma vez, preciosa a lição de Manoel Justino Bezerra Filho (op.cit., p. 77):

            O credor que não se habilitar nesse prazo não poderá apresentar impugnação na forma do art. 8º com o fito de inclusão de seu crédito, pois a impugnação não é substituto da habilitação retardatária.

            Assim, se o credor (não incluído ou preterido na primeira lista do administrador judicial) não apresentar sua habilitação ou divergência, não poderá impugnar o conteúdo da segunda lista de credores. Deverá lançar mão do mecanismo da habilitação retardatária.

            A questão que surge aqui é saber se o credor que tenha seu crédito integralmente não admitidopor decisão judicial em impugnação da qual tenha interposto recurso continua legitimado a impugnar outros créditos apresentados. Por outras palavras: o credor que recorre da decisão que não admitiu seu crédito preserva a legitimação para a ação de impugnação?

            Também aqui é preciosa a lição de Pontes de Miranda, que entende que somente com o trânsito em julgado da decisão que exclui o crédito em definitivo é que cessa a legitimidade do credor para impugnar (op.cit., p. 189):

            O credor que se apresentou, declarando seu crédito, foi invitado, de modo que não é posto fora sem ainda ter transitado em julgado a decisão, e a decisão do juiz, na impugnação, favorável ao impugnante, não vai retirar o convite, antes de se ter dado a preclusão processual. O impugnado, que teve decisão contrária a seu crédito, continua convidado, e pode intervir no processo falencial, como se decisão favorável ao impugnante não tivesse havido. Só é expulso, digamos assim, com o trânsito em julgado da decisão que o não admitiu ao concurso de credores.

            Apresentada a impugnação, segue-se, conforme o rito anteriormente aludido, as manifestações dos credores, do Comitê, do devedor e do administrador judicial. Ato contínuo, o juiz pode julgar o feito de plano ou deferir provas, com ou sem designação de audiência de instrução e julgamento.

            Uma última questão: se o Ministério Público não for autor da impugnação, deverá funcionar nos autos como custos legis? A resposta é positiva. Aliás, no Estado de São Paulo, o  ATO NORMATIVO Nº 675/2010-PGJ-CGMP, de 28 de dezembro de 2010, que aprova o Manual de Atuação Funcional dos Promotores de Justiça do Estado de São Paulo, ressalta que:

Art. 239. Incumbe, ainda, ao Promotor de Justiça:

           

(…)II – manifestar-se fundamentadamente em todos os incidentes do processo(declarações de crédito, impugnações, pedidos de restituição rio, a juntada de documentos e de certidões relativas às datas de ajuizamento, deferimento do pedido, homologação e decreto de falência, bem como certidão quanto aos valores e a qualidade dos créditos relacionados ou indicados, além de apresentação de planilhas ou demonstrativos de evolução do crédito e de extratos contábeis, se o caso; (g.n.)

6.HABILITAÇÃO INTEMPESTIVA (RETARDATÁRIAS)

            Não se habilitando no prazo anteriormente mencionado,  não há propriamente preclusão do direito do credor a ser admitido no processo falimentar e de recuperação.

            De fato, o credor que não promoveu sua inclusão na via coletiva falimentar ou no feito recuperacional pode ainda lançar mão do pedido de habilitação retardatária. Quanto à natureza desse pedido, a doutrina é razoavelmente pacífica em entender que se trata do ajuizamento de uma ação, no entanto, embora não haja preclusão total do direito de ser admitido, o credor retardatário sofre algumas consequências de sua desídia (art. 10, §§§ 1º, 2º e 3º, da Lei 11.101/05):

  • Na recuperação judicial, os titulares de créditos retardatários, excetuados os titulares de créditos derivados da relação de trabalho, não terão direito a voto nas deliberações da assembleia-geral de credores. O mesmo se aplica à falência, salvo se, na data da realização da assembleia-geral, já houver sido homologado o quadro-geral de credores contendo o crédito retardatário;
  • Na falência, embora possam pleitear reserva de valores, os créditos retardatários perderão o direito a rateios eventualmente realizados e  ficarão sujeitos ao pagamento de custas, não se computando os acessórios compreendidos entre o término do prazo e a data do pedido de habilitação.

            Assim, conquanto não haja preclusão do direito de ingressar no feito, cessa ao credor retardatário o direito de ser tratado igualmente aos outros credores. Terá ele de suportar restrições em seu poder de participação nos órgãos deliberativos da falência ou recuperação, bem como cerceamento nos rateios a receber.

