RESUMO
Este trabalho tem por objetivo oferecer uma breve análise a respeito das medidas provisórias, dos limites materiais que a Constituição impôs à sua elaboração e edição por parte do Presidente da República, bem como do controle jurisdicional de constitucionalidade que pode incidir sobre as mesmas.
Palavras-chave: Medidas Provisórias. Limites. Controle de Constitucionaldiade.
1. INTRODUÇÃO
Segundo a definição de Bernardo Gonçalves Fernandes, a medida provisória “é um ato normativo elaborado e editado pelo Presidente da República com força de lei, sob o fundamento de relevância e urgência e que deve ser apreciado pelo Congresso Nacional em prazo de 60 dias prorrogáveis por mais 60 dias”. Dessa forma, a medida provisória é um instituto que cria a possibilidade de o chefe do Poder Executivo, excepcionalmente, exercer uma função que tipicamente cabe ao Poder Legislativo, qual seja a função de legislar. Contudo, em observância ao princípio da separação dos poderes, a Constituição estabeleceu a relevância e a urgência como pressupostos para a elaboração de medidas provisórias, bem como estabeleceu que determinadas matérias não podem ser objeto do referido instituto, visto que as medidas provisórias não são submetidas ao mesmo processo legislativo pelo qual se submetem as outras espécies normativas.
O instituto da medida provisória, disciplinado pelo art. 62 da Constituição, foi criado com o intuito de ser um ato normativo excepcional, que desse ao Presidente da República a possibilidade de elaborar normas provisórias com força de lei em situações que urgência e relevância as quais não fosse possível aguardar sua submissão ao processo legislativo típico. Entretanto, o que se tem observado nos últimos anos, é a medida provisória sendo adotada de forma abusiva pelo Poder Executivo, sem que se atente para o caráter excepcional dessa espécie normativa.
Este artigo busca oferecer uma breve análise a respeito dos limites materiais impostos à elaboração e edição de medidas provisórias, bem como a respeito do controle jurisdicional de constitucionalidade exercido pelo Supremo Tribunal Federal sobre as mesmas.
2.1. LIMITES MATERIAIS
A emenda constitucional n. 32 de 2001, que acrescentou o § 1º ao art. 62 da Constituição, estabeleceu vedações ou limites materiais às medidas provisórias. Dessa forma, além dos pressupostos de urgência e relevância, as medidas provisórias também deveriam observar limites materiais expressos constitucionalmente, limites estes que vedam a deliberação de determinadas matérias mediante o instituto da medida provisória.
O entendimento do constituinte é que a medida provisória é uma espécie normativa de caráter excepcional, elaborada e editada pelo Poder Executivo como função atípica, atendendo a critérios de urgência e relevância. Dessa forma, não seria adequado que determinadas matérias, em razão de sua complexidade e importância, fossem deliberadas nessas circunstâncias, sem um processo legislativo comum, que passasse por todas as fases e procedimentos necessários e estabelecidos constitucionalmente, de forma a garantir que o ato legislativo seja amplamente discutido pelos parlamentares, em ambas as casas, bem como pela sociedade e, em seguida, seja submetido ao veto ou sanção presidencial.
Existem quatro grupos de matérias que não podem ser deliberadas mediante medida provisória. Primeiramente, a emenda constitucional n. 32/2001 veda a adoção de medidas provisórias para tratar de temas relativos à: nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral. De fato, seria inconcebível, no âmbito de um Estado Democrático de Direito e da ordem político-constitucional instituída pelo Poder Constituinte, que o Presidente da República pudesse elaborar atos normativos relativos aos referidos temas através de medida provisória.
A Constituição também veda a adoção de medidas provisórias para tratar de direito penal, direito processual penal e direito processual civil. O direito penal, sendo o ramo do direito que tipifica as condutas que lesam os bens jurídicos mais relevantes à sociedade e estabelece as formas mais gravosas de punição a quem pratica tais condutas, não pode ter suas normas elaboradas e editadas sem um processo legislativo que faça jus à sua gravidade. Ora, as normas de caráter penal estabelecem sanções que incidem diretamente sobre a liberdade do indivíduo, não sendo coerente que, no âmbito de um Estado Democrático garantidor dos direitos fundamentais, se permita que normas de direito penal sejam criadas através de medida provisória. O mesmo pode ser dito das normas de direito processual penal e civil, visto que o processo é uma garantia constitucional e uma das bases da democracia, sendo inaceitável que qualquer norma que verse sobre essas matérias sob nenhuma justificativa podem ser deliberadas em caráter de urgência, mediante um ato normativo excepcional originário do Poder Executivo, de vigência que pode ou não vir a ser permanente.
