A barriga solidária e seus efeitos no regime geral de previdência social

05/06/2015 às 11:35
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A resolução 2013/13 do Conselho F de Medicina permite técnicas de reprodução assistida, e é sob a ótica desta resolução que farei uma análise de quais os efeitos deste procedimento médico para as pessoas envolvidas no Regime Geral de Previdência Social.

A Resolução 2013/13 do Conselho Federal de Medicina permite técnicas de reprodução assistida, e é sob a ótica desta resolução que farei uma análise de quais os seus efeitos deste procedimento médico para as pessoas envolvidas no Regime Geral de Previdência Social, partindo-se do pressuposto que ambos são segurados obrigatórios da Previdência Social.

Introdução

Recentemente foi divulgada na mídia televisiva certo caso envolvendo uma família que devido a problemas de saúde uma mulher com pouco mais de 20 (vente) anos e que não conseguia gerar em seu útero um filho, e em virtude disso sua mãe de forma gentil e com espirito de solidariedade, conforme afirmado na própria reportagem, e em gesto de verdadeira humanidade cedeu o seu útero para a geração do seu neto.

A partir desta situação fática é que resolvi escrever o presente artigo, analisando assim, os reflexos deste acontecimento e seus efeitos perante Previdência Social, partindo do pressuposto que ambas são seguradas da Previdência Social e que mantém qualidade de segurado.

Diante do que fora mostrado na reportagem, e do que dispõe a resolução 2013/13 do Conselho Federal de Medicina, não resta qualquer dúvida quanto à possibilidade cientifica de uma mulher vir a ter um filho biológico sem que tenha sido gerado em seu útero.

E frente a uma situação fática como a demonstrada, resta nos sabermos como esta situação é vista pelo ordenamento jurídico.

Ora, o Direito existe para regular as vidas das pessoas com o objetivo de estabelecer a paz e o bem estar social, mas é de todo oportuno lembrar que será feita uma abordagem apenas voltada ao campo do Direito Previdenciário.

Sendo assim, considerando a importância da infertilidade humana como um problema de saúde, com implicações médicas e psicológicas e, a legitimidade do anseio de superá-la e que o avanço do conhecimento científico permite solucionar vários dos casos de reprodução humana, quando não é conseguido pelos procedimentos tradicionais é que se desenvolveu referida técnica.

As técnicas de reprodução assistida tem o papel de auxiliar na resolução dos problemas de reprodução humana, facilitando o processo de procriação quando outras terapêuticas tenha sido revelado ineficazes ou consideradas inapropriadas, e podem ser utilizadas desde que exista probabilidade efetiva de sucesso e não se incorra em risco grave de saúde para a paciente ou o possível descendente.

As clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técnicas de reprodução assistida para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética, no entanto, a doadora, porque é assim que dispõe “doadora” a Resolução do CFM em que pese no meu entendimento tratar-se de cedentes e é o termo que usarei neste artigo, temporária do útero deve pertencer à família da doadora genética, num parentesco até o segundo grau, sendo os demais casos sujeitos à autorização do Conselho Regional de Medicina, sendo totalmente vedado o intuito lucrativo.

Daí, feito estas considerações iniciais, resta verificar que implicações, ou quais os reflexos de fatos como o exemplo citado, pode trazer para o campo do Direito Previdenciário.

O Direito Previdenciário

Com autoridade diz Wagner Balera, que “o Direito, todo o Direito, nasce e se desenvolve a partir de certas questões sociais que demandam solução”, e como visto, o exemplo acima referido, trata-se de uma fato recente e que demanda do aparato normativo uma solução para referida questão social, e é exatamente aí que entra o Direito Previdenciário, pois este sem favor algum é o conjunto de medidas constitucionais de proteção dos direitos individuais e coletivos concernentes à saúde, à previdência e a à assistência social, e atua justamente quando do agravamento dos riscos sociais que de alguma forma retire ou acarrete aumento de despesas na vida dos segurados.

Conforme ensina Wagner Balera, “a normatividade ajusta o real (aquilo que é) ao ideal (o que deve ser). O direito atua para transformar as realidades encontradas na vida das comunidades. Tais realidades desvelam, à espera na órbita da seguridade social, situações de necessidades nas quais se encontram sujeitos de proteção”, e a situação fática relatada na reportagem trata-se questão que deve inusitada no campo do Direito e que precisa ser agasalhada pelo atual sistema de proteção, que é a seguridade social.

Miguel Horvath Junior, diz que “a seguridade social é a proteção que a sociedade proporciona a seus membros mediante uma série de medidas públicas contra as privações econômicas e sociais – que de outra forma derivariam no desaparecimento ou em forte redução de sua subsistência, como consequências de enfermidade, maternidade, acidente do trabalho ou enfermidade profissional, desemprego, invalidez, velhice e morte – e também a proteção de assistência médica e de ajuda as famílias com filhos”.