            O rito da habilitação retardatária recebeu interessante tratamento na Lei 11.101/05. Nos termos do art. 10, §§ 5º e 6º desse diploma, teremos trâmites diferentes, conforme a época em que forem apresentadas, como se verifica no esquema seguinte:

                                        Questiona-se a respeito da possibilidade de o credor apresentar uma divergência retardatária. Imaginemos a hipótese: um credor tem seu crédito incluído parcialmente na primeira lista do administrador judicial, mas não apresenta diretamente a este último a competente divergência no prazo legal. Poderia posteriormente apresentar em juízo uma divergência retardatária? Na doutrina, Fábio Ulhoa Coelho opina favoravelmente (op.cit., p. 49). Na jurisprudência também há decisões que admitem a divergência retardatária, como se pode ver do seguinte acórdão do TJSP:

                            AGRAVO DE INSTRUMENTO N.° 990.10.014339-5 - VOTO N.° 20.428

                                      COMARCA DE SÃO PAULO

                                      EMENTA: Recuperação Judiciai Credor que apresenta divergência no prazo estabelecido no art. 7º, § 1º, mas não observa o estabelecido no art. 8º para a impugnação do resultado daquela. Processamento admitido como divergência retardatária.

                                      Recuperação Judicial Assembleia de credores. Credor relacionado pelo devedor e pelo administrador. Participação assegurada, mesmo tendo apresentado divergência intempestiva.

                                      Recuperação Judicial. Assembleia de credores. Participação do credor, pelo valor e classificação de crédito por ele pretendidos, concedida em tutela antecipada, à vista da verossimilhança de suas alegações, mesmo diante da intempestividade de sua divergência.

                                      Recurso não provido.

7.CASOS ESPECIAIS: O CRÉDITO TTRABALHISTA E TRIBUTÁRIO

            Dois tipos de crédito apresentam peculiaridades quanto à habilitação: o crédito trabalhista e o crédito tributário, as quais passaremos a verificar a seguir,

            Com relação ao crédito trabalhista, a regra geral é aquela consignada art. 6º, § 2o, da Lei 11.101/05, qual seja, mesmo após a falência ou recuperação, devem as ações trabalhistas continuar perante a Justiça do Trabalho até a apuração do respectivo crédito. Depois do trânsito em julgado, deverá o credor trabalhista se habilitar na falência ou recuperação (vide julgamento do STJ no AgRg no CC 110287 / SP e no CC 103025 / SP).

            No entanto, dada a competência especial da Justiça do Trabalho, não é possível rediscutir no procedimento de habilitação matéria constante da sentença definitiva proveniente daquele ramo do Poder Judiciário. Nesse sentido:

                                      Falência - Habilitação de crédito - Verbas trabalhistas - Impossibilidade de rediscutir questão submetida à justiça especializada - Caráter indenizatório do Fundo de Garantia – Honorários advocatícios que não pertencem ao habilitante, que foi patrocinado por sindicato - Apelação provida em parte. (TJSP APELAÇÃO CÍVEL n° 0125249-54.2006)

            Dessa forma, a matéria cabível em impugnação à habilitação do crédito trabalhista é mais restrita que nas demais hipóteses.

            Em relação ao crédito tributário, deve-se consignar que, nos termos do art. 187 do Código Tributário Nacional, com a redação dada pela Lei Complementar nº 118, de 2005, “A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento”.

            No entanto, mesmo não estando sujeito a declarar seu crédito, não raras vezes, o fisco se apresenta para habilitar-se em processos de falência ou recuperação. Tal Procedimento gerou inúmeras discussões entre os operadores jurídicos. A última orientação da jurisprudência do STJ, entretanto, é que a habilitação de crédito para o fisco é uma faculdade, podendo este escolher se prefere prosseguir na execução fiscal ou habilitar seu crédito. Escolhendo uma das vias, porém, ocorre renúncia à outra:

AgRg no Ag 713217 / RS

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2005/0169638-6

Relator(a) Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS) (8155)

Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA

Data do Julgamento 19/11/2009

Data da Publicação/Fonte DJe 01/12/2009

Ementa

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMERCIAL E PROCESSO CIVIL. FALÊNCIA. HABILITAÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE DE PROPOSITURA DE EXECUÇÃO FISCAL. ADMISSIBILIDADE DE OPÇÃO DA VIA ADEQUADA AO CASO CONCRETO.