Outra matéria que não pode ser objeto de medida provisória, segundo a Constituição, é a relativa à organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, bem como as carreiras e garantias de seus membros. O Poder Judiciário, como poder autônomo e independente, não poderia ter suas normas regimentais e organizacionais deliberadas pelo chefe do Poder Executivo mediante um procedimento provisório e excepcional tal como é a medida provisória, sobretudo em respeito à separação dos poderes e ao princípio da não ingerência indevida. Já o Ministério Público, como fiscal da lei, também goza da mesma autonomia do Poder Judiciário e de forma análoga não pode ter seus regimentos e normas de organização, bem como as garantias institucionais da carreira, deliberadas por medida provisória.
Por fim, a Constituição proíbe a adoção de medida provisória para tratar sobre planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamentos e créditos adicionais e suplementares. Essa vedação parte da idéia de que o Poder Executivo não pode elaboras atos normativos que tratem de leis orçamentárias e contas públicas em razão dessa ser uma função que cabe ao Poder Legislativo. Além criar leis, o Poder Legislativo tem a função típica de fiscalizar o Poder Executivo, sobretudo no que se refere aos orçamentos e contas públicas. Seria inconcebível que o próprio Executivo fiscalize a si mesmo, usurpando uma função que constitucionalmente cabe ao Legislativo.
2.2. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
A medida provisória, sendo um ato normativo com força de lei, está sujeita a controle de constitucionalidade abstrato, sendo este um entendimento da jurisprudência tradicional do Supremo Tribunal Federal.
O controle jurisdicional de constitucionalidade das medidas provisórias ocorre em três níveis. O primeiro nível se refere aos pressupostos constitucionais que devem ser observados previamente à adoção da medida provisória (analisa-se se os pressupostos de relevância e urgência estão presentes ou não), em seguida, há o controle sobre a matéria do objeto da media provisória (analisa-se se a medida provisória está tratando de matéria que não admite deliberação por essa espécie normativa), e, por último, há o controle de constitucionalidade propriamente dito, em que o Judiciário analisa se a medida provisória está ou não em acordo com a Constituição.
Como é ressaltado pelo Ministro Celso de Mello, "A mera possibilidade de avaliação arbitrária daqueles pressupostos (relevância e urgência), pelo Chefe do Poder Executivo, constituiu razão bastante para justificar controle jurisdicional. O reconhecimento de imunidade jurisdicional, que pré-excluísse de apreciação judicial o exame de tais pressupostos, caso admitido fosse implicaria consagrar, de modo inaceitável, em favor do Presidente da República, uma ilimitada expansão de seu poder para editar medidas provisórias, sem qualquer possibilidade de controle, o que se revelaria incompatível com nosso sistema constitucional."¹
3. CONCLUSÃO
Desta breve análise pode se concluir que a medida provisória é um instituto jurídico destinado a ser uma exceção ao princípio da separação de poderes. É um ato normativo de caráter excepcional, provisório e temporário que, em razão de deliberar a respeito de assuntos que apresentam urgência e relevância em serem regulados em lei, podem ser elaborados pelo Presidente da República e vigor por 60 dias prorrogáveis por mais 60 dias sem ser submetido ao processo legislativo comum pelo qual todas as espécies normativas se submetem.
Contudo, a Constituição estabeleceu diversas limitações ao poder do Presidente de adotar medidas provisórias, de forma a manter a ordem político-constitucional, o Estado Democrático de Direito e a separação dos poderes. Assim, a medida provisória deve, primeiramente, atentar para os pressupostos de relevância e urgência, bem como aos limites materiais introduzidos pela emenda constitucional n. 32 de 2001, que disciplina que determinadas matérias, por sua importância e complexidade, não podem ser deliberadas mediante medida provisória. Além dos pressupostos e limites estabelecidos constitucionalmente, é admissível que haja controle jurisdicional de constitucionalidade sobre as medidas provisórias, de modo a evitar excessos, arbitrariedades e resguardar a ordem constitucional.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1998.
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de direito constitucional. 6.ed. Salvador: Jus Podium, 2014.
MENDES, Gilmar Ferreira; GONET BRANCO, Paulo Gustavo. Curso de direito constitucional. 10.ed. São Paulo: Saraiva, 2015
NOLASCO, Lincoln. Limites materiais à edição de medidas provisórias. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 96, jan 2012.