Daí conclui-se que a seguridade social atua quando da ocorrência do evento que venha retirar a capacidade de trabalho do segurado ou que cause aumento de despesas como é o caso do auxílio-maternidade e que será objeto mais aprofundado de nosso estudo.

Risco e Contingência

Dispõe o art. 201 da Constituição Federal que:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:

I - ...

II – proteção à maternidade, especialmente à gestante;

III - ...

...

Partindo do pressuposto que a seguridade social é o instrumento de política social que visa proteger as pessoas quando da ocorrência de necessidades referente a saúde, assistência e previdência social, e que esta última enquanto parte integrado de um sistema protetivo social, atua como instrumento de redistribuição da riqueza nacional utilizando e cumprindo tal qual foi fixado pelo legislador entre eles a proteção à maternidade.

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Do Benefício

Conforme acima exposto, e de acordo com o art. 71 da Lei nº 8.213/91, o benefício coberto denomina-se salário-maternidade, e este benefício é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerte à proteção à maternidade.

Agora, diante da situação fática narrada inicialmente, ou seja, do caso envolvendo uma família que devido a problemas de saúde uma mulher com pouco mais de 20 (vinte) anos e que não conseguia gerar em seu útero um filho, e em virtude disso sua mãe de forma gentil e com espirito de solidariedade, conforme afirmado na própria reportagem, e em gesto de verdadeira humanidade cedeu o seu útero para a geração do seu neto, resta nos saber quem faz “jus” ao benefício, se a Carta Constitucional em seu art. 201, protege a maternidade e em especial a gestante.

Quem tem Direito a essa Cobertura

Como visto anteriormente, o benefício previdenciário é concedido ao segurado que apresenta necessidade, e as regras previdenciárias a respeito da concessão do salário-maternidade não são claras a quem é estendida a proteção salário-maternidade quando da ocorrência de situação fática como a narrada.

Segundo Miguel Horvath Junior, com base nas atuais disposições legislativas, e pela presunção da certeza da maternidade, somente poderia habilitar-se ao salário-maternidade a mãe gestacional (gestatrix), salvo no caso desta doar a criança logo ao nascer.

Asssim, a forma para as duas mulheres terem proteção previdenciária é a criança vir a ser adotada pela mãe genetrix (a que forneceu o material genético). Neste caso, a adoção seria a regulada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), impondo-se a assistência do Poder Público por determinação constitucional (art. 227, § 6º) e sendo formalizada mediante sentença (art. 47 do ECA)”.

 

Entendo que se a maternidade é uma contingência biossocial já que projeta impacto orgânico e social, e que suas causas originárias de proteção tanto abrange questões de ordem médica uma vez que a concessão do benefício salário-maternidade pode ser precedida ao parto (28 dias) já que os índices de mortalidade materna e infantil eram enormes quando não havia esse descanso prévio; como questões de ordem social, que é a proteção após o parto sem perdas financeiras.

Daí partindo do pressuposto de que a proteção salário-maternidade se dá antes e depois do parto, tanto a mãe gestacional como a mãe biológica fazem “jus” ao percebimento do benefício, mas não em períodos concomitantes, e minha sugestão é de que o período que antecede o parto (28 dias) e parte do período gozo pós parto (30 dias) seja concedido a mãe gestacional e o restante a mãe biológica.

É de se consignar aqui que durante o percebimento do salário-maternidade, a segurada está proibida de desenvolver trabalho remunerado, pois isto está em desacordo com o objetivo da proteção à maternidade, que além da recuperação físico-psíquica deve haver a prestação de cuidado ao filho estabelecendo assim os vínculos afetivos.

Conclusão

Diante da situação fática inicialmente abordada, e se o objetivo da proteção previdenciária é o alcance da justiça social, as regras previdenciárias a respeito da proteção salário-maternidade precisam ser revistas para se adequarem a realidade, daí entendemos que tanto a mãe gestacional como a mãe biológica fazem “jus” ao benefício salário-maternidade, tal qual exposto neste artigo, e que a ausência de norma legislativa regulamentando referida matéria não pode servir como obstáculo a implementação da justiça social.

Bibliografia

BALERA, Wagner. Noções Preliminares de Direito Previdenciário. Editora Quartier Latin 2ª Edição – 2010. São Paulo.

________, Sistema de Seguridade Social. Editora LTr 7ª Edição – 2014. São Paulo.

COIMBRA, Feijó. Direito Previdenciário Brasileiro. Editora Edições Trabalhistas 11ª Edição – 2001. Rio de Janeiro.

HORVATH JR, Miguel. Salário Maternidade. Editora Quartier Latin – 2004. São Paulo.

________, Direito Previdenciário Editora Quartier Latin 10ª Edição 2014. 

Sobre o autor
Sérgio Reis Gusmão Rocha

Advogado mestre em Direito Previdenciário pela PUC/SP, especialista em Direito Previdenciário pela Escola Paulista de Direito, especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Braz Cubas, Diretor da Comissão de Direito Previdenciário da 103ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil - Vila Prudente São Paulo - Capital.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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