1. A jurisprudência desta Corte Superior se firmou na vertente de que os arts. 187 do CTN e 29 da LEF (Lei 6.830/80) conferem, na realidade, ao Ente de Direito Público a prerrogativa de optar entre o ajuizamento de execução fiscal ou a habilitação de crédito na falência, para a cobrança em juízo dos créditos tributários e equiparados. Assim, escolhida uma via judicial, ocorre a renúncia com relação a outra, pois não se admite a garantia dúplice.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

8.DECISÃO, COISA JULGADA E RECURSO

            A decisão judicial que se pronuncia sobre a admissibilidade do crédito objeto de habilitação é tratada pela melhor doutrina como uma sentença (cf. Waldemar Ferreira, Instituições de Direito Comercial, v.5, 1955, p. 267). Segundo grande parte da doutrina, cuida-se de sentença meramente declaratória,uma vez que se limita a declarar a viabilidade do ingresso do crédito apresentado no processo de falência ou recuperação.

            Do mesmo modo, doutrinadores de renome entendem que a decisão que admite ou inadmite o crédito habilitado não faz coisa julgada material, permanecendo seus efeitos apenas no bojo do processo de falência ou recuperação e para os exclusivos fins deste.

            Nessa linha, ressalta Carvalho de Mendonça (op.cit., p. 103), cuja opinião, embora se refira à legislação revogada, é plenamente aplicável ao sistema da Lei 11.101/05:

            No rigor do direito, não se pode dizer que da verificação dos créditos e da classificação dos credores resulte um ato com autoridade de coisa julgada, não só porque o art. 8º da Lei n. 2.024 ainda permite a contestação dos créditos em casos especialíssimos, não por meio de um recurso, mas de uma ação judicial, como porque, no maior número de vezes, os créditos são aceitos sem impugnação, ou discussão judicial.

            Mais uma vez, contudo, o ilustre jurista Pontes de Miranda traz opinião completamente distinta da maioria da doutrina quanto à natureza da sentença que examina a admissibilidade dos créditos, bem como sobre a existência de coisa julgada. A nosso ver, com toda a razão.

            Segundo este último tratadista, embora a decisão que seja desfavorável ao credor (e, portanto favorável ao impugnante) seja de natureza declaratória (negativa), a decisão que admite o crédito tem força condenatória-executiva. Esse fenômeno seria explicado por alguns fatores, tais como: 1) o credor, ao ter seu crédito habilitado, e.g., em uma falência, é admitido num processo que tem de natureza de execução coletiva; assim, para possibilitar o ingresso de um credor numa execução coletiva, a sentença deve ter caráter de condenação e ser dotada de executividade; 2) admitido o credor no processo falimentar, pela habilitação de seu crédito, terá este direito a receber a parcela que lhe tocar no patrimônio do devedor, após ser este devidamente expropriado, o que configura ato de execução; 3) mesmo que encerrado o processo falimentar, a admissão do credor lhe dá o direito de prosseguir ulteriormente na cobrança executiva do saldo não pago no processo de falência, conferindo-lhe, inclusive, um título executivo judicial para tanto.

            Do mesmo modo, Pontes de Miranda entende que, em relação à sentença que julga o crédito apresentado, apreciando seu mérito, “A eficácia da decisão é definitiva, com as consequências da coisa julgada material, e não só no interior do procedimento falencial” (op.cit., p. 195). Obviamente, em relação à decisão que não admite ou rejeita a habilitação por fundamento meramente processual (p.ex., falta de condições da ação ou pressupostos processuais), haveria meramente coisa julgada formal, não impedindo a repropositura do pleito, conforme o caso.

            ‘É de se salientar que há decisões importantes reconhecendo a existência de coisa julgada material derivada de decisão em habilitações de crédito, como se verifica no acórdão do TJSP transcrito a seguir, em que se impediu, por força de coisa julgada, a rediscussão da validade de contrato bancário cujo crédito fora objeto de anterior habilitação em processo falimentar:

EXTINÇÃO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. Ação declaratória de nulidade de negócio jurídico. Contrato bancário. Questão já decidida nos autos de habilitação de crédito. Decisão já transitada em julgado e crédito já incluso no quadro geral de credores. Ausência de interesse processual que justifique nova discussão sobre questão já decidida. Hipótese, ademais, que não se inclui na exceção prevista no art. 99 da Lei 7.661/45. Sentença de extinção mantida. Observação, contudo, no que concerne à execução das verbas de sucumbência, que ficará condicionada ao disposto no art. 12 da Lei 1.060/50, em face da concessão da gratuidade – Recurso desprovido, com observação (Apelação Cível nº 9107483-92.2007.8.26.0000 .VOTO Nº 9229).

No que toca ao recurso, a Lei 11.101/05 foi taxativa no art. 17, consignando que, da decisão judicial sobre a impugnação caberá agravo. Dispõe ainda no parágrafo único do mesmo artigo que, recebido o agravo, o relator poderá conceder efeito suspensivo à decisão que reconhece o crédito ou determinar a inscrição ou modificação do seu valor ou classificação no quadro-geral de credores, para fins de exercício de direito de voto em assembleia-geral.Duas questões devem ser trazidas à análise a respeito da matéria recursal.

            A primeira delas é que, dada a taxatividade da Lei 11.101/05 quanto ao cabimento do agravo (embora a doutrina majoritária trate a decisão referida como uma sentença),a jurisprudência tem-se orientado no sentido da não admissibilidade da interposição de apelação, em lugar do agravo, sendo inaplicável o princípio da fungibilidade recursal:

                                      TJSP AGRAVO DE INSTRUMENTO n° 0419768-95.2010.8.26.0000

                                      SÃO PAULO

                                      Voto n° 26.472

                                      RECURSO - APELAÇÃO - INTERPOSIÇÃO CONTRA DECISÃO PROFERIDA EM HABILITAÇÃO DE CRÉDITO NA FALÊNCIA - INADMISSIBILIDADE - CABIMENTO DE AGRAVO - ART 17 C.C. ART. 10, § 5°, DA LEI 11.101/2005 - ERRO INESCUSÁVEL - PROCESSAMENTO DO APELO CORRETAMENTE NEGADO - RECURSO DESPROVIDO.

                                      TJSP Agravo Regimental n° 0578435-82.2010.8.26.0000/50002

                                      VOTO N° 19.624

                                      Agravo Regimental. Insurgência contra decisão monocrática que negou provimento a agravo de instrumento manifestamente improcedente, mantendo a decisão a quo, que não recebeu apelação interposta contra decisão de habilitação de crédito. Erro inescusável a teor dos arts. 10, §5° e 17, da Lei n° 11.101/2005. Decisão monocrática mantida. Agravo regimental desprovido.

            A segunda questão importante refere-se ao momento em que o recurso é cabível. No sistema anterior, sob a vigência do Dec. Lei 7.661/45 o recurso (de apelação) somente era cabível em quinze dias depois da publicação o quadro geral dos credores (art. 97, §1º, do Dec. Lei 7.661/45). Agora, porém, o recurso (de agravo) passa a ser cabível imediatamente após a publicação da decisão. A mudança tem uma repercussão muito interessante, percebida e mencionada por Fábio Ulhoa Coelho (op.cit., p. 55), que aponta um retrocesso na disciplina da matéria:

            A definição da publicação do quadro geral de credores como o termo inicial do prazo para o recurso contra a admissão de crédito possibilitava aos interessados avaliarem a pertinência da medida. Somente após o QGC, tem o habilitante ou o impugnante plenas condições de saber se aquele crédito admitido ou rejeitado pela decisão contrária à sua postulação afetará, no final, o direito que titulariza. Se, pelo quadro, o habilitante percebe que não irá receber mesmo nada na falência, ele pode optar por não recorrer; se o impugnante, por seu turno, avalia que, mesmo com o crédito contra o qual se insurgira, seu pagamento está garantido ou comprometido, ele também pode concluir por não apresentar o recurso.

            Com a nova sistemática, o habilitante ou impugnante devem apresentar seu recurso, mesmo sem ter eventualmente a visão geral do quadro de credores e a avaliação quanto ao futuro de seu crédito.

AÇÃO RESCISÓRIA

            A legislação falimentar e de recuperação prevê ainda a ação rescisória para os créditos definitivamente admitidos (art. 19 da Lei 11.101/05). Essa ação, aliás, é uma particularidade do procedimento de habilitação de créditos e não se confunde com a ação rescisória prevista no Código de Processo Civil (CPC), nem a substitui.

            E tanto as duas medidas convivem harmonicamente que, fora dos casos do art. 19 Lei 11.101/05, que veremos a seguir, a melhor doutrina entende também cabível, contra as decisões proferidas em habilitação de crédito, a rescisória prevista no CPC.

            São legitimados para o ajuizamento da rescisória o administrador judicial, o Comitê, qualquer credor ou o representante do Ministério Público. Não pode fazê-lo o devedor falido ou em recuperação, pois não foi incluído no rol de legitimados do art. 19.

            O prazo para ingresso da ação em comento se estende até o encerramento da recuperação judicial ou da falência. Tal prazo, segundo a melhor doutrina, é decadencial.

            O rito da ação rescisória é o ordinário, previsto no Código de Processo Civil e a competência (ao contrário do que ocorre com a rescisória prevista no CPC) é do próprio juízo em que se processa a falência ou recuperação (art. 19, §1º, da Lei 11.101/05).

            A pretensão vinculada pelo autor da rescisória pode envolver a exclusão, outra classificação ou a retificação de qualquer crédito. Em qualquer caso, porém, pressupõe a prova de que, em relação ao crédito admitido, descobriu-se falsidade, dolo, simulação, fraude, erro essencial ou, ainda, documentos ignorados na época do julgamento do crédito ou da inclusão no quadro geral de credores.

            Cumpre salientar que a procedência da rescisória só afeta o crédito admitido. Não há influência da decisão do processo falimentar ou de recuperação como um todo. Do mesmo modo, se rescindido o crédito que originou a decretação da falência, nem por isso o processo falimentar deve ser extinto.

CONCLUSÃO

            O procedimento de habilitação de créditos destina-se precipuamente à determinação do passivo do devedor falido ou em recuperação.

            Sua natureza jurídica é controvertida na doutrina. Seguimos o conceito de Pontes de Miranda, que entende que, em habilitações de crédito tempestivas, o credor habilitante não ajuíza uma ação e não postula, apenas atende a um convite para se habilitar. Nas impugnações e nas habilitações retardatárias, porém, há claro exercício de uma ação judicial.

            No rito das habilitações tempestivas, a Lei 11.101/05 desjudicializou a primeira fase do procedimento, só havendo intervenção da jurisdição se houver impugnação. Nas habilitações retardatárias, porém, o rito é seguido integralmente em juízo.

            Há créditos com algumas peculiaridades, como o trabalhista (cuja impugnação é restrita, dada a impossibilidade de se rediscutir matéria de competência da Justiça do Trabalho) e o tributário, o qual, não obrigado à habilitação, dá a seu titular a faculdade de fazê-lo, optando exclusivamente por uma das vias para a cobrança (execução fiscal ou habilitação), segundo a jurisprudência do STJ.

            A doutrina entende, em sua maioria, que a decisão que julga as habilitações é sentença meramente declaratória. Pontes de Miranda, porém, argumenta, a nosso ver com razão, que a decisão tem força condenatória-executiva. Do mesmo modo, este último autor diverge de parte da doutrina, afirmando que a decisão referida faz coisa julgada material.

            Na disciplina da Lei 11.101/05, o recurso cabível da decisão que julga as habilitações é o agravo. A jurisprudência não tem aceitado a aplicação do princípio da fungibilidade para admitir a interposição de apelação. O prazo para  interposição se inicia com a publicação da decisão e não mais, como no sistema anterior, com a publicação do quadro geral de credores.

            É admitida a ação rescisória do crédito habilitado, nas hipóteses do art. 19 da Lei 11.101/05.

            Pode-se verificar que é a fase mais longa e complexa da lei Falimentar, cujas mudanças na lei foram de suma importância para o análise e compreensão do magistrado para promover uma celeridade processual, no entando,na prática a lei não conseguir ser pragmática a ponto de promover uma segurança jurídica aos credores, haja vista que é um a fase muita longa e requer do magistrado conhecimentos específicos, bem como há possibilidade de se prolatar várias sentenças de impugnação, que ainda poderão ser recorridas por parte do insatisfeito, proporcionado aos insolvente o condão de protelar por muitos anos a fase de habilitação dos créditos.

REFERÊNCIAS

http://www.blogdireitoempresarial.com.br/2011/05/as-habilitacoes-de-credito-nos.html

OLIVEIRA, Celso Machado de. Comentários à nova lei de falências. São Paulo: IOB Thomson, 2005

REQUIAO, Rubens. Curso de direito falimentar. São Paulo: Saraiva, 1998, v 1 e 2.

RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. São Paulo: Saraiva 2014

FÁBIO, Fábio Ulhoa, Cometário á lei de Falência e de Recuperação de empresa. São Paulo: Saraiva, 2014.

Sobre os autores
José Neto

Bacharelando em direito pela Faculdade Luciano Feijão<br>

Marcos Ricardo Rodrigues Marques Sampaio

Servidor do Ministério Publico Estadual do Ceará,Bacharelando em Direito pela faculdade Luciano Feijao

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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